Aqui está um excerto da minha entrevista ao "Mundo Português" sobre o meu novo livro:
Afirma no livro que acabou de lançar, que Portugal apresenta actualmente, o pior crescimento económico médio desde a I Guerra Mundial, a maior dívida externa dos últimos 120 anos, a taxa de desemprego mais elevada dos últimos 80 anos e a maior dívida pública e a segunda maior vaga emigratória dos últimos 160 anos. Na sua opinião, a partir de quando e como chegou o país a esta situação?
Entre finais dos anos 50 e meados dos anos 90 (do século XX), Portugal foi das economias com mais sucesso na Europa. Foi a segunda que mais cresceu, tendo sido de facto uma economia de grande sucesso. Os processos de agravamento da situação económica começaram há cerca de 15 anos atrás e deterioraram-se principalmente na última década.
Praticamente não temos crescimento económico há dez anos. Quando o crescimento económico fica abaixo de dois a dois e meio por cento, não há criação de emprego, o que faz com que muita gente não tenha oportunidades. É por isso que o desemprego atingiu níveis históricos. Não há grandes perspectivas e é por isso que as pessoas continuam a emigrar.
Como chegamos a essa situação? Há várias causas. Desde o euro, que foi um grande choque para a economia portuguesa ao qual nós no princípio não soubemos responder e que agora já estamos claramente a responder. A nível internacional, por causa da concorrência da China e dos países do Leste da Europa, que afectou muitas das nossa empresas. Por outro lado, na minha óptica, tem também a ver com uma série de políticas económicas e públicas, erradas, irresponsáveis e incompetentes que agravaram os desequilíbrios que já existiam na economia portuguesa. E fizeram com que a espiral de endividamento que começou nos anos 90, não fosse travada a tempo.
O que contribuiu para que o país apresente, como referiu, a maior dívida pública dos últimos 160 anos?
Despesismo, falta de cuidado com a situação orçamental do país, pensar que por estarmos integradas numa união monetária poderíamos aumentar as dívidas porque mais cedo ou mais tarde, alguém nos iria ajudar. Foi uma estratégia totalmente errada. A dívida pública baixou nos anos 90 porque tivemos muitas receitas oriundas das privatizações e a economia estava a crescer, mas quando a economia para de crescer e a despesa continua a aumentar, o seu peso na economia aumenta. Chega-se a um ponto em que é totalmente insustentável.
Quais são na sua opinião, os principais riscos desse excessivo endividamento?
A consequência limite é entrarmos em insolvência. E não estamos longe. O que mostro no meu livro é que não só temos a maior dívida externa dos últimos 120 anos, como também temos níveis de endividamento externo que são superiores a praticamente todos os países que entraram em incumprimento nos últimos 40 anos. Ou seja, se olharmos para todos os países que entraram em insolvência nas últimas quatro décadas, nós estamos no top cinco.
Onde se deve cortar?
No Estado. Estive a ver as propostas da troika e eles falam exactamente numa reestruturação do Estado, até mesmo a redução das freguesias e dos concelhos. Isso vai claramente acontecer. O mais importante é que as medidas de austeridade sejam implementadas a nível de Estado e não das famílias e das empresas. É muito importante que consigamos diminuir a despesa do Estado e reestruturá-lo. Principalmente cortar em institutos, organismos e entidades públicas para que não tenhamos que sacrificar ainda mais as famílias, os funcionários públicos e as empresas. Porque senão, nunca mais saímos desta crise. O despesismo do Estado também é culpa nossa, mas é principalmente culpa dos nossos governantes. Quanto a mim, tem que ser o estado a pagar pela crise, a maior factura não tem que ser apresentada nem às famílias nem às empresas.
As Parcerias Público-Privadas (PPP) devem ser revistas?
São um negócio fantástico para estes governos. O que se passa é que se consegue fazer obra, inaugurá-la, aparecer na fotografia, cortar a fita dos hospitais, dos túneis e das auto-estradas e não se pagar um cêntimo. O que se faz é «chutar» essa despesa para o futuro, para os próximos governos e para os nossos filhos, porque não se paga nos cinco ou dez anos seguintes. Não só é altamente irresponsável, como é o maior atentado inter-geracional que foi feito neste país, de que me lembro.
Defende uma política de privatizações?
São inevitáveis. Em relação a alguns activos, como a Caixa Geral de Depósitos, não sou a favor de o fazerem neste momento, porque acho que se formos vender, vai ser ao desbarato. Mas sou totalmente a favor, nas empresas públicas, de «tirar» de lá os partidos, para se acabar com as nomeações políticas. Nas empresas do Estado, e mesmo no próprio Estado, o principal critério de ascensão a posições de liderança deve ser o mérito, não por partidarismos ou por se ter o cartão do partido. É preciso moralizar a vida pública. Tem que haver transparência, auditorias externas regulares, mas é preciso haver - e isso é urgente - uma delimitação muito clara daquilo que são cargos políticos e o que são cargos públicos.
É obvio que têm que haver alguns cargos de confiança política no topo da hierarquia, mas deveríamos minorar esses cargos. No Canadá - onde se realizaram quatro eleições em sete anos e só agora houve uma maioria, ganha pelos Conservadores - o Estado funciona tão bem porque têm uma administração pública muito forte. Não interessa qual é o governo que lá está, estão a servir o Estado. É o que temos que fazer em Portugal: acabar com o compadrio, o favoritismo político e a partidocracia. Defendo que todos os salários das pessoas que trabalham para empresas públicas, institutos, devem ser publicados na internet, deve haver o acesso total a essa informação. Transparência total para que as pessoas tenham menos suspeição em relação ao Estado.
Portugal é um país muito voltado para o litoral?
Andamos a negligenciar o interior há muitos anos. Pensa-se em Lisboa e no Porto e o resto não existe. Gostaria de saber quais são os políticos que, fora da época das eleições, pegam no carro e vão visitar Portugal. Porque se o fizerem vão encontrar um país que está em declínio. O interior está totalmente negligenciado. É preciso não investir em grandes auto-estradas, mas atrair as empresas para se criar emprego. É preciso que o Estado tenha uma política de descriminação positiva em relação ao interior: baixar a fiscalidade e as contribuições sociais das pessoas que trabalham no interior; dar-lhes uma bonificação salarial por estarem a trabalhar em zonas de interior. É preciso haver uma política que faça com que o despovoamento do interior seja travado e que cada vez mais casais jovens voltem a viver no interior ou pelo menos não saiam de lá.
Afirma que é preciso produzir mais para importar menos. Em que sectores?
Nós exportamos muito pouco, em percentagem do nosso PIB. A aposta tem que ser feita nas exportações. Nós não apoiamos pouco as empresas, mas damos às empresas protegidas, as que não estão abertas à concorrência internacional. Isso tem que ser invertido. Em vez de dar incentivos às empresas que têm interesses instalados, temos que os dar às empresas que inovam e que exportam. Há empresas que o fazem e com imenso sucesso e no que os governantes podem ajudar é a dar-lhes incentivos: reduzir a Taxa Social Única, baixar os impostos que pagam se apostarem nos sectores de internacionalização em vez de olharem apenas para o mercado interno.
Mas mesmo assim, as apostas não podem ser feitas apenas nas exportações, há muita coisa a fazer internamente. Há muitas empresas que não têm que exportar e que podem ser empresas de excelência. O que interessa é que as empresas inovem, que sejam empreendedoras e, por exemplo, que produzam bens que nós importamos.
Quais são as medidas mais urgentes que o próximo governo terá que tomar, na sua opinião? E quais as que devem ser adoptadas a médio e longo prazo?
A primeira terá que ser uma política de transparência e anti-corrupção. O próximo governo não pode ser mais do mesmo, terá que ser um governo que mostre ser diferente do que os que o precederam. Gostaria que o clima de suspeição e de muita crispação que existe hoje em dia em relação aos nossos governantes, acabasse. E a única maneira de o fazer é com uma política de transparência.
Depois há duas coisas muito importantes. Uma clara política de combate, sem tréguas, ao endividamento, que deverá ser multifacetada: estimular a poupança, diminuir a importação de produtos, diminuir a dependência do exterior e claramente pagar as nossas dívidas.
Outra medida será coligar as finanças públicas a uma política de crescimento e produtividade. Ou seja, é importante perceber que nunca vamos ter contas públicas saudáveis enquanto não começarmos a crescer. Não pode ser um crescimento a todo o custo, mas tem que ser feito conjugando a austeridade com políticas de crescimento. Como se faz? Podemos aumentar o IVA em um por cento, mas baixar consideravelmente a Taxa Social Única porque assim os custos do trabalho baixam, não teremos que cortar salários, as empresas tornam-se mais competitivas e criam mais empregos e consequentemente diminui o desemprego.
Entre finais dos anos 50 e meados dos anos 90 (do século XX), Portugal foi das economias com mais sucesso na Europa. Foi a segunda que mais cresceu, tendo sido de facto uma economia de grande sucesso. Os processos de agravamento da situação económica começaram há cerca de 15 anos atrás e deterioraram-se principalmente na última década.
Praticamente não temos crescimento económico há dez anos. Quando o crescimento económico fica abaixo de dois a dois e meio por cento, não há criação de emprego, o que faz com que muita gente não tenha oportunidades. É por isso que o desemprego atingiu níveis históricos. Não há grandes perspectivas e é por isso que as pessoas continuam a emigrar.
Como chegamos a essa situação? Há várias causas. Desde o euro, que foi um grande choque para a economia portuguesa ao qual nós no princípio não soubemos responder e que agora já estamos claramente a responder. A nível internacional, por causa da concorrência da China e dos países do Leste da Europa, que afectou muitas das nossa empresas. Por outro lado, na minha óptica, tem também a ver com uma série de políticas económicas e públicas, erradas, irresponsáveis e incompetentes que agravaram os desequilíbrios que já existiam na economia portuguesa. E fizeram com que a espiral de endividamento que começou nos anos 90, não fosse travada a tempo.
O que contribuiu para que o país apresente, como referiu, a maior dívida pública dos últimos 160 anos?
Despesismo, falta de cuidado com a situação orçamental do país, pensar que por estarmos integradas numa união monetária poderíamos aumentar as dívidas porque mais cedo ou mais tarde, alguém nos iria ajudar. Foi uma estratégia totalmente errada. A dívida pública baixou nos anos 90 porque tivemos muitas receitas oriundas das privatizações e a economia estava a crescer, mas quando a economia para de crescer e a despesa continua a aumentar, o seu peso na economia aumenta. Chega-se a um ponto em que é totalmente insustentável.
Quais são na sua opinião, os principais riscos desse excessivo endividamento?
A consequência limite é entrarmos em insolvência. E não estamos longe. O que mostro no meu livro é que não só temos a maior dívida externa dos últimos 120 anos, como também temos níveis de endividamento externo que são superiores a praticamente todos os países que entraram em incumprimento nos últimos 40 anos. Ou seja, se olharmos para todos os países que entraram em insolvência nas últimas quatro décadas, nós estamos no top cinco.
Onde se deve cortar?
No Estado. Estive a ver as propostas da troika e eles falam exactamente numa reestruturação do Estado, até mesmo a redução das freguesias e dos concelhos. Isso vai claramente acontecer. O mais importante é que as medidas de austeridade sejam implementadas a nível de Estado e não das famílias e das empresas. É muito importante que consigamos diminuir a despesa do Estado e reestruturá-lo. Principalmente cortar em institutos, organismos e entidades públicas para que não tenhamos que sacrificar ainda mais as famílias, os funcionários públicos e as empresas. Porque senão, nunca mais saímos desta crise. O despesismo do Estado também é culpa nossa, mas é principalmente culpa dos nossos governantes. Quanto a mim, tem que ser o estado a pagar pela crise, a maior factura não tem que ser apresentada nem às famílias nem às empresas.
As Parcerias Público-Privadas (PPP) devem ser revistas?
São um negócio fantástico para estes governos. O que se passa é que se consegue fazer obra, inaugurá-la, aparecer na fotografia, cortar a fita dos hospitais, dos túneis e das auto-estradas e não se pagar um cêntimo. O que se faz é «chutar» essa despesa para o futuro, para os próximos governos e para os nossos filhos, porque não se paga nos cinco ou dez anos seguintes. Não só é altamente irresponsável, como é o maior atentado inter-geracional que foi feito neste país, de que me lembro.
Defende uma política de privatizações?
São inevitáveis. Em relação a alguns activos, como a Caixa Geral de Depósitos, não sou a favor de o fazerem neste momento, porque acho que se formos vender, vai ser ao desbarato. Mas sou totalmente a favor, nas empresas públicas, de «tirar» de lá os partidos, para se acabar com as nomeações políticas. Nas empresas do Estado, e mesmo no próprio Estado, o principal critério de ascensão a posições de liderança deve ser o mérito, não por partidarismos ou por se ter o cartão do partido. É preciso moralizar a vida pública. Tem que haver transparência, auditorias externas regulares, mas é preciso haver - e isso é urgente - uma delimitação muito clara daquilo que são cargos políticos e o que são cargos públicos.
É obvio que têm que haver alguns cargos de confiança política no topo da hierarquia, mas deveríamos minorar esses cargos. No Canadá - onde se realizaram quatro eleições em sete anos e só agora houve uma maioria, ganha pelos Conservadores - o Estado funciona tão bem porque têm uma administração pública muito forte. Não interessa qual é o governo que lá está, estão a servir o Estado. É o que temos que fazer em Portugal: acabar com o compadrio, o favoritismo político e a partidocracia. Defendo que todos os salários das pessoas que trabalham para empresas públicas, institutos, devem ser publicados na internet, deve haver o acesso total a essa informação. Transparência total para que as pessoas tenham menos suspeição em relação ao Estado.
Portugal é um país muito voltado para o litoral?
Andamos a negligenciar o interior há muitos anos. Pensa-se em Lisboa e no Porto e o resto não existe. Gostaria de saber quais são os políticos que, fora da época das eleições, pegam no carro e vão visitar Portugal. Porque se o fizerem vão encontrar um país que está em declínio. O interior está totalmente negligenciado. É preciso não investir em grandes auto-estradas, mas atrair as empresas para se criar emprego. É preciso que o Estado tenha uma política de descriminação positiva em relação ao interior: baixar a fiscalidade e as contribuições sociais das pessoas que trabalham no interior; dar-lhes uma bonificação salarial por estarem a trabalhar em zonas de interior. É preciso haver uma política que faça com que o despovoamento do interior seja travado e que cada vez mais casais jovens voltem a viver no interior ou pelo menos não saiam de lá.
Afirma que é preciso produzir mais para importar menos. Em que sectores?
Nós exportamos muito pouco, em percentagem do nosso PIB. A aposta tem que ser feita nas exportações. Nós não apoiamos pouco as empresas, mas damos às empresas protegidas, as que não estão abertas à concorrência internacional. Isso tem que ser invertido. Em vez de dar incentivos às empresas que têm interesses instalados, temos que os dar às empresas que inovam e que exportam. Há empresas que o fazem e com imenso sucesso e no que os governantes podem ajudar é a dar-lhes incentivos: reduzir a Taxa Social Única, baixar os impostos que pagam se apostarem nos sectores de internacionalização em vez de olharem apenas para o mercado interno.
Mas mesmo assim, as apostas não podem ser feitas apenas nas exportações, há muita coisa a fazer internamente. Há muitas empresas que não têm que exportar e que podem ser empresas de excelência. O que interessa é que as empresas inovem, que sejam empreendedoras e, por exemplo, que produzam bens que nós importamos.
Quais são as medidas mais urgentes que o próximo governo terá que tomar, na sua opinião? E quais as que devem ser adoptadas a médio e longo prazo?
A primeira terá que ser uma política de transparência e anti-corrupção. O próximo governo não pode ser mais do mesmo, terá que ser um governo que mostre ser diferente do que os que o precederam. Gostaria que o clima de suspeição e de muita crispação que existe hoje em dia em relação aos nossos governantes, acabasse. E a única maneira de o fazer é com uma política de transparência.
Depois há duas coisas muito importantes. Uma clara política de combate, sem tréguas, ao endividamento, que deverá ser multifacetada: estimular a poupança, diminuir a importação de produtos, diminuir a dependência do exterior e claramente pagar as nossas dívidas.
Outra medida será coligar as finanças públicas a uma política de crescimento e produtividade. Ou seja, é importante perceber que nunca vamos ter contas públicas saudáveis enquanto não começarmos a crescer. Não pode ser um crescimento a todo o custo, mas tem que ser feito conjugando a austeridade com políticas de crescimento. Como se faz? Podemos aumentar o IVA em um por cento, mas baixar consideravelmente a Taxa Social Única porque assim os custos do trabalho baixam, não teremos que cortar salários, as empresas tornam-se mais competitivas e criam mais empregos e consequentemente diminui o desemprego.
O resto da entrevista está aqui, onde se fala ainda da natalidade, da emigração, e da agricultura, entre outros temas.
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