31 março 2010
29 março 2010
AINDA O RATING
O Expresso fez-me algumas perguntas sobre a descida do rating da última semana. Aqui estão as minhas respostas:
EXPRESSO: Como é que a descida do Rating de Portugal efectuada pela Fitch irá reflectir-se na carteira dos Portugueses? Quais as principais alterações para a carteira das pessoas que esta descida vai originar? Como o rating do país afecta o rating dos bancos, para quem solicitar um novo empréstimo o spread irá ser mais elevado?
É muito provável que a descida do rating provoque um aumento dos custos dos empréstimos. Ora, se nos lembrarmos que se prevê que as taxas de juros comecem a subir ainda este ano, poderemos ter a receita perfeita para que tanto o Estado, como as famílias e as empresas mais endividadas fiquem ainda mais dificuldades. No entanto, é preciso pôr as coisas em perspectiva. Nos últimos meses, todos beneficiámos com a descida pronunciada dos juros, pois as prestações dos empréstimos bancários baixaram. Por isso, por agora, a descida do rating irá ter um impacto pouco significativo. O principal efeito da subida do custo dos empréstimos nos rendimentos das famílias e das empresas deverá começar a ser sentido quando os juros começarem novamente a subir.
EXPRESSO: Com a diminuição do rating as empresas vão ver o seu custo de financiamento aumentar. Irá isto contribuir para uma menor valorização das acções e para uma diminuição dos lucros?
Tudo vai depender do nível de endividamento das empresas e do tipo de empréstimos que essas empresas têm. Em média, o aumento dos custos de financiamento poderá afectar a valorização de algumas acções e os lucros das mesmas, principalmente das empresas mais endividadas ou com menor capacidade de financiamento. Porém, tudo vai depender das circunstâncias actuais das empresas em causa. Mais uma vez, é preciso lembrar que as empresas estão igualmente a beneficiar com a descida dos juros dos últimos anos.
EXPRESSO: Com a descida do rating, a dívida pública vai ter um custo maior a refinanciar. Acredita que isto poderá levar no futuro a um aumento dos impostos?
Actualmente, todos os anos o Estado já paga mais em juros do que equivalente a um TGV Lisboa-Porto. Ainda assim, desde 2008, a descida das taxas de juros ajudou o Estado (e as famílias e as empresas) a pagar menos pelo seu financiamento. Ora, tanto a descida do rating como a subida de impostos irão alterar esta situação, pois o pagamento dos juros irá aumentar substancialmente. Será assim preciso aumentar impostos para compensar esta subida da dívida pública? Tudo depende. A resposta é sim, se o governo insistir na sua trajectória despesista, mas é não se o Estado decidir cortar verdadeiramente nas despesas públicas. É tudo uma questão de escolha.
EXPRESSO: Como é que a descida do Rating de Portugal efectuada pela Fitch irá reflectir-se na carteira dos Portugueses?
26 março 2010
COMO COMBATER UMA DÍVIDA PÚBLICA
O governo Trabalhista (sim, Trabalhista) do Reino Unido anunciou que o crescimento explosivo da dívida pública britânica será combatido através de um corte das despesas públicas na ordem dos 25% até 2017. Sim, leu bem, 25%. Ou seja, cortes ainda mais profundos do que os efectuados por Margaret Thatcher nos anos 80. Medidas draconianas? Claro que sim. No entanto, os trabalhistas britânicos, bem como os próprios Conservadores, acreditam que a única maneira de combater os graves desequilíbrios orçamentais do Reino Unido é cortar na despesa pública. Porquê? Porque acreditam nas previsões do prestigiado (e independente) Institute for Fiscal Studies, que avisou que um reequilíbrio das contas públicas britânicas necessitava de um corte das despesas na ordem dos 25% nos próximos 7-8 anos.
E como no Reino Unido os governos não gostam de desbaratar o dinheiro dos contribuintes e têm a tradição de levar em linha de conta o bem-estar dos contribuintes futuros nos seus cálculos orçamentais, gerou-se um consenso político de que o corte da despesa pública é a única via para a sustentabilidade das contas públicas. Um exemplo e um consenso que, obviamente, não interessa ao governo nem à generalidade dos políticos portugueses. Porquê? Porque, é claro, quem está errado são eles, não nós.
O RATING DOS OUTROS
Como em tudo na vida, vale a pena pôr em perspectiva os acontecimentos dos últimos dias. Como podemos ver no gráfico acima (retirado do New York Times), o aumento da dívida pública portuguesa não é caso único. Se atentarmos para o que tem acontecido desde 2008 nos EUA, na França, no Reino Unido e na própria Alemanha, veremos que a crise financeira internacional teve um impacto muito significativo na dívida pública dos diversos países. Portugal não foi excepção. Aliás, a descida de rating de Portugal também não foi excepção no mundo ou, pelo menos, não o será dentro em breve, pois fala-se que muitos países endividados poderão sofrer o mesmo destino. Entre estes contam-se os Estados Unidos. Nos últimos dias, a Moody's (outra agência de rating) avisou que o rating dos EUA poderia dentro em breve baixar de um perfeito AAA. O mesmo deverá acontecer ao Reino Unido, a braços com um rápido crescimento da dívida pública. Por isso, não são só a Grécia e Portugal que estão a sofrer com estes problemas. É claro que, mesmo assim, e apesar de haver uma tendência generalizada para o aumento da dívida pública, o que interessa mesmo para a sustentabilidade dessa mesma dívida são o crescimento económico (e a inerente capacidade de gerar receitas) e o plano de ataque ao endividamente crescente.
E é aqui que estamos a sofrer as consequências da falta de credibilidade: os mercados e as agências de rating acreditam que o nosso crescimento económico vai continuar anémico (isto é, medíocre) e acham que o plano de combate à dívida é insuficiente, pois o corte nas despesas públicas estruturais é demasiado tímido e insuficiente. E enquanto não resolvermos estes problemas (isto é, enquanto não começarmos a crescer mais e/ou cortarmos significativamente na despesa do Estado), a nossa credibilidade junto dos mercados e das agências de rating continuará pelas ruas da amargura.
25 março 2010
A CHANTAGEM
A descida do rating da dívida portuguesa era, de certa forma, esperada, assim como confirmou o próprio Ministro das Finanças. Não deixa, contudo, de ser lamentável. Lamentável porque teria sido evitada se o governo não tivesse errado por completo as suas previsões para o défice de 2009. Lamentável porque o governo andou meses a pregar números irrealistas e que só se compreendem por razões eleitorais. Lamentável porque não só o Orçamento de Estado para 2010 é pouco ambicioso no combate aos problemas estruturais das contas públicas nacionais, como o PEC foi manifestamente insuficiente para inverter a desconfiança que os mercados e as agências de rating têm em relação a Portugal neste momento. E ainda mais lamentável porque o governo continua a fazer politiquices com o bem-estar dos portugueses e a esquecer o interesse nacional.
Só assim é que se pode entender a inqualificável decisão de ratificar o PEC no Parlamento, por forma a arrastar os principais partidos da oposição para a dança suicida que as políticas deste governo estão a causar ao nosso país. A verdade é que o governo não precisava de o fazer. O governo só o fez, porque queria que os principais partidos da oposição assinassem por baixo os sacrifícios que o PEC acarreta, garantindo ainda a manutenção das irresponsabilidade que o documento e o Orçamento de Estado preconizam (vale a pena não esquecer que o TGV Lisboa-Madrid não foi adiado, o novo aeroporto continua programado, assim como todas as auto-estradas projectadas). E o que faz o governo perante a descida do rating da República? Chantagem. Faz autêntica chantagem com a oposição ao afirmar que o chumbo de um documento que não tinha que ser votado pelo Parlamento levará a uma descida do rating da dívida portuguesa. Pois eu acho que não. Pelo menos, não necessariamente. O que eu sei é que um chumbo do PEC no Parlamento conduzirá quase de certeza a novas eleições. E, perante o estado lastimoso a que chegámos, vale a pena perguntar: e por que não? Por que não?
22 março 2010
PEC E PIIGS
O Diário Económico fez-me algumas perguntas sobre o PEC e a economia dos PIIGS (Portugal, Italy, Ireland, Greece, Spain). Aqui estão as minhas respostas:
DE_ 1. As economias dos PIIGS atingiram níveis de endividamento bastante elevados colocando em causa a própria estabilidade da economia europeia. Qual o caminho mais sensato que estes países deverão tomar?
O caminho mais sensato é colocarem as suas casas em ordem. Estes países têm de atacar os problemas estruturais das suas contas públicas, cortando despesas supérfluas e aumentando a eficiência fiscal. Porém, é importante relembrar que o endividamento não se limita ao Estado, pois tanto as famílias com as empresas viram aumentar significativamente as suas dívidas a terceiros na última década. O mesmo se passou em Portugal. Qual é a solução? Consolidar e renegociar dívidas enquanto os juros estão baixos e, principalmente, fomentar o crescimento da poupança, de forma a reduzir padrões de consumo insustentáveis.
DE_ 2. Portugal apresentou recentemente um conjunto de medidas no PEC. Qual a sua análise a este documento?
Acho que é um documento que poderá ser suficiente para alcançar a redução do défice abaixo dos 3% do PIB até 2013. Isto se a economia recuperar, se o Governo conseguir arrecadar os fundos que pretende nas privatizações, e se conseguirmos obter os ganhos de eficiência no Estado que o documento promete. São, portanto, muitos “ses” para um documento só.
Porém, infelizmente, a verdade é que este PEC não ataca as verdadeiras causas dos desequilíbrios estruturais das nossas contas públicas. Por mais que o Governo nos queira convencer do contrário, este PEC preconiza a consolidação das contas públicas através de um aumento de receitas e da carga fiscal efectiva, e não se reduzem de forma significativa as principais causas do despesismo do Estado. Este PEC adia, mais uma vez, a consolidação das contas públicas portuguesas.
DE_ 3. Muitas vozes têm-se levantado a favor da ideia da Grécia abandonar o Euro. De que forma esta decisão poderia afectar os restantes Estados-membros?
Se tal acontecesse, haveria um verdadeiro risco de contágio para outros países em situações fiscais mais periclitantes (como Portugal), e que poderiam ficar numa situação muito complicada. Acho que não vamos chegar a esse ponto, pelo menos por enquanto, pois os custos da saída de um país do euro são bastante mais elevados para toda a Eurolândia do que os benefícios que poderiam advir com tal decisão.
20 março 2010
O MELHOR E O PIOR DO PEC
O Expresso pediu-me para sintetizar o melhor e o pior do PEC. Aqui estão as minhas respostas
O MELHOR
As privatizações e previsões económicas realistas.
O PIOR
Este é um PEC fingidor. Finge-se que o investimento público baixa, mas mantêm-se as parcerias público-privadas. Finge-se que as despesas com o pessoal descem, mas esquece-se que estas têm baixado principalmente porque se transformaram os hospitais em empresas do Estado. Finge-se que se atacam os problemas estruturais da despesa pública, mas a consolidação orçamental é conseguida sobretudo com o aumento da carga fiscal efectiva e com as receitas das privatizações. Acima de tudo, este é um PEC que adia mais uma vez a resolução dos problemas estruturais das contas públicas nacionais.
As privatizações e previsões económicas realistas.
O PIOR
Este é um PEC fingidor. Finge-se que o investimento público baixa, mas mantêm-se as parcerias público-privadas. Finge-se que as despesas com o pessoal descem, mas esquece-se que estas têm baixado principalmente porque se transformaram os hospitais em empresas do Estado. Finge-se que se atacam os problemas estruturais da despesa pública, mas a consolidação orçamental é conseguida sobretudo com o aumento da carga fiscal efectiva e com as receitas das privatizações. Acima de tudo, este é um PEC que adia mais uma vez a resolução dos problemas estruturais das contas públicas nacionais.
19 março 2010
OS ALEMÃES VÃO À LUTA
Como era esperado, os alemães vão à luta. Depois de, nos últimos dias, vários analistas terem pedido aos alemães para subirem os seus salários para reduzirem a sua competitividade (pois os salários subiriam em relação aos outros países europeus), chega agora a altura de os alemães recusarem esta possibilidade. A ideia é simples: por que é que haveriam de ser os alemães a pagar pelos erros e as irresponsabilidades cometidas pelos outros? Por que é que os alemães haveriam de afectar a competitividade da economia voluntariamente, se quem aumentou os custos laborais acima do que devia foram os outros (isto é, nós, os gregos, os espanhóis, etc)?
E agora pergunto: não terão os alemães razão nesta área? Por que razão haveriam eles(as) de se auto-mutilarem se eles(as) se comportaram de uma forma (quase) exemplar desde o início do euro?
Obviamente, os alemães têm razão. Não faz sentido fazê-lo. Só há um senão. É que, numa altura de crise, o bem-comum da União deveria sobrepôr-se aos interesses individuais e nacionais. Pelo menos seria assim numa união monetária "normal" (como nos Estados Unidos ou no Canadá). Porém, a união monetária europeia é tudo menos normal, pois não há união política. Numa união monetária normal, os ajustamentos seriam feitos não através de um aumento voluntário de salários nas regiões menos afectadas pela crise (como os alemães recusam), mas sim através da transferência de fundos das regiões mais ricas para as mais pobres e, claro, através da emigração. Como a UE não prevê essa solidariedade fiscal de transferências de fundos, resta-nos ajustar a economia com mais desemprego, mais desinflação e mais... emigração. E, claro, procurar outras soluções milagrosas e bem menos penosas, que ainda ninguém descobriu. (E quem sabe se não é o TGV????).
E agora pergunto: não terão os alemães razão nesta área? Por que razão haveriam eles(as) de se auto-mutilarem se eles(as) se comportaram de uma forma (quase) exemplar desde o início do euro?
Obviamente, os alemães têm razão. Não faz sentido fazê-lo. Só há um senão. É que, numa altura de crise, o bem-comum da União deveria sobrepôr-se aos interesses individuais e nacionais. Pelo menos seria assim numa união monetária "normal" (como nos Estados Unidos ou no Canadá). Porém, a união monetária europeia é tudo menos normal, pois não há união política. Numa união monetária normal, os ajustamentos seriam feitos não através de um aumento voluntário de salários nas regiões menos afectadas pela crise (como os alemães recusam), mas sim através da transferência de fundos das regiões mais ricas para as mais pobres e, claro, através da emigração. Como a UE não prevê essa solidariedade fiscal de transferências de fundos, resta-nos ajustar a economia com mais desemprego, mais desinflação e mais... emigração. E, claro, procurar outras soluções milagrosas e bem menos penosas, que ainda ninguém descobriu. (E quem sabe se não é o TGV????).
18 março 2010
A CULPA É DA ALEMANHA
Mais um artigo interessantíssimo de Martin Wolf, que acusa a Alemanha e a China de tentarem impôr uma estratégia deflacionária aos restantes países do mundo, e, por consequência, aos seus maiores parceiros económicos. A ideia é simples. A China e a Alemanha têm excedentes comerciais fabulosos, mas, em vez de tentarem financiar os seus (países) clientes numa altura recessiva, estão a insistir dogmaticamente em soluções que somente vão agravar o mal-estar de todos. A China insiste em desvalorizar a moeda, prejudicando a recuperação das exportações dos seus principais clientes (e concorrentes), como os Estados Unidos. Por seu turno, a Alemanha continua a tentar impôr uma disciplina orçamental férrea a alguns dos seus maiores parceiros económicos (e compradores de bens alemães). Ou seja, a Alemanha quer exportar deflação para países que são seus clientes. Como as medidas de austeridade levarão necessariamente à descida da procura agregada, (isto é, o consumo e o investimento baixarão) a exportação da deflação por parte da Alemanha irá necessariamente levar a uma redução da procura dos próprios bens alemães. Uma estratégia suicida, portanto. Um estratégia de tal modo suicida por parte de duas importantes economias mundiais que, de acordo com Wolf, poderá conduzir ao fim da globalização actual.
Vale também a pena citar esta frase em relação à Alemanha:
"Germany is in a supposedly irrevocable currency union with some of its principal customers. It now wants them to deflate their way to prosperity in a world of chronically weak aggregate demand."
SAIR DO EURO (2)
O Publico faz hoje referência a mais um artigo académico que discute a saída para a crise actual. Ainda não li, mas este relatório preparado por vários economistas parece ser, no mínimo, provocatório. Esperemos que valha a pena (quando ler eu digo).
17 março 2010
14 março 2010
13 março 2010
DEBATE A NÃO PERDER
Se estivesse em Portugal, certamente que não perderia este debate sobre a economia portuguesa, onde estarão presentes alguns dos melhores economistas nacionais:
http://www.ics.ul.pt/instituto/?ln=p&mm=1&ctmid=1&mnid=1&doc=&linha=1&ev2id=577&mtype=
11 março 2010
POBREZA EM ÁFRICA
Vários estudos têm demonstrado que a pobreza em África desceu de uma forma significativa na última década. Ainda há alguma controvérsia sobre a matéria, mas a tendência parece ser manifestamente de melhoria para a grande maioria dos países do continente africano.
10 março 2010
UM PEC INSUFICIENTE
PUBLICO: As medidas anunciadas são as suficientes e necessárias para atingir o objectivo de equilibrar as finanças públicas até 2013?
Não, obviamente que não.
Primeiro, a consolidação orçamental é manifestamente insuficiente e é feita, mais uma vez, pelo lado da receita (mais impostos e receitas extraordinárias com as privatizações). Infelizmente, este governo nunca conseguiu conter o seu intuito despesista (uma característica comum a muitos dos governos que o antecederam), nem a tentação de controlar as contas públicas somente através de um aumento da receita fiscal. Um erro, como é óbvio. E um erro que estamos a pagar cada vez mais caro.
Segundo, as privatizações são uma boa medida, mas vão afectar principalmente a dívida pública e não o défice orçamental (dado que 80% das suas receitas têm de ser canalizadas para o pagamento da dívida). Contudo, não adianta vender as poucas jóias que nos restam se teimarmos em manter uma trajectória de endividamento insustentável. Se o fizermos, daqui a alguns anos os credores virão ter connosco novamente e, nessa altura, já não teremos mais jóias para vender.
Finalmente, esta é a pior altura para aumentar impostos, pois iremos mais uma vez penalizar a competitividade fiscal do país, bem como as famílias portuguesas.
PUBLICO: Em caso negativo, que outras medidas deveriam ser programadas para este período temporal?
Primeiro, um verdadeiro programa de redução da despesa pública, que diminuísse a despesa corrente primária entre 3 a 5% do PIB. Por outras palavras, o congelamento dos salários justifica-se, mas não é suficiente. É preciso emagrecer e racionalizar o Estado, cortando despesas não estritamente necessárias, bem como reduzir o excessivo número de fundações e institutos públicos. Mais eficiência com menos recursos devia ser a palavra de ordem na Administração do Estado.
Segundo, urge travar o crescimento exponencial das parcerias público-privadas (PPPs). As PPPs vão-nos custar mais de 2 mil milhões de euros por ano a partir de 2013 e irão condicionar as contas públicas futuras (um facto que o actual governo claramente não se interessa). Persistir nesta loucura despesista é um verdadeiro atentado às futuras gerações e governos vindouros.
Em terceiro lugar, é preciso tomar em linha de conta o sector público alargado, que inclui o sector empresarial do Estado, que já tem uma dívida indirecta muito elevada. Uma dívida que, como é evidente, mais cedo ou mais tarde terá de ser paga pelo Estado (isto é, pelos contribuintes).
Acima de tudo, maior clareza e maior transparência nas contas públicas é fundamental para o país readquirir a credibilidade perdida junto dos mercados e credores internacionais.
Primeiro, a consolidação orçamental é manifestamente insuficiente e é feita, mais uma vez, pelo lado da receita (mais impostos e receitas extraordinárias com as privatizações). Infelizmente, este governo nunca conseguiu conter o seu intuito despesista (uma característica comum a muitos dos governos que o antecederam), nem a tentação de controlar as contas públicas somente através de um aumento da receita fiscal. Um erro, como é óbvio. E um erro que estamos a pagar cada vez mais caro.
Segundo, as privatizações são uma boa medida, mas vão afectar principalmente a dívida pública e não o défice orçamental (dado que 80% das suas receitas têm de ser canalizadas para o pagamento da dívida). Contudo, não adianta vender as poucas jóias que nos restam se teimarmos em manter uma trajectória de endividamento insustentável. Se o fizermos, daqui a alguns anos os credores virão ter connosco novamente e, nessa altura, já não teremos mais jóias para vender.
Finalmente, esta é a pior altura para aumentar impostos, pois iremos mais uma vez penalizar a competitividade fiscal do país, bem como as famílias portuguesas.
PUBLICO: Em caso negativo, que outras medidas deveriam ser programadas para este período temporal?
Primeiro, um verdadeiro programa de redução da despesa pública, que diminuísse a despesa corrente primária entre 3 a 5% do PIB. Por outras palavras, o congelamento dos salários justifica-se, mas não é suficiente. É preciso emagrecer e racionalizar o Estado, cortando despesas não estritamente necessárias, bem como reduzir o excessivo número de fundações e institutos públicos. Mais eficiência com menos recursos devia ser a palavra de ordem na Administração do Estado.
Segundo, urge travar o crescimento exponencial das parcerias público-privadas (PPPs). As PPPs vão-nos custar mais de 2 mil milhões de euros por ano a partir de 2013 e irão condicionar as contas públicas futuras (um facto que o actual governo claramente não se interessa). Persistir nesta loucura despesista é um verdadeiro atentado às futuras gerações e governos vindouros.
Em terceiro lugar, é preciso tomar em linha de conta o sector público alargado, que inclui o sector empresarial do Estado, que já tem uma dívida indirecta muito elevada. Uma dívida que, como é evidente, mais cedo ou mais tarde terá de ser paga pelo Estado (isto é, pelos contribuintes).
Acima de tudo, maior clareza e maior transparência nas contas públicas é fundamental para o país readquirir a credibilidade perdida junto dos mercados e credores internacionais.
PUBLICO: Por fim, considera que este plano é ou não suficientemente credível para os mercados?
Claramente que não. A prova disso é que os mercados já estão a reagir, penalizando ainda mais os seguros da dívida pública portuguesa. Um sinal evidente que os mercados não acreditam que o plano do governo seja suficiente para controlar as contas públicas nacionais.
Claramente que não. A prova disso é que os mercados já estão a reagir, penalizando ainda mais os seguros da dívida pública portuguesa. Um sinal evidente que os mercados não acreditam que o plano do governo seja suficiente para controlar as contas públicas nacionais.
O PEC NO NYT
O New York Times incluiu na sua edição de ontem uma pequena apreciação do Plano de Estabilidade agora apresentado pelo governo. Vale a pena salientar duas pequenas frases, que traduzem bem a credibilidade deste PEC a nível internacional:
"Portugal plans to cut its budget deficit to below the euro zone’s limit by 2013 by reducing investment and capping wage growth in the public sector, but the government is also counting on an economy recovery starting this year."
"Some economists said the plan may be too dependent on economic growth, meaning more measures will be required if the economic expansion fails to materialize."
Ou seja, como alguns comentadores internacionais afirmaram, este PEC é "austeridade à portuguesa"...Muito credível, sem sombra de dúvida.
04 março 2010
PORTUGAL: THE NEXT GREECE
Foi com este título que a BBC World está hoje a abrir os seus noticiários da secção de Business. News São mais de 5 minutos de reportagem (a abrir os noticiários!) sobre o nosso país. Porquê? Por causa da greve geral de hoje. A BBC fala dos problemas ("troubles") laborais em Portugal, e sublinha que um "simples" congelamento de salários está a dar azo a uma enorme greve geral. O descontentamento é inimigo da estabilidade dos mercados e, por isso, não será de estranhar que, face a esta publicidade toda, aconteçam novos ataques especulativos contra o euro e "contra" a dívida pública portuguesa. Ainda por cima, a BBC menciona um facto que era por demais evidente já há algumas semanas atrás: no Orçamento de Estado, o governo previu um decréscimo do défice orçamental em um mero ponto percentual. Ou seja, por mais que o governo queira fingir o contrário, um decréscimo do défice orçamental em 1% do PIB não é sinónimo de contenção orçamental nem aqui nem em qualquer outro país do mundo. Uma situação ainda mais evidente quando a própria Grécia (que é a Grécia) previu baixar o défice orçamental em 4% do PIB este ano.
Enquanto isso, o governo continua a adiar (até sábado) a apresentação do novo documento sobre o Pacto de Estabilidade. Com amigos assim, quem é que precisa de inimigos?
PRIVATIZAÇÕES E PARTICIPAÇÕES
Já se sabia (ou já se desconfiava), mas agora está aí a confirmação. Para fazer face à crescente dívida pública, o Estado vai levar a cabo uma nova série de privatizações e de venda de participações, que devem incluir a venda de parte da TAP e da ANA. A venda de imóveis do Estado também está a crescer. É natural. Quem não corta a despesa, tem que arranjar receitas por outro lado. E se aumentar os impostos não é desejável, nem económica nem politicamente, vender os activos do Estado é sempre apetecível. Resta saber o que é que iremos fazer quando estes activos acabarem... Principalmente se nada for feito até lá para controlar o voraz apetite da despesa pública.
RETORNADOS
Um excelente artigo de opinião da autoria de Helena Matos hoje no Público sobre um dos temas ainda tabú na sociedade portuguesa: os "retornados" das ex-colónias. Aqui está um extracto:
Seja na versão oficial ou no imaginário de cada um de nós, os retornados são um fenómeno de 1975. De facto, são de meados de 1975 as imagens dos caixotes junto ao Padrão dos Descobrimentos e das crianças sentadas no chão do aeroporto de Lisboa. É também em 1975 que começa oficialmente a ponte aérea que traria centenas de milhares de portugueses de África. E finalmente é em 1975 que, perante a evidência da catástrofe, se arranjou um termo politicamente inócuo, susceptível de nomear essa massa de gente que só sabia que não podia voltar para trás. Arranjar um nome para esse extraordinário movimento transcontinental de milhares e milhares de portugueses foi difícil, não porque as palavras faltassem, mas sim porque os factos sobravam.
Contudo, não só muitos deles não eram retornados, pela prosaica razão de que tinham nascido e vivido sempre em África, como surgem muitos meses antes de a palavra "retornado" ter conseguido chegar às primeiras páginas dos jornais portugueses. Desde Junho de 1974 que encontramos notícias sobre a fuga dos colonos, dos brancos, dos africanistas, dos europeus, dos ultramarinos, dos residentes e dos metropolitanos. Enfim, de pessoas brancas, pretas, mestiças, indianas... que residiam em Angola, Moçambique, Guiné e Cabo Verde. Nenhum destes termos é verdadeiramente apropriado para descrever o que eles de facto eram, mas a desadequação dos sinónimos foi breve, pois dentro de poucos meses eles deixaram de ser definidos em função dessa África onde foram colonos, brancos, africanistas, europeus, ultramarinos, residentes ou metropolitanos para passarem a ser definidos em função da própria fuga. Então passarão a ser desalojados, regressados, repatriados, fugitivos, deslocados ou refugiados. Finalmente, em meados de 1975, tornar-se-ão retornados.
"Oficialmente, os retornados nasceram há 35 anos, em Março de 1975, através do Decreto n.º 169/75 que criou o IARN. Ao contrário do que ficou para o futuro, as siglas não queriam dizer Instituto de Apoio aos Retornados Nacionais, mas sim Instituto de Apoio ao Retorno de Nacionais, pois quanto mais os factos davam conta da catástrofe, mais cuidado punha Lisboa na gestão das palavras. .. Ou seja, escassas semanas antes de começar uma das maiores pontes aéreas mundiais para evacuação de refugiados, numa fase em que por barco e carreiras aéreas regulares já tinham afluído a Portugal milhares de residentes nos territórios africanos e quando os próprios funcionários públicos portugueses e membros das forças segurança abandonavam em massa os seus lugares em África, o poder político-militar de Lisboa finalmente reconhecia não ainda a sua existência mas a possibilidade de virem a existir...
Contudo, não só muitos deles não eram retornados, pela prosaica razão de que tinham nascido e vivido sempre em África, como surgem muitos meses antes de a palavra "retornado" ter conseguido chegar às primeiras páginas dos jornais portugueses. Desde Junho de 1974 que encontramos notícias sobre a fuga dos colonos, dos brancos, dos africanistas, dos europeus, dos ultramarinos, dos residentes e dos metropolitanos. Enfim, de pessoas brancas, pretas, mestiças, indianas... que residiam em Angola, Moçambique, Guiné e Cabo Verde. Nenhum destes termos é verdadeiramente apropriado para descrever o que eles de facto eram, mas a desadequação dos sinónimos foi breve, pois dentro de poucos meses eles deixaram de ser definidos em função dessa África onde foram colonos, brancos, africanistas, europeus, ultramarinos, residentes ou metropolitanos para passarem a ser definidos em função da própria fuga. Então passarão a ser desalojados, regressados, repatriados, fugitivos, deslocados ou refugiados. Finalmente, em meados de 1975, tornar-se-ão retornados.
"Oficialmente, os retornados nasceram há 35 anos, em Março de 1975, através do Decreto n.º 169/75 que criou o IARN. Ao contrário do que ficou para o futuro, as siglas não queriam dizer Instituto de Apoio aos Retornados Nacionais, mas sim Instituto de Apoio ao Retorno de Nacionais, pois quanto mais os factos davam conta da catástrofe, mais cuidado punha Lisboa na gestão das palavras. .. Ou seja, escassas semanas antes de começar uma das maiores pontes aéreas mundiais para evacuação de refugiados, numa fase em que por barco e carreiras aéreas regulares já tinham afluído a Portugal milhares de residentes nos territórios africanos e quando os próprios funcionários públicos portugueses e membros das forças segurança abandonavam em massa os seus lugares em África, o poder político-militar de Lisboa finalmente reconhecia não ainda a sua existência mas a possibilidade de virem a existir...
Não se sabe ao certo quantos foram os retornados, pois muitos "retornaram" directamente de África para Brasil, Canadá, Venezuela ou deixaram-se ficar pela África do Sul. E não fosse o povo ter chamado bairro dos retornados a alguns conjuntos de habitação social, geralmente prefabricada, para onde alguns deles foram residir, não se encontraria outra referência no espaço público à sua existência. Até hoje ninguém os homenageou. Deles o poder político e militar falou sempre o menos possível. A comunicação social, tão ávida de histórias, demorou anos a interessar-se por aquilo que eles tinham para contar. E os poucos que entre eles passaram a papel as memórias desse tempo só em casos excepcionais conseguiram romper o universo restrito das edições de autor.
Há 35 anos inventámos a palavra retornado. Mas eles não retornavam. Eles fugiam. Retornados foi a palavra possível para que outros - os militares, os políticos e Portugal - pudessem salvaguardar a sua face perante a História. Contudo, a eles o nome colou-se-lhes. Ficaram retornados para sempre. Como se estivessem sempre a voltar."
Há 35 anos inventámos a palavra retornado. Mas eles não retornavam. Eles fugiam. Retornados foi a palavra possível para que outros - os militares, os políticos e Portugal - pudessem salvaguardar a sua face perante a História. Contudo, a eles o nome colou-se-lhes. Ficaram retornados para sempre. Como se estivessem sempre a voltar."
02 março 2010
MAIS UNIÃO POLÍTICA?
Como muitos têm feito, Barry Eichengreen defende que a crise que assola o euro só pode ser resolvida com mais integração política. Nas palavras deste reputado economista, a actual união monetária é só meia união, falta o resto. Resta saber se os europeus estão intessados em dar este próximo passo.
01 março 2010
O PAÍS QUE SE SEGUE?
O Financial Times prevê que a Espanha é o país que se segue na tempestade financeiras dos mercados internacionais. Tudo porque há dúvidas sobre a credibilidade e sobre a vontade do governo espanhol em reformar o mercado de trabalho e em cortar as despesas públicas. Por enquanto, o Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC) apresentado pelo governo espanhol não convence os mercados nem os analistas. Um aviso para Portugal, cujo governo ainda nem sequer apresentou o seu documento do PEC (somos o único país que está atrasado na entrega do texto) a Bruxelas.
É claro que, se a Espanha for ainda mais acossada pelos mercados internacionais, não se augura nada de muito bom para Portugal (nem para o euro, para todos os efeitos). É que, como o Ricardo Reis avisou aqui, o risco de contágio é bastante real.
TROVOADA À PORTUGUESA
João César das Neves tem toda a razão. As coisas estão mal, mas às vezes temos a tendência de dramatizar as nossas "desgraças" em demasia.
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