Nos últimos anos, os nossos governos têm feito uma grande aposta no investimento em Educação, por forma a melhorar o nosso capital humano e a competitividade da economia. E a aposta tem sido realmente grande. Após décadas de reduzido investimento em capital humano, Portugal gasta actualmente em Educação em percentagem do PIB do que a média da OCDE. A grande questão é assim: quão eficiente tem sido o investimento em Educação? Será que temos sido eficazes na melhoria da qualidade e da quantidade do capital humano português? A triste verdade é: não muito.
Como é que nós sabemos? Bem, só temos que olhar para os resultados dos inquéritos PISA para perceber que a qualidade da educação em Portugal ainda deixa muito a desejar. Simplesmente ninguém na OCDE tem resultados piores ao nível da qualidade da Educação (matemática, leitura e ciência) do que os nossos alunos, com a excepção muito duvidosa do México e da Turquia.
Porém, e sabendo que a metodologia do PISA não é perfeita, haverá evidência empírica adicional em relação à eficiência do nosso sistema educativo? A resposta é positiva. A nova base de dados Barro-Lee acabou de ser publicada e os resultados são bastantes elucidativos.
Há boas notícias e más notícias quando analisamos os dados de Barro e Lee em relação à media de anos de escolaridade. As boas notícias é que, sem dúvida, e assim como podemos ver no gráfico 1, tem havido um aumento progressivo do número de anos de escolaridade desde a década de 1950 e, em particular, após a implementação da democracia.
Gráfico 1 _ Anos médios de escolaridade em Portugal, 1950-2010
As más notícias é que estes avanços não são assim tão impressionantes quando comparamos Portugal e outros países. Para perceber porquê, comecemos por comparar a situação actual em Portugal e outros países europeus. Mais tarde, iremos analisar o progresso (ou a falta dele) registado nas últimas décadas.
O próximo gráfico apresenta os anos de escolaridade média em vários países da Europa Ocidental e a Europa de Leste em 2010. O gráfico é bastante revelador. Apesar de todo o investimento das últimas décadas, nós ainda somos o país com a pior escolaridade média em toda União Europeia.
Gráfico 2 _ Anos médios de escolaridade em 2010
Se atentarmos agora para os anos médios de escolaridade para o ensino secundário, Portugal está ligeiramente melhor em termos relativos, mas não muito.
Pior do que nós, só mesmo a Polónia, a Bulgária e a Eslovénia. Contudo, e como podemos observar, um habitante de um país como a Grécia, a Bulgária ou a Itália tem, em média, bem mais anos de escolaridade do ensino secundário do que nós.
Gráfico 3 _ Anos médios de escolaridade secundária em 2010
Por seu turno, se analisarmos a educação universitária, as coisas não são, mais uma vez, muito agradáveis. Portugal é simplesmente o último em termos de anos de escolaridade universitária em toda a União Europeia, atrás de países como a Roménia e a Bulgária, substancialmente mais pobres do que nós.
Gráfico 4 _ Anos médios de escolaridade universitária em 2010
Como os nossos governos gostam de apregoar que os nossos decepcionantes indicadores de capital humano são somente um reflexo do nosso baixo investimento em Educação no passado (que é, em parte, explicado pelo lamentável legado da ditadura nesta área), vale a pena comparar Portugal com uma amostra de cinco economias mais desenvolvidas (a Alemanha, a França, a Holanda, a Itália e o Reino Unido), que irei chamar de Europa Avançada. Vejamos se a nossa “paixão pela educação” resultou realmente.
Comparemos então a distância relativa entre a média de anos de escolaridade na Europa Avançada com a média de anos de escolaridade em Portugal. O gráfico 5 representa esta comparação para a escolaridade média global, isto é, para todos os níveis de educação.
Gráfico 5 _ Anos de escolaridade média em Portugal em relação à Europa Avançada (Europa Avançada =100)
É visível que a “convergência” de Portugal com a Europa Avançada em termos de anos de escolaridade ocorreu principalmente nos anos iniciais da democracia. Nos últimos anos, e apesar de ter havido um aumento substancial do financiamento do sector educativo, o diferencial entre Portugal e a Europa Avançada tem permanecido relativamente constante. Ou seja, parece que nós não fomos os únicos na Europa com uma paixão pela Educação...
Por outro lado, se atentarmos para o ensino secundário, o cenário é semelhante, como podemos ver no gráfico 6. Mais uma vez, não há grande paixão aqui, pelo menos comparativamente aos outros países europeus.
Gráfico 6 _ Anos de escolaridade média do ensino secundário em Portugal em relação à Europa Avançada (Europa Avançada =100)
Finalmente, em relação à educação universitária (sempre uma grande ênfase da politica de Educação), os resultados comparativos são ainda mais decepcionantes. Com efeito, em relação à escolaridade universitária média, Portugal aparece pior actualmente em termos relativos do que há 20 anos atrás
Gráfico 7 _ Anos de escolaridade universitária média em Portugal em relação à Europa Avançada (Europa Avançada =100)
Em suma, apesar dos recursos sem precedentes que dedicámos ao nosso sistema educativo, e apesar da tão proclamada “paixão” por esta área, Portugal continua atrasado em termos da qualidade do seu capital humano (de acordo com os resultados do PISA) relativamente a quase todos os países da OCDE. Os dados sobre a escolaridade média só confirmam estes resultados.
Por isso, e apesar de toda a retórica politica com que somos bombardeados frequentemente, os nossos governos merecem ser verdadeiramente ser chumbados pelo seu esforço de melhoria do nosso capital humano. E esta desvantagem do nosso capital humano, mais do que qualquer grande obra pública, será uma das verdadeiras determinantes da nossa competitividade e do nosso sucesso no futuro.
4 comentários:
Grave, muito mais grave, embora possa agora parecer exagerado, é o resultado dos últimos cinco anos de alterações no sistema educativo. Quando os efeitos forem sentidos perceber-se-á que o desastre não é apenas uma figura de retórica. Sou professor do ensino público. Continuo a gostar da minha profissão, apesar de tudo, mas lamento profundamente a incapacidade dos responsáveis para compreenderem (!) a situação real que se vive na educação e os resultados dramáticos que já começam a fazer-se notar. Deviam saber já, que o ser humano resulta de processos complexos e que a natureza humana é construída, como bem sabemos desde o séc xviii, e recordámos com Morin. Mas não parece que os responsáveis (?) saibam.
Não falo no vazio: sou professor há 37 anos.
O embuste das Novas Oportunidades vale uma investigação profunda. Pelo menos pode servir para mostrar ao mundo o que não deve ser feito a bem da Educação de um país. Como se explica que seja dado o 9.º ano em 1 mês e que sejam dado o 12.º ano em 1 ano!
O socialismo moderno é uma farsa, mata o povo pela ignorãncia.
Caro Álvaro,
Em Espanha criaram uma palavra nova. Os "mileuristas". Que em Portugal se podia designar por, os "setecentoseuristas". Esta palavra é a designação que se dá aos jovens saídos das faculdades e que passam a vida a fazer mestrados e pós-graduações e que passam os primeiros dez anos da sua via profissional a fazerem estágios, porque as empresas não se querem compremeter com empregos para toda a vida e porque um estágio é pago a setecentos euros.
Na Europa criou-se esta nova classe dos "setecentos euristas", a que não é estranho o processo de bolonha.
É gente que vai estagiar até aos 45 anos com trabalhos precários e que a partir dos 45 anos começam a entrar naquela idade em que já são demasiado velhos para começçarem uma carreira.
Este problema existe e não sou eu que o estou a inventar. Existe e é dramático.
Eu conheço Kilos de casos assim. E depois temos os putos a acabar arquitectura e a concorrerem 10 anos para darem aulas, sociólogas em caixas dos supermercados continente etc. Eu necesssitei de um Vigilante nocturno no ano passsado e até fiquei arrepiado. Apareceram-me licenciados em direito, em engenharia do ambiente, engenheiros informáticos e licenciados em gestão. E claro, eu recusei liminarmente estas candidaturas por entender que estes candidatos teriam um elevado sentimento de frustração e que nunca encarariam o seu emprego de vigilante como uma situação motivadora.
Caro Álvaro, estas questões têm de ser muito bem analisadas e os chavões do "ensino democrático" para todos distorce as necessidades e a realidade social.
Temos que saber reconhecer que no dia a dia necessitamos de uma enorme quantidade de gente com um grau de especialização baixo e talvez poucos(mas muito bons especializados).
Dentro dos poucos especializados vou enumerar apenas 20 para todos percebermos que a nossa vida teria muito menos qualidade se eles não existissem. O padeiro, o homem do talho, a mulher que arranja o peixe, os empregados que carregam as prateleiras dos supermercados,as caixas dos supermercados, as mulheres de limpeza nos supermercados e os vigilantes nos supermercados. A boazona da perfumaria, os empregados da sapataria, a cabeleireira, o empregado de café,o homem dos jornais, o varredor de rua,o jardineiro,o calceteiro, o pedreiro, o camionista, o pintor, o limpa chaminés, a empregada da 5 à SEC, a florista e a menina do call center. Acho que já passei dos 20. Mas podia dar-lhe uma lista de 1000 em vez de 20.
E a solução não pode ser passar a vida a importr imigrantes para nos fazerm os trabalhos sujos. Diria até que isso é imoral e que se assemelha a um tipo de "servidão".
Caro Álvaro, o papel de um economista é ajudar uma sociedade a viver melhor e não ajudar a criar situções insustentáveis que soam bem mas acabam por saber muito mal.
Abraço
Antonio
Prezado Álvaro,
Sou brasileira e estou fazendo um trabalho para a faculdade sobre o desenvolvimento economico e social de Portugal entre os anos 2000 e 2010. Este post foi muito útil! No entanto não compreendi seus graficos comparativos com a "Europa Avançada", na horizontal estão os anos, e na vertical? é uma porcentagem?
Aguardo seu email em resposta: caroline.gibin@hotmail.com
Obrigada,
Caroline.
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