30 abril 2008

O PAI DO LSD

Morreu o pai do LSD, Albert Hofmann. Aos 102 anos. Pelo que parece, este químico descobriu por acaso a droga de excelência dos anos 60. A sua curiosidade científica fê-lo provar o composto químico que tinha desenvolvido, o que lhe provocou sintomas "não desagradáveis" (segundo ele) e uma imaginação extremamente estimulada. O problema foi que ao tentar esse composto no dia seguinte, Hofmann teve a sua primeira "bad trip", caracterizada por dificuldades de visão, bem como a percepção que estava a ser perseguido por um demónio. Como chegou aos 102 anos, presumo que este senhor não tenha experimentado muitas mais vezes a droga que veio a ser baptizada de LSD. Mesmo assim, e apesar das "bad trips", comercializou um composto de LSD mais fraco, que foi vendido livremente até ser proibido pelas autoridades americanas em 1966. O LSD já estava então em vias de se tornar na droga preferida do movimento hippie dos anos 60, sendo louvada por músicos, artistas entre outros(as). Muitas halucinações e muitas, muitas bad trips se seguiram nos anos seguintes. Aos 102 anos, Hofmann teve a sua bad trip final.

RENDIMENTO REGIONAL

Já saíram os últimos dados do Eurostat sobre o rendimento regional. Na UE27, Lisboa continua a ser a região portuguesa mais abastada, logo seguida pela Madeira. A região mais pobre de Portugal é o Norte.

Figura: Rendimento per capita (% da média europeia)

Num próximo post irei comparar estes números regionais com regiões semelhantes de outros países europeus.

EURO E EXPORTAÇÕES

Nas últimas duas décadas, o sector exportador português tem sofrido uma grande transformação e reorganização, cujo ritmo está a ser grandemente acelerado pela nossa adesão ao euro. Para entendermos esta reorganização, analisemos então as principais alterações no sector exportador nacional desde a nossa adesão à UE.
A nível da composição das exportações, as alterações mais substanciais ocorreram a nível do peso relativo dos diversos sectores. Desde 1985, os sectores do vestuário e calçado, agro-alimentar, da madeira, cortiça e papel, bem como os sectores das peles, couros e têxteis, viram baixar significativamente a sua contribuição relativa nas exportações totais. Mais concretamente, em meados da década de 80 estes sectores eram responsáveis por cerca de 70 por cento das exportações portuguesas, enquanto que actualmente o seu peso é de menos de 40 por cento das exportações totais. Em contrapartida, desde 1985, os sectores que viram aumentar significativamente a sua importância relativa nas exportações globais incluem máquinas (de 12 por cento em 1985 para quase 20 por cento do total em 2004) e os materiais de transporte (de 5 para 17 por cento). Estes movimentos divergentes ocorreram não só graças ao início da facturação da Autoeuropa (responsável por 5% das exportações nacionais) e de todos os investimentos associados, mas também devido à crescente perda de competitividade dos nossos sectores tradicionais em relação à Europa de Leste e da Ásia.
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É neste contexto que se entende o comportamento bastante modesto das exportações portuguesas recentemente. Para além das exportações nacionais terem tido um crescimento negativo em grande parte dos trimestres nos últimos cinco anos, desde os finais da década de 90 a economia portuguesa sofreu uma perda acumulada de mais de 10 por cento da sua quota de mercado na UE-15. Visto que o comportamento das exportações portuguesas piorou substancialmente desde a adesão ao euro, é tentador concluir que o euro tem sido nefasto para as nossas exportações. Será isto verdade?
À primeira vista poder-se-á argumentar que o euro não tem tido um impacto significativo sobre as nossas exportações. Afinal, é sabido que 80 por cento das exportações nacionais são para o espaço económico europeu (UE-15). Como a grande maioria dos nossos parceiros europeus aderiram igualmente à moeda única, poderíamos facilmente concluir que estarmos ou não no euro pouco afectaria a competitividade das nossas exportações. Nada poderia estar mais errado, pois muitos dos principais competidores das nossas exportações não estão na moeda única. Isto é principalmente verdade em relação aos competidores dos nossos sectores mais tradicionais, os quais não só não estão constrangidos pela política monetária comum como também não sofreram o grande agravamento dos custos que a recente substancial valorização do euro acarretou.
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Neste sentido, não é surpreendente constatar que a perda de quota de mercado das nossas exportações na UE-15 nos últimos anos se deveu principalmente aos crescentes problemas de competitividade dos sectores do vestuário e do calçado. Deste modo, é patente que o principal impacto do euro na nossa economia foi agravar os problemas de competitividade dos nossos sectores tradicionais. De facto, os sectores exportadores mais produtivos não foram grandemente afectadas pelo euro, visto que as empresas destes sectores puderam compensar os maiores custos inerentes a um euro forte com subidas de produtividade.
É neste sentido que a introdução do euro está a desempenhar um papel fundamental na reorganização da nossa estrutura produtiva e exportadora. Como os dados acima referidos indicam, este processo de reorganização do sector exportador iniciou-se bem antes da adesão ao euro. Porém, o euro tem conduzido a uma aceleração deste processo de reorganização da estrutura produtiva da economia portuguesa, com reflexos óbvios a nível do desemprego e da performance económica. Ao eliminar as muletas das desvalorizações competitivas, o euro funciona como uma espécie de mecanismo de selecção natural que ajuda a diferenciar as empresas mais produtivas das menos competitivas. Ora, a longo prazo, quando esta reorganização estiver concluída, poderemos ter a certeza que não só teremos um sector exportador mais competitivo, mas também uma economia mais saudável.

BUSHISMOS

Citação:
"A lot of times in politics you have people look you in the eye and tell you what's not on their mind."— George Bush, 6 de Abril, 2008

DEDICAÇÃO EXTREMA

John Badman /AP

Um americano corta a relva do seu jardim apesar das cheias que rodeiam a sua casa. Isto é o que se chama dedicação...

29 abril 2008

DANÇAS DOS NÚMEROS

Tabela do PUBLICO
Continua a dança dos números entre o governo e a Comissão Europeia. A discrepância é cada vez maior e a discussão sobre os números em causa cada vez mais infrutífera. Como é que se chegam a valores tão distintos? A Comissão Europeia prevê uma grande desaceleração das exportações (devido à crise mundial), bem como a permanência da apatia do investimento. Em contrapartida, o governo aposta numa baixa menos acentuada das exportações, bem como no reanimar do investimento, provavelmente apoiado na política de betão que tem caracterizado os últimos meses do executivo. Quem tem razão? Veremos daqui a 2 ou 3 meses, quando será mais claro o impacto que a desaceleração da economia mundial terá sobre a economia nacional. Mesmo assim, se tivesse que apostar, diria que é provável que o valor final se situe entre estas duas previsões. Veremos.

FERREIRA LEITE

O anúncio da candidatura de Manuela Ferreira Leite galvanizou muitos dos sectores do PSD preocupados com o populismo que parece ter tomado conta do partido. Ainda assim, e mesmo que a candidatura de Ferreira Leite seja bem sucedida, parece-me que esta candidatura não traz muito de novo à política nacional. De facto, esta candidatura representa a continuação do obsessão do défice e do rigor orçamental excessivo. Qual é assim a diferença com o actual governo?
Sou a favor de legislação que promova a consolidação das contas públicas durante os ciclos económicos. No entanto, continuar a dar prioridade ao défice numa altura em que a economia teima em não acelerar parece-me, no mínimo, dogmático e simplesmente errado. Veremos se Ferreira Leite se agarra somente ao défice ou se apresenta propostas concretas para fomentar a retoma económica.

A CORRUPÇÃO DA BARBIE

As autoridades iranianas vão impôr restrições à importação de brinquedos ocidentais, tais como a Barbie, o Batman, e o Homem Aranha. Artigos com o Harry Potter também. Segundo as autoridades do Irão, estas personagens têm um efeito corruptor dos jovens iranianos e, por isso, é preciso bani-los. A Barbie é especialmente perigosa, devido aos vestidos arrojados da boneca. Tudo a favor da moral e dos bons costumes. De pequenino se torce o pepino. Afinal, quem pede Barbies quando é criança talvez um dia demande a liberdade, não é? E a liberdade é um fruto profunda e irremediavelmente diabólico, pelo menos para os ditadores do Irão.

OS PINGUINS E AS POMBAS

LIMPAR A PRAÇA

Ng Han Guan/AP

A limpar a Praça de Tiananmen para as comemorações do dia 1 de Maio. Afinal, ainda existe o dia do Trabalhador na China...

BRUTALIDADE POLICIAL

Tenho aqui enaltecido frequentemente a extraordinária recuperação económica de Moçambique. Este país tem levado a cabo um autêntico milagre que vale a pena salientar. Dito isto, é claro que nem tudo são rosas em Moçambique. Muito longe disso. Assim, hoje surgiu um relatório da Amnistia Internacional que condena a violência e a brutalidade da polícia moçambicana. Segundo este relatório, a polícia deste país tem respondido de forma muito violenta à subida da criminalidade que tem ocorrido nos últimos meses. A Amnistia Internacional recomenda uma reforma do sistema judicial e dos códigos da polícia para combater o clima de impunidade que caracteriza a violência policial.

28 abril 2008

ESTUDANTES MADUROS

Segundo o PUBLICO, não pára de aumentar o número de estudantes maiores de 25 anos matriculados nas universidades portuguesas. No mundo anglo-saxónico, estes alunos são chamados de "maduros". Ora, os estudantes maduros já constituem cerca de 10 por cento da população universitária portuguesa. Óptimas notícias. Alguns dos melhores alunos(as) que já tive foram exactamente desta faixa etária. Quase sempre, os(as) alunos mais velhos(as) são de muito boa qualidade e são muito esforçados. Como já têm experiência profissional, estes alunos entendem bem a importância de um curso superior e percebem facilmente o segredo do sucesso na universidade: estudar, estudar, estudar. Neste sentido, não tenho grandes dúvidas que a crescente entrada destes alunos no meio universitário português é de saudar a vários níveis. Esperemos que tal tendência se mantenha.

FALTA DE ELECTRICIDADE

Facto do desenvolvimento:
Milhões de pessoas sem acesso a electricidade:
Sul da Ásia 706
Africa 547
Ásia Oriental 224

PÁSSAROS DINOSSAUROS

Sabia que os pássaros são provavelmente parentes dos dinossauros? Já há muito se especula sobre o assunto. No entanto, ainda existem poucas provas. Surgiu agora um estudo que apresenta provas mais concretas sobre a dita hípótese. Através de uma análise dos ossos de alguns T.Rex, alguns cientistas concluiram que o T.Rex está geneticamente mais próximo das avestruzes e das galinhas do que os outros répteis, como os crococodilos. Segundo um investigador da Universidade de Harvard: “There is more than a 90 percent probability that the grouping of T. rex with living birds is real.” As amostras de DNA confirmam assim aquilo que muitos paleontólogos desconfiavam há alguns anos.

O SUSTO

Esta mulher desmaiou quando encontrou pela frente o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad. Pudera. Quem a censura? Se fosse eu, talvez me acontecesse o mesmo... (Já agora, pelo que parece, Ahmadinejad ignorou o mal-estar da senhora. Sou tão bonito que até desmaiam por mim, devia ele estar a pensar...)

FOME MUNDIAL

João César das Neves assina hoje no DN um artigo de opinião sobre a subida dos preços alimentares. Vale a pena ler. Aqui fica um pequeno extracto:
"Qual a origem deste surto altista? Uma causa imediata é a queda do dólar. Em euros, as subidas são bem menores (trigo 88%, arroz 55% e milho 19%) mas ainda significativas e no trigo mantêm-se as mais elevadas no registo. Por outro lado, descontada a inflação, os preços, mesmo em dólares, ainda estão bastante abaixo dos valores do início dos anos 80. As matérias-primas registaram uma tendência decrescente nas últimas décadas, agora invertida. O fantasma global ainda vem longe."

27 abril 2008

PREÇOS DOS ALIMENTOS

O PUBLICO tem hoje uma série de artigos muito interessantes sobre a subida dos preços alimentares a nível mundial. Já aqui falámos sobre o assunto, e dentro de uns dias irei escrever mais posts sobre as causas e consequências do aumento dos preços. Entretanto, aqui ficam uns gráficos do Banco Mundial:
No primeiro gráfico, vemos que os preços alimentares a nível mundial aumentaram 75 por cento desde o ano 2000. O problema deste índice é que os números estão em dólares americanos, e é sabido que dólar depreciou-se consideravelmente nos últimos anos.





Por outro lado, o preço do trigo (em dólares) nos mercados mundiais aumentou 200 por cento desde o ano 2000, subida que foi principalmente acentuada no último ano:

A GUERRA ANUNCIADA

Os tambores da guerra continuam a rufar no Médio Oriente. Há quase uma bolsa de apostas informal sobre quando irá começar o novo conflito entre Israel e o Hezbollah. O Observer tem hoje uma interessante reportagem sobre o conflito latente e sobre a participação do Irão e da Síria no treino dos guerrilheiros desse movimento xiita. Este Verão promete ser quente no Médio Oriente. É uma autêntica crónica de uma guerra anunciada.

O RECUO NAS URGÊNCIAS

Começam a surgir mais e mais indicadores que sugerem que o governo já está em fase pré-eleitoral. Agora foi a vez das urgências de Ovar, que tinham sido encerradas no horário nocturno pelo ministro da Saúde demitido. Sabemos agora que vão reabrir novamente em meados de Maio. Supostamente este recuo do governo se deve às dificuldades sentidas com o aumento da afluência da urgência do hospital de Santa Maria da Feira (originado pelo encerramento da SAP de Ovar), bem como aos problemas sentidos nos transportes nocturnos ao concelho vizinho.
Ora, o problema não está no recuo do governo. Se, de facto, houve uma decisão que não correu bem e que teve consequências indesejadas, há que ter coragem para voltar atrás. Até pode ser que sim. O problema é que este tipo de decisões cheira demasiado a esturro, demasiado a estratagemas eleitorais.
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Independentemente das preferências políticas de cada um(a), o que interessa perguntar é: porque é que estas decisões não foram bem estudadas e analisadas? Se tivessem havido análises custo-benefício cuidadosas, haveria uma menor probabilidade de ocorrerem erros nas decisões políticas. Ora, se esses estudos se realizaram (como é apregoado pelo governo), então os recuos não deviam acontecer. Se acontecem, então é porque provavelmente a decisão é mais política do que económica. E alguma coisa não bate certo.

26 abril 2008

POBREZA MUNDIAL (4)

Se o mundo está cada vez mais desigual (devido ao crescimento económico) o que é que podemos fazer para diminuir a pobreza mundial?
Primeiro, os países subdesenvolvidos têm que melhorar os seus governos e respectivas políticas económicas. Uma das maiores lições dos últimos 200 anos é que é não há receitas mágicas para o desenvolvimento. De facto, é muito mais fácil destruir do que construir uma economia. Destruir é simples. Se um governo imprimir dinheiro desmesuradamente, deixar sobrevalorizar excessivamente a moeda nacional, criar défices excessivos, deixar crescer a dívida pública de forma desmedida, ou se fomentar a corrupção, então os incentivos dos agentes económicos serão distorcidos e o crescimento económico morrerá. Por outro lado, construir uma economia é muito mais difícil. Contudo, políticas macroeconómicas estáveis e responsáveis, conjuntamente com o estabelecimento de instituições que protejam os direitos de propriedade são importantes pré-condições para o desenvolvimento económico.
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Em segundo lugar, é crucial que depois de um período mais proteccionista, a estratégia de desenvolvimento privilegie o comércio com o exterior, como o exemplo das economias asiáticas bem demonstra. Finalmente, é imperioso que as economias subdesenvolvidas diminuam o grau de corrupção existente em muitos desses países. A corrupção é extremamente penalizadora para o desenvolvimento económico não só porque muitos importantes recursos são desviados para fins duvidosos, mas também porque os incentivos à produção são distorcidos. De facto, muitos países subdesenvolvidos nunca poderão aspirar a uma melhoria significativa das suas populações enquanto não diminuírem esse cancro das economias chamado corrupção.
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Porém, a eliminação da pobreza deverá ser alcançada não só com políticas internas, mas também através do auxílio dos países desenvolvidos e organizações internacionais. O que podemos então fazer para ajudar?
Primeiro, é preciso darmos conta que a ajuda externa deverá ser utilizada principalmente para emergências. Se os elementos fundamentais de uma economia não estiverem correctos, então não há ajuda externa que valha. Segundo, contrariamente a muitas correntes de opinião, reduzir o crescimento populacional não é suficiente para os países se desenvolverem. De facto, quase sempre é o crescimento económico que conduz a um decréscimo do crescimento populacional, e não ao contrário. Terceiro, o perdão da dívida externa dos países subdesenvolvidos não contribuirá para a eliminação da pobreza se esse perdão for utilizado para fins que não sejam o do desenvolvimento. Se a dívida externa for perdoada a um governo corrupto, quais são as garantias que temos que os pobres desse país irão beneficiar da nossa generosidade? Porque deverão os nossos contribuintes financiar governos corruptos? Deste modo, tanto a ajuda externa como o perdão de dívidas deverão ser somente atribuídos a governos que demonstrem que estão genuinamente interessados em eliminar a pobreza nos seus povos.
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Finalmente, os países desenvolvidos deveriam abrir mais os seus mercados aos países subdesenvolvidos. Atrás de uma retórica de protecção de “sectores sensíveis”, a UE, os EUA e Japão têm sistematicamente encerrado os seus mercados aos produtos mais exportados pelos países subdesenvolvidos. Ora, se quisermos realmente ajudar diminuir a pobreza a nível mundial, a abertura dos mercados tem que ser bidireccional e não ter apenas um sentido.
Em suma, a pobreza de mais de dois terços da humanidade é o problema mais premente que a economia mundial enfrenta actualmente. Existem muitos obstáculos ao desenvolvimento económico de muitas regiões, tais como guerras, o flagelo da SIDA, e corrupção endémica. Porém, a nível do desenvolvimento económico, o recente sucesso da China e da Índia dão-nos a esperança de que no futuro é mesmo possível termos um mundo melhor e eliminarmos a pobreza das nações.

O MERCADO DAS ALMAS (3)

O meu artigo no DN de hoje sobre o mercado das almas encontra-se aqui.

25 abril 2008

OS JOVENS E A DEMOCRACIA

O Presidente da República manifestou-se hoje chocado ("impressionado) com a ignorância e o alheamento dos jovens em relação às comemorações do 25 de Abril. Eu até acho bem que o Presidente da República faça esse alerta e esse apelo à participação dos jovens na nossa democracia. No entanto, antes de o fazer, interessa perceber as causas dessa falta de participação dos jovens. Há duas grandes razões para tal atitude:
Por um lado, a apatia dos jovens deve-se à própria natureza das democracias. A luta pelos grandes ideais e principíos é mais premente nas ditaduras. Numa ditadura, a prioridade é lutar pela democracia e pela liberdade. Nas ditaduras há menor probabilidade de haver "gerações rascas" (ou seja, desinteressadas) porque o que está em causa é demasiado vital. Quando a democracia chega e é consolidada, a luta por esses grandes ideais já não se justifica (pelo menos no país em causa). É certo que é preciso preservar a liberdade e a memória, mas as ideologias são menos importantes, menos fundamentais no dia-a-dia. Deste modo, as gerações mais novas não sentem necessidade de se revoltar contra o regime nem de agitar as águas, como acontece nas ditaduras. E ainda bem que assim é. Mesmo que os críticos estejam certos e os jovens das democracias sejam mais fúteis (o que não é certamente linear), é porque podem. As futilidades são o luxo de quem não se tem que preocupar com coisas mais importantes, como sejam a liberdade e a democracia.
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Por outro lado, o pouco interesse demonstrado pelos jovens em relação ao 25 de Abril deve-se também em grande parte aos próprios políticos. Por razões históricas, o 25 de Abril foi durante anos apropriado pela esquerda mais militante e ignorado pela direita. O 25 de Abril nunca foi uma verdadeira festa da democracia que envolva todos os sectores da sociedade. O 25 de Abril devia ser o verdadeiro dia de Portugal, o dia mais importante do nosso país. Mas não é. E não o é, porque damos demasiada importância à ideologia (p. ex. , "às causas dos trabalhadores") em vez de nos preocuparmos em explicar aos jovens quais são as diferenças entre as democracias e as ditaduras.
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Sou de uma geração que não se lembra de ter vivido em ditadura. Sinceramente, não me sinto mais ou menos rasca por isso. Penso que as gerações mais jovens também sentem o mesmo. E se os mais jovens não participam mais na política ou na democracia é porque os incentivos a tal participação não existem ou são fracos. Se quisermos alterar este estado de coisas, há que alterar o sistema de incentivos. E aí os políticos deviam dar o exemplo, mostrando o quão nobre essa actividade devia ser. E isto, certamente, não é mesmo linear. Pelo menos nos tempos que correm.

A REPRESSÃO NO ZIMBABWE

Os ditadores são assim. Um mês após as eleições, os resultados das presidenciais ainda não foram publicados. Agora, surgem mais e mais notícias que as forças policiais intensificaram a uma campanha de repressão contra os opositores do regime. Não interessa que o país esteja à beira do colapso, que a economia esteja em auto-destruição, que a hiperinflação atinja ou 200 ou 300 mil por cento ou que a pobreza não páre de aumentar. Mugabe persiste agarrado ao poder, convencido que sem ele o Zimbabwe implodiria (o que está a acontecer), iludido pelo seu antigo estatuto de herói nacional, desesperado para manter a corrupção e as clientelas do seu regime. Por isso, tudo fará para se manter no poder. Tudo. Quando é que o o Zimbabwe terá o seu verdadeiro 25 de Abril?

BOLA DE PÊLO

Uma bola de trapos? Um ouriço com pêlos? Não, é um Hungarian Puli sheep dog. Um cão verdadeiramente original... e peludo.

24 abril 2008

JORNAIS PORTUGUESES NO ESTRANGEIRO

É raro, muito raro, encontrar jornais ou revistas portuguesas nos aeroportos internacionais. Há revistas inglesas, americanas, francesas, alemas, espanholas, italianas ou chinesas, mas nunca portuguesas. Foi por isso que fiquei extremamente contente quando vi a bandeira nacional num quiosque de imprensa internacional do aeroporto de Frankfurt. É hoje que compro o Publico no estrangeiro!, pensei todo contente. Procurei com ansiedade os ditos jornais e revistas. Procurei, procurei. Só havia a Maria e a Nova Gente. Falso alarme!, suspirei. Ainda não foi desta que tive a satisfação de comprar imprensa portuguesa num aeroporto internacional. Fica para a próxima. Esperemos.

23 abril 2008

POBREZA MUNDIAL (3)

Como já aqui debatemos, um dos maiores desafios para a economia mundial relaciona-se com a extrema desigualdade de rendimentos existente. Esta desigualdade de rendimentos é um facto relativamente recente da História Universal, visto que há 200 anos atrás não havia uma grande diferença de rendimentos entre os países mais ricos e os mais pobres. Contudo, a força do crescimento económico sustentado ao longo dos últimos dois séculos, conjugada com o baixo crescimento dos países mais pobres, foi suficiente para criar um fosso nunca dantes visto.
Ora, quais são então os motivos para o subdesenvolvimento de grande parte do globo? Em primeiro lugar, a pobreza das nações é muitas vezes associada com a irresponsabilidade dos governos. Em muitas partes do mundo, sucessivos governos não só têm sistematicamente destruído o crescimento dos seus países, como também têm comprometido o desenvolvimento económico para as gerações futuras. Quais os sintomas de um mau governo? axas de inflação demasiado elevadas, distorções da taxa de câmbio, baixas taxas de literacia, parco investimento na educação, infra-estruturas sofríveis, e outros impedimentos dos mercados.

Segundo, a corrupção em muitas partes do mundo em desenvolvimento é um verdadeiro cancro que aniquila o desenvolvimento. A corrupção destrói os incentivos à produção, e quando é endémica, é difícil haver crescimento económico.
Terceiro, a falta de recursos poderá contribuir para a persistência da pobreza nalguns países subdesenvolvidos (como a Papua Nova Guiné). Mas, às vezes é a abundância de recursos que não ajuda. Em países como a Nigéria (que têm abundantes recursos petrolíferos), as rendas associadas a esses recursos são frequentemente utilizadas para fomentar a corrupção das elites em vez de melhorar os rendimentos dos mais pobres. Assim, a falta ou abundância de recursos não é provavelmente suficiente para explicar a pobreza das nações.
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Finalmente, um dos grandes problemas que os países em desenvolvimento enfrentam é a falta de instituições que não só salvaguardem os direitos de propriedade, mas também aumentem os incentivos à produção. Sem direitos de propriedade bem definidos não existem incentivos à produção, e o crescimento económico é comprometido.
Em suma, o subdesenvolvimento de largas partes do mundo deve-se a uma série de factores, alguns dos quais (como a colonização, etc) nem sequer foram aqui abordados. Alguns destes factores são internos, outros externos. Não existe uma só causa comum. É exactamente por estes factores serem tão complexos que é tão difícil para os países subdsenvolvidos sairem das suas armadilhas da pobreza. E é por isso que cada país que o faz deve ser enaltecido e admirado por ter engendrado tamanho milagre. O milagre do desenvolvimento.

DIA MUNDIAL DO LIVRO

Hoje é o Dia Mundial do Livro. Em parte, é só mais uma efeméride como tantas as outras. Mesmo assim vale a pena.
Sinceramente nunca percebi como é que alguns escritores afirmam à boca cheia que os livros não prestam para nada, que os livros são uma inutilidade. Se o são, porque é que os escrevem? Para que é que dedicam meses e meses das suas vidas num acto tão inútil???
Enfim, um contra-senso. É óbvio que os livros não são inúteis. Muito pelo contrário. Sem livros, muitos de nós não seriam o que hoje são. Para mal e para bem.

AMBIENTE OU DESENVOLVIMENTO?


SÁBADO

Perguntas da Revista Sábado:
S. Temos cada vez mais doutores e engenheiros e uma produtividade cada vez mais baixa. E temos uma população mal-formada. Perante este cenário, que podemos esperar da produtividade de Portugal dentro de 10 ou 20 anos? Pior do que agora?
A produtividade não está propriamente mais baixa. Tem crescido, só que a taxas pouco mais elevadas do que as taxas de produtividade dos nossos congéneres europeus. E é isto que nos exaspera. A convergência da produtividade relativa (i.e. em relação aos outros países europeus) tem sido extremamente lenta. Ora, o aumento da produtividade nacional depende de vários factores, dos quais se destacam a melhoria da qualidade educativa e o aumento da nossa eficiência organizativa. Temos que acabar com as nossas tendências de fazer tudo em cima do joelho, temos que promover uma maior cultura de prevenção (em vez de sermos tão reactivos), temos que criar os incentivos necessários a um maior dinamismo do nosso sector empresarial. Nos próximos 10 a 20 anos, a produtividade certamente irá crescer. O que falta saber é quanto. Se crescer menos do que nos outros países europeus, Portugal será crescentemente preterido pelos investidores estrangeiros e, inclusivamente, nacionais.
O novo estatuto do aluno não o chumba por faltar às aulas. Como avalia esta medida, tendo em conta que já considera que um dos problemas do actual sistema de ensino é a permissividade?
É péssima. É negativa e contraproducente. É uma medida completamente contrária a um aumento da qualidade educativa. Diminuem-se os incentivos ao trabalho e ao esforço dos alunos e fornecem-se incentivos à mediocridade e à permissividade. De facto, a única explicação para medida tão bizarra é que os nossos fracos índices escolares supostamente melhorariam artificialmente, pois haveriam menos alunos a reprovar. No entanto, não é assim que nos aproximamos da média da OCDE a nível educativo, e não é assim que se criam os incentivos a uma melhoria da qualidade da educação e da produtividade. Muito pelo contrário.
Por que razão diz que Portugal precisa mais de Espanha, não de menos?
Em primeiro lugar, porque a nossa relação bilateral a nível económico é ainda bastante inferior à registada entre outros países vizinhos com dimensões relativas comparáveis, tais como entre o Canadá e os Estados Unidos ou entre a Alemanha e a Holanda. Em segundo lugar, os recentes alargamentos da União Europeia mudaram o eixo de desenvolvimento da UE do Sul para o Leste europeu. Ora, a nível da atracção do investimento estrangeiro as condicionantes geográficas ainda são muito importantes. Assim, é natural que os investidores alemães ou holandeses prefiram localizar um maior número dos seus projectos de investimentos em países vizinhos. É neste contexto que os nossos próprios vizinhos se tornam ainda mais importantes. Por outro lado, existem sinergias entres as economias ibéricas que ainda não estão totalmente aproveitadas. Todos estes factores fazem com que a economia espanhola assuma uma crescente importância para a economia nacional.

DARFUR

O Mundo continua impávido ao genocídio em Darfur. Já são mais de 300 mil mortos. Mais centenas de milhares de deslocados. Milhares e milhares de mulheres violadas. O que é que nós fazemos? Nada, rigorosamente nada. Ou quase nada, que é o mesmo.

21 abril 2008

ENTREVISTA AO DIÁRIO DO MINHO

DM – É um dos conferencistas das XX Jornadas Teológicas de Braga, subordinadas ao tema “O big bang de Deus: Criacionismo e evolucionismo”. Em sua opinião, qual é a importância do debate no contexto actual?
O debate é fundamental, tanto a nível religioso como para a sociedade civil. O crescimento do movimento criacionista é extremamente preocupante. O criacionismo é, por natureza, fundamentalista, pois só admite uma verdade absoluta e incontornável. O diálogo e a crítica informada são as melhores formas de combater este fundamentalismo.

DM – A par da sua actividade como docente de economia na Universidade de York e em Vancouver, escreveu já vários livros. Como surgiu esse gosto pela literatura?
A literatura está-me na alma, no sangue. Não sei viver sem literatura, sem ler ou sem escrever. Poucas coisas me fazem tão feliz como escrever. Quando acabo um romance é quase como ter um filho. É uma das melhores sensações do mundo.

DM – Um dos seus livros que mais celeuma deu foi “Diário de um Deus criacionista”, que nos irá apresentar. Em breves palavras, qual é a intenção do livro? Defende evolução e criação, ou exclusivamente uma?
Em parte, o livro é uma sátira ao criacionismo. Mas é muito mais que isso. O livro é uma reflexão sobre as consequências do tempo. Por exemplo, se a eternidade é infinita (com triliões e triliões de anos) e Deus é eterno, então porque é que o universo existe há somente 14 biliões de anos? Porque é que Deus levou tanto tempo a criar um universo? Ou, por outro lado, o que é que acontecerá à nossa relação com Deus daqui a mil anos, um milhão de anos, mil milhões de anos?
Por outro lado, o livro tenta abordar algumas das questões que os teólogos e cientistas muitas vezes se defrontam. Por exemplo, se Deus é omnipresente e omnisciente, se Deus conhece todo o passado e todo o futuro, então como é que permitiu a criação do Diabo, o Mal? Porque é que Deus não acaba com o Diabo? A minha resposta é que Deus o fez por escolha própria. Antes de criar o universo, Deus esteve só, demasiado só, durante demasiado tempo. Assim, quando cria o universo prefere introduzir um elemento de incerteza, de dúvida. No livro, Deus afirma que não valia a pena criar um universo em que não existissem surpresas. Se fosse assim, mais valia sonhá-lo do que criá-lo. Por isso, as surpresas acontecem. E quando as surpresas acontecem podem aparecer entidades que se rebelam contra Deus, tais como Satanás.

Em relação ao criacionismo e o evolucionismo, eu não defendo nada que, por exemplo, o Papa não advogue. A igreja católica e o Papa gostam da ideia do Big Bang, porque dá azo à criação do universo por parte de uma inteligência superior chamada Deus. Deus cria as condições da vida e a vida evolui. O livro parte da mesma hipótese, em que Deus cria o universo, mas deixa-o evoluir, excepto nalgumas circunstâncias especiais em que é forçado a intervir.

DM – O tema do evolucionismo e do criacionismo tem estado muito em debate nos EUA, sobretudo no que diz respeito ao ensino de uma ou de outra. Afinal, o que é que está em jogo? Concorda que ambas devam fazer parte do currículo escolar, ou apenas se deve dar primazia ao estudo da evolução?
O que está em jogo é a visão moderna do mundo, é saber se defendemos o fundamentalismo ou o diálogo. O criacionismo é, por natureza, fundamentalista, não-dialogante. No criacionismo só há uma verdade, a da leitura literal da Bíblia. Ora, como um grande número de teólogos também defende, a Bíblia foi escrita num determinado contexto histórico, e, por isso, contém uma linguagem e alegorias apropriadas para a época em que foi redigida. Quando se diz que Deus criou a mulher a partir de uma costela do homem, o que está em causa é uma metáfora ou uma alegoria. Ora, os criacionistas lêem esta e todas as outras passagens da Bíblia como sendo literais. E aí é que está o perigo. Aí é que está o fundamentalismo.

Neste sentido, sou completamente contra a introdução do criacionismo no currículo escolar. É uma perversão completa da realidade histórica e científica actual. Se queremos mesmo ensinar o criacionismo, tal não deve ser feito nas escolas públicas, mas sim nas instituições religiosas apropriadas.

DM – Acredita que o pensamento religioso e a razão científica podem estabelecer pontes de diálogo neste tema em debate e noutros? Quais os contributos de ambas para o ser humano?
Completamente. Aliás, foi por isso mesmo que quando lancei o meu livro, fiz questão de convidar um padre e um cientista, para que pudéssemos todos dialogar sobre questões que interessam a todos. As pontes de diálogo podem e devem ser estabelecidas entre a religião e a ciência, pois é através do diálogo que se diminui a intolerância e a incompreensão de parte a parte. Se não houver diálogo só resta uma alternativa, o fundamentalismo. E todos sabemos bem onde o fundamentalismo costuma levar...

DM – “O olhar da literatura sobre a criação e evolução” é o tema que o traz a estas XX Jornadas Teológicas. O assunto tem sido devidamente tratado pelas diversas áreas da literatura (romance, ciência, filosofia, teologia…), dada a proliferação de livros sobre esta temática?
Já se falou e escreveu muito sobre o assunto, mas podemos ter a certeza que continuaremos a debater apaixonadamente estas questões nos próximos anos e nas próximas décadas. Ainda há muito para falar, analisar e discutir. A única certeza que podemos ter é que, neste assunto, nunca haverá uma palavra final.

DESEMPREGO E A EMIGRAÇÃO

Apesar de ainda não ter atingido os valores históricos das décadas de 60 e 70 (bem longe disso), o fluxo emigratório tem vindo a crescer desde 2001. Entre 2001 e 2002, o número de emigrantes portugueses aumentou cerca de 30 por cento e nos últimos anos os valores absolutos da emigração têm vindo a aumentar. Assim, nos últimos anos, mais de 200 mil portugueses emigraram só para o Reino Unido, quer temporária quer permanentemente. Deste modo, é fácil concluir que o desemprego em Portugal só ainda não chegou aos 10% porque os portugueses têm emigrado em número considerável para países como o Reino Unido, a Espanha e a França. Apesar da ideia que existe uma fuga de cérebros do país (o infame ‘brain drain’), a verdade é que a emigração continua a fazer-se de forma muito tradicional: em 2003, a grande maioria dos emigrantes portugueses possuía o ensino básico (77,4%), enquanto que somente 9% possuíam o ensino superior.

PREVISÕES ECONOMISTAS _ Citação

“Economists may make lots of bad predictions, but they do have a method - a systematic way of thinking about the world that is more true than not, that gives them genuine if imperfect expertise. (That is also, of course, why lay commentators and other social scientists tend to hate them). Other social sciences haven't yet found anything remotely equivalent.
(Paul Krugman)

20 abril 2008

VENTOS DE MUDANÇA


Na última década, um dos países do mundo que tem registado das mais altas taxas de crescimento económico no mundo é o Vietname. Tal como Moçambique, este país asiático ultrapassou enormes barreiras e desafios para finalmente alcançar o milagre do desenvolvimento. O Vietname nunca mais será o mesmo. Esta semana os vietnamitas lançam o seu primeiro satélite para o espaço.

PRESTES A ESTOIRAR

MONTEIROGATE

Numa altura em que os(as) portugueses(as) se viram a apertar o cinto por causa das irresponsabilidades orçamentais dos diversos governos, o secretário de Estado do Desporto arranjou maneira de compensar a antiga equipa de Tiago Monteiro na Fórmula 1 por não existirem patrocinadores suficientes que garantissem a participação do piloto nesta prova automobilística. Tudo porque supostamente a participação de um piloto português na Fórmula 1 seria bom para a “marca Portugal”. Ou seja, avançou o Estado para um projecto que os próprios privados achavam arriscado e de baixa rendibilidade. Um contra-senso e um autêntico insulto para o cidadão comum, provando mais uma vez que há leis para uns, mas para o Estado há sempre excepções. Noutro país, este Monteirogate seria suficiente para levar à demissão dos responsáveis. Em Portugal, certamente que amanhã ou depois de amanhã estará tudo esquecido.

DIAS EM PORTUGAL

Apesar do tempo menos bom, é bom estar de regresso a Portugal. Na segunda-feira são as XX Jornadas Teológicas, onde irei falar sobre “O Big Bang de Deus e a literatura”. Na terça-feira pelas 19 horas estarei na Antena 3 em directo à conversa com Fernando Alvim no Prova Oral.
PS. Como estarei em viagem a maior parte do tempo, os posts do Desmitos serão mais irregulares durante esta semana.

18 abril 2008

A NOVA PESTE NEGRA

Em meados do século 15, a peste bubónica ou Peste Negra dizimou grande parte da população europeia. A situação foi tão grave, que em certos países a população diminuiu em cerca de 25 a 30 por cento, o que contribuiu para o fim do sistema feudal. Salvaguardando os devidos contextos históricos, existem alguns paralelos interessantes entre a peste bubónica e a maior epidemia da nossa História recente, o HIV/SIDA. Para muitos países subdesenvolvidos, com o maior desafio ao seu desenvolvimento económico e à saúde pública é mesmo o vírus HIV/SIDA.
Os números do flagelo da SIDA são absolutamente aterradores, principalmente na Africa Subsaariana. Segundo dados do Banco Mundial, até ao ano 2001, mais de 15 milhões de pessoas tinham morrido devido ao vírus da SIDA. Em 2003, existiam cerca de 40 milhões de adultos portadores do vírus HIV/SIDA, 30% dos quais tinham entre os 10 e 24 anos. Dois terços dos portadores do vírus encontram-se na África Subsaariana, onde se registam mais de 83% das mortes relacionadas com o vírus da SIDA. Países como a Africa do Sul, a Namíbia, o Quénia, Moçambique, a Tanzânia, a Zâmbia e o Zimbabué têm entre 10 e 26 por cento das suas populações entre os 15 e os 49 anos infectadas.
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Esta epidemia de proporções históricas representa o mais sério obstáculo ao desenvolvimento económico de toda a região Subsaariana. Por exemplo, nos últimos 35 anos o Botswana tornou-se num modelo de sucesso sem paralelo em Africa. Desde a sua independência, o Botswana passou de um dos países mais pobres do mundo na década de 60 para um pais de rendimento médio, com um PIB per capita de $7,800 em 2003. Contudo, o Botswana é actualmente um dos países mais afectados pelo vírus HIV/SIDA, com cerca de 40% da sua população infectada. No Botswana, o vírus da SIDA tem assim o potencial de eliminar grande parte dos ganhos resultantes do milagre económico das últimas décadas. O mesmo se passa em muitos outros países.
O vírus da SIDA tem também reduzido dramaticamente a esperança de vida das populações mais afectadas, a mortalidade infantil tem aumentado desproporcionalmente e um número sem precedentes de órfãos tem surgido devido a esta epidemia. Estima-se que somente em Africa existam mais de 10 milhões de órfãos resultantes do vírus da SIDA. Uma tragédia de proporções dantescas.

O INJUSTIÇADO

Luís Filipe Menezes saiu, aborrecido com as injustiças do partido. Fez-me lembrar o Ferro Rodrigues, a bradar contra as cabalas. Ainda me lembro há alguns anos, Menezes a sair do congresso do PSD lavado em lágrimas depois de ter sido vaiado pelos congressistas por ter chamado sulista a Durão Barroso. Então, não parecia possível que Menezes iria ressuscitar politicamente. Veremos se o mesmo se passa desta vez. Aliás, veremos se não foi tudo uma jogada para regressar já para as primárias. De qualquer maneira, ficou mais uma vez provado que o populismo só oferece retórica, mas poucas ou nenhumas soluções (aliás, como já se tinha passado com Santana Lopes).
Independentemente das nossas preferências políticas, o que eu gostaria de ver era uma oposição de jeito, com ideias, com propostas e com dinamismo. Melhor oposição significa mais escolha e concorrência. Melhor oposição significa melhor governo e melhores políticas. Uma melhor oposição é do interesse de todos. Veremos se é desta que uma alternativa credível surge no principal partido da oposição.

MANHÃ DE NEVOEIRO

Getty images

Com a saída de Menezes, haverá algum São Sebastião (ou Sebastiã) a emergir das brumas do principal partido da oposição?

17 abril 2008

O MITO DA CRIMINALIDADE IMIGRANTE

Na nossa Europa ainda tão xenófoba, o aumento da número de imigrantes dos últimos anos tem provocado toda a espécie de reacções negativas e, muitas vezes, racistas. Entre nós, muitos se insurgiram contra os ucranianos, contra os africanos ou contra os dentistas brasileiros. Segundo estes sectores, os imigrantes só nos roubam empregos e nos trazem maior criminalidade. Já discuti no "Mitos" esta questão, e por isso não me vou delongar muito mais. No entanto, como é referido no livro, é fácil concluir que estas ideias não estão minimamente de acordo com os factos. Os imigrantes têm, em média, maiores qualificação do que os trabalhadores portugueses e o seu trabalho é muitas vezes complementar ao emprego existente. Neste sentido, vários estudos demonstram que maior imigração não é sinónomo de maior desemprego ou baixa de produtividade. Bem pelo contrário.
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E quanto à criminalidade? Será verdade que a entrada de imigrantes causa (ou pode causar) um aumento da criminalidade? Muito se discute sobre o assunto e muitas vezes ouvimos nos meios de comunicação social que este ou aquele ucraniano violou alguém ou que este ou aquele romeno roubou mais uma loja. Se é assim, será que os imigrantes não aumentam o desemprego, mas originam um aumento da taxa do crime?
Sinceramente, não conheço nenhum estudo para Portugal. No entanto, ontem foi publicado um estudo na Grã-Bretanha sobre o assunto. O aparecimento deste estudo faz sentido. Os britânicos andam assustados com o "grande" aumento de criminalidade provocado pela chegada de mais de um milhão (pelo menos) de imigrantes dos países da Europa de Leste (i.e, dos países do último alargamento da União Europeia). Contrariamente aos outros países da UE, a Grã-Bretanha abriu imediatamente as portas a estes cidadãos do Leste europeu e os resultados não se fizeram esperar: muitos imigrantes e maior criminalidade... ou... será que não?
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À primeira vista, até parecia que sim. Quase todos os dias há relatos deste ou daquele crime provocado por um canalizador polaco, ou a violação levada a cabo por um português malvado (porque os portugueses têm também afluido ao Reino Unido em grandes números nos últimos anos), ou um crescimento da criminalidade organizada devido à chegada das redes mafiosas dos países de Leste. Não é assim de espantar que os media têm feito uma grande cobertura destes crimes um pouco por todo o território britânico.
Deste modo, seria de esperar que este estudo sobre o crime imigrante confirmasse aquilo que era reportado nos media. Mas não foi. Para espanto de muitos, o relatório encomendado pelo Ministério da Administração Interna britânico conclui que as taxas de criminalidade das comunidades polacas, romenas, búlgaras, entre outras, são semelhantes às taxas de criminalidade da restante população.
Ainda mais, a taxa de criminalidade tem vindo a baixar nos últimos anos, apesar da chegada de centenas de milhares de novos imigrantes. Só no último ano a taxa de criminalidade baixou 9 por cento... E estes são os factos.
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O que é que tudo isto quer dizer? Que a ideia que mais imigração traz consigo um aumento da criminalidade é simplesmente um mito e é errada. Esta é uma história simplista com contornos populistas, mas pouco verdadeiros. É assim no Reino Unido (e no Canadá e nos Estados Unidos) e certamente assim será em Portugal.

PREÇOS PORTUGUESES


Segundo o Eurostat, tem havido um crescimento dos preços um pouco por toda a Europa, aliás, em linha ao que tem acontecido noutros países. Os preços em Portugal têm crescido também, mas a uma taxa mais baixa do que tem acontecido na Europa. A única excepção é o álcool e o tabaco, produtos que ainda são taxados a taxas mais baixas do que na Europa. Mesmo assim, por enquanto, nada de dramático nesta subida dos preços. Por enquanto, os sinais da estagflação ainda são bastante ténues.

DINOSSAURO EXCELENTÍSSIMO



Dan Kitwood/Getty Images
Se fosse há 65 milhões de anos...

16 abril 2008

O MERCADO DAS ALMAS

A propósito da propagada visita do papa aos Estados Unidos, vale a pena tecer as seguintes considerações sobre aquilo que podemos baptizar do mercado das almas.
Actualmente, a igreja católica enfrenta três grandes problemas. O primeiro é a competição das outras denominações cristãs. Este problema não é novo, pois já existe (pelo menos) desde a Reforma Protestante levada a cabo por Lutero e outros. Mesmo assim, é evidente que em países anteriormente extremamente católicos (como, por exemplo, o Brasil), a influência da igreja católica tem vindo a diminuir significativamente, muito devido à crescente concorrência de outras igrejas cristãs e de outras doutrinas. Para um(a) economista, a competição é sempre de saudar, pois os preços diminuem e os consumidores beneficiam. Para os crentes, a competição entre igrejas e entre fés é igualmente boa, pois os consumidores da religião (os crentes) têm mais escolha e o “preço” da salvação diminui (por exemplo, se antigamente não ir à missa era considerado um pecado mortal que levava à ostracização dos fiéis, hoje em dia tal omissão é bem menos grave e bem menos punível). Mas, para a igreja católica, maior concorrência significa o fim do seu tradicional monopólio no mercado das almas. A igreja já não é a única a determinar o “preço” da salvação.
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Em segundo lugar, a igreja católica sofre actualmente de uma crise de vocações. Isto é, há cada vez menos jovens dispostos a tornarem-se padres, o que tem diminuído o número de sacerdotes e tem envelhecido a igreja. O envelhecimento da igreja católica é preocupante, pois quanto maior for a idade média dos sacerdotes, mais conservadora tenderá a ser a igreja, diminuindo ainda mais a sua influência nas sociedades modernas. Qual é a causa da crise de vocações? É simples: o preço do sacerdócio é demasiado elevado, pelo menos para muitos jovens ocidentais. Ser-se padre na igreja católica implica uma série de sacrifícios, incluindo um celibato que não é exigido por outras igrejas cristãs. Quando a igreja tinha o monopólio do mercado das almas cristãs, não havia problema: o preço do sacerdócio podia ser elevado, mas a quantidade de padres podia ser mantida, pois não havia concorrência. A competição com outras igrejas cristãs acabou com isso: um jovem pode tornar-se num padre cristão mas casar-se na mesma. Para tal, basta optar sair da igreja católica. Isto é, uma maior escolha pode ser boa para os crentes, mas é claramente má para uma instituição que costumava deter o monopólio do mercado das almas. Por outro lado, a diminuição do preço do sacerdócio poderá igualmente acontecer através do aumento da oferta de potenciais sacerdotes. Como? Abrindo a vocação sacerdotal às mulheres, assim como já é prática noutras igrejas cristãs.
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Finalmente, existe o problema do menor número de almas disponíveis. Isto é, a frequência dos fiéis nas igrejas tem vindo a diminuir substancialmente nos últimos anos. Por um lado, a redução do número de fiéis deve-se à crescente concorrência de outras igrejas e fés. Mais oferta no mercado das almas significa menos almas disponíveis para a igreja católica. Ainda assim, é de assinalar que este problema não ocorre noutras igrejas em ascensão ou noutras fés (como a muçulmana). Porquê? Porque um dos grandes dilemas da igreja católica é a sua crescente falta de competitividade.
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Ora, o que é que se aconselha às economias com problemas de competitividade? Cortar os custos, aumentar a atractividade dos bens e serviços produzidos e reestruturar. É exactamente isso que deve fazer a igreja católica se quiser recuperar a sua tradicional influência no mercado das almas cristãs:
  • diminuir o preço do sacerdócio (i.e., acabar com o celibato e com o monopólio masculino),
  • melhorar o marketing das vocações (algumas igrejas já o fazem, tais como http://www.nypriest.com/), e
  • reestruturar a hierarquia da igreja, tornando-a mais atractiva.
Por mais que estas verdades custem ouvir a alguns sectores desta instituição, a verdade é que, se quiser aumentar a sua influência no mundo, a igreja católica tem que ser mais sexy, mais atraente e mais aprazível quer para os fiéis quer para os próprios potenciais sacerdotes. Só assim é que a igreja católica poderá tornar-se mais competitiva. Só assim é que a igreja católica irá novamente restabelecer o seu domínio no mercado das almas.

O MERCADO DAS ALMAS (2)

Está tão bem feito que parece um video dos apoiantes de Barack Obama. Mas não é. É um video sobre os padres de Nova Iorque. Sobre ser-se sacerdote na Big Apple. Chama-se "Deus nas ruas de Nova Iorque". O marketing da internet já chegou ao mercado das almas americanas. Vale a pena ver.

FACTO: PREÇOS ALIMENTARES

Segundo a UNESCO, os preços do trigo a nível mundial subiram cerca de 103 por cento no último ano. Os preços da soja aumentaram 87 por cento. O Banco Mundial estima que os preços alimentares a nível global cresceram cerca de 83 por cento nos últimos 12 meses.

SUBIDA DOS MARES

Um novo estudo estima que a subida dos mares está a acontecer a um ritmo bastante mais rápido do que o previsto até agora. Adaptação e prevenção são cada vez mais as palavras de ordem.

NOVAMENTE A POBREZA MUNDIAL

A propósito deste post do Pedro Lains e este do Manuel Fonseca, vale a pela relembrar que a pobreza mundial tem decrescido um pouco por todo o mundo, tanto a nível relativo quer absoluto (alguns números já foram apresentados aqui). A razão? Na última década, os países subdsenvolvidos registaram as mais altas taxas de crescimento económico desde sempre. Países anteriormente alegadamente condenados ao fracasso e à miséria têm conseguido emerger das cinzas da pobreza e, aos poucos e poucos, têm alcançado verdadeiros milagres económicos. Estes factos não são de conhecimento geral, porque os media quase sempre preferem enfatizar as desgraças em vez dos sucessos. Mas há sucessos e muitos. Dito isto, uma grande camada da população mundial (o "Bottom Billion" do Paul Collier) permanece desesperadamente pobre. Mesmo assim, nunca houve tanta esperança, nunca houve tanto desenvolvimento como agora. Esperemos que a subida dos preços dos produtos alimentares e/do petróleo não façam descarrilar esta autêntica locomotiva do desenvolvimento.

PAZ EM RAMALLAH

Muhammed Muheisen/AP
Quando a vida é normal em Ramallah, na Palestina.

15 abril 2008

CRISE? QUAL CRISE?

Segundo o PUBLICO, dentro de 4 anos, Portugal terá mais carros por habitante do que o Japão. De acordo com as previsões publicadas no jornal, em 2012 Portugal terá 583 carros por cada mil habitantes, enquanto o Japão terá 525. Portugal terá então mais carros por habitante do que a Inglaterra (555) e a Bélgica (547), mas menos do que a Alemanha (590), o Luxemburgo (690), a Espanha (622), ou a França (598).
Ter mais carros por habitante do que o Japão e a Inglaterra parece-me bastante indicativo do nosso amor pelos carros, mas não só. Também é bem demonstrativo que a pseudo-crise não é suficiente para dissuadir as famílias portuguesas a comprarem carro próprio. E ainda bem que assim é.

NÃO ULTRAPASSAR


Joel Philippsen/The Republic/AP

O MAIOR EMISSOR


A China já é o maior emissor de dióxido de carbono do mundo, tendo o privilégio de ultrapassar os Estados Unidos nesta categoria pouco honrosa . Claro que a China ainda não é o país que emite mais CO2 por habitante. Bem longe disso. E, relembre-se, a China continua a ter um PIB per capita bastante mais baixo do que os países da OCDE, o que quer dizer que a margem de manobra para os chineses aumentarem as suas emissões por habitante ainda é muito larga. Já agora, ficam aqui alguns indicadores das emissões de dióxido de carbono. Em 2004, os maiores emissores de CO2 (em percentagem do total) eram:
  1. Estados Unidos 30.2 %
  2. China 18.4 %
  3. União Europeia 11.4 %
  4. Russia 5.6 %
  5. India 4.9 %
  6. Japão 4.6 %
  7. Alemanha 3.0 %
  8. Canadá 2.3 %
  9. Reino Unido 2.2 %
  10. Coreia do Sul 1.7 %

A nível das emissões por habitantes, os 5 maiores emissores de CO2 eram (por ordem relativa):

  1. Luxemburgo
  2. Estados Unidos
  3. Austrália
  4. Canadá
  5. Finlândia

SISMOS DELES E SISMOS NOSSOS

Novos cálculos feitos por cientistas revelam que a probabilidade da Califórnia (o estado mais populoso ds Estados Unidos) ser abalada por um sismo de magnitude 6.7 ou mais (na escala de Richter) nos próximos 30 anos é superior a 9o por cento. No Sul da Califórnia (onde se situam Los Angeles e San Francisco) a probabilidade é cerca de 97 por cento. Ou seja, estes cálculos confirmam aquilo que já se suspeitava, que um sismo de grande magnitude irá atingir a Califórnia nos próximos anos. O que fazer? Fugir? Emigrar? Abandonar o estado? Talvez. Mas provavelmente a melhor solução é mesmo prevenir o mais possível os estragos inerentes a uma tragédia desta dimensão. É isso que as autoridades federais e locais americanos têm procurado fazer.
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Apesar das probabilidades não serem tão grandes como na Califórnia, é muito provável que um sismo de magnitude elevada atinja o sul de Portugal nos próximos anos. E o que é que fazemos? Não muito. Acima de tudo, continuamos a ignorar o problema. Em vez de prevenir, continuamos a reagir. Uma estratégia que pode resultar noutros contextos, mas que, definitivamente, deixa muito a desejar quando ocorre este tipo de cataclismos naturais.

14 abril 2008

OS INCENTIVOS DA INTERIORIDADE

Depois do disparate relacionado com a proposta de uma nova Constituição, o presidente do PSD, Luís Filipe Menezes, fez uma aposta acertada. Seguindo algumas das medidas propostas pelo presidente da câmara de Bragança, Luís Filipe Menezes veio a público defender a taxas de IRC "muito reduzidas" para empresas que se instalem em "concelhos deprimidos". É claro que ainda há muito que limar a estas "propostas" (por exemplo, o que é que são concelhos deprimidos? O que é que constitui a depressão de um concelho? Poderá um concelho ser considerado "deprimido" se estiver rodeado por outros deprimidos?). Mesmo assim este é um bom início. E finalmente conhece-se uma proposta concreta ao presidente do PSD. Só por isso vale a pena.
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Penso que a melhor maneira de prosseguir tais propostas seria explorar as propostas do presidente da câmara de Bragança, António Jorge Nunes, que sugeriu um pacote de incentivos fiscais para as regiões interiores, que incluem:
  • uma redução drástica do IRC (zero para as empresas que se instalem de novo, 10 por cento para as restantes),
  • uma redução até 50 por cento do IRS para os residentes no interior,
  • uma redução em 5 por cento do valor do IVA
Todas estas seriam boas ideias para começarmos a contrariar a crescente desertificação do interior do país. No entanto, temos também que estar cientes das dificuldades que tais iniciativas iriam criar. Por exemplo, não seria de estranhar que, com taxas de IVA e de IRC tão baixas, iriam surgir muitas empresas fictícias que supostamente estariam sediadas no interior, mas que, na prática, estariam em Lisboa ou no Porto. Ou seja, o impacto real seria nulo para o interior do país. Os mecanismos de controlo e de implementação de tais medidas também me parecem assumir contornos delicados (e até complicados). Dito isto, tiro o chapéu tanto ao presidente da câmara de Bragança como ao presidente do PSD. Este é um tema que vale a pena explorar, porque afecta uma grande parcela da nossa população, que tem permanecido esquecida pelos grandes centros populacionais e pelos dirigentes políticos.
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Ainda assim, sinceramente, não acho que é o combate ao Mezzogiorno português que dará ao presidente do PSD a tão almejada vitória eleitoral. Quem é que realmente se interessa com os esquecidos do interior? (Eu interesso-me, porque sou originário do interior...) José Sócrates tem as suas raízes no interior, mas, apesar disso, ainda não vi uma grande aposta na temática do desenvolvimento dessas regiões do país (apesar das estradas). Porquê? Porque o primeiro-ministro não se interessa? Não creio. É mais provável que tal atitude se deva a outra razão: infelizmente, não se ganham eleições tendo a interioridade como principal bandeira eleitoral. E é isso que o presidente do PSD irá descobrir dentro em breve.

AS MANIFESTAÇÕES E AS LEIS LABORAIS

Ainda não conheço em profundidade os preceitos da revisão das leis laborais em preparação pelo governo. Mesmo assim, parece-me óbvio que, pelas declarações do Ministro do Trabalho nos últimos dias, as novas leis preconizarão uma maior flexibilidade do trabalho. O que é que isso quer dizer em português corrente? Que será mais fácil contratar e despedir trabalhadores. É uma lógica que seduz a grande maioria dos economistas, pois maior flexibilidade significa maior capacidade de adaptação das empresas a condições adversas. Contrariamente ao que afirmam algumas centrais sindicais, maior flexibilidade não implica necessariamente mais emprego precário. Portugal já é dos países europeus com elevadas taxas de precaridade do emprego. Duvido que uma maior flexibilidade do emprego aumente essas mesmas taxas.
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O que a maior flexibilidade do emprego irá fazer é que as empresas sejam capazes de responder mais rápida e adequadamente aos choques internos e externos que a nossa economia possa sofrer (quer seja a globalização, quer a recessão num país europeu, quer outro factor qualquer). E quando as empresas são capazes de responder mais rápida e adequadamente, mais facilmente conseguem recuperar das adversidades, e mais facilmente conseguem restaurar as suas produções e empregos.
É claro que nem todos gostam das alterações das leis laborais. Mexer nas leis do trabalho implica mexer com interesses instalados. Mexer com os dinossauros das nossas organizações sindicais. Mexer com alguns sindicatos que se preocupam mais em defender as opções políticas e ideológicas dos seus dirigentes do que com o bem-estar dos seus associados. Mexer com o dogma cristalizado e ideológico de décadas doutrora. Mexer, cruz credo!, com os direitos "adquiridos" dos trabalhadores.
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Não é assim de estranhar que aquelas organizações-sindicais-que-são-autênticos-apêndices-de-alguns-partidos-políticos já anunciaram manifestações para esta semana. A unidade sindical é assim: dogmática, monologante, e fossilizada no tempo. E suspeito inclusivamente que nem mesmo as leis laborais mais liberais do mundo seriam capazes de modificar o comportamento de contornos autistas destas centrais sindicais. Há pessoas e instituições que não mudam nem mesmo quando o mundo ameaça ruir à volta delas.

O MITO DA CRIMINALIDADE ELEVADA (2)

A propósito dos comentários em relação ao post da criminalidade, foram apontados vários factores relevantes. É, de facto, correcto assinalar que as estatísticas oficiais não incluem os crimes que não são participados. Muitos não o são porque são de pequena dimensão e muitos outros não o são porque as vítimas têm receio ou vergonha de o fazer. É assim certo assinalar que as estatísticas do número dos crimes são intrinsicamente incompletas e insuficientes.
Mesmo assim, é importante sublinhar que a tabela apresentada do post é comparativa. Se muitos dos pequenos crimes não são participados em Portugal é muito provável que também não o sejam noutros países.
Por outro lado, apesar de ainda haver um longo caminho a percorrer, parece-me evidente que registámos muitos progressos nesta matéria. Alguém acredita que não existisse pedofilia ou outros crimes horrendos no tempo da ditadura ou mesmo nos anos 80? Será que a pedofilia só surgiu com a internet? Claro que não. Mas as nossas estatísticas assim parecem indiciar.
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É por isso temos que ler e interpretar todas estas estatísticas com a máxima atenção. E temos que estar também atentos às correlações inexistentes que muitas vezes são reportadas nos media. Por exemplo, há uns dias surgiu uma notícia que os crimes sexuais estavam a aumentar em Portugal (uma notícia que, aliás, surgiu da Procuradoria da República). Mas, será que estão mesmo ou será que os números apenas reflectem taxas de participação destes crimes mais elevadas? A resposta é: depende (principalmente do contexto). E é por isso que lá por existir uma série de números não quer dizer que a interpretação associada a esses números seja a correcta. Temos que analisar o processo como esses números foram angariados, bem como o contexto em que foram produzidos. Só então é que estaremos em condições para retirar conclusões.

BRAVO, ESPANHA

Aplausos para José Luis Rodríguez Zapatero, que nomeou mais mulheres do que homens para o seu novo governo. Certamente um sinal dos tempos que estão para vir e um reflexo do imenso progresso que se tem registado nas sociedades ocidentais (principalmente, mas não só) nas últimas décadas. Hoje em dia é fácil esquecer que a mulheres só tiveram direito a voto muito mais tarde do que os homens e que, até recentemente, a governação de um país estava praticamente vetada ao sexo feminino. Até então, as mulheres eram para ficar atrás dos grandes homens, não há frente deles. Não sou grande adepto da afirmação positiva das mulheres na política (mais por ser uma imposição do que por qualquer discordância ideológica), mas é reconfortante haver governos europeus em que os homens não estão em maioria.

TRATADO DE LISBOA

13 abril 2008

O ODOR DE SANTIDADE

Fotografia: Plinio Lepri/AP
Hoje há eleições em Itália. Berlusconi tenta mais uma vez voltar ao poder. Numa entrevista durante a campanha, Berlusconi pediu ao jornalista que o entrevistava para lhe cheirar a mão para que pudesse verificar que cheirava a santidade. Porquê? Por tudo o que Berlusconi teve que passar durante a campanha. Um grande santo, não há dúvida nenhuma...

PREÇOS ALIMENTARES (3)

Os avisos sobre a dramática subida dos preços dos produtos alimentares continuam. Agora for a vez do presidente do FMI, que manifestou-se muito preocupado com o impacto da subida dos preços dos cereais e de outros bens alimentares nos países subdesenvolvidos. Segundo o FMI, a subida de preços poderá originar a escassez de alimentos em várias partes do mundo, dando azo a fomes que poderão abranger centenas de milhares de pessoas. Para os países mais pobres, mais do que a crise financeira, é a crise dos preços alimentares que interessa e que virá ter um impacto junto das suas populações.

COMEMORAR AS NACIONALIZAÇÕES

O PCP continua igual a si próprio e, como todos sabemos, nem mesmo a queda do muro de Berlim fez mudar as convicções mais profundas do partido. Assim , não é de estranhar que a liderança do PCP tenha arranjado mais um pretexto para juntar os seus fieis militantes na Casa do Alentejo. Qual foi o pretexto? Comemorar os 33 anos das nacionalizações da banca e dos seguros. Só mesmo o PCP poderia ter tal iniciativa. Só mesmo o PCP poderia celebrar um processo que condenou grande parte dos nossos sectores produtivos à ineficiência e ao compadrio durante anos e anos a fio. Nem mesmo os "comunistas" chineses acreditam na nacionalização de empresas privadas (a não ser em casos extremos). Só mesmo o PCP permanece com esta fé inabalável. É caso para dizer: Assim, se vê, a força do PC!

A NOTA DE 50 MILHÕES


A situação política no Zimbabué continua num impasse. Apesar da ajuda sul-africana, ainda não se sabe se o governo e a oposição irão chegar a um acordo. Os votos vão ser recontados, mais ainda não há certezas sobre a reacção de Mugabe perante resultados que lhe são desfavoráveis. Entretanto, a economia continua em queda livre. A inflação já está acima dos 100 mil por cento, e nem mesmo as notas de 10 milhões de dólares do Zimbabué chegam para as encomendas. Mas, não há qualquer problema. Já foram introduzidas notas de 50 milhões de Zimbabué dólares, que valem menos de 2 ou 3 euros... Mugabe deve continuar orgulhoso por mais este feito do seu excelente governo.

12 abril 2008

O FIM DO ALFABETO



O que faria se lhe dissessem que tem um mês para viver? Viajar? Viver os últimos dias intensamente? Sentar-se e esperar a morte? Rezar até ao fim dos seus dias? Converter-se a uma religião nunca dantes praticada? Viver exactamente como dantes? Reviver o passado?
^
Um mês para viver. Este é o tema de “The End of the Alphabet”, um pequeno grande livro de um autor desconhecido até agora. C.S. Richardson trabalha na indústria literária há mais de 25 anos, mas não como escritor. É book designer, já premiado com alguns dos galardões da indústria. Apesar da ideia não ser nova, o livro é tudo menos um cliché. A escrita é sóbria. O ritmo é perfeito. Frases curtas. Lentas. Cheias de significado. Intensas.
^
Lê-se num fôlego. Um livro altamente recomendável. Não sei se a tradução portuguesa já está a ser feita. Esperemos que sim. Se não, aconselha-se vivamente que as editoras nacionais não deixem passar esta oportunidade para publicar uma obra simplesmente notável.
Aqui está uma sinopse do editor canadiano:
“The End of the Alphabet is about Ambrose Zephyr, an absolutely average man who is content with the habit of his days. His only extraordinary aspect is his utter passion for his wife of some years, Zappora Ashkenazi, whom he calls Zipper. Zipper is elegant and distinctive, and Ambrose is besotted with her; even after years of marriage, he simply cannot understand what she sees in him. When Ambrose fails his “annual medical exam” and is told by his doctor that he has only a month to live, he decides to contradict his impending death by embarking on a wild journey, an alphabetical “grand tour” of all the places on the globe that demand visiting. And thus begins a frantic odyssey, from Amsterdam to Berlin to Chartres to Paris to Florence and onwards, with Ambrose trying to outrun his limited time by gulping down all the sights of a bountiful world and its infinite variety. Zipper travels with him, watching her husband’s physical erosion and struggling to negotiate her own pain and grief. Until gently, quietly, the two of them reach an understanding about love and mortality. Instead of going for the easy structure of the complete alphabet, Richardson interrupts their journey and they return to their London home to face together the final and most inevitable destination, death.”

IDOLOS DE RAMALAH

Fotografia: Muhammed Musheisen-AP

Cristiano Ronaldo entre Sadam Hussein, Arafat, e o ex-lider do Hamas? Onde é que uma combinação tão estranha poderá ser encontrada? Numa loja em Ramalah, na Palestina.

A SOCIEDADE DE MARTE

Há quem procure marcianos entre nós e há quem os quer procurar em Marte. As viagens tripuladas com humanos a Marte ainda estão a umas décadas de distância. Mesmo assim, há já quem ande a ensaiar as condições ambientais desse planeta no deserto do Utah.

MISS SOBREVIVENTE DE MINAS (2)

Lembram-se da Miss Sobrevivente de Minas em Angola? Pois aqui está a vencedora. Qual é o seu maior sonho? Poder exercer a sua profissão de electricista. Segundo esta mulher extraordinária: "Os 4500 dólares, o fogão, o frigorífico e um conjunto de bens de conforto que ganhou no concurso vão servir para "começar a vida" de "mulher independente", desde logo para comprar um terreno onde pensa construir a sua casa". Uma história bonita, sem dúvida.

11 abril 2008

O MERCADO E O ACORDO ORTOGRÁFICO (2)

A propósito de alguns comentários do post sobre o acordo ortográfico, vale a pena fazer as seguintes considerações. No fundo, o que está em causa na questão do acordo ortográfico é escolher entre uma solução de mercado e uma estratégia centralizadora. A nível económico, os mercados decidem os preços e as quantidades de produtos a produzir, enquanto que nas sociedades sem mercados (mais centralistas), é o Estado que decide o preço e as quantidades a produzir.
A nível da questão da lusofonia, o mercado é o que temos actualmente: cada povo lusófono decide o rumo a tomar em relação à grafia e gramática da sua língua. A quantidade de variações gramaticais é decidida pelo mercado (isto é, pelas preferências de cada povo). Por outro lado, o acordo ortográfico é um exemplo de uma estratégia centralista. Neste caso, os vários países lusófonos reuniram-se e decidiram esquecer os preceitos do mercado, preferindo uniformizar os preços e as quantidades de variedades gramaticais.
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Quem está certo, o mercado ou a estratégia centralizadora? A resposta certa é: depende das circunstâncias. Habitualmente, os(as) economistas preferem os mercados, pois alcançam-se resultados de maior eficiência e menores preços. Neste sentido, seria tentador descartar o acordo ortográfico e deixar o mercado determinar a grafia e gramática de cada país lusófono.
No entanto, há uma complicação. Os mercados funcionam bem se não houverem falhas de mercado. Isto é, há circunstâncias em que os mercados não são suficientes para garantir a eficiência económica e/ou a provisão de bens. Este é caso dos chamados bens públicos, nos quais os benefícios sociais se sobrepõem aos privados. Exemplos? A defesa nacional, entre outros. A defesa de um país é um bem público porque não só o meu consumo desse bem não preclui a(o) leitor(a) de o consumir também, mas também porque o meu consumo da defesa nacional não exclui o(a) leitor(a) de o fazer também.
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Deste modo, se considerarmos a lusofonia como um bem comum, ou um bem público da comunidade lusófona, podemos argumentar que actualmente há várias falhas de mercado na língua portuguesa. Nomeadamente, há ineficiência em relação à proliferação de diferentes grafismos e escritas nos diferentes países. Qual é a melhor forma de eliminar essa ineficiência? Deixar o mercado de lado e centralizar/uniformizar a escrita. Isto é, implementar um acordo ortográfico que satisfaça os diferentes interessados pelo consumo desse bem público comum que é a lusofonia.
Ora, o que temos de decidir de uma vez por todas é se acreditamos mais no mercado ou nas falhas deste. No entanto, mesmo se decidirmos optar pela opção centralizadora (isto é, pelo acordo ortográfico), devemos estar cientes que o mercado continuará a existir. Ou seja, mesmo que o acordo ortográfico seja finalmente ratificado, é muito natural que, aos poucos e poucos, surjam nos vários países diferentes preços e quantidades distintas do grafismo e da gramática da lusofonia. Centralizar o mercado linguístico da lusofonia pode ser uma opção de curto prazo, mas é provável que as forças de mercado acabarão por vencer a longo prazo.

UNIVERSIDADE DO ALGARVE

O PUBLICO de hoje refere que a Universidade do Algarve está disposta a alienar património com o intuito de salvaguardar o futuro da instituição. A propósito desta notícia, decide retirar um texto do "Mitos da Economia Portuguesa", onde se refere a falta de aproveitamento do potencial da universidade algarvia:

"Não se consegue compreender como é que o Algarve tem uma universidade de qualidade sofrível em quase todas as áreas de investigação. Ora, no lugar onde está localizada, a Universidade do Algarve deveria ser uma das melhores do país, se não mesmo a melhor. De facto, é surpreendente como é que o Algarve não consegue atrair professores estrangeiros de craveira internacional ou, pelo menos, de qualidade superior à média nacional. Porquê? Sabendo da qualidade de vida que poderiam usufruir no Algarve, não seria possível à universidade algarvia atrair professores de qualidade internacional? Claro que sim. Se as condições forem boas (financeiramente e a nível de investigação), eu garanto-lhes que muitos professores ingleses, alemães, ou holandeses de 40, 50 ou 60 anos não se importarão nada de deixarem as suas instituições e os seus países para virem leccionar e fazer investigação para o Algarve. No entanto, actualmente, poucos ou nenhuns o fazem. Porquê? Porque os salários e a fiscalidade não são competitivos, a qualidade dos departamentos e faculdades não é das melhores, e os incentivos à investigação deixam muito a desejar. E porque é que os sucessivos reitores da instituição algarvia não fazem nada (ou quase nada) por isso? Porque não existe vontade de incomodar os interesses instalados. Não existe coragem para lutar contra práticas enraizadas durante décadas de imobilismo e marasmo académico. E este não é um mal exclusivo do Algarve. É um mal extensivo à grande maioria das universidades e politécnicos portugueses."

A MODA AFEGÃ


A moda em Herat, Afeganistão.

O BOICOTE DOS JOGOS

Cartoon de Stuart Carlson (www.slate.com)

10 abril 2008

O MITO DA CRIMINALIDADE ELEVADA

Segundo alguns media, a situação da criminalidade em Portugal não pára de aumentar e está mesmo a ficar fora do controlo. Ora são as mortes violentas, ora assassínios crueis, ora os assaltos às estações de serviço, ora os abusos sexuais, ora o rapto de menores, ora ora ora. A sitação é tão má que alguns entre nós se dedicam a semear o pânico e a desconfiança, principalmente contra aqueles que são mais visíveis, isto é, os imigrantes. Afinal, se a criminalidade violenta tem crescido significativamente na última década e foi durante este período que assistimos a um aumento sem precedentes na criminalidade, é fácil concluir de quem é a culpa.
Ou ... será que não? (A resposta é um enorme não).
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A verdade é que se atentarmos para os números existentes é fácil perceber que essa teoria (esse mito) não é verdadeira. É neste sentido que se deve saudar o artigo de hoje do PUBLICO, no qual se divulgam os números do Relatório Anual de Segurança Interna. De acordo com este relatório, registou-se uma decréscimo significativo da criminalidade violenta em Portugal durante o ano de 2007. Para além do mais, e contra a percepção de muitos entre nós, Portugal continua a ser um país relativamente pacífico, pelo menos em comparação com os outros países ocidentais. Portugal não é um paraíso sem crime, mas também não é um país prestes a explodir social ou criminalmente. E tudo o resto são alaridos empolados pelos media.


A CRISE MUNDIAL

O FMI alerta que a economia mundial vive o seu pior choque financeiro desde a Grande Depressão dos anos 30 e prevê que as perdas relacionadas com o chamado escândalo do "subprime" possam totalizar um trilião de dólares. Mesmo assim, o Fundo prevê que a economia mundial cresça a uns saudáveis 3,7 por cento este ano. Se isto é uma crise, então que ela chegue a Portugal o mais depressa possível... (É claro que o FMI está principalmente com as ramificações que uma recessão da economia americana possa ter nas restantes economias. É por isso que justifica ou compreende o pessimismo).

A CRISE ALIMENTAR MUNDIAL

O New York Times tem hoje um editorial sobre a crise alimentar mundial. O jornal culpa principalmente a aposta dos países desenvolvidos nos chamados biocombustíveis, que tem aumentado desmesuradamente a procura de cereais para fins não alimentares. O crescimento da China e da Índia (e os seus maiores consumos de carne) não ajuda, mas os biocombustíveis agravam ainda mais a situação de relativa escassez de cereais. Ou seja, o jornal entende que os países desenvolvidos têm culpa no cartório em relação à subida dos preços alimentares. Por isso, o Times considera que os países desenvolvidos deviam aumentar a ajuda externa para colmatar as subidas dos preços dos produtos alimentares. É controverso, mas vale a pena ler

EMBAIXADOR RONALDO


Afinal, o Cristiano Ronaldo não é só fintas e golos. Seguindo os passos de Figo e de Mourinho, Ronaldo começa a participar activamente em campanhas para caridade. Ontem, Cristiano Ronaldo recebeu da UEFA um cheque no valor de 100 mil francos suíços devido ao seu papel como embaixador do programa Marque pela Cruz Vermelha. Este programa beneficia as vítimas de minas terrestres no Afeganistão, quer financiando-lhes próteses como sessões de fisioterapia e programas de formação profissional. No âmbito desta campanha, a UEFA doará 5 mil euros por cada golo marcado por Cristiano Ronaldo no Euro 2008. Esperemos que marque muitos. Quem disse que o futebol só serve para entreter as massas?

A TOCHA TIBETANA


Os protestos contra a repressão no Tibete continuam. A passagem da tocha olímpica pelas cidades do mundo continua a causar polémica. Desta vez foi São Francisco. As autoridades tiveram tanto receio que as coisas descambassem que a tocha quase não foi vista em público. Segue-se a Argentina, onde se esperam novos protestos. Quem diria que os Jogos Olímpicos seriam a melhor forma de aumentar a publicidade para a causa tibetana? Definitivamente, o feitiço virou-se contra o feiticeiro.

09 abril 2008

A DANÇA DOS NÚMEROS

O FMI anunciou hoje uma revisão das suas previsões do crescimento económico mundial. Segundo esta organização, o crescimento mundial em 2008 será cerca de 3,7 por cento, mais baixo do que em 2007 (quando a economia mundial cresceu a uma taxa perto dos 5 por cento). 3,7 por cento ainda é uma taxa muito boa historicamente, mas, é claro, já surgiram os habituais profetas da desgraça a jurar a pés juntos que estamos à beira do colapso da economia mundial. Enfim...
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Em Portugal, como estamos numa época de marasmo já há algum tempo, dá-se ainda mais atenção a estes profetas da desgraça. Neste sentido, como o FMI ajustou a previsão sobre o crescimento português para 1,3 por cento (abaixo dos 1,8 por cento anteriormente previstos), já há muitos a avisar que a crise irá continuar, que está mais que provado que o país não sai da cepa torta, que já só nos resta emigrar. Um disparate.
Porém, a dança dos números e das previsões não se fica por aqui. Ontem o governador do Banco de Portugal afirmou que a economia portuguesa deve crescer mais do que a Eurolândia, pela primeira vez em mais de 5 anos. Assim, quem tem razão? O FMI ou o Banco de Portugal?
Provavelmente, os dois até poderão estar certos. O crescimento português deverá ser menor este ano do que o ano passado, por causa do abrandamento da economia mundial. No entanto, a economia nacional poderá crescer acima da Eurolândia, pois a economia europeia parece estar a abrandar mais depressa do que a nacional.
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Mesmo assim, se tivesse que apostar numa destas duas previsões, eu preferia ir com o Banco de Portugal. Porquê? Porque, primeiro, o Banco de Portugal tem um conhecimento mais profundo da economia nacional. Segundo, as previsões do FMI parecem-me tão negativas porque dão mais importância às exportações nacionais, que estão a desacelerar em relação ao ano passado. As previsões do Banco de Portugal dão mais relevância ao investimento, que dá sinais de alguma recuperação.
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Ainda assim, é importante referir que tanto alarido por causa de umas previsões não faz sentido. Previsões são previsões e quase nunca estão certas. Como alguém disse, as contas fazem-se no fim. Entrarmos em pânico por causa de uma meras previsões não tem sentido nenhum.

AS FACES DE UM NÚMERO (2)

Mais sobre as faces de um número. Hoje debatemos os critérios de convergência, os tais do famoso (e infame) Pacto de Estabilidade, que tanta dor de cabeça nos tem causado.
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DESCIDA DO DÉFICE ORÇAMENTAL PARA 2.6%. É MUITO OU POUCO?
O mítico valor de 3% do défice orçamental foi fruto de um consenso dos diversos países que negociaram os critérios de convergência ao euro, bem como uma certa imposição da Alemanha (que queira desencorajar a adesão ao euro de países com fraca credibilidade a nível fiscal). Dito isto, interessa referir que não existe nenhuma teoria económica ou evidência empírica que nos diga que um défice orçamental acima dos 3 por cento é perigoso para a estabilidade económica. Aliás, antes da adesão ao euro, nós já tivemos por várias vezes défices acima dos 3 por cento do PIB. Não nos aconteceu nada. Ainda estamos aqui.
Claro que agora há as regras do Pacto de Estabilidade que exigem (aos países pequenos, pelo menos) que o défice orçamental seja menor que 3% do PIB. Por isso, interessa perguntar: e 2,6% é razoável? Os 2.6% não são altos nem são baixos. Parecem elevados no contexto do Pacto de Estabilidade mas não são certamente dramáticos. Vários países vivem bem com défices acima dos 3 por cento durante vários anos. O que interessa é que o défice orçamental seja controlado ao longo do ciclo económico. Isto é, o que interessa é poupar em tempos de vacas gordas (em fases de expansão económica) para termos meios de subsistência em tempos de vacas magras (i.e., em recessão).
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DÍVIDA PÚBLICA ACIMA DOS 60%. É BOM OU MAU?
Mais uma vez, os 60% foram encontrados um pouco ad hoc pelos países que negociaram os critérios de convergência. Lá por termos a dívida pública acima dos 60% do PIB não é muito significativo. Durante vários anos, a Bélgica teve dívidas públicas acima dos 100% do PIB e sobreviveu perfeitamente bem. Convém conter a dívida pública (e o défice orçamental) não porque o futuro do país disso depende, mas sim para evitar impostos mais caros no futuro. É porque quando os governos aumentam a dívida pública ou o défice orçamental estão a transferir impostos hoje para impostos amanhã. E como os governos poderão não estar cá amanhã, existe todo o interesse em limitar este poder dos governos, para que estes não abusem da sua posição dominante. Só isso.