23 dezembro 2010

PRENDAS DE NATAL

Aqui estão algumas sugestões para prendas de Natal para quem quiser perceber um pouco melhor a situação em que nos encontramos:




21 dezembro 2010

SOLIDARIEDADE EUROPEIA

A solidariedade europeia dá mostras de estar cada vez mais generosa. Resta saber o que irá acontecer quando a crise europeia se agravar nos próximos tempos.

REESTRUTURAÇÃO OU NÃO, EIS A QUESTÃO

Um artigo extremamente interessante de Barry Eichengreen, que também defende que a crise da dívida soberana europeia só pode ser ultrapassada com uma reestruturação das dívidas dos países em dificuldades (sim, Portugal está obviamente incluído). Aqui estão os principais pontos da argumentação de Eichengreen:
"The crisis countries have, in fact, shown remarkable resolve in implementing painful cuts. But one economic variable has not adjusted with the others: public and private debt. The value of inherited government debts remains intact, and, aside from a handful of obligations to so-called junior creditors, bank debts also remain untouched.
This simple fact creates a fundamental contradiction for the internal devaluation strategy: the more that countries reduce wages and costs, the heavier their inherited debt loads become. And, as debt burdens become heavier, public spending must be cut further and taxes increased to service the government’s debt and that of its wards, like the banks. This, in turn, creates the need for more internal devaluation, further heightening the debt burden, and so on, in a vicious spiral downward into depression.
So, if internal devaluation is to work, the value of debts, where they already represent a heavy burden, must be reduced. Government debt must be restructured. Bank debts have to be converted into equity and, where banks are insolvent, written off. Mortgage debts, too, must be written down.
These are reasonable objections, but they should not be allowed to lead to unreasonable conclusions. The alternatives on offer are internal and external devaluation. European leaders must choose which one it will be. They are united in ruling out external devaluation. But internal devaluation requires debt restructuring. To deny this is both unreasonable and illogical."
Leia o resto do artigo aqui.

CENÁRIOS

Um artigo interessante da autoria de Charles Wyplosz, um dos economistas que, nos últimos anos, mais tem investigado a economia da União Europeia. Wyplosz defende que os governos europeus dos países em dificuldades deviam começar já a preparar-se para os cenários menos desejáveis, incluindo a insolvência de um ou mais países do euro e/ou situações de incumprimento. Não é que seja certo que esses cenários aconteçam (apesar de a probabilidade de acontecerem é hoje bem mais elevado do que há uns meses atrás). No entanto, vale mais estar preparado para todas as eventualidades do que acabar por ser surpreendido, o que, decerto, terá consequências ainda mais nefastas para as economias em questão. Ou seja, vale mais prevenir (e preparar) do que remediar.
Aqui estão algumas citações do artigo de Wyplosz:

"According to the IMF, the financing needs of Greece, Ireland, Portugal and Spain over the last quarter of 2010 and 2011 – most of which will come due in the early part of 2011 – add up to € 320 billion. Add Italy and you get € 712 bn. It is understandable that the ECB has called for an enlargement of the European Financial Stability Fund (EFSF) which can provide up to € 440 bn. but this request has just been turned down by the Heads of State. The IMF can add some money at some notice, but this is limited. In short, it is unlikely that we have the means to quiet down market concerns if they lead to a refusal of providing fresh money. We have only a few weeks before we find out how the markets react; recent downgrades by the rating agencies, however, belie the official optimism."
 ...
"Undoubtedly, policymakers will respond that they cannot discuss openly these issues for fear of pouring oil on a burning fire. This is probably true, but one can hope that they are actively working on these complicated issues and will be ready when and if needed."

CRISE EUROPEIA (2)

A crise da dívida soberana europeia continua a alargar-se e a afectar outros países.

20 dezembro 2010

FINANÇAS SÓLIDAS

Crescemente acossada pelo rebentamento da bolha no mercado imobiliário, a Espanha tenta mostrar que o seu sistema financeiro é sólido.

AMENDOINS PARA PAGAR CONSULTAS

As coisas no Zimbabwe estabilizaram um pouco nos últimos tempos. Após meses de uma hiperinflação recorde e de um crescente caos económico, o acordo de partilha do poder entre Mugabe e a oposição trouxe um pouco mais de estabilidade macroeconómica ao país. E para acabar com a hiperinflação, o Zimbabwe adoptou o dólar americano como moeda de referência, o que permitiu uma descida da inflação para níveis abaixo de 4% ao ano. 
O problema é que o Zimbabwe tem poucas reservas e a oferta de dólares americanos permanece bastante escassa. Por isso, e continuando um dos legados da hiperinflação, uma percentagem bastante elevada da população do Zimbabwe opta pela troca directa para efectuar as suas transacções. A troca directa permanece assim bastante generalizada no país, sendo inclusivamente utilizada para pagar consultas nos hospitais. Como podemos ler neste artigo do New York Times, os hospitais chegam a reservar partes das suas instalações para armazenar os produtos agrícolas (amendoins, feijões, etc) que os doentes utilizam para pagar as consultas médicas. Mais uma das heranças da liderança iluminada de Mugabe... 
Já agora, vale a pena acrescentar que o Zimbabwe é um dos poucos países do mundo cujos níveis de vida e indicadores de educação e de saúde são piores do que há 40 anos.

AS DÚVIDAS DO BCE

O Banco Central Europeu expressa as suas dúvidas sobre o plano de resgate irlandês e os impactos que este terá para a estabilidade financeira da Zona Euro.

18 dezembro 2010

A CAUSA DA QUEDA

A razão que poderá conduzir a Espanha ao mesmo destino da Grécia e da Irlanda, e levar a Europa (e ao euro) a uma crise ainda bem mais grave.

17 dezembro 2010

QUE FIM PARA A CRISE EUROPEIA?

Um artigo interessante no Wall Street Journal de hoje que debate o futuro do euro e as opções que a Europa terá pela frente nos próximos tempos. Como o WSJ salienta, há 3 grandes possibilidades para superar a crise da dívida soberana europeia: 
1) uma união fiscal, na qual existirá uma maior integração das políticas económicas, bem como mecanismos de redistribuição fiscal entre os países mais abastados e os países em dificuldades. O grande problema desta possibilidade é que não parece haver grande interesse ou vontade política por esta opção, nem nos países da periferia europeia (que perderiam ainda mais soberania económica), nem nos países que teriam de financiar os mecanismos de redistribuição entre os Estados europeus.

2) a reestruturação da dívida dos países em dificuldades, na qual poderá haver uma insolvência parcial de um ou mais países e/ou o reescalonamento e a renegociação das dívidas soberanas nacionais. Neste caso, os países em dificuldades tentariam não só aumentar os prazos de pagamento das suas dívidas, como também tentariam conseguir maiores facilidades de pagamento para as mesmas dívidas. Como? Quer através da redução das taxas de juros associadas às suas dívidas, quer inclusivamente renogociando os montantes do endividamento. Por isso, neste caso, os detentores das obrigações destes Estados seriam forçados a partilhar os custos da reestruturação da dívida.

3) o fim do euro, ou a saída unilateral de alguns países da moeda única europeia. Uma saída unilateral do euro seria, no mínimo, conturbada. O problema é que, como já aqui salientei, há enormes custos políticos associados a esta possibilidade, bem como custos económicos muitíssimo altos para os países com elevados níveis de endividamento externo. Porquê? Porque uma desvalorização de 30% ou 40% da nova moeda faria aumentar ainda mais a já explosiva dívida externa dos países em dificuldades, o que poderia levar estes países a uma situação de insolvência. É ainda possível que uma eventual saída do euro pudesse dar azo a uma fuga de capitais do país que declarasse um abandono unilateral, e uma consequência corrida aos bancos desse país, o que, por sua vez, poderia conduzir a uma grave crise bancária. Ou seja, sair do euro acabaria por ser um remédio que poderia matar o doente, o que, como é evidente, não é aconselhável ou desejável.
O fim do euro não parece ainda ser um cenário provável. No entanto, a verdade é que este cenário já esteve bem mais longínquo. E como para o ano há cerca de 1,5 triliões de euros de dívida soberana que tem de ser emitida pelos vários países europeus, há um risco real de alguma coisa não correr bem. 2011 será assim um ano decisivo para o euro e para muitos dos países na união monetária.
Qual é a hipótese mais provável? É difícil de dizer com certeza absoluta. No entanto, se eu gostasse de apostas, não teria grandes dúvidas em afirmar que o mais provável é que, mais cedo ou mais tarde, se venha a fazer a reestruturação das dívidas dos países mais endividados. Uma reestruturação das dívidas dos países em dificuldades poderá não acontecer em 2011 ou 2012, mas não seria de todo estranho se chegássemos a esse cenário em 2013 ou nos anos seguintes. Tudo vai depender do que os líderes europeus decidirem nos próximos meses, do crescimento económico dos países em dificuldades e da saúde dos seus sistemas financeiros. Por outro lado, uma união fiscal ou o fim do euro parecem-me possibilidades bem menos desejáveis e bem mais difíceis de alcançar. Não me parece que a solução para a crise europeia será feita por aqui. Mas, pode ser que esteja enganado.
Independentemente do que irá acontecer, de uma coisa poderemos estar certos: ainda estamos bem longe de uma resolução para a crise da dívida europeia. Bem, bem longe.

16 dezembro 2010

50 MEDIDAS

Ainda não tive oportunidade para analisar com pormenor as 50 medidas apresentadas ontem pelo governo para estimular a economia, para apaziguar os ânimos dos nossos parceiros europeus e para tentar acalmar os mercados financeiros. Ainda assim, parece-me óbvio que as medidas agora apresentadas não são mais do uma vã tentativa para mostrar aos nossos parceiros europeus que o governo tem espírito reformista e para tentar despistar as atenções dos mercados sobre nós. Espero sinceramente estar enganado, mas também me parece evidente que essa tentativa do governo será, mais cedo ou mais tarde, infrutífera. Porquê? Porque após o que aconteceu ao longo deste ano, o governo português já não tem a mínima credibilidade nem interna nem externamente. Por isso, poucos irão acreditar que estas reformas é que serão "a sério". Segundo, não são medidas mais ou menos avulsas que irão evitar aquele que será o(s) grande(s) teste(s) do próximo ano, que acontecerá quando o Estado português terá de emitir mais de 25 mil milhões de euros em dívida pública. Só então é que iremos perceber quão "credíveis" são as medidas agora anunciadas aos olhos dos mercados. 
Nota: Já agora, vale a pena ler este post de Pedro Pita Barros sobre as 50 medidas anunciadas.

RETRATOS DO DESPESISMO (4)

De acordo com os dados mais recentes da OCDE, os pagamentos dos juros relacionados com a dívida pública nacional não param de crescer, uma tendência que já aqui mencionei várias vezes. Como podemos ver no gráfico abaixo, em 2011 os juros que o Estado terá que pagar pela sua dívida atingirá os 3,7% do PIB. Em 2012, o peso dos juros já será de 3,9% do PIB. Vale a pena lembrar que, em 1999, quando entrámos no pelotão do euro o peso dos juros da dívida do Estado era somente de 2,9% do PIB, e em 2005, este valor era de apenas 2,4% do PIB. Ou seja, em 2011 os juros que o Estado irá pagar pela sua dívida serão 1,5 pontos percentuais do PIB a mais do que pagava em 2005. Qualquer coisa como 2400-2500 milhões de euros. Um TGV Poceirão-Madrid por ano. Só em juros da dívida do Estado.
Isto se as coisas correrem como tinham sido anteriormente planeadas. Com notícias como esta, o mais certo é que o peso dos juros da dívida pública cheguem aos 4% do PIB já em 2011. 
O descontrolo das despesas públicas e o excessivo despesismo do Estado têm um preço, e esse preço chama-se impostos (bem) mais altos e dívidas públicas muito mais onerosas.

Pagamentos dos juros da dívida pública portuguesa em % do PIB, 1999-2012
Fonte: OCDE

PARTILHAR OS CUSTOS

A Irlanda já começa a dar os primeiros passos para obrigar os detentores de obrigações dos bancos em crise a partilharem os custos dos resgates dos bancos. Certamente o primeiro de muitos passos nesse sentido que iremos assistir nos próximos tempos na Europa.

15 dezembro 2010

SEMPRE A CRESCER

A dívida externa bruta portuguesa continua a crescer. Segundo os dados mais recentes do Banco de Portugal, em 30 de Junho de 2010, a dívida externa bruta nacional já tinha ultrapassado os 405 mil milhões de euros, cerca de 240% do PIB português. A dívida externa líquida ronda os 110% do PIB.
Como um gráfico diz mais do mil palavras, aqui está a evolução da dívida externa bruta portuguesa nos últimos 10 anos (os dados são trimestrais). Mais uma vez é visível que, contrariamente à retórica do governo, os problemas da economia nacional não surgiram com o dealbar da crise internacional. Os problemas começaram bem antes. O que houve foi uma total ausência de reconhecimento destes problemas por parte dos nossos governantes.  No mínimo, faltou vontade política para os resolver ou para os tentar combater. O resultado desta indesculpável negligência  e desta inaceitável inércia está bem à vista. Uma negligência e uma inércia que ainda iremos pagar muito caro. 

Dívida Externa Bruta Portuguesa _ 1999-Junho 2010
Fonte: Banco de Portugal

DESVALORIZAR OU NÃO?

Um artigo interessante a comparar a situação económica na Islândia (que sofreu uma enorme crise com o dealbar da crise financeira internacional, mas cuja moeda desvalorizou muito em 2008 e 2009) e a Letónia (igualmente muito afectada pela crise, mas que teimosamente manteve uma taxa de câmbio fixa com o euro). Segundo o autor, a desvalorização permitiu à Islândia mitigar alguns dos impactos negativos da grave recessão que se abateu sobre o país, enquanto o ajustamento na Letónia foi bem mais díficil.

MAIS AUSTERIDADE NA GRÉCIA

Mais um pacote de austeridade na Grécia. Mais cortes nas despesas e mais reduções salariais. As autoridades gregas estão a tentar fazer todos os possíveis para conseguirem cumprir os tectos fixados com o FMI e com os parceiros europeus. Porquê? Porque, se não o fizerem, a entrega de parte do empréstimo europeu para ajudar a Grécia poderá estar em risco. O empréstimo de 6,5 mil milhões de euros previsto para Dezembro já foi adiado para Janeiro e já há quem diga que uma situação de incumprimento será inevitável se os gregos não receberem 14 mil milhões de euros do empréstimo europeu e do FMI até Março. O que falta saber é se o incumprimento e/ou uma insolvência parcial da Grécia não serão mesmo inevitáveis independentemente ou não do pacote de ajuda europeia. A verdade é que a situação grega é de tal modo complicada que é difícil imaginar um cenário onde os gregos não terão de efectuar uma reestruturação e renegociação das suas dívidas. E quem diz os gregos diz outros países europeus em situações igualmente complicadas.

14 dezembro 2010

RELATÓRIO DE INVERNO

Aqui está o relatório mais recente da OCDE sobre a Zona Euro. Como era de esperar, as previsões não nos são muito favoráveis.

MALDITA DÍVIDA

Um dos países da OCDE menos afectado pela crise financeira internacional debate-se agora com problemas de... endividamento. No Canadá, os últimos números das dívidas das famílias e dos particulares foram agora publicados e as autoridades canadianas já declararam estar muito preocupadas com a evolução da dívida privada. Porquê? Porque o rácio dívida-rendimento já ultrapassou os 148%, um valor ainda mais elevado do que nos Estados Unidos, cuja dívida privada é considerada bastante elevada. Por isso, no Canadá já se diz que o Banco do Canadá irá brevemente aumentar os juros para tentar conter possíveis bolhas especulativas no mercado imobiliário e que têm contribuído para o crescimento da dívida privada canadiana. Veremos se as autoridades do país ainda vão a tempo de evitar algo mais dramático.

UNITED WE FALL

Foram agora publicados os dados mais recentes do Bank for International Settlements sobre a exposição dos vários países às dívidas da Grécia, de Portugal, da Irlanda e da Espanha. Os dados confirmam mais uma vez que há vários países altamente expostos às dívidas destes países. Aqui está um resumo da situação feita pelo blog Zero Hedge (como poderão ver, os gráficos do post são muito sugestivos):

"The country with biggest exposure to the PIGS is not surprisingly Germany with $513 billion, followed by France at $410 billion, Great Britain at $370 billion, and... the US at $353 billion. As for the next two dominoes to drop, Portugal and Spain, the countries whose banks are most at risk are Spain, France and Germany for Portugal and Germany, France and the US for Spain. Which explains why the Fed is now collaborating fully with the ECB from preventing the Portugues rout from hitting Spain, and makes us wonder just how many Spanish bonds the Fed may have been buying in recent weeks."

13 dezembro 2010

PALAVRAS SENSATAS (2)

Palavras sábias de António Barreto sobre a situação actual.

REFORMAS LABORAIS E PRECARIEDADE

É mais do que evidente que uma das reformas que será levada a cabo nos próximos tempos é a reforma das leis laborais. E não, não estou a falar de somente de tornar os despedimentos mais baratos. Estou mesmo a pensar (oh heresia!) numa maior flexibilização dos despedimentos individuais. A verdade é que, para o bem ou para o mal, uma flexibilização das leis laborais é simplesmente inevitável, quer seja com este governo (se assim for forçado pelos nossos parceiros europeus), quer seja com o próximo governo (o mais provável). Porquê? Porque Portugal é o país da OCDE com o maior índice de rigidez laboral ao nível dos despedimentos individuais, um factor que impede uma mais rápida criação de emprego e prejudica a competitividade das nossas exportações.
Ainda assim, e perante a inevitabilidade desta reforma, seria bom que houvesse mais elevação no debate sobre estas matérias. É que, nesta área, a retórica política e ideológica sobrepõe-se ao bom senso que estas questões deviam acarretar. E o bom senso (e inúmeros trabalhos empíricos) demonstra inequivocamente que as nossas leis laborais não só fomentam o desemprego, como também são a principal fonte da precariedade do trabalho no nosso país. Para percebermos porquê, vale a pena olhar para o gráfico abaixo, onde se vê que Portugal é um dos países da OCDE com maior incidência de trabalho precário (eixo horizontal), um facto que está intimamente ligado às nossas leis referentes aos despedimentos individuais (eixo vertical).
É igualmente visível que, contrariamente à percepção errada que existe entre nós, muitos dos países onde as leis laborais são menos rígidas (isto é, onde é mais fácil despedir trabalhadores individuais) são exactamente países que têm Estados Sociais fortes (p. ex, a Dinamarca ou o Canadá). Ou seja, flexibilizar as leis laborais não equivale a destruir o Estado Social. Bem pelo contrário. Ao promoverem uma mais rápida criação de emprego e ao fomentarem a competitividade das exportações, leis laborais menos rígidas contribuem para uma maior criação de riqueza, que poderá ser então utilizada para proteger o Estado Social. Afirmar o contrário é demagogia ideológica.


Precariedade, precariedade, precariedade deviam ser as palavras de ordem dos partidos de oposição ao defenderem a reforma das leis laborais. A reforma laboral é imperiosa porque, entre outras coisas, é preciso combater a precariedade e criar mais emprego. E a verdade nua e crua é que os “direitos adquiridos” são a principal fonte de precariedade do mercado de trabalho português. Os economistas do trabalho já sabem disso há muito tempo. Seria bom se os políticos nacionais e os portugueses também o soubessem.
 Fonte: Santos Pereira (2011) "Como Retomar o Sucesso"
(clique no gráfico para ampliar) 

12 dezembro 2010

SINAIS DOS TEMPOS (3)

Há uns anos atrás os nossos governantes faziam périplos pelos países estrangeiros para ajudar a vender os produtos portugeses e para tentar atrair investimento estrangeiro para o nosso país. Hoje em dia os nossos governantes fazem périplos pelos países estrangeiros para tentar vender a dívida do Estado. Ao que chegámos...

11 dezembro 2010

(ALGUMAS) PREVISÕES PARA 2011

Agora que nos aproximamos do final de 2010, é tempo de começar a fazer projecções para o próximo ano. Antes disso, interessa relembrar que todas as previsões devem ser lidas com a maior cautela. Não é à toa que os economistas têm tanta relutância em fazê-lo, pois sabem que as incertezas são muito consideráveis. Esta máxima é ainda mais pertinente nos tempos que correm, pois a crise internacional e a crise da dívida soberana europeia tornam o cenário de curto prazo ainda mais incerto e difícil de prever.
Feito o aviso, quais são então as principais projecções para o próximo ano? Comecemos com os cenários internacionais. É provável que 2011 continue a ser um ano mau para o Ocidente (incluindo Japão), e um ano bom para os países emergentes. Pelo menos é isso que nos dizem as previsões mais recentes do FMI e da OCDE, que indicam que o Ocidente registará um crescimento económico muito modesto, enquanto a China, a Índia, os seus países vizinhos, bem como muitos países da África subsaariana alcançarão taxas de crescimento do PIB acima dos 5% ao ano. Por outras palavras, o mundo está a mudar e já não é o Ocidente que está a servir de locomotiva do desenvolvimento. Bem pelo contrário. 
A nível nacional, o mais certo é que 2011 seja o ano em que a recessão regressará. Porquê? Por causa da austeridade a conta gotas que tem vindo a ser imposta no nosso país, e que mais não é do que o preço das irresponsabilidades que foram sendo cometidas nos últimos anos. É certo que uma recessão só é classificada como tal quando existem dois trimestres consecutivos de crescimento económico negativo. Porém, o mal-estar económico já dura há tanto tempo que é difícil destrinçar o que é estagnação e o que é recessão. O que sabemos é que o desemprego já está no nível mais elevado dos últimos 100 anos e que já está em curso uma nova vaga emigratória. Tudo o resto são detalhes. Como é óbvio, certamente que não será em 2011 que estas tendências serão invertidas. Bem pelo contrário. 
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Ainda assim, poderão haver surpresas. O sector exportador tem demonstrado um notável dinamismo nos últimos anos, de modo que é possível que o desempenho da economia nacional não seja tão mau como agora se antevê (isto se a procura externa se mantiver elevada). Esperemos que sim.
Em suma, as previsões para 2011 não são nada apetecíveis. Pelo menos para nós, para a Europa e para a América do Norte. O resto do mundo deverá ter um ano bom.
Apesar do cenário sombrio, não queria terminar sem uma palavra de esperança, aliás como convém antes de iniciarmos um novo ano. É verdade que esta é a maior crise económica nacional dos últimos 120 anos. É até possível que ainda não tenhamos batido no fundo. Porém, as coisas estão tão mal e o desalento é tal, que estou convencido de que a crise actual representa a maior oportunidade de reforma das últimas décadas.
Neste sentido, tenho poucas dúvidas que 2011 representará um novo começo para o nosso país. Um novo começo diametralmente oposto às irresponsabilidades dos últimos anos e que nos conduziram à lamentável situação actual. Um novo começo que nos faça atacar de uma vez por todas os grandes problemas nacionais (a crise das contas públicas, a nossa falta de competitividade, e a insustentável subida do endividamento externo) e que, por uma vez, leve em linha de conta o bem-estar dos nossos filhos, já tão sacrificados por causa do despesismo actual. Esperemos que sim. E esperemos que o próximo governo esteja à altura das dificuldades que nos esperam. 
Nota: Meu artigo de hoje no Notícias Sábado, que também já está reproduzido aqui

10 dezembro 2010

JOBS FOR THE BOYS

O meu novo post no Portuguese Economy é sobre um dos artigos mais interessantes que li ultimamente sobre a economia portuguesa e que prova inequivocamente que nos meses 3-6 meses que antecedem as eleições legislativas e nos 3-6 meses após as eleições, o número de contratações nas empresas públicas literalmente dispara, tal como podemos ver no gráfico abaixo (o período zero representa a data da eleição). Como era de esperar, as contratrações nas empresas públicas são ainda mais significativas quando o governo muda de cor. 
Gráfico_ Contratações nas empresas públicas antes e depois das eleições legislativas
  Fonte: Martins (2010), reproduzido com permissão daqui.

Como é óbvio, este compadrio tem enormes implicações para o despesismo do nosso Estado, bem como para o crescente endividamento das nossas empresas públicas. Não é à toa que os governos não conseguem controlar a despesa pública e não é à toa que as dívidas das empresas públicas continuam a aumentar cerca de 3000 milhões de euros todos os anos. 
E, como sublinhei no meu post, tudo isto tem enormes implicações para o próximo governo:
 
"It is widely expected that we will have general elections sometime in 2011 (hopefully sooner rather than later), after the presidential election is over and after the constitutional limits allow. It is also widely expected that there will be a government of a new "color"(to use Martins's terminology),  probably in coalition with a smaller party. Thus, the temptation to emulate the past will be there, with interest groups associated with the new parties in power pushing for new jobs for the boys.  Let's hope this does not happen. If it does, it would be simply unexcusable in times like these. The fact is that it is not worth changing the boys from pink to orange or even to blue just for the sake of doing it. Boys will be boys will be boys. And this "boy" culture and tradition is partly responsible for the sad state of our public  finances. Therefore, if the new government truly wishes to reform the State and get away from the sorry state of affairs that is taking place in Portugal right now, it must avoid, at all costs, the temptation to distribute new jobs for the boys in the State and in public companies. If it does so, the new government will fail and won't be able to implement a truly reformist agenda, something that Portugal desperately needs. Let's hope not. I am sincerely hopeful that next time will indeed be different (even if it is because we really can't afford to do otherwise)."
 
O post completo está aqui.

PAGAR PARA ENTRAR?

Afinal, os islandeses sempre vão pagar as dívidas dos seus bancos aos britânicos e holandeses. Será este o preço a pagar pela entrada na União Europeia?

E VIVA A REVOLUÇÃO CUBANA

Ah, os milagres da revolução cubana...

09 dezembro 2010

A VERDADE SOBRE A REFORMA DA JUSTIÇA

Nos últimos anos, ouvimos falar vezes sem conta da propagada reforma da Justiça, uma reforma que, é sem dúvida, urgente, e que foi uma das grandes bandeiras deste governo (assim como o PRACE e o Plano Tecnológico). O governo teve o mérito de discutir e propor um novo mapa judicial, e assim investiram-se centenas e centenas de milhões de euros em novos tribunais e "campus da Justiça". E qual foi o resultado de todo este investimento? Quais foram os frutos de todo este esforço? Poucos, muito poucos.
Para percebermos porquê, vale a pena debruçarmo-nos um pouco sobre as estatísticas da eficiência do sistema judicial, principalmente no que diz respeito aos casos pendentes nos tribunais e à duração média dos processos. E aqui o cenário não é definitivamente bonito. Se não, vejamos.
Comecemos com os casos pendentes. É mais sabido que este é um dos principais problemas do sistema judicial português. Existem igualmente um milhão a mais de casos pendentes actualmente do que existiam em 1995. Sim, leu bem, um milhão de casos mais do que em 1995.
Nos últimos anos, falou-se muito em combater este problema, mas os resultados foram, no mínimo, modestos. Como podemos ver no Gráfico 1, é verdade que o número de casos pendentes desceu ligeiramente entre 2006 e 2008, mas em 2009 retomou-se a tendência de subida dos últimos 15 anos. Só em 2009, foram 10,000 novos casos pendentes. Ou seja, de pouco nos valeram as centenas e centenas de milhões de euros no sector para fazer desentupir os tribunais das referidas pendências.

Gráfico 1_ Casos Pendentes nos tribunais portugueses _ 1992-2009
Fonte: Ministério da Justiça

Porém, as más notícias não se ficam por aqui. Se olharmos para os indicadores de eficiência do próprio Ministério da Justiça é interessante constatar que a taxa de eficiência dos tribunais portugueses em relação os processos recebidos e findos tem permanecido praticamente inalterada desde 1995. É exactamente isso que podemos observar no gráfico abaixo, que mostra que indicadores de eficiência judicial são bastante distintos da retórica política dos últimos anos.

Gráfico 2 _ Taxa de eficiência dos tribunais portugueses
Fonte: Ministério da Justiça

A duração média dos processos judiciais também tem aumentado de forma dramática, tendo aumentado de 13 meses em 1995 para 30 meses em 2007. 
E se nos compararmos aos outros países, a lamentável e sofrível ineficiência da Justiça portuguesa é ainda mais marcante e preocupante. Só para dar um exemplo,Portugal tem hoje quase tantos casos pendentes como a França e a Alemanha, que têm populações muito superiores. A grande maioria dos nossos indicadores judiciais deixam igualmente muito a desejar.
E por que é que isto interessa para a economia? Porque a Justiça portuguesa é um dos maiores factores de descompetitividade da economia nacional. O nosso lento e burocrático sistema judicial é um dos grandes entraves a um maior dinamismo e a uma maior eficiência económica. E, como estes indicadores mostram bem, não é por deitarmos centenas e centenas de milhões euros aos problemas do nosso sistema judicial que vamos alcançar progressos significativos nesta área. Muito pelo contrário. 
O que fazer? Uma verdadeira reforma da Justiça, sem fanfarra, mas com eficácia. Como? Seguindo as prescrições de alguns dos nosso melhores analistas, e que são analisadas em maior pormenor no meu novo livro. Mas isso fica para outra ocasião.

CARIDADE

Uma das modas (saudáveis) dos últimos tempos nos Estados Unidos tem sido a doação de uma parte das grandes fortunas de alguns bilionários americanos para obras de caridade (ainda agora surgiram mais 16).  Os americanos têm uma grande tradição nesta área, mas nos tempos mais recentes esta "moda" recomeçou com Bill Gates, propagando-se em seguida a outros filantropos. E em Portugal? Não seria bom que os nosso bilionários seguissem o exemplo dos americanos e fizessem o mesmo? Não seria interessante se os nossos bilionários e multimilionários fizessem pela África lusófona aquilo que Bill Gates e outros filantropos andam a fazer em outros países africanos? Champalimaud e da Fundação Manuel dos Santos fossem replicados ainda mais

08 dezembro 2010

A DESCOBERTA DA NASA

A "descoberta" anunciada pela NASA na última semana já começou a ser disputada.

BOAS NOTÍCIAS

Os resultados do PISA 2009 divulgados ontem são, sem dúvida, boas notícias. É certo que ainda é cedo para se saber todos os pormenores referentes à melhoria dos resultados dos(as) alunos(as) portugueses(as). (Pessoalmente, entre outras coisas, gostaria de saber um pouco mais sobre a amostra das 212 escolas portuguesas em que o inquérito foi feito). É igualmente verdade que ainda é cedo para se saber se os progressos agora alcançados serão mantidos no futuro (o PISA 2012 será assim fundamental para percebermos se os resultados agora divulgados foram extraodinários ou se se enquadram numa tendência de progressão assinalável). No entanto, parece-me uma questão de elementar bom senso dar os parabéns aos professores e ao Ministério da Educação por finalmente termos um indicador de qualidade educativa que revela um claro progresso em relação aos anos anteriores. Agora o que há a fazer é manter o esforço efectuado até aqui e tentar melhorar ainda mais no PISA 2012.
Porquê? Porque apesar da progressão registada, a verdade é que ainda há muito para andar para ficarmos satisfeitos com os resultados alcançados. Ainda estamos abaixo da média da OCDE em todos os indicadores de desempenho educativo, e não nos podemos esquecer que continuamos a ter a terceira taxa de abandono escolar mais alta da OCDE (à frente do México e da Turquia), e que temos ainda os mais baixos anos de escolaridade média de toda a União Europeia.
Isto não quer dizer que os resultados divulgados ontem não são de enaltecer. Bem pelo contrário. No entanto, de nada nos valem estes resultados se o esforço de melhoria dos indicadores da qualidade educativa não for continuado nos próximos anos.
Dito isto, analisemos então os rankings de desempenho nacional em relação aos restantes países da OCDE. Comecemos pela leitura. Como podemos ver no gráfico 1, nos indicadores de leitura, Portugal já se encontra bastante perto da média da OCDE, e à frente de países como a Itália, a Eslovénia, a Grécia, a Espanha, Áustria e a República Checa, e já não muito longe de países como o Reino Unido e a Dinamarca. Este é um dos nossos melhores indicadores e que já tem vindo a progredir desde o início da década.

Gráfico 1 _ Resultados do PISA 2009, leitura

Em relação à matemática, os indicadores do PISA 2009 são igualmente animadores, pois não só registámos resultados quase 5% superiores ao obtidos em 2006, mas também porque, como podemos ver no gráfico 2, a média obtida pelos alunos portugueses é praticamente igual à média da OCDE, e acima da Espanha, da Itália e da Grécia, e empatada com a Irlanda e com os Estados Unidos.

Gráfico 2 _ Resultados do PISA 2009, matemática

Finalmente, em relação à ciência, as comparações ainda não nos são tão favoráveis, mas, mesmo assim, os resultados denotaram um progresso assinalável, na ordem dos 4%, em relação a 2006. Mais concretamente, os resultados dos alunos portugueses em Ciência estão acima dos resultados alcançados pelos alunos do Luxemburgo, da Grécia, da Espanha, da Itália e da Eslováquia (gráfico 3).

Gráfico 3 _ Resultados do PISA 2009, ciência


Em suma, uma primeira análise dos resultados do PISA 2009 só nos podem deixar satisfeitos. Ainda há muito para andar, mas, pelo menos, os primeiros passos de progresso significativo já parecem ter sido dados. Veremos se estas tendências se mantêm no futuro. Esperemos que sim. Nos próximos dias continuarei a analisar os resultados do PISA 2009.

O EXEMPLO CHINÊS

Um dos factos mais salientes dos indicadores educativos do PISA é que os rankings são liderados por dois países asiáticos, a China (na cidade de Shanghai) e a Coreia do Sul, logo seguidos pela Finlândia. Por que é que os asiáticos conseguem desempenhos tão bons? O Financial Times de hoje apresenta algumas razões. No entanto, também me parece que tal proeza se explica em parte pelas estruturas e pelas culturas educativas asiáticas, muito distintas das nossas. Mais concretamente, os alunos asiáticos trabalham, em média, bastante mais do que os alunos ocidentais. Como a literacia funcional de países como a China passa pela memorização e mecanização entre 2000 e 3000 caracteres, os alunos são forçados desde muito novos a trabalhar muito mais do que nos países ocidentais, onde é bastante menos penoso aprender a mecânica do alfabeto. É sabido que em países como a China, até os alunos da primeira classe estudam e aprendem caracteres até altas horas da noite, muitas vezes até às 22h ou 23h, trabalhando afincadamente durante horas a fio. Em claro contraste, nos países ocidentais, a cultura educativa predominante agora preconiza que o ensino deve ser "divertido" e não feito à base de mera repetição ou memorização. A enorme diferença em horas de estudo reflecte-se, em parte, nestes desempenhos educativos do PISA.
Quer isto dizer que a cultura educativa asiática é superior à ocidental? Não necessariamente. Talvez os dois sistemas só enfatizem valores diferentes. E se os estudantes asiáticos costumam trabalhar bem mais do que os ocidentais (por exemplo, nos programas de doutoramento e de mestrado) também não deixa de ser verdade que os estudantes ocidentais são, em média, mais criativos e tem mais espírito crítico do que os seus congéneres orientais. Para além do mais, sistemas educativos ocidentais como os da Finlândia ou do Canadá continuam a estar no top 5 dos rankings do PISA, apesar de as horas de estudo médias nestes países serem bastante inferiores à média asiática, e apesar destes sistemas (pelo menos o canadiano) darem uma grande ênfase à necessidade do ensino ser "divertido", isto é, sem obrigar as crianças a memorizar ou a decorar conceitos que as aborreçam.
Em suma, os dois sistemas têm vícios e virtudes. Nenhum me parece melhor ou ideal. Contudo, perante os indicadores do PISA, é muito provável que nos próximos anos apareçam ainda mais estudos comparativos entre os dois sistemas. E todos só temos a ganhar com isso.

BLOG REVELAÇÃO DO ANO


O Desmitos e o Portuguese Economy foram ambos nomeados para a categoria "Blog Revelação do Ano" pelo programa "Combate de Blogs" da TVI. Gostaria de agradecer a todos(as) a confiança depositada, bem como convidá-los(as) a votar nos blogs do ano no site do programa.

07 dezembro 2010

CUSTOS DA INSOLVÊNCIA

Às vezes ouvimos dizer que as dívidas dos países são como as dívidas das famílias, pois as consequências de um endividamento excessivo são parecidas. Será verdade? Não existirão diferenças? Claro que sim: existem semelhanças e também diferenças. Comecemos pelas semelhanças.
Quando o nível de endividamento é baixo, conseguir crédito a taxas pouco penalizadoras é relativamente simples, desde que existam rendimentos e/ou activos que possam servir de garantia. Porém, quando as famílias ou os Estados ficam demasiado endividados, a única forma de alcançar mais crédito é estar disposto a pagar juros mais altos ou taxas mais onerosas. É exactamente isto que nos está acontecer actualmente.
Porém, se chegarmos a um ponto em que as dívidas crescem mais rapidamente do que os rendimentos familiares ou do que o PIB nacional, a dívida torna-se insustentável e o incumprimento torna-se mais ou menos inevitável. E é aqui que começam as diferenças entre o endividamento familiar e nacional. Neste cenário, para as famílias pouco mais restará do que vender os seus bens e activos e declarar a insolvência. É provável então que os credores tentem recuperar os seus créditos nos tribunais ou por outros meios, a dívida terá que ser reestruturada, e as famílias ver-se-ão sem acesso aos mercados de crédito por uns anos. Os países também podem entrar em insolvência, mas, habitualmente, os credores não vêm atrás de nós, invadindo-nos o país para poderem cobrar as nossas dívidas.

E o que é que acontece quando os países não conseguem pagar as suas dívidas? Esta é uma questão que nos interessa, visto que as dificuldades actuais foram em parte provocadas pela nossa explosiva dívida externa, que já ultrapassou os 405,6 mil milhões de euros (quase 3 vezes o nosso PIB).
Ora, há quatro grandes custos relacionados com o incumprimento da dívida de um país. Primeiro, os países incumpridores perdem credibilidade e reputação junto da comunidade internacional. Segundo, as exportações e as importações dos países incumpridores tendem a diminuir após uma insolvência. Terceiro, o incumprimento é associado a um período de menor crescimento económico. Quarto, os governos responsáveis pelo incumprimento quase sempre perdem as eleições seguintes.
Por incrível que pareça, e contrariamente ao que costuma acontecer com as famílias e com as empresas, todos estes custos são essencialmente de curto prazo, tendo uma duração média de 2 a 3 anos. Passado a turbulência do incumprimento, quase sempre o crescimento económico reaparece, as exportações renascem e a perda de reputação é invertida. Ou seja, os custos económicos rapidamente se dissipam nos anos seguintes. Por isso, os grandes custos do incumprimento são políticos. Isto é, os governos são os que pagam a principal factura do incumprimento. É que os eleitores não costumam perdoar aos governos que conduziram o país para a humilhação de um incumprimento ou para uma situação em que o FMI é chamado a intervir. E é por isso que os governos costumam fazer o que podem para evitar este maldito cenário. 

Nota: dois artigos meus publicados no Notícias Magazine, mas combinados neste post.

06 dezembro 2010

DÍVIDA PÚBLICA E CRESCIMENTO ECONÓMICO

Em 2011, a dívida pública portuguesa em percentagem do PIB será a mais elevada dos últimos 160 anos, batendo o anterior máximo registado na última década do século 19, quando o país foi forçado a declarar uma bancarrota parcial.
E repare-se que este valor da dívida pública não inclui sequer as dívidas das empresas estatais (que já ultrapassaram os 23% do PIB), nem as parcerias público-privadas (a maior parte das quais começará a ser paga depois de 2013 e cujos encargos futuros já totalizam cerca de 30% do PIB).
Quais as consequências deste elevadíssimo endividamento público? Menos crescimento económico e ainda mais incerteza quanto ao financiamento externo. Há inúmeros estudos que apontam muito claramente que o crescimento económico tende a baixar mais de um ponto percentual quando a dívida pública ultrapassa os 90% do PIB, e que mostram que a margem de manobra da política económica se torna mais reduzida. Os países endividados também ficam mais vulneráveis nos mercados financeiros. Obviamente, não é crível que Portugal será excepção a estas tendências.

Nota: Declarações que fiz ao semanário SOL sobre o impacto da dívida pública no crescimento económico.

VISTO DE FORA (4)

A crise da dívida soberana da Europa e o futuro do euro continuam a dar que falar. Aqui está mais uma análise:
“We’re going to get a continuation of the problems that Ireland, Portugal, Spain and others are suffering... The fundamental issue is these are countries that have relatively large debts, large budget deficits, large current-account deficits, they don’t have their own currency and they can’t cut interest rates. The only way they can get out of this is to have significant recessions.”

SINAIS DOS TEMPOS (2)

Quando o Wall Street Journal e alguns economistas de renome começam a olhar para a América Latina para tentar perceber o que é pode e deve ser feito em relação à crise da dívida europeia, não é difícil chegar à conclusão de que estamos a viver tempos verdadeiramente extraordinários.

VISTO DE FORA (3)

Uma visão de fora que mostra bem a percepção que os outros têm de nós:
"Portugal is seeing all sorts of its economic dynamics go into reverse, except: “The only thing that is not likely to move in reverse is debt levels. There are two main reasons for this. First, the measures the government are adopting to reduce the fiscal deficit will likely result in a deflationary dynamic, boosting the debt-to-GDP ratio.
“Second is Portugal’s strong reliance on international investors to fund its debt. 80% of Portugal’s public debt is held by foreigners (Portugal is very similar to Ireland in this respect), and its total external debt position amounts to 90% of its GDP. The deflationary correction elicited by the austerity measures will in itself be a reason for outside investors to stay away from Portuguese debt.
“This will continue to be a source of vulnerability because it leaves the country exposed to the continuing risk of having financial markets shutter to its debt. Portugal’s government debt, at 82% of GDP, currently sits at less than that of Greece (126%) and Ireland (almost 100%). Yet adding in corporate and private debt, Portugal’s debt-to-GDP ratio rises to over 250%. Foreign investors are unlikely to tolerate such situations for much longer. It thus likely Portugal will have to apply for an EU/IMF bailout in a matter of weeks rather than months.”

PORTUGUESE ECONOMY

O blogue Portuguese Economy voltou ao activo. Uma boa notícia.

05 dezembro 2010

DE DESASTRES ANUNCIADOS A MILAGRES PROPAGADOS

Nos últimos anos, o mundo tem assistido a um dos mais rápidos e mais impressionantes milagres económicos da História universal: os milagres económicos de países como o Brasil, a China e a Índia. É verdade que a emergência destes países na cena internacional tem despoletado todo o tipo de reacções e de receios, devido ao peso e influência que estas economias têm no mundo. No entanto, vale a pena recordar que há apenas uma ou duas décadas atrás ninguém ou quase ninguém acreditava que o futuro próximo destes países seria risonho ou sequer promissor. Bem pelo contrário. Durante décadas, o Brasil foi caracterizado como o país do futuro, cujo futuro era sempre adiado por causa da incúria dos seus governantes e pelo desperdício dos seus recursos. A China permanecia como um gigante de pés de barro, onde líderes carismáticos condenavam os seus súbditos a uma vida de privação e de pobreza. E 40 anos após a independência, a Índia permanecia num ritmo vagaroso de desenvolvimento, o que levou muitos analistas a apelidarem de forma pejorativa a chamada “taxa de crescimento hindu".
Passadas umas décadas, tudo mudou. A China está a caminhar a passos largos para se tornar na maior economia do mundo (mas não a mais rica), a Índia cresce a taxas elevadas impulsionada pelo dinamismo do sector das novas tecnologias, e até o Brasil alcança taxas de crescimento económico capazes de rivalizar com os chamados milagres do Sudoeste asiático. Os extraordinários milagres económicos destes países (principalmente da China) são visíveis no gráfico 1, onde se apresentam os dados do PIB por habitante (ou per capita) do Brasil, da Índia e da China em paridades de poder de compra. Como podemos ver, durante a grande parte do século 20, os rendimentos por habitante médios da China e da Índia mantiveram-se quase constantes, e assim estes países continuaram a ser dos países mais pobres do mundo.
Por sua vez, o Brasil registou um período de forte crescimento económico na década de 60 (aquando da industrialização do país), mas estagnou entre os meados da década de 70 e a década de 90. As razões desta estagnação são bem conhecidas e relacionam-se não só com uma elevada instabilidade macroeconómica (que deu azo a taxas de inflação superiores a 300% na década de 80 e de 750% nos primeiros anos da década de 90), mas também com o falhanço estrondoso da política de industrialização, que fomentou a criação e a manutenção de monopólios estatais altamente ineficientes.

A DÍVIDA "SOBERANA" AMERICANA

A crise da dívida soberana não se restringe à Europa. Na América, há inúmeros estados (incluindo alguns proeminentes, tal como California, Illinois, New Jersey e New York) e municípios cujas dívidas poderão tornar-se insustentáveis. Há já quem anteveja crises e bailouts nos EUA assim como está agora a acontecer na Europa.

LEGADO DA DÍVIDA EXTERNA

Uma das frases do meu próximo livro: 
"O pesado legado da dívida externa é, porventura, o maior desafio que iremos enfrentar nos próximos anos."

CARTA DE DUBLIN

Uma carta aberta de um dos melhores economistas (e historiadores económicos) irlandeses, Kevin O'Rourke, sobre o bailout àquele país e o que significou a "chegada" do FMI. Vale a pena ler, até por tudo o que nos poderá acontecer num futuro mais ou menos próximo.

04 dezembro 2010

O FRACASSO DO PRACE

Uma das principais bandeiras do primeiro governo de José Sócrates foi a chamada reforma do nosso Estado, o PRACE (Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado). Prometeu-se com grande alarido uma maior racionalização de recursos, um Estado mais eficiente, e poupanças consideráveis na despesa pública. Cinco anos volvidos e sabendo que há uma elevada probabilidade de o excessivo despesismo do nosso Estado nos conduzir a uma grave crise de liquidez (ainda pior do que os problemas de financiamento que hoje se fazem sentir), interessa perguntar: onde está a racionalização dos recursos prometida? Onde estão as poupanças publicamente propagadas? Onde estão as despesas públicas mais baixas? Onde está o combate ao nosso Estado despesista?
Como é evidente, o PRACE não deu azo nem a poupanças significativas, nem deu azo a uma verdadeira reforma da Administração Pública. A verdade é que o PRACE foi (e é) um tremendo fracasso. A prova disso é o despesismo rompante e o inaceitável descontrolo das despesas públicas nos últimos anos. Um fracasso proporcional à propaganda que o rodeou, aliás como aconteceu com o já olvidado Plano Tecnológico. Mais um fracasso colossal na lamentável tragicomédia que foram as irresponsabilidades dos últimos anos.

03 dezembro 2010

DESIGUALDADE EUROPEIA

O mapa das desigualdades europeias é bem revelador das enormes desigualdades que existem no nosso país. Desigualdades que, como já aqui referi, têm vindo a crescer nos últimos anos.


Nota: para que não conhece, o coefficiente de Gini é o indicador mais utilizado das desigualdades de rendimento e varia entre 0 (perfeita igualdade) e 100 (desigualdade perfeita ou total). Valores acima dos 40 são habitualmente considerados elevados para os países desenvolvidos.
Nota 2: Mapa retirado daqui.

ASSIMETRIAS REGIONAIS (2)

Alguns leitores chamaram-me à atenção de que os números que apresentei sobre o PIB per capita das regiões (NUTS) portuguesas eram de certa forma distintos aos números que eu já tinha apresentado em outras ocasiões. Têm toda a razão. Mais concretamente, os números que tinha referido num post post de 2008 indicavam que Lisboa tinha um PIB per capita superior à média europeia, enquanto os números que mencionei há poucos dias mostravam que Lisboa tinha um rendimento equvalente a 90% do rendimento europeu.  A que se deve a diferença? Ao facto de os números do post de 2008 serem em paridades de poder de compra, enquanto os números do post mais recente serem em preços constantes, mas sem ajustar o poder de compra. 
Por isso, e para que as coisas sejam comparáveis, aqui ficam os valores mais recentes (referentes a 2007) do Eurostat sobre o PIB per capita regional em paridades de poder de compra. Como podemos ver no primeiro quadro, neste indicador, o rendimento médio da região de Lisboa ainda se encontra acima do rendimento médio europeu. A Madeira também já está muito perto de alcançar a média europeia, mas todas as outras regiões estão ainda bastante longe de o conseguirem. E os Açores já são mesmo mais "ricos" do que a região Norte e a região Centro.


  PIB per capita em PPP (UE = 100)
Norte 60.3
Algarve 79.6
Centro 64.4
Lisboa 104.7
Alentejo 71.9
Açores 67.6
Madeira 96.3
Fonte: Eurostat

Ainda assim, é igualmente interessante verificar que a crise teve um impacto muito significativo sobre o PIB por habitante regional. Mais concretamente, segundo o Eurostat, entre o ano 2000 e 2007, o PIB por habitante regrediu em em regiões como Lisboa, o Norte, o Algarve e a Região Centro. A descida de Lisboa foi particularmente acentuada, tendo sido na ordem dos 6 pontos percentuais do PIB. Ou seja, entre 2000 e 2007, a maioria das regiões portuguesas divergiu em relação à média europeia. 
As honrosas excepções a esta tendência foram as duas regiões autónomas, bem como o Alentejo. Mais uma vez, estes números contêm uma diversidade enorme, pois algumas das regiões (as NUTS) são muito diversas (principalmente no que diz respeito à região Norte). Voltarei a esta questão nos próximos dias, até para responder a outros comentários que foram feitos a propósito do meu post anterior. 



Variação do PIB per capita em PPP entre 2007 e 2000
Norte
-3.1
Algarve
-1.2
Centro
-1.4
Lisboa
-6.1
Alentejo
1.4
Açores
4.8
Madeira
8.0

DESLOCALIZAÇÕES SUBSIDIADAS

O Financial Times investigou a deslocalização de empresas da Europa Ocidental para a Europa de Leste e chegou à conclusão de que milhões de euros em subsídios comunitários foram utilizados pelos países do Leste europeu para atrair empresas anteriormente sediadas em outros países europeus. Estes fundos europeus serviram para atrair estas empresas para a Europa de Leste apesar de existirem regras concretas destinadas a prevenir a deslocalização de empresas no espaço comunitário. Nenhuma surpresa, portanto, apesar de ser interessante constatar que, até agora, este assunto tem passado completamente ao lado da discussão pública e política.

LEITURA OBRIGATÓRIA

Um excelente texto de Barry Eichengreen sobre a crise da dívida europeia e o futuro do euro. Imperdível.

02 dezembro 2010

REEQUILIBRAR AS CONTAS EXTERNAS

O Público perguntou-me qual será a melhor estratégia para reequilibrar a balança externa. Aqui estão as minhas respostas:

O défice externo português é crónico e já dura há várias décadas. As únicas duas vezes em que registámos excedentes comerciais foi durante a Segunda Guerra Mundial, quando houve uma grande procura de produtos como o volfrâmio e outros bens. A diferença é que durante décadas nós conseguimos não só manter um défice comercial relativamente baixo (em % do PIB), mas também financiámos os nossos défices crónicos com as remessas dos emigrantes (e mais tarde com as transferências da UE). Como agora já não podemos desvalorizar a moeda e a concorrência internacional é maior, o défice externo em percentagem do PIB tem-se mantido em valores muito elevados, o que, por sua vez, contribui para o nosso alto endividamento externo. Por todos estes motivos, o reequilíbrio da nossa balança externa tem de ser feito não só tentando controlar os nossos custos produtivos, mas também tentando reduzir as nossas importações, utilizando (melhor) as remessas dos emigrantes, e estimulando as exportações.
Como é que podemos estimular as exportações? Concedendo todo um conjunto de incentivos aos nossos exportações (subsídios, benefícios e créditos fiscais, bem como utilizando toda uma série de apoios directos e indirectos que já existem para muitas das nossas empresas), e não complicando a vida às empresas exportadoras.

Público: O sector exportador português tem estado acima das expectativas? Ou as expectativas têm sido demasiado conservadoras? 
Tem ficado acima das expectativas por dois motivos. Primeiro, porque a economia mundial tem crescido mais do que era previsto (aumentando assim a procura dos nossos procura dos nossos produtos). Em segundo lugar, o comportamento das exportações só pode surpreender porque há muita gente que não tem dado a devida atenção ao notável desempenho do nosso sector exportador nos últimos anos. A verdade é que após um período inicial de alguma dificuldade relacionado com a nossa entrada no euro, as exportações têm crescido consistentemente a bons ritmos. A excepção foi, obviamente, 2008 e 2009, por causa da crise internacional.
No entanto, como já defendi por várias vezes, o nosso problema principal são as importações mais do que as exportações.

A NOTÍCIA DO DIA

Ora, aí está. Talvez seja a notícia do dia, quiçá do ano. A não ser que tudo não passe de um grande golpe publicitário de uma importante agência governamental numa época de défices orçamentais e de cortes das despesas.

01 dezembro 2010

GASTOS NA EDUCAÇÃO

Sabia que Portugal é um dos países do mundo que mais gasta por aluno do ensino secundário em percentagem do PIB per capita? Mais concretamente, as despesas com cada aluno do ensino secundário português corresponde a cerca de 30% do nosso PIB per capita. Entre 145 países, Portugal é o 15º país que mais gasta por aluno do ensino secundário em percentagem do PIB por habitante. E como podemos ver no gráfico abaixo, na Europa, só o Chipre e a Dinamarca gastam mais por aluno do ensino secundário (em % do PIB per capita) do que nós. A Espanha, por exemplo, gasta somente um montante equivalente a 24% do PIB per capita por aluno do secundário, 5 pontos percentuais do PIB por habitante a menos do que nós. Apesar de todo este esforço e de todas estas estas despesas, Portugal continua com os terceiros piores indicadores da OCDE em relação ao abandono escolar, o desempenho dos nossos alunos nos estudos internacionais (como o PISA) deixa muito a desejar, e continuamos a ter as percentagens mais baixas de alunos com o ensino secundário (completo) de toda a União Europeia. Por outras palavras, gastar mais não é necessariamente sinónimo de qualidade ou de melhoria do capital humano. Bem pelo contrário.
A verdade é que há muito desperdício, bem como um centralismo exagerado por parte do Ministério da Educação que impede um melhor funcionamento do nosso sistema educativo e uma maior eficiência do sector. Mas não há problema. Havemos de continuar a arranjar maneira de melhorar os nossos índices educacionais. Nem que para isso tenhamos de acabar de uma vez por todas com as reprovações e as retenções, ou que tenhamos de manipular descaradamente as estatísticas educativas, ou que tenhamos que continuar a apostar nesse bastião de qualidade educativa chamado Novas Oportunidades.

Gráfico _ Despesas por aluno do ensino secundário em % do PIB per capita, 2009
Fonte: Banco Mundial

DÍVIDA EUROPEIA

A crise da dívida europeia alarga-se a outros países.

EXPORTAÇÕES

O Público dá hoje atenção às exportações portuguesas num artigo que inclui algumas declarações minhas.

30 novembro 2010

CUSTOS DA COMPETITIVIDADE

Às vezes, perguntamo-nos o que causou a alegada perda de competitividade das nossas exportações nos últimos 10-15 anos. A resposta mais ouvida (e que tem um grande fundo de verdade) é que a perda da competitividade das nossas exportações se deve principalmente ao facto de que os nossos custos unitários do trabalho terem subido mais rapidamente do que na Zona Euro, o que tornou as nossas exportações menos atractivas e originou elevados défices da balança comercial (e contribuiu de sobremaneira para o nosso endividamento externo). De acordo com esta lógica, como já não temos uma moeda nacional para desvalorizar e tornar as exportações artificialmente competitivas, a subida desses mesmos custos unitários foi fatal para as exportações e, consequentemente, para a economia nacional. Resultado? Uma década de estagnação e mais outra a caminho se não levarmos a cabo o chamado ajustamento nominal, em que os nossos salários e os nossos preços teriam que baixar para conseguirmos reganhar competitividade e, assim, podermos ter uma retoma económica sustentada. Pelo menos é isso que nos dizem inúmeros e reputados economistas que analisaram a situação portuguesa.
Pessoalmente, não duvido que parte da perda de competitividade também ocorreu através deste mecanismo. No entanto, também me parece que nem só dos custos unitários do trabalho vive a competitividade das nossas exportações. Mais concretamente, há toda uma série de custos de contexto que urge diminuir para tornar as nossas exportações mais atractivas. Entre estes, contam-se dois que irei analisar hoje: os impostos e o preço da energia (mais concretamente o preço da gasolina). Outros custos de contexto serão analisados em futuros posts.
Comecemos pelos impostos. Neste post, irei debruçar-me sobre os impostos individuais, ficando os impostos colectivos para outra ocasião. Para podermos levar a cabo uma análise comparativa, recolhi dados do Banco Mundial referentes às taxas marginais dos impostos individuais (o nosso IRS). No caso português, esta taxa corresponde ao escalão mais alto do IRS, que foi recentemente aumentada pelo governo. Se levarmos em linha de conta este aumento, é interessante verificar que entre os 92 países para os quais existem dados, Portugal tem a 10ª taxa marginal de imposto mais elevada, conjuntamente com 4 outros países. 
Mais: se olharmos somente para a UE27 e juntarmos no mesmo gráfico as taxas marginais de imposto com o PIB per capita, o resultado é extremamente elucidativo de quão atractivos nós conseguimos ser a nível fiscal. Com efeito, como podemos ver no gráfico abaixo, quando tomamos em linha de conta o rendimento médio dos países europeus, é notório que as taxas marginais dos impostos portugueses estão bem acima do que é habitual para países com o nosso nível de rendimento. Isto para já não nos compararmos com a Espanha, a Finlândia, ou, por exemplo, com a Irlanda. É certo que os impostos não explicam tudo (bem longe disso), mas também não deixa de ser verdade que quanto mais alta for a carga fiscal, menos atractivas tenderão a ser as exportações de um país. E Portugal não é excepção neste campo.

Gráfico _ Taxas marginais dos impostos individuais vs. PIB por habitante
Calculado de dados da AMECO e do Banco Mundial

Porventura ainda mais significativo é a questão do preço da energia. Se atentarmos para os dados do Banco Mundial, é possível observar um indicador bem sugestivo sobre o preço da energia em Portugal: o preço do litro da gasolina. Eu sei que seria melhor utilizar a electricidade, mas fiquemos pela gasolina por enquanto (a electricidade fica para mais tarde).
Ora, entre 175 países, Portugal tem a 15ª gasolina mais cara do mundo, acima de países como a Alemanha, a França, a Espanha, e todos os países da Europa do Leste. Isso é perfeitamente visível no próximo gráfico, onde se apresenta o top 20 dos países com a gasolina mais cara do mundo, mais alguns outros países europeus com quem nos costumamos comparar. No gráfico, o número junto do país refere a posição que esse país tem no top mundial do preço da gasolina. Neste sentido, é interessante observar que enquanto Portugal está 15º lugar entre esses 175 países, a Espanha tem a 67ª gasolina mais cara do mundo. Uma diferença bastante signficativa, como é óbvio. Portugal tem ainda a gasolina mais cara de toda a Europa, com a excepção da Holanda e de Malta.

Gráfico _ Preço da gasolina por litro (em $) em 2008
Fonte: Banco Mundial

Moral da história: é certo que a pouca contenção dos custos unitários nacionais em relação ao que se passou na Zona Euro ajuda a explicar alguma perda de competitividade das nossas exportações na última década. No entanto, há todo um outro número de factores que também contribuiram para essa mesma perda de competitividade, incluindo a entrada da China e da Europa de Leste em muitos dos nossos mercados internacionais, bem como a evolução de alguns dos nossos custos de contexto menos favoráveis. Em relação a estes, é certo que a nossa situação periférica não ajuda. Porém, certamente que não é um impedimento de maior para que as nossas exportações sejam mais competitivas. O problema é que nós temos agravado os nossos custos de contexto, quer através dos nossos elevados custos energéticos, quer por causa do excessivo despesimo do nosso Estado, cujo voraz apetite nos tem feito subir a carga fiscal para níveis bem mais altos do que seria desejável para o nosso nível de rendimento. Por todos estes motivos, e para que as nossas exportações se tornem mais competitivas, parece-me que baixar estes custos de contexto é tão ou mais importante do que a mera contenção do crescimento dos custos unitários do trabalho.