27 junho 2009

DIVINA

Estava hoje à procura de novidades de jazz numa loja quando ouvi uma música que me chamou a atenção. Perguntei quem cantava e responderam-me Melody Gardot. Não conhecia. Eu sei, eu sei. A capa engana. Não parece jazz, mas é. E do melhor, pelo menos algumas das músicas. As primeiras músicas do album são engraçadas, mas não são certamente nada do outro mundo. Porém, a faixa 9, "My one and only thrill", que dá nome ao album, é simplesmente divinal. Os arranjos são extraordinários e a música é do mais bonito que ouvi nos últimos tempos. Simplesmente perfeito. Vale a pena descobrir, principalmente se começar na nona faixa.

26 junho 2009

UM OUTRO MANIFESTO

Como era esperado, depois dos insultos gratuitos e das acusações de manipulação política em relação ao apelo à reavaliação dos grandes investimentos públicos, chegam-nos agora notícias que há um novo grupo de economistas a preparar um manifesto alternativo em que se irão defender os mega-projectos públicos. Sinceramente não surpreende e até provável que o novo manifesto venha a ter 30 ou 40 economistas para contrapôr ao primeiro, que, como se sabe, subscrevi. Afinal, como é óbvio, até seria possível arranjar um grupo de economistas marxistas (é verdade... ainda existem...) que defendessem uma nova nacionalização das principais actividades produtivas e empresas do país.
No entanto, nenhum outro manifesto retira o mérito do apelo que considerámos necessário fazer. Um dos objectivos do chamado manifesto dos 28 economistas, que tanto tem sido debatido nos últimos dias, era exactamente este: pôr o país a falar sobre as melhores formas de combater a crise, e se as grandes obras públicas são realmente necessárias no actual contexto. Só por isso, já valeu a pena, pois finalmente ouvimos os diversos campos a discutir as várias opções de política económica que se colocam ao país.

24 junho 2009

ATAQUE À CRISE

Agora que nos aproximamos a passos largos das eleições legislativas, seria bom que os diversos partidos nos apresentassem propostas claras sobre como tencionam combater a crise e o crescente aumento do desemprego. Devem investir nos grandes investimentos públicos? Cortar impostos? Aumentar os apoios às empresas e às famílias? Apoiar as empresas inovadoras? Ou devem tentar outras alternativas?
Neste sentido, o meu desejo é que os partidos façam um verdadeiro debate sobre as suas visões estratégicas para o país e não passem o tempo preocupados com um confronto de estilos ou com trivialidades que não levam a nenhum lado. Tenho a esperança que possamos levar a cabo esse debate, nem que não seja devido à grave crise que nos assola. Veremos se esta não é uma esperança infundada.

20 junho 2009

O APELO DOS ECONOMISTAS

Vale pena tecer as seguintes considerações adicionais sobre o apelo à avaliação dos investimentos públicos, que também subscrevo:
Em primeiro lugar, o que nos levou a redigir e subscrever o documento não foi nenhuma motivação política nem uma outra qualquer razão obscura. Entre os 28 subscritores, há pessoas de várias tendências políticas, independentes e ex-ministros de diversos governos, que têm certamente posições muito distintas em relação à política económica nacional.
Em segundo lugar, penso que é importante realçar que o que fez unir 28 pessoas com opiniões tão diversas foi o desejo de alertar os portugueses sobre a necessidade de reflectir um pouco mais sobre os grandes projectos públicos (TGV, aeroporto, e auto-estradas), e de realizar estudos mais aprofundados sobre estes mesmos projectos. Entendemos que, na conjuntura actual, o interesse nacional não é devidamente salvaguardado com o investimento publico em mega projectos de rentabilidade duvidosa. No mínimo, entendemos que deve haver uma reflexão adicional e um debate mais alargado sobre estes projectos.
Em terceiro lugar, certamente que os 28 subscritores do apelo têm opiniões distintas sobre a melhor forma de atacar os problemas estruturais da economia portuguesa. No entanto, o que é notável é que foi possível obter consenso entre tantos economistas. Uma das anedotas mais conhecidas dos economistas é que se colocarmos 5 economistas numa sala a discutir um problema de política económica, sairão de lá 5 recomendações diferentes. Aplicando o mesmo raciocínio, penso que é significativo que 28 economistas esqueceram as suas diferenças para assinar um documento conjunto sobre um tema da maior importância para o país.
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Finalmente, uma opinião mais pessoal. É óbvio que a intenção dos subscritores não foi criar uma arma de arremesso político. Houve inclusivamente o cuidado de avançar somente depois das eleições europeias. No entanto, também me parece evidente que este será um dos temas da campanha eleitoral, o que acho bem, pois é preciso que haja um debate alargado sobre o assunto. Porém, e independentemente das nossas preferências políticas, o que seria importante é que os principais partidos políticos portugueses defendessem de uma vez por todas um estudo mais abrangente destes mega-projectos públicos. Seria igualmente desejável que houvesse uma reavaliação das prioridades nacionais numa altura em que temos uma crise interna que já dura há quase uma década, o país sobreendividado tanto interna como externamente, bem como a maior crise internacional das últimas décadas. Não serão estes motivos suficientes para sermos mais prudentes na aplicação de escassos recursos públicos e privados? Não haverão alternativas melhores à aplicação destes fundos? Penso que sim, assim como defendi no meu último livro.

Fico à espera da vossa opinião sobre o assunto. Se desejarem ver o documento, bem como uns gráficos que preparámos sobre a situação económica actual, podem fazê-lo aqui.

15 junho 2009

PRIMEIRO PASSO

Benditas eleições europeias. Finalmente, parece que vamos ter um debate sobre o TGV e as grandes obras públicas. Hoje tanto o editorial do Publico como o DN se debruçam sobre a necessidade de construir o TGV. Ainda bem. Esperemos que se faça um debate sério e honesto sobre o assunto, pois, se o fizermos, os portugueses facilmente concluirão que a Alta Velocidade não se justifica no situação económica actual do país. Aliás, como já aqui falei várias vezes, o TGV é um autêntico disparate que não faz sentido no contexto em que nos inserimos.
No entanto, mesmo que, na melhor das hipóteses, o TGV seja suspenso indefinidamente, é importante que os partidos da oposição (e o próprio governo) apresentem propostas concretas (isto é, com números) sobre como é que pensam resgatar o país da crise estrutural em que nos encontramos. Ou seja, é ilusório pensar que os partidos da oposição podem tentar vencer as eleições legislativas somente numa plataforma anti-grandes obras públicas. Tem de haver propostas, políticas, e novas ideias que forneçam aos portugueses a esperança que algo pode e deve ser feito para combater a crise nacional. Se tal não for feito, a suspensão das grandes obras públicas como o TGV será apenas um pequeno passo na direcção certa. Um pequeno passo que, apesar de importante, não será suficiente para inverter a alarmante trajectória descendente dos últimos anos da economia portuguesa.

14 junho 2009

CRISE E BANCOS CENTRAIS

Perguntas de Luís Leitão, jornalista do jornal Expansão de Angola, sobre o papel dos bancos centrais na crise financeira internacional
A crise financeira que assola as economias há mais de um ano trouxe para a ribalta os bancos centrais, que se pautaram por políticas de forte intervencionismo pela via da injecção de moeda na economia, da redução das taxas de juro e até a nacionalização de bancos. Apesar de, certa maneira, todos os Bancos Centrais terem seguido estas políticas, quais são as diferenças que podemos encontrar no “meios operandis” do BCE, Fed, Banco do Japão e Banco de Inglaterra no combate à crise?
A Fed e o Banco da Inglaterra foram muito mais activos e tiveram uma intervenção mais contundente nos primeiros meses da crise, enquanto o BCE foi mais prudente. Em parte, esta diferença justifica-se com os próprios mandatos de cada um dos bancos. A FEd e o Banco de Inglaterra têm por mandato a estabilidade de preços, mas também o estímulo da economia, enquanto o BCE só tem por mandato a estabilidade de preços. Penso que essa foi uma das razões que levaram o BCE a demorar um pouco mais a baixar os juros do que os seus congéneres nos outros países mais desenvolvidos.
No entanto, vale a pena assinalar que desde meados de 2008 que os bancos centrais da OCDE cooperaram entre si para aumentar a quantidade de fundos na economia mundial. A crise do subprime levou a uma grande contracção da oferta de crédito e, por isso, os vários bancos centrais actuaram aumentando os fundos existentes.
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Se até há pouco tempo quase toda a gente falava na privatização dos bancos públicos, hoje são poucas as vozes que se levantam para defender esta ideia. Afinal, qual é o papel dos bancos de capitais públicos no meio desta crise? Funcionam um pouco como “a mão invisível” de governos e Bancos Centrais como forma de garantir a tão desejada “estabilidade” económica ou são mais que isso?
A crise financeira internacional veio demonstrar que manter um banco público pode ser útil, principalmente para países com um menor nível de desenvolvimento (e que, assim, estão sujeitos a maior volatilidade). O banco público pode ser utilizado em períodos de maior instabilidade como um garante de estabilidade financeira. Isto é, nestes casos, o banco público pode ser uma autêntica âncora estabilizadora do sistema financeiro. Um banco público pode igualmente servir de suporte ao próprio desenvolvimento económico, ao ser o financiador de projectos de importância estratégica e ao aparecimento de novas empresas. Mas, nem tudo são rosas. Se o banco público não mantiver uma certa independência na sua gestão, há sempre o risco de instrumentalizar em demasia a sua actividade. Por outro lado, é também importante realçar que a nacionalização de bancos privados nos países mais ricos é meramente temporária, até que estes bancos recuperam da crise dos últimos meses.

É conhecida a crispação entre Greenspan e o presidente norte-americano George W. Bush durante o seu mandato, chegando este a utilizar o seu discurso sobre o estado da união em 1991 para mostrar o seu descontentamento do papel da Fed ao dizer que "Temos observado demasiado pessimismo". Qual é a importância dos Bancos Centrais estarem forem da alçada do governo, de serem verdadeiramente independentes? É da máxima importância que isso suceda para o bem da economia ou ambas as organizações (Governo e Banco Centrais) podem/devem estar directamente ligadas?
É muito importante. Vários estudos demonstram que a taxa de inflação média é mais baixa nos países com bancos centrais independentes e que a estabilidade macroeconómica é maior. Para além do mais, quando os bancos centrais não são independentes, há sempre a tentação de um governo pedir ao banco central para estimular a economia antes de uma eleição, por forma a ganhá-la. O banco central pode fazê-lo quer baixando as taxas de juros, quer aumentando a quantidade de dinheiro na economia. Se tudo correr como esperado, a economia cresce, a inflação sobe e o desemprego diminui antes da eleição. Depois de ganhar as eleições, o governo e o banco central são forçados a re-estabilizar a economia e a controlar a inflação, o que irá fazer com que o crescimento económico baixe e o desemprego suba. O processo termina com uma situação semelhante à inicial, mas com maior inflação. Isto é, a situação macroeconómica deteriora-se. Por outras palavras, quando os bancos centrais não são independentes do poder político há sempre a tentação de criar ciclos económicos políticos que somente aumentam a instabilidade económica.
Um exemplo ainda mais dramático da ausência de independência dos bancos centrais é-nos dado pelo Zimbabwe, que viveu recentemente uma das maiores hiperinflações da história mundial. Se o banco central zimbabueano fosse independente do poder político é muito provável que o país não teria sido sujeito à tragédia económica e social dos últimos meses.

12 junho 2009

IRRESPONSABILIDADE AO RUBRO

O meu artigo no DN de ontem sobre as eleições europeias.
"No rescaldo das eleições europeias, alguns ministros do governo já vieram a público afirmar que o calendário da aprovação das grandes obras públicas era para manter. Não interessa o pequeno pormenor que as eleições legislativas se irão realizar em Outubro e que há sempre a possibilidade de o país mudar de rumo (com ou sem o PS). Não interessa que o partido do governo perdeu as eleições de forma decisiva. Não interessa que os portugueses mostraram um enorme desinteresse em relação à política actual ou que vociferaram um inédito voto de protesto através de um número recorde de votos brancos e nulos. Não interessa sequer que, até hoje, nenhum governo explicou aos portugueses as verdadeiras consequências financeiras e económicas de projectos como o TGV.
Afinal, se as grandes construtoras anseiam pelas grandes obras públicas, o que importam a opinião dos portugueses ou o interesse nacional? No entanto, a verdade é que, ao teimar nessa estratégia autista, contra tudo e contra todos, o governo faz um péssimo serviço ao país. Independentemente da cor política de cada um, as regras mínimas da prudência e da responsabilidade democrática seriam para o governo esperar pelo veredicto das eleições de Outubro antes de embarcar na adjudicação das grandes empreitadas. Para perceber porquê, basta lembrar que projectos como o TGV irão dar azo aos maiores custos financeiros e económicos desde a Guerra Colonial.
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Numa altura em que o endividamento da economia portuguesa atingiu níveis históricos e em que o mundo se debate com a maior recessão das últimas décadas, insistir na irresponsabilidade das grandes obra públicas como o TGV sem as submeter ao plebiscito dos portugueses é de uma irresponsabilidade atroz, com laivos de uma prepotência política indefensável. No mínimo, é uma atitude extremamente questionável.
Por isso, interessa perguntar: porquê tanta pressa? Por que não esperar quatro meses? Por que não perguntar aos portugueses a nossa opinião sobre o assunto, antes de decidir assinar contratos que terão enormes consequências financeiras para as próximas gerações? Ora, sabendo que os fundos europeus não vão ser redireccionados nuns meros quatro meses, sabendo que projectos como o TGV não se iniciarão a tempo para combater a crise actual, sabendo inclusivamente que o impacto de tais projectos no emprego é residual, por que é que o Governo quer aprovar as grandes obras públicas a todo custo antes de Outubro? Sinceramente, é difícil perceber o porquê de tamanha teimosia, a não ser que apelemos a certas teorias conspirativas de interesses obscuros que todos gostamos de negar.
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Esperemos assim que o cartão amarelo das eleições europeias sirvam para o governo reflectir e suspender temporariamente a adjudicação das grandes empreitadas. Pessoalmente, até acho que este governo teve o mérito de iniciar algumas reformas importantes para o futuro do país. Porém, ao insistir numa estratégia cega, demagógica e irresponsável nos projectos das grandes obras públicas, o governo ameaça hipotecar irremediavelmente o seu próprio legado político. E quem pagará a factura serão os portugueses, durante muitas e muitas décadas. E, claro, tal acontecerá mesmo que o governo actual não vença as eleições de Outubro.

INTERREGNO

Após um longo interregno da blogosfera por estar envolvido nalguns projectos que me têm consumido uma boa parte do meu tempo, finalmente regresso ao Desmitos. Nos próximos dias irei tentar responder aos vossos comentários e sugestões.