Agora que a nova edição da Visão já saiu, aqui está o meu artigo da última semana sobre os custos e benefícios de uma eventual saída do euro:
E SE SAÍSSEMOS DO EURO?
Se a economia nacional continuar estagnada por muito mais tempo, é possível que alguns comecem a pedir o que antes parecia impensável: uma saída do euro. Porquê? Porque não será difícil para algumas vozes mais populistas somar dois mais dois e verificar que a estagnação económica nacional coincidiu com a nossa adesão à moeda única. Neste sentido, um retorno ao escudo seria visto como a receita mágica para nos fazer emergir da crise actual. Assim, e por tudo o que está em causa, vale a pena perceber quais seriam os custos e benefícios de tal decisão. Comecemos pelos benefícios.
a) adeus euro, olá desvalorizações competitivas
Se saíssemos do euro poderíamos desvalorizar a moeda nacional (o escudo) para melhorar a competitividade das nossas exportações, que ficariam mais baratas. O ganho seria artificial, pois não seria baseado em ganhos de produtividade ou numa descida dos custos de produção. Ainda assim, é provável que os exportadores beneficiassem de uma desvalorização da moeda. É claro que as desvalorizações competitivas não fariam com que a produtividade nacional aumentasse, nem garantiriam, por si só, a competitividade das exportações nacionais de menor valor acrescentado em relação às exportações da China e da Europa de Leste. Pelo contrário. Estaríamos a adiar mais uma vez a solução para a nossa baixa produtividade.
b) adeus euro, olá política monetária nacional
Se o escudo voltasse, não teríamos que nos cingir pelas políticas do Banco Central Europeu (BCE), nem pelas regras do Pacto de Estabilidade. Portugal poderia seguir uma política monetária própria e uma política fiscal menos restritiva. Isto teoricamente. Na prática, as coisas não se iriam passar bem assim, pois Portugal não deixaria de ser um país pequeno, nem a Eurolândia deixaria de ser a nossa principal área comercial. Por isso, é provável que um Banco de Portugal independente tivesse que seguir por perto os passos do BCE.
E quais seriam os custos de uma saída do euro?
i) olá escudo, adeus juros baixos
i) olá escudo, adeus juros baixos
O euro trouxe-nos juros mais baixos e maiores facilidades de financiamento. Foi exactamente a pronunciada descida dos juros e a maior oferta de crédito que fizeram com que muitos de nós se endividassem para adquirir casa própria e os mais diversos bens de consumo. Ora, este elevado endividamento da economia nacional seria exactamente uma das principais razões que nos levariam a pensar duas vezes antes de abandonarmos o euro. Se saíssemos do euro, os juros subiriam, o que provocaria dificuldades enormes às famílias e às empresas mais endividadas, bem como ao próprio Estado.
ii) adeus euro, olá rating mais baixo
Uma saída do euro iria acarretar uma descida considerável do rating português, pelo menos temporariamente. Um rating mais baixo agravaria ainda mais o custo do crédito e do financiamento da economia nacional. Mais uma vez, juros mais caros e spreads mais elevados seriam autênticos pesadelos para as famílias e empresas mais endividadas.
iii) Olá escudo, adeus irresponsabilidade financeira
Se não quiséssemos que a descida do rating português fosse vertiginosa e que o escudo não caísse nas ruas da amargura, uma saída do euro teria que ser acompanhada por medidas que aumentassem a credibilidade fiscal do Estado. Assim, se queremos abandonar o euro para podermos ter um Estado ainda mais irresponsável, é melhor que pensemos duas vezes. Se optássemos por persistir no nosso despesismo habitual, não só seriamos sujeitos a uma enorme volatilidade financeira, como também seria muito provável que o Estado português sentisse enormes dificuldades para se financiar junto dos mercados financeiros. E como um resgate da UE seria muito improvável se saíssemos do euro, o mais certo é que, mais cedo ou mais tarde, lá teríamos o FMI à nossa porta. Adeus euro, olá austeridade.
iv) olá escudo, adeus solidariedade europeia
Se saíssemos do euro, seriamos alvo de uma enorme desconfiança por parte dos nossos parceiros europeus. Menos influência política e menos tolerância aos nossos pedidos económicos (e políticos) seriam consequências previsíveis de abandonar o euro.
v) Euro forte, eficiência redobrada?
No euro, os ganhos de competitividade têm de ser alcançados através da contenção salarial ou através de melhorias da produtividade. Como ninguém quer que os salários permaneçam demasiado baixos por muito tempo, só nos resta melhorar a eficiência das empresas para diminuir custos. Ou seja, a longo prazo, permanecer no euro será um estímulo à eficiência e a uma maior produtividade. Uma saída do euro poderia comprometer estes ganhos de eficiência de longo prazo.
Em que ficamos?
Se subtrairmos os benefícios e os custos de uma eventual saída do euro, facilmente concluiremos que as vantagens seriam bem menores do que os custos de sair. Sair do euro pode ser um erro que poderemos pagar muito caro. Quer isto dizer que Portugal (ou outro país) nunca sairá do euro? Não necessariamente. Por um lado, é sempre possível sermos forçados a sair. Se a situação da Grécia se agravar e a UE não ajudar, é possível que os gregos saiam do euro, o que poderia ter um efeito de contágio a países como Portugal. Por outro lado, se a estagnação económica se prolongar, é igualmente possível que nós próprios optemos por sair do euro. Um governo mais populista poderá sempre pensar que tem mais a ganhar com uma saída do euro a curto prazo, mesmo que tal decisão seja nefasta para a economia a longo prazo.
Sair do euro resolveria os problemas da economia nacional? Claro que não. Os problemas da economia nacional só poderão ser resolvidos com aumentos da produtividade, com exportações mais competitivas e com o ressurgimento do investimento privado. Ainda assim, se a crise continuar, a triste verdade é que uma saída do euro poderá tornar-se demasiado tentadora aos olhos de um eleitorado farto de fazer sacrifícios que não parecem dar resultado. E se o país continuar sem saída, é natural que procuremos saídas onde seria desejável não o fazer.
2 comentários:
E que aconteceria às dívidas sobre o exterior, seja do Estado seja de particulares (incluindo a banca neste conceito)? Depois da desvalorização do novo escudo, as dívidas em euros (e também as em dólares ou em outras moedas) ficariam mais elevadas em escudos e seriam mais difíceis de pagar. As importações também seriam mais caras e, embora isso servisse para as desencorajar, não se poderia passar sem elas, visto que não somos auto-suficientes. Como os bancos teriam de continuar a pedir financiamento no exterior, passariam a ter mais dificuldades em amortizá-lo e teriam, além disso, de fazer repercutir a desvalorização da moeda nacional aumentando os juros dos empréstimos.
É curioso ver que a argumentação a favor da permanência no Euro, está completamente desajustada. Rating alto e juros baixos devido a estarmos na zona euro? Será?... Começam a ficar só as vantagens da saída.Claro que temos de impôr regras financeiras a nós próprios no caso de uma saída e não podemos abdicar de fazer as necessárias reformas estruturais para que tenhamos uma economia mais competitiva ( e não só virtualmente). Contudo, fazer um ajustamento com mais instrumentos económicos ( política monetária) é sempre mais fácil. A situação social tornou-se insustentável. Do meu ponto de vista, a saída do euro tem de facto consequências políticas e, sem dúvida, ao nível da fuga de capitais e de empolarmos automaticamente o valor da dívida.Contudo, e como parece que já teremos mesmo de fazer um rescalonamento da dívida, então devemos, do meu ponto de vista, tentar encetar uma saída organizada, que reúna o consenso política dos nossos parceiros e que nos assegure financiamento para o primeiro impacto de saída. Quanto à fuga de capitais, ter-se-ia de impor restrições a mobilidade de capitais ( impostos )a fim de não haver uma retirada massiva de capitais da economia nacional, mas pelo menos asseguraria a eficácia da política monetária. A única vantagem de estarmos no euro, quanto a mim, prende-se com o facto de nos obrigar a ter ganhos de competitividade. Contudo, os ajustamentos estruturais podem levar muitos anos, e , uma coisa são os livros e a teoria económica, outra é a governação real de um país, em que as pessoas não são uma entidade abstracta. Hoje em dia a situação social é grave e não creio que possamos passar mais uma década a crescer 1% ao ano. Seria o lume perfeito para nos queimarmos. Num momento em que ficámos reduzidos à condição de colónia e em que estamos de mão estendida perante a Europa e o Mundo, seria necessário pôr todas as cartas em cima da mesa, e recuperar a independência nacional que hoje está refém dos nossos "parceiros" europeus.
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