30 abril 2009

GRIPE SUÍNA

O DN fez-me umas perguntas sobre o impacto económico da gripe suína. Aqui estão as minhas respostas:

DN_ O Banco Mundial estimava que uma epidemia de gripe da aves teria um impacto de 3 mil milhões de dólares na economia global. É possível prever os impactos desta nova gripe?

Certamente que, brevemente, quando tivermos uma noção mais concreta do impacto e da extensão do problema, irão surgir estimativas do impacto da gripe suína. O que sabemos é que o impacto final irá depender da extensão e difusão desta nova gripe. Tudo vai depender se vai haver realmente uma pandemia, quantos países serão afectados, etc.

DN- O fecho das fronteiras é a principal ameaça? Que efeitos pode ter?

Sim, o encerramento das fronteiras é uma das ameaças mais sérias. Se tal acontecesse, os efeitos económicos seriam bastante consideráveis, pois esta gripe surge num momento em que a economia mundial já está bastante debilitada. O encerramento das fronteiras irá lesar principalmente os países mais dependentes do comércio externo.

DN- Os mercados, depois de um impacto negativo nos primeiros dias, parecem agora estar a reagir bem... é de esperar que continuem a reagir bem?

Tudo vai depender da evolução da doença. Se a febre suína se tornar mesmo numa pandemia, o comércio internacional será muito atingido, o que seguramente irá afectar negativamente os resultados das empresas. Num tal cenário, certamente que os mercados irão reagir de forma negativa.

DN- Há empresas que podem sair a ganhar?

Há sempre empresas que podem sair a ganhar. Obviamente, muitas empresas do sector da saúde irão beneficiar, não só os produtores de medicamentos como o Tamiflu, mas também as empresas que vendem máscaras, produtos desinfectantes e sanitários, etc. Mas há muitos outros potenciais vencedores. Imaginemos um cenário em que se dá mesmo uma pandemia mundial e que o comércio internacional é seriamente afectado. Haverá produtores nacionais que poderão sair beneficiados se os seus concorrentes externos forem atingidos. Obviamente, se os preços dos produtores nacionais forem mais elevados do que os preços dos seus concorrentes internacionais, quem pagará a diferença serão os consumidores.

DN- Quais as que podem perder mais?

As empresas que podem perder mais são exportadores e importadoras, bem como aquelas que dependem de matérias-primas e bens intermédias para as suas produções. Ou seja, as empresas que podem perder mais são aquelas que mais dependem do comércio internacional para as suas actividades.

DN- É importante para as empresas estabelecerem planos de contingência?

Sim, claro que sim. Aliás, é muito provável que muitas empresas já o estejam a fazer, principalmente se dependerem de mercados externos para as suas produções

28 abril 2009

PROCEDIMENTOS EXCESSIVOS

Segundo o Publico, "A União Europeia lançou hoje oficialmente procedimentos por défices excessivos contra a França, a Espanha, a Irlanda e a Grécia, cujas finanças públicas se degradaram nos últimos meses." Pois fazem muito bem. Aliás, nem existe uma regra do (defunto) Pacto de Estabilidade que diz que as regras do Pacto não se aplicam quando as economias contraem mais de 0,75% ao ano. E se existe não interessa. O que interessa é salvaguardar a disciplina fiscal no seio da Eurolândia. Quanto a mim, eu nem aplicava os procedimentos pelos défices excessivos. Passava logo às multas. E se o desemprego aumentar ou se as economias estagnarem durante anos a fio, paciência. O que interessa é o equilíbrio orçamental.
Com dirigentes assim, como é que a Europa espera ter alguma credibilidade perante os seus cidadãos? Quando é que a Europa deixará de se auto-destruir?

SALAZARENTO VS MOBUTU

Mário Lino, o ministro responsável pela construção do TGV e do novo aeroporto internacional, não gostou das críticas do líder parlamentar do PSD sobre os grandes investimentos públicos do Governo no seu discurso do 25 de Abril. Segundo Mário Lino, «Ouvir o discurso do líder parlamentar do maior partido da oposição na sessão solene do 25 de Abril foi ver uma visão cinzenta e salazarenta do país, sem investimentos e sem legado para as gerações futuras." Ou seja, quem ousa criticar as opções do governo sobre os grandes investimentos públicos é salazarento e cinzentão. É, sem dúvida, muito mais bonito endividar ainda mais o país para construir uma infra-estrutura ferroviária que se irá tornar no maior fiasco financeiro dos últimos 50 anos. Um excelente legado para as gerações futuras, sim senhor. Não é salazarento, mas não deixa de ser mobututenco, i.e. uma estratégia digna do saudoso Mobutu Sese Seko, que deixou ao Zaire (agora República Democrática do Congo) lindos legados para as gerações futuras.

NÃO SABER

Hoje dei um exame de Macroeconomia em que perguntei para os alunos representarem com gráficosa situação económica actual (e o efeito esperado das diversas políticas económicas possíveis). Para meu grande espanto, um aluno virou-se para mim e perguntou-me "qual é a situação económica actual?... Eu nunca vejo as notícias..." Não sei se era um truque ou não para tentar saber a resposta (até porque falámos várias vezes sobre o assunto nas aulas). O que sei é que os alunos nunca deixam de me surpreender...

PS. A razão por o blog ter estado parado nos últimos dias é esta mesma: exames, exames e mais exames, trabalhos, trabalhos e mais trabalhos (dezenas deles) para corrigir.

22 abril 2009

SATISFAÇÃO NACIONAL E SUICÍDIOS

Que os(as) portugueses(as) andam bastante desencantados com a economia nacional é bem sabido. Também é sabido que há bastante descrença em relação às potencialidades do país e à eficácias das políticas a aplicar perante a crise. Por isso, não é de estranhar que os portugueses estejam pouco satisfeitos quanto às suas vidas. Numa sondagem mundial realizada pela Gallup, podemos ver que actualmente os portugueses são dos povos mais desencantados com as suas vidas (ver gráfico abaixo). Num índice de satisfação de vida, na OCDE os portugueses só ficam à frente dos húngaros e eslovacos. Os povos mais satisfeitos são os escandinavos, os holandeses, os irlandeses e o Canadá. Os nossos vizinhos espanhois estão bem mais satisfeitos do que nós (pelo menos até à crise se ter instalado...) e até os gregos e os italianos estão mais felizes do que os portugueses.


Ainda assim, o desespero não é total, pelo menos quando nos comparamos com outros países. Se olharmos para a taxa de suicídios, Portugal é dos países que regista menores taxas de suicídios na OCDE (ver tabela abaixo e gráfico). É verdade que a nossa taxa de suicídio é maior do que a da Espanha, da Grécia, do México e da Itália, mas é bem menor do que a grande generalidade dos países. É interessante observar que, de um modo geral, os povos latinos suicidam-se bem menos do que todos os outros, inclusivamente os países bem mais abastados do que nós. Será o sol? A nossa disposição perante a vida? A nossa tendência para viver bem a vida mesmo quando as coisas não correm bem? É igualmente interessante também observar que os húngaros não só andam desencantados com a vida, mas também se suicidam a uma taxa bem mais elevada do que todos os outros na OCDE...
Taxa de suicídio vs. PIB por habitante
Finalmente, vale também chamar a atenção para um último facto. As mulheres suicidam-se muitíssimo menos do que os homens. A taxa de suicídio nacional para os homens é de 14.6 por 100 mil habitantes, enquanto a das mulheres é somente de 3,8 (ver tabela abaixo). Por que será? Qual será o segredo?


Total

Homens

Mulheres

Greece

2.9

4.7

1.1

Mexico

3.8

7

1

Italy

5.6

9.3

2.4

United Kingdom

6.3

10

2.8

Spain

6.7

10.7

3.1

Netherlands

7.9

11.1

4.9

Iceland

8.7

13.2

4.2

Portugal

8.7

14.6

3.8

United States

10.2

17

3.9

Germany

10.3

16.3

4.8

Norway

10.5

15.8

5.3

Canada

10.6

16.7

4.6

Australia

11.1

17.6

4.7

Ireland

11.1

18.2

4

Denmark

11.3

16.8

6.3

Sweden

11.4

17

6

OECD average

11.88

19.0

5.4

Slovak Republic

11.90

22

3.1

New Zealand

12

20.2

4.2

Luxembourg

12.5

20.2

5.5

Czech Republic

13

22.6

4.4

Poland

13.6

24.2

3.9

Austria

14.5

24

6.4

France

15.1

23.4

7.8

Switzerland

16.3

23.9

9.6

Belgium

18.4

28

9.8

Finland

18.4

28.9

8.5

Korea

18.7

28.1

11.1

Japan

20.3

30.5

10.4

Hungary

22.6

39

8.9


20 abril 2009

O EURO E PORTUGAL

Já aqui falámos várias vezes do impacto que o euro teve em Portugal. Recentemente, li um artigo da autoria de Alan Ahearne e de Jean Pisani-Ferry do think tank Bruegel, que contrasta a experiência dos vários países da Eurolândia, dando revelância à taxa de câmbio real e à evolução das exportações. Segundo os autores, e como é bem conhecido, Portugal e a Itália foram os países que mais sofreram perdas de competitividade com a adesão ao euro. Porquê? Por dois motivos. Primeito, porque os preços em Portugal e na Itália cresceram muito mais rapidamente do que nos outros países da Eurolândia, tornando os nossos produtos menos atractivos. Assim, a taxa de câmbio real portuguesa (e italiana) apreciou-se em quase 15% desde 1999. Segundo, porque Portugal e a Itália ainda não transformaram as suas estruturas produtivas, sofrendo, assim, mais com a concorrência de países como a China. E, finalmente, por causa das irresponsabilidades da política fiscal do final dos anos 1990. Mais concretamente, os autores apontam o dedo aos anos 1995 a 1999, quando a política orçamental portuguesa se expandiu em vez de se ter tentado preparar para o impacto do euro. Conclusão: a expansão da procura interna no final dos anos 1990 (devido à descida das taxas de juro e do aumento das despesas do Estado) deram azo ao aumento do nível dos preços, que, por sua vez, afectou seriamente a competitividade da economia portuguesa (pois as nossas exportações se tornaram menos atractivas devido à subida dos preços nacionais). Segundo os autores, o preço que iremos pagar é um período prolongado de "desinflação competitiva", que só acabará quando os nossos principais sectores produtivos aumentarem a sua eficiência e produtividade, e quando os aumentos dos preços (e salários) internos forem menos significativos em relação ao resto da Europa.

MAPA JUDICIÁRIO (2)

O Nuno Garoupa, um economista especialista em questões da Justiça e do Direito, e autor de algumas das opiniões mais interessantes sobre esta matéria, comentou aqui que considera que a reforma do mapa judicial é apenas uma operação de cosmética. Entretanto, o Nuno começou a escrever no sempre estimulante blogue da Sedes, uma excelente notícia. Aqui está o seu primeiro post, que vale a pena transcrever:
"O óbvio: este governo foi o primeiro que abordou directamente a necessidade de mexer no mapa judiciário. Qualquer critica não pode deixar de começar com esta palavra de reconhecimento. Em particular, recordar que o PSD e o CDS não fizeram nada em 2002-2005. A maquilhagem: metade dos tribunais em Portugal não têm carga de trabalho que justifique a sua existência; os dados estatísticos demonstram uma e outra vez que temos demasiados tribunais; o governo não está em condições políticas de enfrentar os interesses locais depois do que aconteceu na saúde e na educação; nenhum tribunal fecha!A ineficiência: Portugal tem quase 15 juizes por 100,000 habitantes; deveria ter 8 a 10 juizes por 100,000 habitantes; os dados estatísticos demonstram uma e outra vez que temos demasiados juizes; o governo anuncia mais juizes; o novo mapa judiciário não vai libertar juizes para poder expandir o quadro de secretários judiciais; muito provávelmente Portugal terá mais de 15 juizes por 100,000 habitantes quando o novo mapa judiciário for funcional. Uma década: o PS formou governo em Abril de 2005 e prometeu um novo mapa judiciário; a fase experimental do novo mapa judiciário entrou em vigor em Abril de 2009; o novo mapa judiciário estará operativo em 2011; os resultados optimistas do governo não se devem sentir antes de 2012 ou 2013. Uma previsão: quando terminar a fase experimental, o novo Ministro da Justiça (do PS ou do PS-PSD) vai anunciar a reforma do novo mapa judiciário!"