27 fevereiro 2009

DIREITOS DE PROPRIEDADE E SUCESSO NACIONAL


O relatório mais recente do Intellectual Property Rights Index foi agora publicado, revelando alguns dados interessantes sobre a economia nacional (ver tabela acima. Clique no quadro para visualizar melhor). Como já aqui referi várias vezes, rankings são rankings e devem ser lidos com algum cuidado. No entanto, vale a pena realçar algumas das ilações que se podem retirar deste índice em relação à economia portuguesa.
Primeiro, em relação à igualdade entre os sexos, estamos muito bem, obrigado. Segundo o índice, Portugal é um dos países do mundo onde a discriminação entre os sexos é menos significativa em termos de direitos sociais, divisões de heranças, e ao acesso a empréstimos bancários e à propriedade. Talvez o mesmo não se passe noutras áreas (no emprego, no diferencial salarial, na facilidade de obter licenças de maternidade/paternidade, etc), mas em relação aos direitos de propriedade não existe grande diferença entre os homens e as mulheres.
Segundo, o ambiente legal não é bom. A nossa Justiça é demasiado lenta, demasiado burocrática e os cidadãos têm pouca confiança nos tribunais. Não é de espantar. Como refiro detalhadamente no "Medo do Insucesso Nacional", a Justiça portuguesa é um factor de descompetitividade da economia nacional. Os índices de produtividade do sector são verdadeiramente lamentáveis, apesar de os actores do sistema judicial auferirem salários relativos bastante superiores aos seus congéneres europeus (sim, por mais incrível que pareça, é verdade). Este índice internacional de propriedade confirma mais uma vez a ineficiência da nossa Justiça, uma das piores da Europa Ocidental.
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Terceiro, também deixamos muitíssimo a desejar em relação aos direitos de propriedade física e intelectual. O registo de propriedade, e a protecção dos direitos de propriedade e intelectuais continuam a ter um "score" muito baixo ao nível europeu, diminuindo, mais uma vez, a atractividade da economia nacional.
Em suma, este relatório comparativo dos direitos de propriedade ao nível internacional vem confirmar novamente que o caminho para o sucesso nacional e para a melhoria da competitividade das nossas empresas passa mais pelo combate às ineficiências da Justiça, mais pela melhoria do nosso capital humano, mais por uma cultura organizacional mais competitiva e por melhores incentivos económicos, do que pelo investimento em obras faraónicas ou pelo tradicional processo de engorda do Estado.

26 fevereiro 2009

AINDA O MEDO DO INSUCESSO

Após o interregno do Carnaval, "O Medo do Insucesso Nacional" já começou a ser distribuído pelas livrarias do país. O livro já foi recomendado por Marcelo Rebelo de Sousa, que, no seu programa "As escolhas de Marcelo" o considerou "criativo, imaginativo e virado para o futuro". Se desejar ler um pouco mais do livro pode ir aqui ao lado, ao blogue "O Afilhado" do Tiago Moreira Ramalho. A revista EXAME do mês de Março também tem um longo excerto do capítulo 1.

23 fevereiro 2009

I DON'T WANT TO BE A POOR FARMER

A situação na China continua a agravar-se e já há muitos que culpam abertamente o governo chinês por não fazer mais para atenuar o impacto da crise. Como já aqui falámos, estima-se que mais de 2o milhões de chineses já perderam os seus empregos no último ano. A frase mais ilustrativa da situação dramática vivida por milhões de trabalhadores chineses é: “I don’t want to go back to being a poor farmer." Nem mais.

CRISE NO DESERTO

E a crise já atingiu seriamente uma das poucas luzes do Médio Oriente, o Dubai, que muita gente já começa a apelidar de um milagre de pés de barro. A dívida cresce e muitos dos projectos planeados já começam a ser cancelados.

MEDO ESTRANGEIRO

Era inevitável. Agora que a crise se começa a acentuar nalguns países, com as inevitáveis repercussões ao nível do desemprego, já se começam a fazer ouvir algumas vozes xenófobas. No Reino Unido, o governo trabalhista (convém não esquecer...) começa a dar sinais que irá introduzir políticas que irão dar preferência aos trabalhadores britânicos )('to put British workers first'). Muito interessante... E o que farão com os trabalhadores comunitários? Como é que vão eles controlar a sua entrada? Como é que será feita a discriminação? Como é que a Comissão Europeia e os restantes parceiros comunitários irão reagir?
Eu já vivi na Inglaterra alguns anos e a decisão não me espanta tremendamente. Apesar de haver uma maior percentagem de imigrantes no Reino Unido do que na generalidade dos países europeus, a verdade é que ainda existe bastante discriminação, principalmente em relação aos países do Sul da Europa e do Leste europeu. E isto só para falar dos trabalhadores europeus. O que é interessante constatar é que o próprio governo e as elites britânicas começam a ser invadidos por este sentimento discriminatório e xenófobo. Sem dúvida, por motivos políticos, pois as eleições estão à porta. Mesmo assim, um mau sinal. Um muito mau sinal.

INFLAÇÃO DE PODER

Afinal, a inflação no Zimbabwe não é só monetária. É política também. Assim, o novo governo de unidade nacional inclui 61 ministros e 10 governadores. Nada melhor para um país à beira do colapso económico. E um óptimo sinal de como as coisas poderão melhorar daqui para a frente.

21 fevereiro 2009

WHITE TIGER

O vencedor do Man Booker de 2008 foi "White Tiger", o primeiro romance do autor indiano Aravind Adiga. O livro relata a história de Balram Halwai, filho de um condutor de riquexó que morre de tuberculose (tal como acontece todos os anos com milhares de indianos pobres). Balram decide fazer tudo para escapar à sina do seu pai e da sua família, que pertence a uma das castas mais baixas desse país. Por isso, torna-se num condutor de um jovem patrão recentemente retornado à Índia
após uma estada em Nova Iorque. O livro relata então a relação entre Balram e o seu patrão, e transporta o leitor para as desigualdades e as contradições da Índia moderna. Depois de ler um livro, verá com outros olhos a simples entrada num centro comercial...
O texto está bem escrito e bem planeado e apesar de não ser um daqueles livros que se torna num clássico imediatamente, este é um romance que vale a pena ler, nem que não seja para perceber e conhecer um pouco mais a Índia de hoje em dia.
O livro será publicado em Portugal pela Editorial Presença no mês de Março com o título "O Tigre Branco"

20 fevereiro 2009

A CRISE QUE MAIS NOS INTERESSA

O meu artigo de hoje do PUBLICO:
"Numa altura em que a palavra crise anda na ordem do dia, é importante não esquecer que a crise da economia portuguesa não surgiu nem acabará necessariamente com a resolução da crise internacional. A economia nacional já estava em crise desde 2001 e os últimos anos foram os piores das últimas 8 décadas em termos de desempenho económico. Por que é que tal aconteceu? Porque a nossa adesão ao euro e a globalização vieram pôr em causa a competitividade de muitas das nossas empresas de menor valor acrescentado e com práticas concorrenciais baseadas em salários baixos. Neste sentido, o que a crise internacional veio fazer é agravar ainda mais a crise interna dos últimos anos e deitar por terra a tímida recuperação económica registada em 2007. É neste contexto que o combate à crise internacional não deve ser feito sem tomar em linha de conta os problemas de competitividade que muitos dos nossos sectores produtivos têm demonstrado.
E, por isso, temos duas possibilidades: ou aproveitamos a crise para tentar combater as nossas deficiências de competitividade ou continuamos a fazer aquilo que temos vindo a fazer. Se optarmos por fazer aquilo que temos feito nos últimos anos, é simples. Só temos de pedir ao Estado para aumentar ainda mais as despesas públicas, mesmo que estas sejam feitas sem critérios de avaliação económica rigorosos ou sem olhar para as reais possibilidades financeiras do orçamento estatal. A tentação para o fazer será grande, até porque as regras do moribundo Pacto de Estabilidade não se aplicam quando as economias se contraem mais de 0,75% ao ano. No entanto, se o fizermos, iremos certamente agravar a situação orçamental sem retirar os proveitos económicos que urge alcançar.
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É certo que o fundamentalismo do défice dos últimos anos não nos tem ajudado. Numa altura em que a política fiscal oferecia a única possibilidade de estimular a economia por parte do Estado, preferimos embarcar num excessivo e dogmático conservadorismo fiscal, que penalizou o crescimento económico e penhorou a retoma económica. Porém, agora que seremos “autorizados” por Bruxelas a aumentar o défice orçamental, será um erro tremendo embarcar numa estratégica de aumento desmesurado das despesas públicas. A verdade é que gastar por gastar não tem levado a lado nenhum e não é crível que seja agora que tal estratégia nos irá conduzir à terra prometida do desenvolvimento económico.
É óbvio que temos de tentar minorar o impacto da recessão, principalmente em relação ao emprego. Todavia, não é realista pensar que a cura para as recessões passa necessariamente pela engorda do Estado. Não passa. Pelo menos em Portugal, onde a dimensão do Estado já é considerável em relação aos nossos congéneres europeus. Com efeito, se o fizermos, corremos o risco de hipotecar ainda mais a competitividade da economia portuguesa com o combate à crise actual, pois iremos, por certo, pagar impostos mais elevados no futuro.
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O que é que podemos então fazer? A alternativa é aproveitar a maior flexibilidade que a crise nos irá proporcionar em relação ao Pacto de Estabilidade para melhorar a competitividade fiscal das empresas e, por consequente, as suas próprias capacidades concorrenciais. Um futuro mais risonho para a economia portuguesa não passa por um Estado ainda maior e mais gastador. Um futuro melhor passa por mais empresas inovadoras e produtivas. Para o alcançarmos, nada melhor que aumentar a competitividade fiscal das empresas e oferecer os incentivos necessários para que a inovação não seja uma palavra vã no nosso dicionário."

17 fevereiro 2009

OS CURSOS DA CRISE

Uma das previsões mais certas sobre os impactos da crise está realmente a materializar-se. Com o aumento do desemprego era de esperar que muita gente decidisse não entrar já no mercado de trabalho ou, então, melhorar os seus conhecimentos enquanto a crise não passa. A lógica é simples: se não arranjamos emprego, ao menos estudamos. Assim, era previsível que se registasse um número recorde de candidaturas a mestrados e doutoramentos um pouco por todo o mundo. É exactamente o que se está a passar. No Canadá tem havido um enorme influxo de novos candidatos e no Reino Unido o mesmo se está a passar. Ou seja, um dos efeitos potenciais (e interessantes) da crise actual é levar a uma melhoria das habilitações dos trabalhadores. Isto é, por incrível que pareça, a crise vai levar a uma melhoria do capital humano médio de muitos países.

A GRANDE CRISE?

Todos os dias ficamos a saber que a crise internacional se está a tornar cada vez mais grave e que as condições económicas se têm deteriorado de forma significativa um pouco por todo o mundo. Porém, até agora, se é verdade que a crise financeira actual é a mais séria desde 1929, ainda é cedo para saber se a crise económica será a mais grave desde a Grande Depressão. Por enquanto, a crise assemelha-se mais com as recessões dos anos 80 ou dos anos 70, apesar de o ritmo de contracção estar a ser mais acelerado do que nas recessões mais recentes. A grande diferença é que a crise é mais globalizada do que em recessões anteriores.

12 fevereiro 2009

O PLANO OBAMA

O plano Obama de estímulo económico foi aprovado pelo Senado americano. Agora é esperar que resulte. Porém, mesmo que resulte, os resultados só se irão ver dentro de 6 ou 12 meses. Só então é que poderemos saber melhor quão grande é esta crise.
Entretanto, se quiser saber o que alguns dos melhores economistas mundiais pensam sobre o plano Obama e a crise numa linguagem acessível a todos, vale a pena espreitar aqui.

GUERRA COLONIAL

Um dos websites mais interessantes que tomei conhecimento nos últimos tempos foi este dedicado à Guerra Colonial. Para além dos factos relatados e das imagens impressionantes, o website tem igualmente excelentes fontes estatísticas. Vale a pena ver.

CRISE NO BOTSWANA

O Botswana, o grande e surpreendente milagre económico africano dos últimos 40 anos, começa a sofrer o travo amargo da crise internacional. Porquê? Porque tanto o preço como a procura de diamantes (a maior exportação do país) têm diminuído dramaticamente nos últimos anos.

Já agora, quão grande foi o milagre do Bostwana? Enorme. Em 1966, o país tinha um rendimento médio por pessoa de 80 dólares. Hoje em dia, este valor é de 7,000 dólares. O sistema de saúde funciona bem (apesar de um impacto devastador do HIV/SIDA) e a educação é gratuita até aos 13 anos. Um exemplo que os economistas gostam sempre de enaltecer.

A CORRIDA DO REFUGIADO


A nossa alma caridosa nas Nações Unidas teve uma ideia original durante o Fórum Económico Mundial que se realizou em Davos, Suíça. António Guterres e a sua equipa decidiram fazer a "corrida do refugiado", na qual os participantes do congresso podiam passar por refugiados. Uma experiência única, sem dúvida. E que (surpresa!) foi altamente criticada por alguns dos intelectuais mais influentes do planeta, tais como William Easterly.
PS. Obrigado ao Paulo Ferreira por me ter alertado para esta notícia.

10 fevereiro 2009

NOVO LIVRO


Aí está a capa do meu novo livro, "O Medo do Insucesso Nacional". O livro é editado pela Esfera dos Livros e tem prefácio de Belmiro de Azevedo. Começa a ser distribuído no dia 19 de Fevereiro. Nos próximos dias irei falar um pouco mais sobre o seu conteúdo e as razões que me levaram a escrevê-lo. Entretanto, pode conferir algumas informações adicionais neste lugar.

NEW BOOK

In the postwar period, the Portuguese economy was the second-fastest growing European economy and the country was touted for being one of the most important economic miracles after 1945. After it joined the European Economic Community (EEC) in 1986, the success of the Portuguese economy continued, and Portugal was regarded as an example for other countries to follow in the process of European economic integration and good macroeconomic management. However, in the last 10 years, Portugal witnessed an extraordinary reversal of fortunes, after the country began preparing its adhesion to the European monetary union and the European Union initiated its process of expansion to Eastern Europe. The real exchange rate appreciated and the country’s exports lost competitiveness. An excessively expansionary fiscal policy aggravated budget imbalances and reduced the effectiveness of fiscal policy. Consequently, GDP growth stagnated, trend productivity growth fell, and the convergence process was interrupted.

This is the background behind my latest book, “The Fear of National Failure” which is a policy book that not only aims to analyze the trends of the Portuguese economy in the last few decades, but also discusses several policy alternatives to tackle the recent economic crisis.

The book proceeds as follows. The first part of the book surveys the main factors behind the success and the failure of the Portuguese economy since its adhesion to the European Community. Part II analyzes the economic miracle of the postwar period, and presents the reasons behind the success of the industrialization period. Thus, chapter 4 surveys the economic implications of Salazar’s (and Caetano’s) dictatorship (1926-1974) in the short and in the long run. It concludes that, in spite of unprecedented economic success, the dictatorship left two important structural deficiencies: first, there was low investment in human capital (which still persists today in relative terms), and, second, the regime restricted competition and hindered innovation (which impacted negatively the country’s average entrepreneurial practices). Both factors had considerable long-term consequences for Portugal’s performance in the long run. In turn, chapter 5 studies the economic legacy of the Portuguese empire, and debates the shock that the loss of the empire entailed for the Portuguese economy.

Part III and Chapter 6 present examples of entrepreneurial success, and try to understand the determinants of this success in the context of the Portuguese macroeconomy. Part IV investigates economic policy in the last 2 decades. Chapter 7 analyzes the trends in fiscal policy since 1974, especially in terms of the evolution of budget deficits and public debt. The chapter also emphasizes Portugal’s entry in the European Monetary Union and its impact on the country’s economic policy. Chapter 8 takes a closer look to the causes of the structural deficiencies of the country, especially with regards to the education system, average business practices, as well as the inefficiency of Portugal’s Justice system and its impact on competitiveness and productivity. Chapter 9 looks at Portugal’s business demography (birth, death and survival rates of enterprises).

Chapter 10 appraises the public policy choices of the last decade and presents policy alternatives to some of these policies. A major contribution of this chapter is a critical appraisal of the biggest and most important public works project since the start of democracy: the construction and adoption of high-speed trains in Portugal. After analyzing all the cost-benefit studies of the project, the book concludes that not only there is a high opportunity cost associated with the implementation of the project, but also its adoption will likely restrict even further the role of fiscal policy in the future (due to the increasing level of public debt and the greater budget deficits that the project will necessarily entail). The chapter thus looks at alternatives to the project (more tax and financial incentives to entrepreneurship, better investment in human capital, greater incentives for companies and individuals in the interior of the country) in order to spur Portuguese economic growth.

The last two chapters discuss a few more policy choices for the future. This is the official summary of the book:

“Throughout this book, the reader will get to know that causes of stagnation of the Portuguese economy. The author analyzes Portuguese economic growth, the economic consequences of the dictatorship of Salazar and the losses of the Portuguese colonial empire; [he also] diagnoses the reasons behind economic and social stagnation, including the low quality of education, the inßefficient of the Justice system, the State’s bureaucracy, and the investment in large public works of questionable usefulness; and presents cases of entrepreneurial success as well as stories of success.”

08 fevereiro 2009

OSCAR WAO

"The Brief Wondrous LIfe os Oscar Wao" de Junot Díaz foi um dos livros de ano de 2008, tendo ganho o Pulitzer Prize, entre outros prémios e reconhecimentos. O livro relata a história de um jovem americano de ascendência dominicana e da sua família. É mais um livro da tendência mais interessante da literatura anglo-saxónica, em que emigrantes ou filhos de emigrantes escrevem sobre as experiências das suas comunidades tanto no país de acolhimento como nos seus países de acolhimento, nos quais se incluem Jumpa Lahiri, Ha Jin, entre outros. Através da voz das suas personagens, Díaz relata a crueldade do regime de Trujillo que dominou a República Dominicana durante várias décadas até ser assassinado em 1961, bem como a voracidade sexual do ditador que transformou aquele país caribenho na primeira "culocracia" do mundo (nas palavras de Díaz). Só por isso o livro valeria a pena, pois a ditadura de Trujillo é apresentada aqui numa vertente muito diferente da escolhida por Mário Vargas Llosa no seu excelente livro "A festa do Chibo".
Porém, o romance vale muito mais. A escrita é muito boa, num estilo moderno e fluído, misturando frequentemente o espanhol e o inglês e, assim, representando exemplarmente o inglês falado pelas comunidades hispânicas nos Estados Unidos.
O livro será publicado em Portugal em Abril pela Porto Editora e o meu único voto é que a tradução faça justiça ao texto. Este livro é um clássico à nascença e vale mesmo a pena ler.

05 fevereiro 2009

VETO PRESIDENCIAL

O Presidente da República vetou a alteração da Lei Eleitoral, que acabava com o voto por correspondência dos emigrantes. Ainda bem. Sinceramente não consigo perceber a intenção de tal lei. Só quem não conhece a realidade de outros países (e das comunidades emigrantes) é que pode pensar avançar com uma lei que exigisse aos emigrantes o voto presencial nas eleições legislativas. A verdade é que votar é uma verdadeira aventura para quem reside no estrangeiro. Há muitíssimas dificuldades e obstáculos, que quase impossibilitam os votos dos emigrantes. Só para dar um exemplo, quem residir nas províncias canadianas ou nos estados americanos onde não existe um consulado teria que se meter num avião para ir votar ao consulado mais próximo (a várias horas de distância) ou viajar durante um ou dois dias de carro ou comboio para exercer o ser "direito de voto". Ou seja, ridículo. É assim que se pretende que os emigrantes votem? Ou será que a intenção é exactamente o contrário?
Ora, a alteração da lei peca por ser exactamente o contrário do que devia ser. Em vez de facilitar o voto dos emigrantes através de um maior incentivo ao voto por correspondência (como acontece na maioria dos países ocidentais), a lei penalizava ainda mais o voto não presidencial. Um contra-senso. Uma medida emanada directamente da Idade da Pedra. do tempo em que as novas tecnologias da informação ainda não existiam. Ainda bem que Cavaco Silva percebeu o tremendo erro que se estava prestes a cometer e vetou a lei.

ÁGUA SALGADA

A Austrália está a viver a maior seca da sua história moderna. Há zonas do país que quase não viram chuva nos últimos 10 anos ou, pelo menos, a chuva não tem sido em quantidade suficiente. Uma das regiões mais afectadas é a parte ocidental da Austrália, que inclui Perth, uma cidade de 2 milhões de habitantes. As coisas estão tão más que a cidade viu-se forçada em investir em fontes alternativas de obtenção de água, tais como a dessalinização da água do mar. A cidade tem tido algum sucesso nesta área e já há quem diga que outras cidades australianas vão seguir o exemplo de Perth. Quiçá se o mesmo não terá que ser feito no sul da Península Ibérica, principalmente se algumas das previsões relacionadas com as alterações climáticas se materializarem. (eu sei, eu sei, que este inverno não tem havido falta de pluviosidade. Bem pelo contrário. Porém, o que interessa em relação às alterações climáticas é o longo prazo, não um só ano).

"I SCREWED UP"

E aí temos os primeiros erros da nova administração americana. Depois do novo Secretário do Tesouro ter ser alvo de críticas em relação ao não pagamento de impostos, eis que a escolha de Obama para chefiar o ministério da Saúde americano, o ex-senador, Tom Daschle, foi acusado de não ter pago cerca de $140,000 de impostos e juros de mora. Perante a enorme pressão dos meios de comunicação social e do próprio Congresso americano, Daschle decidiu abdicar do cargo. Na sua entrevista mais recente, Obama já confessou que errou na nomeação. Mais concretamente, Obama disse: "I screwed up". Nem mais. É bom ver um presidente que admite os seus erros, mas, sem dúvida, esta situação não devia ter acontecido numa administração que se queria destacar e distinguir pela transparência e pela "maneira diferente" de fazer as coisas.

03 fevereiro 2009

ESTADOS UNIDOS DA ÁFRICA

Vinte países africanos chegaram a acordo para a criação de um governo federal africano, por forma a melhorar o posicionamento internacional do continente. A ideia parece interessante, principalmente porque augura uma nova era de cooperação num continente onde tantos antagonismos ainda persistem. Porém, será mesmo possível avançar com tal projecto? Sinceramente duvido. Não acredito que um governo federal africano se torne realidade num futuro minimamente próximo. No entanto, desde que tal iniciativa dê azo a uma maior cooperação, tudo bem. Para além do mais, seria bom que tal servisse para que o mapa de África fosse parcialmente redesenhado. É que é conhecido que um dos problemas do continente é a existência de inúmeros países inviáveis, principalmente aqueles que não têm acesso ao mar e estão rodeado de vizinhos em conflito, tais como o Chade ou a República Central Africana. É bem sabido que as antigas potências coloniais agravaram o problema ao criarem países artificiais sem respeitar as divisões étnicas. Por isso, há muitos que advogam a fusão de um ou mais países africanos para aumentar a sua influência e viabilidade política e económica. Talvez o diálogo originado pela iniciativa de criar um estado africano ajude a criar estados mais estáveis e mais viáveis. Se for assim, só por isso, esta iniciativa é de louvar.

20 MILHÕES DE DESEMPREGADOS

Um dos países mais afectados pela crise global tem sido a China. O crescimento económico ainda é relativamente forte, pelo menos comparado às restantes economias, mas o sector exportador tem sido de tal modo atingido que o desemprego não pára de crescer. Segundo as estimativas mais recentes, mais de 20 milhões (sim, 20 milhões de trabalhadores já perderam os seus empregos nos últimos meses). Dois Portugais. E estes são só os trabalhadores que regressaram às suas terras no campo. A estes ainda temos que adicionar os que decidiram ficar nas cidades, para os quais ainda não há estimativas. Um problema social colossal, que pode vir a ter consequências bastante desagradáveis para o regime chinês.

02 fevereiro 2009

AINDA O FREEPORT

O caso Freeport continua a dar que falar. Independentemente das nossas preferências políticas pessoais, há dois princípios que me parecem evidentes. Primeiro, mesmo que as investigações em curso o ilibem de qualquer culpa, dificilmente José Sócrates livrar-se-à do clima de suspeição em redor da sua pessoa. É mais ou menos natural que assim o seja, principalmente após o lamentável episódio da licenciatura que o envolveu.
Segundo, ninguém ganhará com todo este imbróglio. Se José Sócrates for considerado culpado, Portugal perde, pois nenhum país ganha quando o seu primeiro-ministro é acusado de corrupção. O PS perderá, certamente, mas também é difícil pensar que o PSD será o grande beneficiário. Sinceramente não sei se o principal partido da oposição estará preparado para que o poder lhe caia de bandeja nas mãos. Posso estar enganado, mas penso que não está. Além do mais, num cenário semelhante, um governo do PSD seria sempre acossado pela ideia que o poder não foi ganho pelo mérito, mas por sorte. Que força teria tal governo para reformar perante estas condições?
Acima de tudo, seria verdadeiramente lamentável se este caso resolvesse os destinos da governação, que devem ser resolvidos nas urnas e não nos tribunais. Sinceramente não sei o que pensar sobre o caso, pois não temos a informação completa sobre o que se passou. O que sei é que esta tremenda distracção não nos serve de muito. Numa altura em que devíamos estar a efectuar um debate sobre as medidas mais adequadas de combate à crise, permanecemos imobilizados por este folhetim político que nos ameaça arrastar para um mal-estar ainda maior do que o actual.

O AGRAVAMENTO DA CRISE

A crise económica internacional continua a agravar-se. Na última sexta-feira ficámos a saber que a economia americana contraiu-se 3,8% no último trimestre de 2008. Parece muito e é. De facto, é a maior contracção da economia americana nos últimos 27 anos. Mesmo assim, e por mais paradoxal que possa parecer, muitos economistas congratularam-se com as notícias. É que os mercados estavam à espera de, no mínimo, uma contracção de 5,5%. É caso para dizer: do mal, o menos. Ainda assim, é por demais evidente que a luz ao fundo do túnel não se vislumbra. As coisas vão certamente piorar antes de melhorar.

A SUPERBOWL DA COMIDA

Ontem realizou-se o maior espectáculo desportivo do ano na América do Norte, a chamada Superbowl, ou o jogo final do campeonato de futebol americano. A Superbowl é um enorme espectáculo mediático, que movimenta somas astronómicas de dinheiro e de recursos.
Estima-se que, durante o jogo, os americanos consumiram cerca de 15 milhões de quilos de "snacks", incluindo cerca de 6 milhões de quilos de batatas fritas, 4 milhões de quilos de tiras de milho, 2 milhões de quilos de salgadinhos e mais de 1,5 milhões de kg de nozes. A juntar a isso, estima-se que mais de 5 milhões de quilos de guacamole foram deglutidos pelos adeptos. A cerveja terá sido igualmente em abundância. Uma festa em cheio, sim senhor.
Ah, já agora, quem ganhou o título foram os Pittsburgh Steelers, com uma jogada alcançada no último minuto (a foto, retirada daqui, é do lance que ganhou o encontro).

A VERTIGEM DO EURO

Um artigo de opinião no Financial Times sobre o euro que vale a pena ler. O artigo é da autoria de Edward Chancellor e descreve algumas das principais conclusões de um livro sobre os 10 anos do euro. Aqui estão alguns excertos:
"In 1973 Derek Mitchell, a British Treasury official, observed that the loss of exchange rate flexibility would remove a simple method for rectifying imbalances between Europe’s economies. Without the option of exchange rate depreciation, once imbalances appeared “equilibrium could only then be restored”, declared Mr Mitchell, “by inflation in the ‘high performance’ countries and unemployment and stagnation in the ‘low performance’ countries, unless central provision is made for the imbalances to be offset by massive and speedy resource transfers”...
"Europeans are paying the price for the oversights of their former political masters. Since the euro came into existence a decade ago, consumer prices in Portugal, Ireland, Italy, Greece and Spain have risen by an average of about 20 percentage points more than in Germany. They have also experienced lower productivity growth. In addition, they have run large current account deficits and, with the exception of Italy, have experienced tremendous housing bubbles and credit booms. The ECB inadvertently contributed to the credit booms by setting an excessively low interest rate for fast-growing economies, such as Ireland.
In the past, the weaker European economies faced with the current crisis would have simply devalued their currencies. With that option closed by monetary union, their economic outlook appears dire..."
As former German Chancellor Helmut Schmidt says “the great strength of the euro [is] that nobody can leave it without damaging his own country and his own economy in a very severe way”.
"However, the alternatives aren’t pleasant. Germany might be forced to make reluctantly huge fiscal transfers to eurozone countries with large current account deficits, such as Spain. But this wouldn’t make them more competitive. As former Bundesbank president Karl-Otto Poehl says: “The other European countries have no choice [but] to . . . embark on a course of cost-cutting.”

O MAGALHÃES INDIANO

Já se sabia que o Magalhães não era tão original como o tínhamos pintado. Afinal, tanto o MIT como os taiwaneses têm computadores semelhantes com um custo a rondar os 100 dólares. Porém, agora a competição ficou ainda mais acérrima. A Índia, a braços com uma "explosão" do sector informático e com uma oferta quase ilimitada de engenheiros informáticos de qualidade a baixo preço, vem agora informar que pretende introduzir um computador portátil para crianças que irá custar a módica quantia de 20 dólares. Se o projecto resultar (em grande se...), a concorrência irá ter que se adaptar a preços tão competitivos. Quando souber das notícias, vamos lá ver se Hugo Chavez não cancela a sua encomenda de Magalhães e vai comprá-los à Índia... Esperemos que não.