16 abril 2008

O MERCADO DAS ALMAS

A propósito da propagada visita do papa aos Estados Unidos, vale a pena tecer as seguintes considerações sobre aquilo que podemos baptizar do mercado das almas.
Actualmente, a igreja católica enfrenta três grandes problemas. O primeiro é a competição das outras denominações cristãs. Este problema não é novo, pois já existe (pelo menos) desde a Reforma Protestante levada a cabo por Lutero e outros. Mesmo assim, é evidente que em países anteriormente extremamente católicos (como, por exemplo, o Brasil), a influência da igreja católica tem vindo a diminuir significativamente, muito devido à crescente concorrência de outras igrejas cristãs e de outras doutrinas. Para um(a) economista, a competição é sempre de saudar, pois os preços diminuem e os consumidores beneficiam. Para os crentes, a competição entre igrejas e entre fés é igualmente boa, pois os consumidores da religião (os crentes) têm mais escolha e o “preço” da salvação diminui (por exemplo, se antigamente não ir à missa era considerado um pecado mortal que levava à ostracização dos fiéis, hoje em dia tal omissão é bem menos grave e bem menos punível). Mas, para a igreja católica, maior concorrência significa o fim do seu tradicional monopólio no mercado das almas. A igreja já não é a única a determinar o “preço” da salvação.
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Em segundo lugar, a igreja católica sofre actualmente de uma crise de vocações. Isto é, há cada vez menos jovens dispostos a tornarem-se padres, o que tem diminuído o número de sacerdotes e tem envelhecido a igreja. O envelhecimento da igreja católica é preocupante, pois quanto maior for a idade média dos sacerdotes, mais conservadora tenderá a ser a igreja, diminuindo ainda mais a sua influência nas sociedades modernas. Qual é a causa da crise de vocações? É simples: o preço do sacerdócio é demasiado elevado, pelo menos para muitos jovens ocidentais. Ser-se padre na igreja católica implica uma série de sacrifícios, incluindo um celibato que não é exigido por outras igrejas cristãs. Quando a igreja tinha o monopólio do mercado das almas cristãs, não havia problema: o preço do sacerdócio podia ser elevado, mas a quantidade de padres podia ser mantida, pois não havia concorrência. A competição com outras igrejas cristãs acabou com isso: um jovem pode tornar-se num padre cristão mas casar-se na mesma. Para tal, basta optar sair da igreja católica. Isto é, uma maior escolha pode ser boa para os crentes, mas é claramente má para uma instituição que costumava deter o monopólio do mercado das almas. Por outro lado, a diminuição do preço do sacerdócio poderá igualmente acontecer através do aumento da oferta de potenciais sacerdotes. Como? Abrindo a vocação sacerdotal às mulheres, assim como já é prática noutras igrejas cristãs.
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Finalmente, existe o problema do menor número de almas disponíveis. Isto é, a frequência dos fiéis nas igrejas tem vindo a diminuir substancialmente nos últimos anos. Por um lado, a redução do número de fiéis deve-se à crescente concorrência de outras igrejas e fés. Mais oferta no mercado das almas significa menos almas disponíveis para a igreja católica. Ainda assim, é de assinalar que este problema não ocorre noutras igrejas em ascensão ou noutras fés (como a muçulmana). Porquê? Porque um dos grandes dilemas da igreja católica é a sua crescente falta de competitividade.
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Ora, o que é que se aconselha às economias com problemas de competitividade? Cortar os custos, aumentar a atractividade dos bens e serviços produzidos e reestruturar. É exactamente isso que deve fazer a igreja católica se quiser recuperar a sua tradicional influência no mercado das almas cristãs:
  • diminuir o preço do sacerdócio (i.e., acabar com o celibato e com o monopólio masculino),
  • melhorar o marketing das vocações (algumas igrejas já o fazem, tais como http://www.nypriest.com/), e
  • reestruturar a hierarquia da igreja, tornando-a mais atractiva.
Por mais que estas verdades custem ouvir a alguns sectores desta instituição, a verdade é que, se quiser aumentar a sua influência no mundo, a igreja católica tem que ser mais sexy, mais atraente e mais aprazível quer para os fiéis quer para os próprios potenciais sacerdotes. Só assim é que a igreja católica poderá tornar-se mais competitiva. Só assim é que a igreja católica irá novamente restabelecer o seu domínio no mercado das almas.

2 comentários:

Anónimo disse...

Ora aqui está a prova que a Economia é como Ele...omnipresente


Nero_Azurra

Alvaro Santos Pereira disse...

Sem dúvida, Nero!

Abraço