07 janeiro 2008

NEW HAMPSHIRE


A próxima etapa das primárias americanas é realiza-se em New Hampshire. Contrariamente a Iowa (onde o sistema eleitoral é feito com os curiosos "causus"), em New Hampshire todos os votos contam. Quem tiver mais votos, ganha. New Hampshire muitas vezes dá boas indicações sobre os candidatos que poderão chegar ao fim, à nomeação desejada. Para além do mais, como New Hampshire é um estado sui generis no nordeste americano (é muito mais conservador do que os outros estados da região), os resultados das primárias amanhã serão importantes para os candidatos. Como o então governador do estado, John Sununu, afirmou em 1988: "The people of Iowa pick corn, the people of New Hampshire pick presidents".
As primárias serão principalmente importantes para os que perderam em Iowa: Hillary Clinton and Mitt Romney. Serão igualmente importantes para John McCain e para Rudi Giuliani.
No campo Democrata, as sondagens mostram que Obama (38-39%) tem agora uma vantagem de dez pontos percentuais sobre Clinton (28-29%). Em contraste, a nível nacional, Clinton (33%)ainda tem vantagem rem relação a Obama (29%). É por isso que New Hampshire é tão importante para Clinton. Se aspirar manter a vantagem a nível nacional, Hillary tem que ganhar as próximas primárias. Hillary tem que ganhar algo até à chamada Super Tuesday (onde vários grandes estados estão em jogo) no início de Fevereiro. Se tal não acontecer, Obama será imparável na corrida à nomeação Democrata (e, possivelmente, à Casa Branca).
PS. O Estado de New Hampshire aparece a vermelho no mapa.

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro Professor
Em primeiro lugar desejo agraadecer o ter publicado o seu livro "Mitos". Permita-me apenas um comentário sobre os indicadores de produtividade assentarem basicamante no factor de produção população. Assim se compreende (e o Prof.refere)o abaixamento de produtividade logo a seguir ao 25ABR74. Ora, a balança de pagamentos no fim de 1973 já estava completamente desequilibrada e a diminuição da produtividade industrial (que de facto é dificil de quantificar) não terá sido tão grande como isso. Por isso penso que a apresntação dos indicadores de produtividade de 1974 em diante tal como o faz poderão levar alguns leitores a dizer cobras e lagartos do 25 de Abril. Gostaria de saber a sua opinião.
A propósito das eleições americanas, gostaria tambem, se achar oportuno, de sdabver a sua opinião sobre o seguinte artigo sobre as regras eleitorais, que tenho vindo a divulgar.
Os melhores cumprimentos.

A matemática e a nova lei autárquica


Há tempos, em conversa num grupo de amigos, falou-se no estranho fenómeno que pode verificar-se em dias de muito trânsito nas auto-estradas: as filas acumulam-se, chega a haver paragem e não se vem a descortinar, quilómetros à frente, nenhuma causa aparente para isso.

Tentei explicar aos meus interlocutores, alguns dos quais com cursos de engenharia, com recurso a um diagrama espaço-tempo (espaço em abcissas, isto é, na escala horizontal; tempo em ordenadas, isto é, na escala vertical) por que acontecia isso.

Como qualquer modelo matemático, o diagrama era uma abstracção que simplificava a realidade e que traduzia a seguinte sequência:

- deslocando-se a fila a alta velocidade (i.é, com a curva do movimento representada por uma linha pouco inclinada, correspondendo distancias grandes a intervalos de tempo curtos), e com os automóveis muito próximos uns dos outros, a uma distância inferior ao espaço percorrido em 2 segundos (tempo de reacção médio em condução prolongada), um dos automóveis abranda por qualquer motivo (uma mosca que atrapalhou a condução, por exemplo) , i.é, a curva do seu movimento passou a ser uma linha um pouco mais inclinada;
- como o carro seguinte viaja a uma distância inferior ao tempo de reacção, o respectivo condutor deixa-o aproximar demasiado do primeiro automóvel e tem de abrandar com uma desaceleração superior (i.é, a curva do seu movimento tem de passar a ser uma linha ainda mais inclinada);
- o terceiro carro vai repetir o comportamento do segundo, com a agravante da curva do seu movimento ter de passar a ser uma linha ainda mais inclinada;
- e assim sucessivamente, até que há um condutor que tem de passar para uma linha vertical (i.é, tem de parar, com a variável tempo a crescer e a variável espaço constante);
- a fila regenera o seu andamento e ninguém consegue identificar uma causa que tivesse levado à paragem (i.é, não apareceu nenhum obstáculo que tivesse impedido o fluxo do trânsito).

Se o leitor teve a paciência de seguir o raciocínio, possivelmente fazendo apelo à memória de alguma aula de matemática (mas cuidado, se faltou a essa aula, ou se esteve na aula com a cabeça a pensar em coisas mais interessantes, não vai conseguir lembrar-se como se constrói um diagrama espaço-tempo) ou simplesmente acompanhando a sequência lógica, concluirá que a explicação até nem é complicada (observando, claro, que se trata de uma abstracção, de um modelo representando a realidade sem uma fidelidade absoluta).

Porém, a reacção dos meus interlocutores foi esta: “Lá vens tu com as tuas coisas. Quando começas com esses gráficos ninguém te entende”.

Provavelmente, o que os meus amigos me quiseram dizer é que não vale a pena cansar o cérebro a tentar compreender um fenómeno quando se pode simplesmente carregar no pedal do travão e logo se vê.

Este exemplo é interessante porque ilustra também a razão por que se deve manter uma distância superior ao espaço percorrido em 2 segundos.
Resposta: para os condutores terem tempo de reagir sem recorrerem a desacelerações (travagens) maiores do que as do carro da frente, mantendo assim a fluidez do trânsito.
Assim, guardar uma distância de segurança não só garante menores riscos mas também maior fluidez de trânsito. Essa distância não é bem para facilitar as ultrapassagens, como os condutores vivaços acharão (numa atitude primária, sem analisar os outros parâmetros em jogo).

Dadas as dificuldades de concitar as atenções gerais para a explicação matemática destes fenómenos, e dado que a matemática é essencial para explicar os fenómenos da física da vida que nos rodeia, poderemos talvez concluir que temos aqui um exemplo em que muitos de nós andamos a correr riscos desnecessários, sem o compreendermos.
Ou mais prosaicamente, andamos a achar que somos muito bons condutores porque temos reflexos muito rápidos, porque conseguimos travar a tempo (quando conseguimos), sem perceber que andamos a ensarilhar o trânsito por andarmos demasiado perto do carro da frente.
Será talvez mais um exemplo de como é difícil conciliar o interesse colectivo dos utilizadores da auto-estrada com o interesse individualista de quem quer andar depressa…a todo o custo.

Chegados aqui (mais uma vez, se o leitor teve paciência para me acompanhar), proponho passar para outro exemplo de aplicação da matemática às coisas reais e dos resultados decepcionantes quando se põe a matemática de lado.

Esse exemplo é a nova lei autárquica que impõe uma maioria absoluta para o partido mais votado, independentemente dos resultados, deixando os restantes lugares para serem distribuídos segundo o método de Hondt (honra ao matemático belga que desenvolveu este método de proporcionalidade para dar voz ao maior numero possível de sensibilidades e que nesta lei é pervertido por ser apenas parcial a sua aplicação).

Desde que a Democracia conseguiu dar voz aos povos no século XVIII que os matemáticos se debruçam sobre a melhor maneira dos eleitos representarem as vontades dos eleitores (i.é, qual o melhor processo de satisfazer um eleitor cujo candidato preferido (ou alternativa preferida) não foi o mais votado(a) ou, como escalonar uma ordem de preferências, para os eleitores, de todos os candidatos). O problema é complexo e não se resolve com regras de voto/maioria simples (nem, muito menos, com definições artificiais de maiorias). Existem até situações em que é impossível cumprir todos os critérios éticos das eleições democráticas, conforme estudado pelo matemático Kenneth Arrow (1951).
(Critérios éticos:
- o consenso - se todos acham que o candidato A é melhor que o candidato B, então B não deve ser eleito;
- o anonimato - “uma pessoa, um voto”, sendo o voto secreto e de igual peso para todos os cidadãos;
- a neutralidade – nenhum candidato deve ser favorecido, ou prejudicado, necessitando p.ex. de menos ou de mais votos para ser eleito; nem a votação num candidato deve alterar a votação nos outros candidatos, o que é o ponto fraco da regra eleitoral por distribuição de pontos por todos os candidatos;
- a transitividade – se o candidato A vencesse uma eleição simples só com o candidato B, e o candidato B vencesse uma eleição simples só com o candidato C, então o candidato A deveria vencer uma eleição simples só com o candidato C e a regra eleitoral deveria respeitar esse resultado)

É muito interessante notar que, quando o matemático Condorcet, no século XVIII, chamou a atenção para a injustiça da regra de voto simples/maioria simples e o matemático Charles Borda apresentou a solução com as votações de todos os candidatos escalonadas por pontos atribuídos pelos eleitores conforme a sua preferência comparada por todos os candidatos, os políticos da Assembleia Nacional Francesa (ou, talvez mais precisamente, por ordem de Napoleão, olhem quem) inviabilizaram as correcções propostas.

As justificações agora apresentadas para a nova lei autárquica enfermam da vontade de resolver um problema particular (os resultados das eleições em Lisboa) com a alteração de uma regra geral (é curioso verificar que a grande maioria das câmaras do País funciona bem com a lei actual e que as últimas eleições de Lisboa culminaram um processo de acumulação de más práticas).
As boas práticas de gestão dos sistemas físicos recomendam evitar a alteração de uma regra geral para resolver um problema particular, porque é um dos critérios de estabelecimento das condições de oscilação dum sistema.

Por outro lado, é impossível escapar à analogia com as regras das eleições dos USA (“quem ficar à frente leva tudo”) que são precisamente regras vindas directamente do século XVIII, criadas num contexto histórico de desenvolvimento da Democracia que só podemos aplaudir, mas que são anteriores ao desenvolvimento da teoria matemática das eleições, numa altura em que as dificuldades de telecomunicações e de computação as justificavam (é como se fosse uma sonda do tempo; adoptá-las é regredir; e não parece possível que os interesses instalados dos dois principais partidos norte-americanos autorizem o “up-grade” das regras).

É ainda interessante estudar o efeito perverso destas regras num fenómeno do séc.XIX na parte ocidental dos USA: a “salamandrização” (definição das fronteiras de estados confinantes de modo a resultarem os eleitos que mais interessavam ou negociados em cada um deles; o nome de salamandrização veio de que um dos círculos eleitorais ficou com a forma clara de uma salamandra).

Uma palavra ainda para o argumento invocado da “governabilidade”.
Seria muito bom que as pessoas reconhecessem que o mal está em não serem capazes de trabalhar para o bem comum com outras pessoas que têm ideias diferentes.
O mal não está nas maiorias relativas. Está nas dificuldades de organização, de trabalhar em equipa, dos mecanismos de tomada de decisões, na falta de método.
Para resolver essas dificuldades e essas faltas há técnicas e práticas de boa gestão e controle (também se pode resolver muita coisa se aceitarmos com naturalidade a constituição de coligações ou de acordos inter-partidos depois das eleições).
E que liderança não é conseguir levar por diante uma ideia que se considera a melhor, porque até os líderes são falíveis, mas conseguir um debate participativo, sem a rigidez das estruturas hierárquicas (que inibem grandemente a competitividade), em que o maior número possível de pessoas possa contribuir para uma solução cuja fundamentação possa ser compreendida (até porque, desde que não haja sonegação ou apropriação de informação, os muitos são muito mais espertos do que os poucos, ou, como diz o provérbio, dois pares de olhos vêem muito mais do que um par).

A fundamentação matemática que eu apresentei aqui não foi inventada por mim e está ao alcance dos cidadãos portugueses (embora eu esteja com dificuldade em conceder o benefício aos autores da lei de que tenham estudado e compreendido os conceitos anteriores).
Estes problemas estão estudados em livros vendidos nas livrarias portuguesas (cito como autores Jorge Buescu e Partha Dasgupta) e é muito preocupante verificar que as regras práticas da nossa sociedade ignoram as conquistas da matemática, cujo objectivo último é servir o Homem.

Caso o leitor não tenha paciência para procurar esses livros, sugiro ao menos a leitura dum interessante artigo de Ana Correia Moutinho a propósito das eleições parlamentares de 2002, em que cita o Prof.Jorge Buescu: “este sistema (o do voto simples e da maioria simples) é o sistema mais primitivo” (e transformar postiçamente uma maioria relativa em maioria absoluta não será ainda mais primitivo? assim a atirar para o napoleónico?), no seguinte endereço:
http://www.prof2000.pt/users/amma/ce/macs/tema1/a_matematica_dos_sistemas_eleitorais.htm

E se, mesmo assim, o leitor não quiser embrenhar-se por estes caminhos, lembre-se, por favor, do nosso grande actor António Silva, e das suas chapeladas para manipular as eleições para regedor, num dos filmes heróicos do tempo da outra senhora.

(Talvez afinal este exemplo valha mais do que os raciocínios matemáticos e as minhas lamentações de que os portugueses, com as suas dificuldades em matemática, correm riscos desnecessários no dia a dia, na estrada, como vimos no início, e na política).

Imagine o grande António Silva a dizer: “Eu não tive a maioria absoluta, mas como consegui que dois compadres votassem em mim (sendo eu, António Silva, um deles, claro), e os outros 7 compadres votaram, cada um deles, em si próprio, eu e o meu compadre de confiança ficamos com 5 votos e os outros 7 compadres ficam livres de utilizar os 4 votos restantes como muito bem entenderem” (a analogia não é perfeita porque a eleição do regedor era por colégio eleitoral composto pelos candidatos, o que já de si parece um pouco primitivo, mas a imagem julgo que é aplicável; anote-se ainda que uma entidade pública não é propriamente uma sociedade por acções, em que o número de votos se conta pelo peso das acções).

Já imaginou? E acha bem a nova lei? (Vá lá, não está ninguém do partido a ouvir, diga só para a sua consciência, e eu também não quero que me responda).

Em consequência, apelo às instituições e ao leitor, caso concorde com os conceitos expressos, ou lhes reconheça fundamento para reanálise da nova lei, que divulgue o que aqui deixei (se quiser reenviar o email, fico reconhecido) e que, caso ache bem, manifeste a sua oposição, ou a sua desconfiança, relativamente à nova lei.

Formulo votos para que, especialmente, não se estenda o novo critério (velho, como vimos) às eleições parlamentares, e que os círculos eleitorais possam continuar com diversidade de representantes.





Este email foi elaborado por Fernando Santos e Silva, BI 1453978 (Lisboa) (fcsseratostenes@hotmail.com), que poderá fornecer coordenadas mais precisas a quem o pedir de boa fé.