15 junho 2010

1,000,000,000,000 DE DÍVIDAS

Há muitas razões para que, apesar de tudo, a Alemanha e a França não deixem cair os países europeus em mais dificuldades. Uma das principais está aqui: 1,000,000,000,000 de dólares que os bancos franceses e alemães têm em activos das dívidas de países como a Grécia, Portugal, Espanha e Irlanda. Por isso, se uns cairem, os outros também não ficam incólumes. Se isto não é integração europeia, eu sinceramente não sei o que é.

AINDA A EMIGRAÇÃO (2)

O resto da entrevista à Visão sobre a questão da emigração:

Visão- Tem alguma explicação para o «fenómeno Angola»? E, também aqui, como caracteriza este tipo de emigração?
Angola é vista como uma terra de oportunidades, assim como já o foi, por razões distintas, nos anos 60. A ida para Angola entende-se graças a estas mesmas oportunidades, bem como a língua, a nossa história comum, e até por afinidades familiares e sentimentais. Trabalhadores com qualificações bastante distintas optam por emigrar para Angola. Ainda assim, de um modo geral, há uma grande incidência relativa de trabalhadores qualificados, o que se percebe, pois os angolanos têm uma carência destes trabalhadores. 
Visão- Podemos dizer que os portugueses emigram por razões fundamentalmente económicas? Mais directamente, que razões levam a esta «debandada»?
Habitualmente, as pessoas emigram devido às diferenças salariais entre os países de origem e de destino, à falta de oportunidades nos seus países de origem, por razões familiares (i.e., ligações com familiares já emigrados), e por motivos políticos (que não é o nosso caso). Os novos emigrantes portugueses não são excepção. A economia está estagnada há uma década, há falta de oportunidades e de emprego, os salários ainda são baixos em relação a destinos como o Reino Unido e até Espanha, de modo que se entende que os portugueses optem por emigrar em busca de melhores condições de vida.
Visão- Quais os efeitos da emigração na economia portuguesa - é benéfica ou prejudicial? Quais as consequências de uma eventual redução da taxa de desemprego por via da emigração? E os efeitos no PIB?
Como em tudo, a emigração tem efeitos positivos e negativos. Se não fosse a emigração, Portugal já há alguns anos teria uma taxa de desemprego a rondar os 10-15%. Mais desemprego implica mais insatisfação social e mais encargos para o Estado. Por isso, neste sentido a emigração é benéfica. Uma maior emigração terá igualmente um efeito positivo sobre o endividamento externo e a balança de pagamentos. Quanto mais emigrarmos, menor será o endividamento externo, desde que os emigrantes continuem a mandar parte das suas poupanças (as remessas) para o país. Aliás, a verdade é que, contrariamente ao que se pensa, o défice comercial português em percentagem do PIB não aumentou muito nos últimos 10 anos. O que se passava há 10-15 anos é que as remessas dos emigrantes (em percentagem do PIB) são bem menores actualmente do que então, e as transferências da União Europeia são igualmente mais diminutas.
Neste sentido, a crise actual é mais uma crise de financiamento de um défice comercial que é crónico do que um súbito decréscimo de competitividade. A verdade é que antes tínhamos as remessas dos emigrantes e os subsídios da UE, mas hoje temos bem menos. Se emigrarmos mais, maior será a capacidade de financiamento do défice externo. Por isso, a emigração é positiva nesse sentido.
Porém, e como é óbvio, há também inúmeras desvantagens económicas relacionadas com o aumento da emigração. A força de trabalho disponível diminui, as contribuições sociais e os impostos baixam (isto é, menos receitas para o Estado), para já não falar do efeito que a fuga de cérebros poderá causar ao nível da produtividade (se esta fuga aumentar ainda mais) e de um menor grau de empreendedorismo. 
Visão- Os imigrantes que recebemos são em número inferior aos emigrantes, ou seja, supostamente ficariam ainda postos de trabalho por preencher. O emprego que o país tem para oferecer é de facto inferior ao número da sua população activa?
Com efeito, a emigração nos últimos anos tem sido de tal forma significativa que não tem sido compensada pela chegada de imigrantes. Com a emigração não ficam necessariamente postos de trabalho por preencher, porque, infelizmente, não temos esses mesmos postos de trabalho. As pessoas saem porque não vêem grandes oportunidades de vida e por causa do desemprego.
Em relação aos imigrantes, é cada vez mais visível de que eles(as) serão fundamentais para o futuro do país. Pessoalmente, defendo há muito que Portugal devia ter uma política de imigração, com quotas anuais e de acordo com as necessidades da economia. A imigração devia existir não para colmatar as perdas da emigração, mas sim por causa da nossa baixíssima natalidade e do impacto que essa reduzida natalidade irá ter sobre as sustentabilidade das contas públicas e da Segurança Social.

13 junho 2010

AINDA A EMIGRAÇÃO

A Visão fez-me algumas perguntas sobre o meu trabalho da emigração portuguesa. Aqui estão algumas das minhas respostas:
Visão - Os números da emigração são escassos e de difícil apuramento, tendo em conta a abolição de fronteiras na União Europeia. Como chegou a estes dados?
Eu segui um método semelhante ao anteriormente utilizado por outros investigadores da emigração portuguesa, como a Maria Ionnis Baganha e o João Peixoto. Recolhi as estatísticas dos países de destino para os países extracomunitários e para os europeus que ainda mantêm registos de estrangeiros, e depois complementei-as com as estatísticas da força de trabalho, dos registos da Segurança Social e até o número de vistos de trabalho concedidos para países como Angola. Utilizei ainda a base de dados da OCDE sobre os fluxos migratórios, que tem números sobre os fluxos e os stocks das migrações para os países da OCDE.
Visão - Em 2007 e 2008, a emigração anual praticamente duplicou em relação ao início do século. Como justifica este aumento?
Penso que este aumento da emigração se justifica pelo prolongar da crise económica do país. Como a estagnação económica já dura há uma década, é natural que, cada vez mais, as pessoas procurem alternativas para as suas vidas. E como o desemprego tem aumentado e as perspectivas de uma retoma económica não são muito risonhas, as pessoas começam a olhar para a emigração como uma alternativa credível e atractiva ao mal-estar do país. É natural que assim seja, até porque nós temos uma história e uma tradição emigratória muito mais elevada do que outros países, como a nossa vizinha Espanha.
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Visão - Ainda que não disponha de dados, considera que a tendência de crescimento se mantém, tendo em conta a situação actual do País?
É muito provável. É muito possível que a emigração para a Europa (com a excepção da Suíça) diminua nos próximos 2 ou 3 anos por causa da crise económica em países como a Espanha e o Reino Unido, dois dos principais destinos da emigração nacional nos últimos anos. Porém, os portugueses não deixarão de emigrar, apenas optarão por países de destino alternativos, tais como Angola, assim como a Visão já noticiou há alguns meses. Só em 2009, mais de 46 mil pessoas procuram vistos para Angola, enquanto a média de 2007 e 2008 rondou “apenas” os 20 mil.
Sinceramente não acredito que consigamos estancar a emigração enquanto não houver uma retoma sustentada da economia e uma consequente descida do desemprego, ou se a emigração mundial for restringida por medidas proteccionistas (algo que não se vislumbra por enquanto).
Visão - Que tipo de emigração é esta? Mais temporária do que permanente? Mais qualificada do que a dos anos 70 ou mantém-se a imagem da «mala de cartão»? Continua a ser a emigração da construção civil e das limpezas ou a «fuga de cérebros» já tem algum peso?
Não sabemos bem. Estudos do INE do início desta década sugerem que a emigração se tem tornado mais temporária. Porém, não temos dados sobre esta matéria para o resto da década. Para além do mais, esses mesmos estudos têm uma série de problemas metodológicos que limita a sua aplicação e interpretação. No entanto, a emigração da construção civil e das limpezas aumentou inquestionavelmente nos últimos anos, para destinos como Andorra, Espanha, Suíça, Reino Unido e, como é óbvio, Angola.
Por outro lado, a fuga de cérebros é uma realidade inquestionável. Há vários estudos empíricos que demonstram que, no ano 2000, Portugal era o segundo país da OECD com maior fuga de cérebros, isto é, trabalhadores com uma educação universitária. Não me parece muito crível que a situação se tenha invertido desde então.
De notar que uma fuga de cérebros não é necessariamente negativa. Se muitos destes trabalhadores qualificados emigrarem mas depois regressarem, a economia nacional poderá beneficiar das suas aprendizagens e experiências no exterior. No entanto, se as condições económicas do país não melhorarem e se não se criarem oportunidades de emprego e de investimento em Portugal, então é muito possível que a grande maioria destes trabalhadores qualificados optem por permanecer fora do país.

11 junho 2010

EMPREGO NAS CÂMARAS

Um dos dados mais interessantes que encontrei ultimamente foi sobre o número de funcionários das câmaras municipais. Como podemos ver no quadro abaixo, cerca de 1,1% da população nacional trabalha para as câmaras municipais. Um valor que não é extremamente elevado se nos compararmos com outros países europeus. Por isso, e apesar de poder haver algum desperdício nalgumas câmaras, não é por aqui que os cortes estruturais nas despesas públicas terão que ser feitos. Disto isto, uma das constatações que podemos retirar dos números de trabalhadores das câmaras municipais é que uma dispersão regional enorme no emprego municipal. Pensa que a maior concentração de trabalhadores se encontra em Lisboa e no Porto? Sim, é verdade em termos absolutos. Mas não em termos relativos. Tanto o Grande Porto como a Grande Lisboa têm um número de funcionários municipais inferior à média do país.
Acha que o despesismo e o favoritismo se passa na Madeira ou nos Açores? Será que é aí que se encontram mais trabalhadores municipais por 1000 residentes? Não, também não é, pois as regiões autónomas têm um número de funcionários municipais semelhante à média nacional.
E se não é aí, onde é que há uma maior percentagem de funcionários muncipais? Sim, exactamente. É no Alentejo, onde o alegado efeito da interioridade é mais forte do que em regiões como Bragança e em Trás-os-Montes. Afinal, não é toa que o Partido Comunista consegue manter o seu irredutível bastião naquela região do país...


NUTS II e III Emprego em CM por 1000 residentes
Portugal 11.2
Norte 9.3
Minho-Lima 9.9
Cávado 7.2
Ave 7.1
Grande Porto 8.7
Tâmega 10.2
Entre Douro e Vouga 7.7
Douro 14.9
Alto Trás-os-Montes 15.1
Centro 10.8
Baixo Vouga 8.0
Baixo Mondego 10.6
Pinhal Litoral 7.1
Pinhal Interior Norte 17.0
Dão-Lafões 12.2
Pinhal Interior Sul 19.6
Serra da Estrela 12.2
Beira Interior Norte 14.9
Beira Interior Sul 10.7
Cova da Beira 7.9
Oeste 10.9
Médio Tejo 11.6
Lisboa 10.5
Grande Lisboa 9.9
Península de Setúbal 11.9
Alentejo 19.9
Alentejo Litoral 24.6
Alto Alentejo 23.7
Alentejo Central 20.5
Baixo Alentejo 24.5
Lezíria do Tejo 13.6
Algarve 18.7


Região Autónoma dos Açores 11.4
Região Autónoma da Madeira 13.7

09 junho 2010

700 MIL NOVOS EMIGRANTES

A revista Visão publica hoje os resultados de uma investigação minha sobre a nova emigração portuguesa. Só entre 1998 e 2008 foram 700 mil novos emigrantes. Esta é, certamente, uma das consequências mais dramáticas e mais visíveis da estagnação económica da última década. Mais aqui e um pouco mais aqui.