O meu artigo do PUBLICO da última sexta-feira:
Numa altura em que muitas das economias da OCDE já entraram em recessão, parece quase inevitável que, mais cedo ou mais tarde, o mesmo irá acontecer à economia portuguesa. É só uma questão de tempo. Ora, como o investimento público costuma ser a receita mais utilizada para combater recessões, à primeira vista poderia parecer que a melhor maneira de estimular a economia passaria pela aposta nos grandes projectos de investimento já projectados. Nada poderia estar mais errado. Por mais que os nossos políticos nos queiram convencer do contrário, o investimento público não é uma receita mágica para a retoma económica. Muito menos no Portugal actual. Desde a nossa adesão à Comunidade Europeia todos os governos têm apostado na modernização das infra-estruturas nacionais. Ainda bem, pois Portugal registava atrasos consideráveis em relação a outros países europeus. Hoje isso já não se passa. Bem pelo contrário.
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No entanto, a política de betão tem sido tão utilizada (e abusada) que já começam a haver indícios de um efeito de saturação do investimento público. Afinal, construir uma segunda auto-estrada entre Lisboa e o Porto não tem o mesmo impacto do que a construção da A1. Por outras palavras, há claros rendimentos decrescentes associados ao aumento do investimento público. É exactamente isto que nos indicam vários estudos académicos recentes. Claro que nem todos os projectos de investimento têm o mesmo impacto. No entanto, antes de continuar a teimar na miragem da Alta Velocidade, convém lembrar que só a ligação do TGV entre Lisboa e Porto irá custar tanto como o volume de negócios anual do grupo Sonae, um dos maiores do país. Isto na melhor das hipóteses. Será que não conseguíamos arranjar melhores soluções para montantes dessa envergadura? Parece-me que sim. E assim urge perguntar: qual é a alternativa ao investimento público? Ajudar as famílias e as empresas portuguesas, quer apoiando-as directamente na renegociação das suas elevadas dívidas junto dos bancos, quer através da introdução de maiores benefícios e reduções fiscais. Igualmente, em vez de embarcar na loucura financeira do TGV, apoiemos os nossos inovadores e empreendedores, e melhoremos os sistemas de incentivos à dinâmica empresarial. Apoiemos os nossos exportadores, não só através da concessão de incentivos e prémios de desempenho, como também através de generosos incentivos fiscais.
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Não tenhamos receio de quebrar imposições comunitárias limitadoras da ajuda estatal às empresas inovadoras, pois, nestes tempos recessivos outros estados-membros também o farão. E mesmo se continuarmos a pensar que a recessão tem que ser combatida com o aumento do investimento estatal, então concentremo-nos em projectos de rentabilidade menos duvidosa. Construamos mais hospitais, melhores escolas, melhores acessibilidades para o interior esquecido pelo poder central. Utilizemos parte dos 4,5 mil milhões de euros destinados à ligação Lisboa-Porto para atrair mais empresas de alto e médio valor acrescentado, para melhorar a competitividade fiscal das empresas, para reciclar os conhecimentos dos trabalhadores desempregados, e para conceder vantagens financeiras às empresas que se localizem nas nossas regiões deprimidas. Mais do que o Sebastianismo do TGV, mais do que o faraonismo da Alta Velocidade, mais do que a varinha mágica ilusória do investimento público, a crise terá que ser vencida com o condão do empreendedorismo e da inovação nacionais. Cabe ao Estado proporcionar as condições para que tal aconteça.