Um excelente artigo de um dos melhores economistas portugueses actuais. O Ricardo Reis tem toda a razão: se a Grécia se afundar, nós certamente seremos o país que se segue. Mas não vale a pena discutir isso. Vale mais continuarmo-nos a insultar na Assembleia da República ou tentar convencer os(as) portugueses(as) que a nossa salvação está nas quimeras do TGV, das grandes obras públicas, ou da regionalização.
16 dezembro 2009
01 dezembro 2009
MAIS IMPOSTOS HOJE OU AMANHÃ?
A questão dos impostos está novamente na ordem do dia. Aqui está o meu artigo publicado no Público no sábado passado.
Apesar de o défice orçamental e de a dívida pública terem disparado, o primeiro-ministro garantiu esta semana que não haverá aumento de impostos nesta legislatura. Em princípio, é crível que o primeiro-ministro estivesse a dizer a verdade. Afinal, sabendo que a carga fiscal actual é a mais elevada de sempre, seguramente que um aumento dos impostos iria ter importantes repercussões eleitorais para o partido do governo (para já não falar da competitividade da economia nacional).
Mesmo assim, numa altura em que o défice orçamental já ronda os 8% do PIB, a dívida pública já está acima dos 70% do PIB, e se prevê que continuemos a registar défices elevados nos próximos anos, é inevitável perguntar: se não aumentarmos os impostos hoje, teremos que o fazer amanhã? Por outras palavras, se não for este governo a aumentar os impostos, terão os governos vindouros forçosamente que o fazer?
A pergunta é tanto mais pertinente se nos lembrarmos que o governo tem projectadas várias grandes investimentos públicos que terão de ser financiados de alguma maneira. Não vale a pena argumentar que as obras serão financiadas pela União Europeia ou através das chamadas parcerias público-privadas (PPPs), pois os fundos europeus só abrangem uma pequena parcela das despesas totais e as PPPs terão que ser pagas pelos contribuintes mais cedo ou mais tarde.
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Ora, como o governo se mostra completamente intransigente em relação à realização das grandes obras públicas, é fundamental que os portugueses obtenham resposta às seguintes perguntas: Como é que vamos financiar os elevados défices estatais e obter os fundos necessários para concretizar as obras projectadas? Aumentando ainda mais a dívida pública? Adiando o pagamento das obras com PPPs que serão pagas pelos contribuintes futuros? Adiando o aumento dos impostos para os governos vindouros.
Enquanto o governo não nos ilucida sobre essas matérias, é possível arriscar uma resposta: é cada vez mais evidente que quem terá de pagar a factura da irresponsabilidade presente serão os governos vindouros e as gerações futuras. E esses, como é óbvio, não se podem manifestar ou ainda não têm direito a votar. Deste modo, é natural concluir que se hoje há pouca margem de manobra na política económica, amanhã haverá ainda menos devido aos encargos relacionados com as irresponsabilidades presentes.
Mas não há problema. Não vale a pena preocuparmo-nos em demasia. Há sempre uma alternativa: sonhar. Se, numa manhã de nevoeiro, a economia portuguesa nos aparecer, por um milagre, a crescer 5 ou 6% ao ano, todos os nossos problemas estarão resolvidos. As receitas fiscais aumentarão, o défice extinguir-se-á e até o desemprego desaparecerá. Talvez seja isso que o primeiro-ministro esteja à espera. É que, como é patente, quem está redondamente enganado são os outros, não ele.
Enquanto o governo não nos ilucida sobre essas matérias, é possível arriscar uma resposta: é cada vez mais evidente que quem terá de pagar a factura da irresponsabilidade presente serão os governos vindouros e as gerações futuras. E esses, como é óbvio, não se podem manifestar ou ainda não têm direito a votar. Deste modo, é natural concluir que se hoje há pouca margem de manobra na política económica, amanhã haverá ainda menos devido aos encargos relacionados com as irresponsabilidades presentes.
Mas não há problema. Não vale a pena preocuparmo-nos em demasia. Há sempre uma alternativa: sonhar. Se, numa manhã de nevoeiro, a economia portuguesa nos aparecer, por um milagre, a crescer 5 ou 6% ao ano, todos os nossos problemas estarão resolvidos. As receitas fiscais aumentarão, o défice extinguir-se-á e até o desemprego desaparecerá. Talvez seja isso que o primeiro-ministro esteja à espera. É que, como é patente, quem está redondamente enganado são os outros, não ele.
26 novembro 2009
VACINA MALDITA
Ontem fiquei a saber através da TSF que o laboratório responsável pela produção da vacina da gripe A tinha aconselhado a suspensão da vacina no Canadá, país onde resido. Ora, tendo acabado de tomar a vacina juntamente com a minha família, logo me pus a ver websites e a ouvir as notícias na rádio e na televisão canadianas para ver se sabia mais de alguma coisa sobre a alegada suspensão da vacina. Escusado será dizer que os meus esforços foram todos em vão. Tal notícia não figurou em nenhum website ou meio de comunicação canadiano. Estranho, pensei. Por que será? Será que os meios de comunicação portugueses sabem mais do Canadá que os canadianos? Será que existe uma conspiração do governo canadiano para abafar notícias tão alarmantes?
Não, nada disso. O que se passou foi que 170 mil doses da vacina enviadas para o Canadá tiveram reacções alérgicas mais severas do que o normal e, por isso, o laboratório e as autoridades de saúde canadianas decidiram prevenir e retiraram as vacinas desse lote dos diversos centros de saúde. Não houve suspensão da vacina nem da campanha de vacinação, mas somente a retirada deste lote de vacinas dos milhões de vacinas actualmente a serem administradas no país. Aliás, no Canadá, a vacinação já está aberta a toda a gente, após os grupos de risco e de as crianças terem tido prioridade. Deste modo, cerca de um quarto da população canadiana já foi vacinada. Assim, e como referi noutros posts, enquanto em Portugal a atitude em relação à vacina é de grande desconfiança (por exemplo, soube-se hoje que somente 8% das grávidas portuguesas foram vacinadas), no Canadá a atitude continua a ser de que a vacinação acarreta um risco bem menor do que a alternativa de não vacinação. Aliás, alguns estudos demonstram que a vacinação é particularmente importante para as crianças e grupos de risco. Por exemplo, no Canadá, enquanto em 2007 e em 2008 houve menos de 40 hospitalizações de crianças devido à gripe sazonal , só na segunda semana de Novembro a gripe A deu azo a cerca de 250 hospitalizações de crianças. Ou seja, a gripe A é especialmente perigosa para as crianças e grupos de risco (como as grávidas) quando comparada à gripe sasonal.
Sabendo isso, e mais uma vez, o que distingue claramente a eficácia das campanhas de vacinação nos dois países passa muito pela forma como a informação sobre a gripe e a vacina tem sido gerida. Em Portugal, o alarmismo e a desinformação que os nossos meios de comunicação (e muitos dos nossos altos responsáveis do sector da Saúde) têm dado a esta questão explica em grande parte a desconfiança que as pessoas têm em relação à vacina. No Canadá, e apesar de existirem as mesmas desconfianças, tem havido um esforço concertado para informar as pessoas de que o risco associado à vacinação é muitíssimo inferior ao risco de contrair a doença, principalmente no que diz respeito às crianças e aos grupos de risco. Numa nota pessoal, como sou pai, a mim não me foi difícil decidir.
25 novembro 2009
BONS INCENTIVOS
O governo anunciou uma importante medida no combate à desertificação do interior: os médicos que se disponham a trabalhar nos concelhos do interior do país vão receber um incentivo adicional de 750 euros mensais enquanto estiverem a ser formados na sua especialidade. Uma óptima medida que deve ser aplaudida e replicada noutros sectores e noutros departamentos estatais.
24 novembro 2009
AUMENTO DE IMPOSTOS
O primeiro-ministro assegurou hoje que o governo não irá aumentar os impostos para fazer face ao aumento desmesurado do défice orçamental. Pois não. É provável que não. Pelo menos antes das próximas eleições. Como é que se irá financiar o défice? Muito simples. Com os impostos futuros, através do aumento da dívida pública. Isto é, como mencionei no post anterior, quem terá que aumentar os impostos ou reduzir a despesa serão os próximos governos, não este.
Entretanto, o que eu gostaria que a oposição perguntasse ao governo era o seguinte:
- Onde é que o governo vai obter os fundos necessários para concretizar as obras públicas projectadas? Através do aumento da dívida pública? Mais parcerias público-privadas que irão aumentar a dívida pública futura?
- Estará o governo ciente que a concretização deste projectos irá necessariamente acarretar um aumento dos impostos no futuro?
- Não estará o governo preocupado com a grave deterioração da competitividade fiscal que esse aumento da carga fiscal iria acarretar?
- Estará o governo consciente que o país terá que destinar uma crescente parcela do seu rendimento ao pagamento dos juros relacionados com a dívida associada a estes projectos?
ACUMULAR DA DÍVIDA
Nos Estados Unidos, a inexorável acumulação da dívida pública irá dentro em breve ter enormes consequências para a condução da política económica. Como este artigo do New York Times revela, a situação irá agravar-se ainda mais quando começarem as inevitáveis subidas das taxas dos juros. Só para dar uma ideia, se as taxas de juros subirem 1%, o pagamento dos juros da dívida pública americana irá aumentar tanto quanto as despesas totais dos ministérios da Educação e da Energia. Ou seja, se a dívida americana continuar a aumentar exponencialmente, dentro de pouco tempo, ou os impostos têm de aumentar ou as despesas públicas têm de diminuir.
Em Portugal, a desorçamentalização de muitas das despesas do Estado (para disfarçar o défice) conjugada o esforço do combate à crise (e a consequente diminuição de receitas) tem igualmente feito disparar a dívida pública. Se aliarmos a isto o alarmante endividamento externo (a crescer entre 9 e 10% ao ano), temos as condições ideais para que uma parcela cada vez maior do orçamento do Estado (e das nossas exportações) seja destinada ao pagamento da dívida.
Ainda assim, os nossos políticos assobiam para o lado e continuam a sonhar com grandiosas obras públicas e outras coisas que tal. Tal comportamento percebe-se. É que quem terá que pagar a factura da irresponsabilidade presente serão os governos vindouros e as gerações futuras. E esses, como é óbvio, não se podem manifestar ou ainda não têm direito a votar.
PRÉMIO À INOVAÇÃO
Todos os anos, o BES premeia projectos que se distinguem pela sua criatividade e inovação. Este ano, o prémio foi para uma empresa de software de Coimbra, que desenvolveu um sistema que processa informações em tempo real e que poderá ser utilizada tanto para "prever" ataques cardíacos para pacientes internados nos cuidados intensivos, como para prever situações de fraude bancária. Os investigadores premiados foram Pedro Bizarro, de 35 anos, e Diogo Guerra, de 23 anos. Centenas de investigadores candidataram-se ao prémio, um sinal do crescente empreendedorismo exibido por alguns sectores da nossa economia. Nem tudo vai mal em Portugal.
19 novembro 2009
DESCULPAS PELA CRISE FINANCEIRA
Um dos directores executivos da Goldman Sachs pediu desculpa pelos abusos que algumas instituições financeiras cometeram nos últimos anos e assumiu responsabilidades na crise financeira internacional. O jornal Público pediu-me para comentar este pedido de desculpas. Aqui estão as minhas respostas:
Público_ Porquê este comentário, e agora?
Penso que este comentário se pode explicar por vários factores. Primeiro, pode ser visto como uma tentativa por parte da empresa para melhorar a sua imagem perante o público e os seus clientes. Ainda há um grande ressentimento da opinião pública americana (e mundial) em relação aos abusos que foram cometidos nos últimos anos no sistema financeiro. Os bancos e as empresas financeiras sabem disso, e sabem também que uma das formas de tentar atrair mais clientes é melhorar a sua imagem. Segundo, este pedido de desculpas pode igualmente ser visto como o reconhecimento por parte de alguns dos gestores das instituições financeiras envolvidas de que, de facto, as práticas menos correctas dos últimos anos tiveram um impacto enorme na vida de milhões de pessoas. Finalmente, agora que o pior da crise parece ter passado, é natural que algumas pessoas venham a público assumir responsabilidades.
Público_ Por que é que tão poucos banqueiros sentem a necessidade de pedir desculpas pela crise financeira?
Penso que, até agora, não havia grandes condições para o fazer. Até agora temos estado mais preocupados em apagar o fogo associado à crise financeira. Agora que já começamos a estar em fase de rescaldo e as economias começam a recuperar, é natural que não só surjam mais iniciativas governamentais no sentido de aumentar a regulamentação dos mercados financeiros, como também é possível que alguns dos principais culpados pela crise venham a público apresentar as suas desculpas.
Público_ E porque é que estes pedidos de desculpa são importantes?
Estes pedidos de desculpa são importantes pois vale a pena não esquecer que tivemos em risco de cair para uma nova Grande Depressão por causa dos abusos cometidos por várias instituições financeiras. Para além do mais, muitas destas instituições financeiras só não caíram porque o dinheiro dos contribuintes as salvou. Assim, algum reconhecimento desta situação por parte dos dirigentes das instituições financeiras faz todo o sentido. Finalmente, este tipo de desculpas é importante para restaurar a confiança dos agentes económicos nas próprias instituições financeiras.
Público_ Acha que há uma grande diferença cultural neste aspecto entre os empresários/gestores ocidentais e os asiáticos?
Há, sem dúvida, alguma diferença cultural. Não é incomum para líderes e gestores asiáticos pedirem desculpas formais à opinião pública e/ou aos seus clientes (chegando inclusivamente a haver casos de suicídios junto com esse pedido de desculpas). No Ocidente, para bem ou para mal, não temos muito essa tradição. Ora, perante a maior crise financeira das últimas décadas e a comoção que essa crise causou na economia mundial, alguma dose de humildade e, porque não, pedidos de desculpas por parte dos principais responsáveis por esta crise fazem todo o sentido.
FUSÃO DE UNIVERSIDADES
O reitor da Universidade de Lisboa defende a fusão (ou integração) de algumas universidades para melhorar a eficiência, combater o desperdício e melhorar a competitividade das instituições portuguesas do ensino superior. Ora, aí está uma proposta que vale a pena pensar.
A CULPA É DOS INGLESES
Agora já percebo porque é que a selecção portuguesa ganhou ontem (e bem)... Foram os ingleses que nos ajudaram...
13 novembro 2009
RESPOSTAS À GRIPE E A CORRUPÇÃO
Uma das diferenças culturais com que deparei ultimamente foi a reacção dos portugueses e dos canadianos em relação à vacinação contra a gripe A. Como é sabido, em Portugal houve no início uma extrema suspeição quanto à vacinação, levando muita gente a declarar que não se iria vacinar. Assim, nos primeiros dias da campanha da vacinação havia clínicas praticamente sem ninguém para ser vacinado. Em parte, este clima de suspeição foi devido às teorias de conspiração sobre a gripe que circulam por aí, bem como à ideia de que a vacina não tinha sido devidamente testada. No Canadá, e apesar de circularem exactamente as mesmas teorias da conspiração e as mesmas alegações, a resposta da população foi drasticamente diferente. Aliás, a resposta foi diametralmente oposta. Na primeira semana de vacinação (dedicada aos grupos de risco), houve clínicas que se depararam com filas de 6 a 8 horas (sim, 6 a 8 horas, ao frio, à neve e à chuva). Havia quase um certo pânico, pois havia a percepção de que a vacina contra a gripe era fundamental para abrandar a difusão da mesma e de que quem não se vacinasse corria o risco de embarcar na roleta russa da gripe. O que explica então a reacção tão distinta da população? Provavelmente, a diferença encontra-se na resposta das autoridades de saúde. No Canadá, e apesar das desconfianças já mencionadas, as autoridades de saúde fizeram uma enorme campanha nos media a alertar para os perigos da não vacinação, informando as populações que os alegados riscos da vacina seriam muitíssimo mais reduzidos do que os perigos que a gripe acarreta (é certo que a gripe não é muito pior do que a gripe comum, mas também é certo que a gripe A tem riscos mais elevados para os mais novos e outros grupos de risco). Em Portugal, várias responsáveis da política de saúde (como o Bastonário da Ordem dos Médicos) declararam que não se iriam vacinar ou de que a gripe não seria muito pior do que uma gripe normal. E, deste modo, pensámos: e se é assim, para quê nos vacinarmos?
Moral da história: os exemplos que "vêm de cima" contam... e muito. E é por isso que se compreendeo clima de quase-histeria que existe em Portugal em relação à corrupção e às alegadas ligações perigosas de altos responsáveis governamentais em badalados casos de corrupção. Perante o acumular dos casos, perante as suspeitas constantes, perante o clima de perfeita imunidade que parece reinar, e perante a gritante incompetência da Justiça paralisada pelos inúmeros casos pendentes e pela falta de meios, não é de estranhar que a respostas das populações em relação à política e à causa pública seja cada vez mais de desconfiança e, por que não, de nojo até. Por isso, a única forma de restaurar a pouca dignidade do nosso sistema político e dos nossos responsáveis políticos passa obrigatoriamente pela aprovação de um grande pacote de medidas contra a corrupção e a favor de maior transparência. Um pacote de medidas concretas que sejam implementadas. Escrever no papel não basta, é preciso passar à prática e demonstrar que as leis existem para ser cumpridas. Já se fala num tal pacote de medidas, mas agora falta fazer. É que, como em muitas coisas na vida, o que parece pode não ser, mas muitas vezes é.
10 novembro 2009
DESIGUALDADES
Portugal é um dos países mais desiguais da OCDE. Mas sabia que a desigualdade portuguesa cresceu principalmente desde 1995? E que antes de 1990 as desigualdades diminuiram? Por que será? Afinal, não foi no período 1995-2001 que foram introduzidas várias medidas sociais, como o rendimento mínimo?
Nota: os dados da figura são da OCDE. Os dados são os coefientes Gini (que medem as desigualdades) para Portugal desde 1970.
JORNAL DAS 9
De regresso a Portugal para participar numa conferência, estarei igualmente no Jornal das 9 da Sic Notícias esta quinta-feira, dia 12.
23 outubro 2009
NOVO GOVERNO
Agora que se conhecem as caras do novo governo, não é difícil perceber que, apesar de José Sócrates ter perdido a maioria absoluta, tudo continuará como dantes. Ou seja, não haverá controlo da despesa pública e continuará a haver uma aposta dogmática nas grandes obras públicas. Se não vejamos. Teixeira dos Santos manterá a política anterior, em que a desorçamentalização de parte das despesas públicas (através das parcerias público-privadas e de iniciativas similares) permitirá ao governo propagandear-se de rigor nas contas públicas, enquanto o défice e a dúvida pública efectivas (mascaradas nas contas do Estado) continuam a aumentar. Também não interessa que a alegada consolidação das contas do Estado tenha sido toda feita através do aumento das receitas (i.e. mais impostos, o que é mau, e mais eficiência fiscal, o que é bom). Não se antevê que tal venha a mudar. Entretanto, as despesas públicas continuaram e continuam a crescer a bom ritmo (mesmo antes da crise internacional). Mas, certamente, não haverá problema.
Nas Obras Públicas, temos agora um economista que defendeu publicamente as grandes obras públicas. Conclusão: todos(as) os(as) outros(as) que defendiam mais ponderação e uma reavaliação desses projectos estão errados(as). E se é assim, porquê travar o ritmo de execução e adjudicação desses projectos?
Finalmente, na Economia, confesso que fiquei verdadeiramente desapontado. É verdade que Vieira da Silva é "trabalhador" e "dedicado". E até foi dos ministro que mais obra deixou no último governo. Porém, não me parece ter a visão estratégica que penso que seria necessária para o Ministério da Economia. A sua nomeação parece-me ser motivada para tentar estancar a subida do desemprego, em vez de tentar combater os problemas estruturais da nossa economia. Pode ser que me engane (espero que sim), mas, infelizmente, acho que não.
19 outubro 2009
JESUSALÉM
Numa altura em que se fala muito sobre o novo livro do Saramago, aqui fica uma sugestão de leitura. "Jesusalém", de Mia Couto, certamente um dos melhores de um autor cuja escrita está cada vez melhor. O livro conta a história de uma família que se auto-exila numa região remota de Moçambique, fugindo do mundo e de memórias de um passado penoso. O livro é contado por um dos personagens, Mwanito, e lê-se num ápice. Se Mia Couto era no início conhecido sobretudo pelos seus engraçados jogos de palavras e linguagens, crescentemente este autor moçambicano tem aperfeiçoado ainda mais os enredos das suas histórias, que narram um Moçambique e uma África que apetece conhecer. Vale a pena conhecer.
14 outubro 2009
AINDA AS AUTÁRQUICAS
Para bem ou para mal, as eleições do último domingo não trouxeram grandes surpresas. Alguns resultados interessantes, mas nada de dramático. De todos os escrutínios, o meu resultado favorito foi o de Felgueiras. É bom saber que, afinal, toda a atenção mediática ligada aos casos de alegada corrupção sempre tem algum impacto nas escolhas dos eleitores. O que era bom era que o exemplo de Felgueiras fosse repetido noutros lugares e mais vezes. Muitas mais vezes.
Interessantes, interessantes, irão ser as próximas eleições autárquicas, quando a legislação sobre o limite de mandatos vai começar a ter efeito. Cerca de centena e meia de autarcas vão ser impedidos de concorrer ao emprego que tiveram durante anos e anos a fio. Resultado? Ou muito me engano, ou nos próximos tempos a questão da regionalização vai ser ressuscitada por muitos destes autarcas quase-desempregados. É que nada melhor do que a promessa de centenas de novos cargos políticos para fazer reavivar a quimera da regionalização, a qual, certamente, se tornará na próxima receita mágica neste cantinho à beira-mar plantado.
30 setembro 2009
CONFLITO
Independentemente da nossa interpretação pessoal da intervenção de ontem à noite, o conflito institucional entre o Presidente da República e o Governo não augura nada de bom para a estabilidade política nos próximos tempos. Com todos os problemas que temos para resolver, era só o que nos faltava para agitar ainda mais as águas.
SÍNDROME CANADIANO
Partilho das preocupações com alguns dos comentários ao meu post sobre as eleições. O que eu queria era chamar a atenção para a questão da estabilidade, que os portugueses parecem prezar tanto (pelo menos, são as sondagens que o dizem). A verdade é que se o PS não se coligar com o CDS, é difícil não imaginar um cenário em que teremos eleições novamente nos próximos 2 anos. Aliás, os partidos parecem crescentemente estar a contar com isso mesmo. E qual é o problema? O problema é que é que, no momento delicado que a economia portuguesa atravessa, instabilidade política é tudo o que não precisamos.
Actualmente, parece-me praticamente impossível um entendimento entre o PS e o PSD e, é por isso que acho mais viável um acordo entre o PS e o CDS. Isto em teoria. Isto se os partidos prezassem realmente a estabilidade política e a necessidade de efectuarem as reformas estruturais que é preciso fazer. Na prática, concordo que tudo é um pouco difícil. Acima de tudo, mais do que diferenças ideológicas inultrapassáveis, não me parece que haja vontade política para qualquer tipo de entendimento entre as forças políticas para que exista mais estabilidade política nos próximos anos.
Resultado mais provável? Ainda acabamos por cair no impasse que se vive no Canadá há mais de 5 anos. Os governos minoritários sucedem-se a um ritmo alucinante (duram cerca de ano ou ano e meio), os partidos estão constantemente a ameaçar eleições e derrubar o governo, e a instabilidade política continua sem fim à vista. Por isso, passa-se o tempo com politiquices e a situação política não se estabiliza. No Canadá esta situação tem pouco impacto, pois não só o aparelho do Estado é forte e eficiente, mas também porque o país tem governos provinciais que ajudam a contrabalançar o governo federal. Para além do mais, nos últimos anos a economia canadiana tem andado muito bem e foi só mesmo a crise internacional que a fez descarrilar temporariamente. Em Portugal, não temos nenhuma destas condições. A economia está estagnada há vários anos, e o Estado não tem propriamente a força e a eficiência do Canadá. Por isso, se cairmos no síndrome canadiano de grande instabilidade política, ninguém vai ganhar com isso. E é também por isso que preferia que houvesse uma solução política mais estável para os próximos tempos. Infelizmente, suspeito que não haja vontade política para que tal aconteça. E quem fica a perder somos todos nós.
PROPOSTAS
O Nicolau Santos sumaria aqui a situação actual da economia portuguesa e fala de algumas das propostas e soluções que defendi na conferência Portugal em Exame.
28 setembro 2009
CENÁRIOS
Numas eleições em que quase todos os principais partidos reclamaram vitória, os principais perdedores foram o PSD e o Bloco Central. O PS ganhou e mereceu, pois fez uma campanha pela positiva, que fez esquecer (ou pelo menos, mitigar) a prepotência com alguns ministros(as) governaram nos últimos quatro anos. Mesmo assim, é incontornável que José Sócrates perdeu a maioria absoluta e verá a sua governação naturalmente fragilizada nos próximos anos. Que solução adoptará José Sócrates para governar? Ainda não sabemos. Mas parece certo que uma coligação com o Bloco ou com o PCP está fora de questão. E assim restam duas opções: ou governa sozinho ou se coliga com o CDS. Governar sozinho será sempre um cenário a prazo, pois é duvidoso que um governo minoritário num parlamento tão hostil dure mais do que dois anos (aliás, como João Cravinho já hoje defendeu). Sim, é possível que um governo PS minoritário possa fazer acordos pontuais no parlamento com o Bloco ou com o PCP (por exemplo, e para nosso prejuízo, em relação às grandes obras públicas), mas será sempre vulnerável quando tiver que apresentar os seus orçamentos de Estado (os quais serão sempre usados como moeda de troca para que o Bloco e/ou o PCP consigam atingir algumas bonanças eleitorais).
Por isso, se José Sócrates quiser ter mais estabilidade na governação, terá forçosamente que se entender com o CDS, que foi, sem dúvida, o grande vencedor das eleições. Pessoalmente, penso que esse seria o cenário ideal. Aliás, se o caso das escutas não tivesse acontecido, não seria difícil imaginar o Presidente da República preferir (impôr?) este mesmo cenário. Assim, sinceramente não sei. O que sei é que esse era o cenário que, provavelmente, era melhor para o país, pois o CDS poderia servir de contra-peso às tentações mais despesistas de certos sectores do PS, quiçá conseguindo inclusivamente refrear o dogmatismo do primeiro-ministro em relação às grandes obras públicas. (Como é óbvio, o TGV Lisboa-Madrid vai avançar, mas não há razão nenhuma para o mesmo acontecer ao Lisboa-Porto ou ao Porto-Vigo, principalmente no contexto económico em que nos encontramos).
Veremos se José Sócrates está disposto a efectuar compromissos ou não. Nos próximos dias veremos o que é que irá acontecer.
25 setembro 2009
TECNOLÓGICAS NACIONAIS
Nos últimos anos, um dos sectores mais dinâmicos da economia portuguesa tem sido o da indústria das tecnologias da informação e comunicação (TIC ou tecnológicas). Há um grande número de novos empreendedores que têm apostado e investido no sector e alguns dos exemplos de empreendedorismo mais bem sucedidos na última década têm ocorrido exactamente nesta área. No "Medo do Insucesso" falei de algumas das empresas que despontaram neste sector e os factores que as fizeram tornar-se numa referência do empreendedorismo nacional (inovação, aposta na internacionalização, elevadas taxas de productividade). Por isso, tive imenso gosto em ter participado na sexta-feira passada numa conferência, onde alguns dos principais empreendedores das TIC se reuniram para falar sobre o sector.
Na minha apresentação revi a evolução das TIC nacionais e apresentei soluções para que o sector se possa tornar ainda mais dinâmico. A principal surpresa que tive quando analisei o sector é que, apesar de todo o sucesso, as tecnológicas nacionais ainda não realizaram muito do potencial que poderiam ter (e que têm prometido). Aliás, se olharmos para os indicadores de desempenho relativo, facilmente percebemos que tanto ao nível do investimento no sector (gráfico 1), como de valor acrescentado (gráfico 2), as tecnológicas nacionais não têm visto aumentar a sua importância relativa na economia portuguesa.
Gráfico 1 _ Proporção do investimento em TICs no investimento total
(Neste gráfico podemos ver que a percentagem do investimento das tecnológicas no investimento total da economia nacional não tem aumentado significativamente nos últimos anos)
Gráfico 2 _ Valor acrescentado das TIC em % do valor acrescentado total (OCDE)
(Neste gráfico é visível que o valor acrescentado das tecnológicas nacionais é baixo quando comparado às tecnológicas de outros países da OCDE)
Por isso, interessa perguntar porquê e o que é que pode ser feito para tornar este sector num cluster de excelência. Quanto a mim, o que há a fazer é apostar neste sector como apostámos nas energias renováveis. Porquê? Porque este sector não só é um dos mais dinâmicos da economia nacional, mas também é um dos sectores com mais elevado potencial de crescimento. Por isso, vale a pena apostar nas tecnológicas nacionais. O que pode ser feito fica para um próximo post. Entretanto, se estiver interessado(a), poderá ver aqui o Power Point (em inglês) da minha apresentação na conferência, onde deixo algumas sugestões sobre o que é que podemos fazer para ajudar estimular o sector.
21 setembro 2009
OS OUTROS
Uma das consequências mais graves da actual crise internacional tem sido o aparecimento de défices orçamentais gigantescos, que ameaçam fazer "explodir" as dívidas públicas nacionais. Por enquanto, quase todos concordam que a prioridade tem que ser o combate à crise. O défice é um problema cuja resolução terá que esperar. Faz todo o sentido, principalmente devido ao acentuado crescimento do desemprego. Contudo, fora de Portugal, já muitos começam a debater o que fazer para fazer travar o descontrolo das contas públicas.
Em Espanha, o primeiro-ministro propõe um aumento de impostos na ordem dos 1,5% do PIB para fazer face ao crescimento do défice orçamental. Em Inglaterra, todos (repito, todos) os principais partidos políticos debatem que despesas é que se irão cortar para lutar contra o défice orçamental. E em Portugal? Será que nos preocupamos com isso? Claro que não. Para quê? Afinal o défice do subsector Estado só subiu 154% nos 8 primeiros meses do ano.
Mas não faz mal. O dinheiro há-de dar para tudo. Para TGVs, para auto-estradas, para novos aeroportos, para ajudas às PMEs, para aumentar os salários acima da inflação, para Planos Tecnológicos, para para para...
É que, como sabemos, as regras que se aplicam aos outros não se aplicam a nós. E, se é assim, para quê nos preocuparmos?
MÁ CAMPANHA
A campanha está má. Muito má. O "caso das escutas" só veio afastar ainda mais as atenções daqueles que deviam ser os assuntos que os partidos deviam debater. Numa altura em que o país se defronta com a maior crise (interna) económica das últimas décadas, numa altura em que o mundo passa pela maior crise internacional desde os anos 1930, numa altura em que mais de meio milhão de portugueses(as) não têm emprego, o que é que os nossos líderes fazem? Passam o tempo a debater alegadas asfixias democráticas, quem é que tem (ou não) o monopólio da verdade, e outras trivialidade que pouco interessam para o nosso futuro. A discussão sobre o TGV tem sido, no mínimo, pouco informativa sobre o que está realmente em causa. A questão do endividamento externo tem sido quase esquecida. A questão de um possível aumento de impostos tem sido escamoteada por todos. A questão de como iremos ajudar as empresas a melharem a sua competitividade praticamente não é debatida. A questão da interioridade não passa de uma nota de rodapé. Enfim, a campanha tem sido um autêntico marasmo de ideias. Um deserto de políticas. Um vazio de propostas. Triste. Muito triste.
Sinceramente, penso que a oposição tem mais culpa nesta matéria do que o governo. Todos sabemos o que nos espera se José Sócrates ganhar as eleições. No mínimo, pensamos que sabemos o que irá acontecer (irão certamente acontecer surpresas, principalmente a nível orçamental). Porém, o mesmo não é verdade em relação às alternativas. Quais são? O que é que os partidos da oposição defendem para combater a crise? Será que os portugueses sabem? Acho que não. Por outras palavras, os partidos da oposição têm sido ineficazes a transmitir quais são as suas principais propostas para reverter o actual estado de coisas. Quem não ler os programas dos partidos (sempre tão ambíguos) não saberá o que eles pretendem fazer. É uma pena, principalmente sabendo da elevada impopularidade que este governo tem junto de tantos sectores da população portuguesa.
O que me parece é que, no final do dia, a oposição vai perder uma oportunidade histórica de ganhar as eleições. Mais por culpa própria do que por mérito do primeiro-ministro (que, obviamente, também o tem). Posso estar muito enganado, mas parece-me que não. Logo veremos no dia 27.
LIGAÇÕES PERIGOSAS
Segundo um relatório do BPI, o valor futuro das acções da construtora Mota-Engil estão altamente dependentes do resultado das eleições legislativas. Hmmm... Por que será?
17 setembro 2009
DUAS CONFERÊNCIAS
Nos próximos dias estarei de regresso a Portugal, onde estarei presente em duas conferências em Lisboa. O primeiro evento debate a criação de um cluster do sector das tecnológicas em Portugal (um pouco como aconteceu nas energias renováveis) e conta com alguns dos mais interessantes empreendedores e inovadores portugueses. A conferência tem por tema: "Promotion of an IT Cluster: a new technological model for Portugal towards the creation of new wealth" e o programa está aqui:
A outra conferência é a conhecida "Portugal em Exame", em que se debaterão estratégias de combater a crise nacional. O programa está aqui:
http://aeiou.expresso.pt/programa-da-conferencia-portugal-em-exame-2009=f534358Os dois eventos prometem e conto poder relatá-los aqui nos próximos dias.
15 setembro 2009
A SAÚDE DOS PORTUGUESES
Estava a ler o relatório da OCDE sobre a Saúde em Portugal e alguns dados saltaram-me à vista. Apesar de reclamarmos muito sobre o que está mal (e ainda bem que o fazemos) na saúde nacional, a verdade é que é fácil esquecermos o grande progresso registado nas últimas décadas. Deste modo, vale a pena relembrar o que já alcançámos:
- A esperança de vida em Portugal é de 78.9 anos, igual à média da OCDE.
- A taxa de mortalidade infantil portuguesa foi de 3,3 mortes por 1000 nascimentos de nados vivos, substancialmente menor do que 24,2 por 1000 em 1980. Portugal tem uma das mais baixas taxas de mortalidade infantil na OCDE.
- A maior surpresa que tive foi constatar que Portugal tem uma das taxas de fumadores diários mais baixas da OCDE! Pensei que seríamos dos piores, mas, afinal, não. Cerca de 19,6% dos(as) portugueses(as) declaram-se fumadores diários, bem menos do que a taxa média da OCDE (23,3%).
- A generalidade dos índices de saúde pública melhoraram consideravelmente nas últimas décadas
- Uma nota mais negativa regista-se em relação às taxas de obesidade, que aumentaram de 11.5% em 1996 para 15.4% em 2006. O efeito do crescimento da fast food nos últimos anos (e os poucos incentivos à promoção de vidas mais activas) está à vista.
JÁ VOTEI
Como já me encontro fora do país há muitos anos, tenho-me deparado com todo o tipo de dificuldades para que possa exercer o meu direito de voto. Felizmente, este ano isso não aconteceu. O progresso já chegou a Portugal também nesta área. Actualmente, nas eleições legislativas, os portugueses emigrados que estejam registados nos seus consulados podem votar por correspondência para o círculo Fora da Europa ou para o círculo da Europa. Eu já recebi o meu boletim de voto e já votei. Fiquei contente. Votei bem.
OS PROGRAMA DOS PARTIDOS
Um dos factos mais assinaláveis dos programas económicos dos dois principais partidos portugueses é a concordância existente nalgumas áreas vitais para o desenvolvimento do país. Assim, tanto o PS como o PSD (e os restantes partidos) concordam que é preciso dar mais atenção às necessidades das pequenas e médias empresas. Aliás, a aposta nas PMEs parece de tal modo generalizada que até os próprios Gatos Fedorento fizeram disso um dos principais temas do primeiro episódio do novo programa...
Noutras áreas, existe também alguma convergência na análise e nas receitas preconizadas pelos dois principais partidos portugueses. As grandes diferenças entre o PS e o PSD registam-se ao nível dos grandes investimentos públicos (principalmente o TGV) e no papel do Estado.
Em relação aos grandes investimentos públicos, os últimos dias demonstram que José Sócrates está perfeitamente convencido que a competitividade (e o futuro) da economia nacional depende de projectos como o TGV, enquanto Ferreira Leite é definitivamente mais céptica. Sinceramente, não percebo por que é que o primeiro-ministro encontra tanta urgência em levar a cabo projectos como o TGV. Aliás, penso até que o PS poderia estar mais bem posicionado junto do eleitorado se admitisse adiar ou reavaliar alguns dos projectos públicos por alguns anos. Ninguém perderia com isso e o país poderia concentrar-se mais na resolução naqueles que são os nossos verdadeiros problemas estruturais: a falta de competitividade de muitos dos nossos sectores e o crescente endividamento externo do país. O obstinação do actual primeiro-ministro com os grandes projectos públicos é ainda mais incompreensível se nos lembrarmos que os projectos como o TGV não só serão certamente deficitários, como também é difícil perceber como é que um projecto ferroviário de transporte de passageiros pode aumentar a competitividade das empresas portuguesas... Se alguém conhece algum estudo de outro país em que isso tenha acontecido, estaria bastante interessado em o ler.
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Quer isto dizer que o TGV nunca será feito? Não. Quer esteja o PS quer o PSD no poder, o mais certo é que, mais cedo ou mais tarde, o projecto do TGV Lisboa-Madrid será feito por razões estratégicas. O ideal é que tal fosse feito mais para tarde do que para cedo. Ou seja, a prioridade não deveria ser o TGV, mas sim investir de uma forma sem precedentes no apoio à inovação e ao sector exportador. Contudo, é provável que o TGV Lisboa-Madrid vá para a frente dentro de alguns anos. É claro que o projecto será um fiasco financeiro que terá que ser suportado pelos contribuintes, mas irá para a frente por "razões estratégicas" (ou seja, políticas). Dito isto, e se se pode admitir a construção desta linha de alta velocidade pelas razões avançadas, as linhas Porto-Lisboa e Porto-Vigo (já projectadas) são um perfeito disparate. Não são necessárias e poderão não ser rentáveis nem num futuro longínquo. Insistir na sua construção é assobiar para o alto e fingir negar o preocupante endividamento externo do país, bem como ignorar aqueles que são os problemas estruturais que enfrentamos. A verdade é que construir o TGV irá aumentar ainda mais o endividamento externo e irá forçar que um futuro governo tenha que aumentar ainda mais os impostos para pagarmos o luxo de sermos um país em "alta velocidade". E era isso que era importante que todos nós percebessemos quando formos chamados a votar.
Num próximo post irei debater as diferenças entre o PS e o PSD em relação ao papel do Estado.
PROGRAMA ECONÓMICO DO PSD
Aqui estão os comentários que escrevi no Público sobre o programa económico proposto pelo PSD:
O programa do PSD parte da premissa que o país tem vindo a seguir um modelo de desenvolvimento errado, que deu azo a um preocupante endividamento externo e público. Para contrariar esta tendência (e um pouco como o PS), o PSD dá grande premência às exportações e à internacionalização das empresas. Contudo, para o PSD, o desenvolvimento e a competitividade alcançam-se apostando no empreendedorismo nacional e não através da engorda de um Estado considerado “asfixiante”. A outra grande diferença entre o PS e o PSD regista-se, como se esperava, ao nível dos grandes investimentos públicos. Nesta área, o PSD defende a reavaliação dos grandes projectos de investimento e a aposta na rede ferroviária convencional.
As principais surpresas do programa talvez sejam a grande ênfase dada à agricultura como um sector estratégico, bem como o objectivo de aumentar a concorrência sectorial.
Porventura, a proposta mais interessante seja a garantia de uma taxa de IRC de 10% para os investimentos a realizar no interior. Tal medida vai na direcção certa no combate à crescente desertificação. Mas não chega. Mais do que uma regionalização burocratizante, precisamos de incentivos fiscais e económicos sem precedentes para travar o inquietante dualismo do país.
As principais críticas a apontar serão a linguagem por vezes demasiado técnica e, principalmente, a ausência de uma mensagem mais positiva. Afinal, mais do que uma política de verdade, o que Portugal precisa é de retomar o sucesso que nos caracterizou nas últimas décadas. E é isto que este programa devia também realçar.
As principais surpresas do programa talvez sejam a grande ênfase dada à agricultura como um sector estratégico, bem como o objectivo de aumentar a concorrência sectorial.
Porventura, a proposta mais interessante seja a garantia de uma taxa de IRC de 10% para os investimentos a realizar no interior. Tal medida vai na direcção certa no combate à crescente desertificação. Mas não chega. Mais do que uma regionalização burocratizante, precisamos de incentivos fiscais e económicos sem precedentes para travar o inquietante dualismo do país.
As principais críticas a apontar serão a linguagem por vezes demasiado técnica e, principalmente, a ausência de uma mensagem mais positiva. Afinal, mais do que uma política de verdade, o que Portugal precisa é de retomar o sucesso que nos caracterizou nas últimas décadas. E é isto que este programa devia também realçar.
PROGRAMA ECONÓMICO DO PS
Aqui estão uns breves comentários que fiz ao Público sobre o programa económico proposto pelo PS:
O programa eleitoral agora apresentado pelo PS é bastante parco na apresentação de propostas concretas sobre o combate à maior crise estrutural que o país enfrentou nas últimas décadas. No entanto, apresentar o programa eleitoral antes do PSD teve um grande mérito, pois o PS apresentou como suas bandeiras que já tinham sido defendidas pelo PSD, tais como o reforço do apoio aos exportadores e às PMEs.
Penso que as medidas mais interessantes incluem a promessa de um Pacto do Emprego (que terá de ser um acordo de concertação social em que o crescimento salarial seja limitado) e, principalmente, a continuação da aposta nas energias renováveis, uma área onde somos líderes mundiais. Seria também desejável que o novo governo desse a mesma prioridade às indústrias tecnológicas, onde temos muitas empresas a brilhar internacionalmente.
O pior deste programa eleitoral é a insistência dogmática nas grandes obras públicas, as quais pouco contribuirão para melhorar a competitividade economica, e acarretam um grave risco de nos arrastar para níveis de endividamento insustentáveis.
Porém, o principal problema que o PS enfrentará com este programa eleitoral é a credibilidade. Os últimos 4 anos demonstraram que há um abismo enorme entre a retórica e a acção. Palavras bonitas ou manipulações de estatísticas não bastam, é preciso resultados. Resultados que não estão à vista. Os portugueses sabem disso e, por isso, o PS terá de reconquistar aqueles que perderam a confiança no partido do governo. E é isso que este programa eleitoral ainda não consegue.
Penso que as medidas mais interessantes incluem a promessa de um Pacto do Emprego (que terá de ser um acordo de concertação social em que o crescimento salarial seja limitado) e, principalmente, a continuação da aposta nas energias renováveis, uma área onde somos líderes mundiais. Seria também desejável que o novo governo desse a mesma prioridade às indústrias tecnológicas, onde temos muitas empresas a brilhar internacionalmente.
O pior deste programa eleitoral é a insistência dogmática nas grandes obras públicas, as quais pouco contribuirão para melhorar a competitividade economica, e acarretam um grave risco de nos arrastar para níveis de endividamento insustentáveis.
Porém, o principal problema que o PS enfrentará com este programa eleitoral é a credibilidade. Os últimos 4 anos demonstraram que há um abismo enorme entre a retórica e a acção. Palavras bonitas ou manipulações de estatísticas não bastam, é preciso resultados. Resultados que não estão à vista. Os portugueses sabem disso e, por isso, o PS terá de reconquistar aqueles que perderam a confiança no partido do governo. E é isso que este programa eleitoral ainda não consegue.
AINDA A CRISE INTERNACIONAL
A Carteira, através do Luís Leitão, fez-me recentemente algumas perguntas (a negrito) sobre a crise financeira internacional. Aqui estão as minhas respostas:
Carteira_ A política dos principais governos de injectarem avultados montantes de dinheiro no mercado foi a decisão mais correcta ou serviu apenas para esconder e alimentar o monstro da crise por mais algum tempo? Que consequências terão estas medidas nos próximos tempos?
A política de injecção de grandes montantes nos sistemas financeiros foi totalmente acertada. Aliás, se não tivesse sido levada a cabo, decerto que o impacto da crise financeira teria sido muitíssimo mais grave. Basta lembrarmo-nos do que aconteceu durante a Grande Depressão dos anos 30 (quando a massa monetária se contraiu) para percebermos da necessidade dessa medida. A curto prazo, o principal objectivo (e efeito( dessa medida é exactamente evitar que a economia mundial caia em deflação, um cenário a evitar a todo custo. Quando as principais economias recuperarem, é natural que surjam alguns efeitos inflacionários. Nessa altura, certamente que a política monetária irá inverter-se com uma subida dos juros. Porém, por enquanto, a inflação é ainda um cenário muito longínquo.
Carteira_ Se na bolsa os ganhos já começam a aparecer - desde 9 de Março que o S&P 500 já valorizou 47% - na economia, os indicadores continuam a não ser muito animadores: as penhoras nos EUA continuam a aumentar, o desemprego na Europa e nos EUA persiste em manter-se elevado e o risco de deflação parece ainda não ter desaparecido. Que sinais precisa o mercado de dar a investidores e consumidores para que a recuperação seja sustentável e não um mero surto de euforia?
Penso que os últimos indicadores de alguma recuperação de várias economias europeias irão dar um novo impulso aos mercados financeiros. Contudo, ainda precisamos de ter mais um ou dois trimestres de crescimento positivo, bem como uma recuperação do consumo e dos mercados imobiliários, para que os mercados comecem a acreditar numa verdadeira retoma das principais economias mundiais. E, neste momento, este cenário ainda não se vislumbra, pois ainda persistem muitas incertezas, apesar dos indicadores começarem a ser mais positivos do que era esperado há alguns meses.
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O FMI diz que a recuperação será longa e demorada e Jean Claude-Trichet, apesar de acreditar que a economia europeia já não está em queda livre, diz que ainda não é tempo para euforias. Quais são as suas perspectivas para a economia mundial e quais serão os sectores que acredita que recuperarão primeiro e porquê?
Penso que ainda há alguma expectativa sobre como as principais economias irão evoluir. Apesar dis sinais crescentemente positivos que nos chegam, ainda há muitos riscos e incertezas. Por exemplo, o crescimento do desemprego e a consequente diminuição de rendimentos de algumas camadas das populações (principalmente da classe média) de muitos países poderão aumentar o crédito mal parado, o que poderá fazer aparecer novos problemas nos mercados de crédito. Neste momento, parece que os primeiros sectores a recuperar serão as exportações de muitos países (como a Alemanha), bem como algumas indústrias de maior valor acrescentada, tais como as tecnológicas. Alguns países aproveitaram a crise para aumentar o proteccionismo de alguns dos seus sectores mais sensíveis (e menos concorrenciais). Estes apoios certamente ajudarão estes sectores a recuperarem mais rapidamente.
No plano das economias em vias de desenvolvimento, estes países não sentiram directamente a crise em virtude de terem um sistema financeiro rudimentar. No entanto, viram as ajudas e as exportações serem reduzidas bruscamente, sobretudo os países produtores e exportadores de petróleo. Acredita que esta crise será mais um obstáculo ao desenvolvimento económico ou uma oportunidade para países como Angola que faz depender do barril de crude mais de 95% das suas exportações?
Quase todos os países em desenvolvimento viram as suas exportações e as ajudas externas diminuir. Penso que a crise será um obstáculo maior para os países em desenvolvimento mais frágeis, isto é, aqueles cujos governos dependem mais da ajuda externa para os seus orçamentos. Para os países exportadores de petróleo, a crise será mais temporária, pois é crível que o preço do crude recupere assim que a procura mundial seja retomada com a aceleração do crescimento económico. Assim, nos próximos um ou dois anos é natural que o preço do crude suba, aumentando novamente os rendimentos dos países exportadores de petróleo. Isto, sem dúvida, será positivo para Angola. No entanto, o principal desafio da economia angolana persiste. É premente que Angola utilize as benesses do petróleo para diversificar a sua economia, para melhorar as suas infra-estruturas, e para investir noutros sectores como o turismo e a indústria. Uma economia tão dependente do petróleo estará sempre vulnerável às naturais oscilações dos preços do crude nos mercados internacionais. Por outro lado, as receitas petrolíferas tendem a apreciar a moeda angolana, o que penaliza as outras exportações (um fenómeno que é chamado de "doença holandesa"). Neste sentido, se Angola pretende realmente diversificar-se para se tornar menos vulnerável às crises internacionais e para se desenvolver mais harmoniosamente, então esta "doença holandesa" terá que ser combatida a todo o custo, através de medidas que apoiem os potenciais sectores exportadores e através de políticas que potenciem alguma desvalorização cambial para contrair a apreciação associada à exportação do petróleo.
DE VOLTA
Após um longo intervalo, o Desmitos regressa. Obrigado a todos que me mandaram mensagens a perguntar se o blogue tinha terminado. A resposta é negativa. Tenho estado em viagem e ocupado com outras coisas, o que não me tem permitido actualizar o blogue com a frequência que gostaria. Nos próximos dias estarei em viagem (de regresso a Portugal por uns dias), o que afectará mais uma vez o blogue. No entanto, tentarei escrever tanto quanto me for possível.
14 julho 2009
OS PARTIDOS E A CRISE
Estamos a dois meses e meio das eleições e, sinceramente, ainda não vi uma discussão (ou um plano sequer) dos principais partidos portugueses sobre as medidas que precisamos de tomar para combater a crise estrutural que a economia portuguesa vem vivendo na última década. Suspender as grandes obras públicas certamente não chega e continuá-las ainda menos. Se se fala em apoiar as PMEs, como é que tal vai ser feito e com que impacto nas contas públicas? Como é que os partidos tencionam ajudar a economia a fazer a transição de um modelo baseado em salários baixos e baixa produtividade para outro com maior produtividade? Que sectores vamos privilegiar? Como vamos fazê-lo? Como vamos aumentar os apoios às exportações? Como é que vamos estimular uma maior diversificação dos destinos das exportações? Haverá lugar para cortes de impostos? Se sim, quais e como? Como é que o combate ao desemprego vai ser feito? Através do investimento público ou de um maior estímulo à criação de empresas?
Estas são algumas das questões (entre outras) que eu gostaria de ver respondidas pelos partidos políticos. Infelizmente, até agora, sabemos pouco ou nada sobre o que é que os partidos pensam sobre estes assuntos. Esperemos que a situação mude até às eleições.
07 julho 2009
O "REI" ESTÁ MORTO
As televisões americanas e as canadianas estão num estado de perfeita histeria com a morte de Michael Jackson. Não se fala de outra coisa. Faz-me lembrar quando a princesa Diana morreu e o Reino Unido ficou num estado de catatonia mórbida durante dias a fio. Hoje só se enaltece o auto-proclamado "rei da pop". Entretanto, ontem a televisão pública canadiana, a CBC, transmitiu um documentário da série Passionate Eye, onde a imagem de Jackson era bem menos abonatória Narrado e contado por antigos colaboradores do cantor, o documentário retrata Jackson como nada menos que um pedófilo e abusador de crianças. Nada que não se sabia, mas com bastante mais pormenores. Numa altura em que Jackson é glorificado por milhões de fãs em todo o mundo, convém não esquecer o lado menos glamorioso do homem. Penso que o documentário ainda não está disponível na net, mas, quando estiver, pode ser encontrado aqui. Muito interessante.
03 julho 2009
A DEMISSÃO DO MINISTRO
Após a lamentável cena no Parlamento, era quase inevitável que Manuel Pinho se demitisse. Se nos lembrarmos das outras gaffes do ex-ministro, talvez a demissão não tivesse acontecido se não estivessemos tão perto das eleições. Assim, não havia grande alternativa. O desgaste para o governo seria demasiado se Pinho não tivesse saído. Como estamos a menos de 3 meses das eleições, os riscos para o governo da permanência de Pinho seriam enormes. A oposição argumentou logo que o gesto de Pinho era mais um sinal do desnorte do governo. Talvez. Porém, o mais provável é que as culpas se centrem mesmo no ex-ministro. É que, quase desde o primeiro dia, ele não conseguia evitar as gaffes. Enfim.
Dito isto, interessa também realçar que o primeiro-ministro esteve muito bem neste episódio. É certo que José Sócrates já devia ter remodelado o ministro há muito tempo. Contudo, perante o gesto de Pinho no parlamento, Sócrates procedeu bem e com a dignidade que se impunha.
Qual é o principal legado de Manuel Pinho? A aposta nas energias renováveis. Não tenho dúvidas que este será um dos sectores mais importantes para a economia portuguesa nos próximos anos. Pinho teve a visão de ser o primeiro a apostar no sector de forma considerável. E por isso, e apesar das gaffes terríveis, Manuel Pinho deixa um importante legado que deve ser continuado.
27 junho 2009
DIVINA
Estava hoje à procura de novidades de jazz numa loja quando ouvi uma música que me chamou a atenção. Perguntei quem cantava e responderam-me Melody Gardot. Não conhecia. Eu sei, eu sei. A capa engana. Não parece jazz, mas é. E do melhor, pelo menos algumas das músicas. As primeiras músicas do album são engraçadas, mas não são certamente nada do outro mundo. Porém, a faixa 9, "My one and only thrill", que dá nome ao album, é simplesmente divinal. Os arranjos são extraordinários e a música é do mais bonito que ouvi nos últimos tempos. Simplesmente perfeito. Vale a pena descobrir, principalmente se começar na nona faixa.
26 junho 2009
UM OUTRO MANIFESTO
Como era esperado, depois dos insultos gratuitos e das acusações de manipulação política em relação ao apelo à reavaliação dos grandes investimentos públicos, chegam-nos agora notícias que há um novo grupo de economistas a preparar um manifesto alternativo em que se irão defender os mega-projectos públicos. Sinceramente não surpreende e até provável que o novo manifesto venha a ter 30 ou 40 economistas para contrapôr ao primeiro, que, como se sabe, subscrevi. Afinal, como é óbvio, até seria possível arranjar um grupo de economistas marxistas (é verdade... ainda existem...) que defendessem uma nova nacionalização das principais actividades produtivas e empresas do país.
No entanto, nenhum outro manifesto retira o mérito do apelo que considerámos necessário fazer. Um dos objectivos do chamado manifesto dos 28 economistas, que tanto tem sido debatido nos últimos dias, era exactamente este: pôr o país a falar sobre as melhores formas de combater a crise, e se as grandes obras públicas são realmente necessárias no actual contexto. Só por isso, já valeu a pena, pois finalmente ouvimos os diversos campos a discutir as várias opções de política económica que se colocam ao país.
24 junho 2009
ATAQUE À CRISE
Agora que nos aproximamos a passos largos das eleições legislativas, seria bom que os diversos partidos nos apresentassem propostas claras sobre como tencionam combater a crise e o crescente aumento do desemprego. Devem investir nos grandes investimentos públicos? Cortar impostos? Aumentar os apoios às empresas e às famílias? Apoiar as empresas inovadoras? Ou devem tentar outras alternativas?
Neste sentido, o meu desejo é que os partidos façam um verdadeiro debate sobre as suas visões estratégicas para o país e não passem o tempo preocupados com um confronto de estilos ou com trivialidades que não levam a nenhum lado. Tenho a esperança que possamos levar a cabo esse debate, nem que não seja devido à grave crise que nos assola. Veremos se esta não é uma esperança infundada.
Neste sentido, o meu desejo é que os partidos façam um verdadeiro debate sobre as suas visões estratégicas para o país e não passem o tempo preocupados com um confronto de estilos ou com trivialidades que não levam a nenhum lado. Tenho a esperança que possamos levar a cabo esse debate, nem que não seja devido à grave crise que nos assola. Veremos se esta não é uma esperança infundada.
20 junho 2009
O APELO DOS ECONOMISTAS
Vale pena tecer as seguintes considerações adicionais sobre o apelo à avaliação dos investimentos públicos, que também subscrevo:
Em primeiro lugar, o que nos levou a redigir e subscrever o documento não foi nenhuma motivação política nem uma outra qualquer razão obscura. Entre os 28 subscritores, há pessoas de várias tendências políticas, independentes e ex-ministros de diversos governos, que têm certamente posições muito distintas em relação à política económica nacional.
Em segundo lugar, penso que é importante realçar que o que fez unir 28 pessoas com opiniões tão diversas foi o desejo de alertar os portugueses sobre a necessidade de reflectir um pouco mais sobre os grandes projectos públicos (TGV, aeroporto, e auto-estradas), e de realizar estudos mais aprofundados sobre estes mesmos projectos. Entendemos que, na conjuntura actual, o interesse nacional não é devidamente salvaguardado com o investimento publico em mega projectos de rentabilidade duvidosa. No mínimo, entendemos que deve haver uma reflexão adicional e um debate mais alargado sobre estes projectos.
Em terceiro lugar, certamente que os 28 subscritores do apelo têm opiniões distintas sobre a melhor forma de atacar os problemas estruturais da economia portuguesa. No entanto, o que é notável é que foi possível obter consenso entre tantos economistas. Uma das anedotas mais conhecidas dos economistas é que se colocarmos 5 economistas numa sala a discutir um problema de política económica, sairão de lá 5 recomendações diferentes. Aplicando o mesmo raciocínio, penso que é significativo que 28 economistas esqueceram as suas diferenças para assinar um documento conjunto sobre um tema da maior importância para o país.
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Finalmente, uma opinião mais pessoal. É óbvio que a intenção dos subscritores não foi criar uma arma de arremesso político. Houve inclusivamente o cuidado de avançar somente depois das eleições europeias. No entanto, também me parece evidente que este será um dos temas da campanha eleitoral, o que acho bem, pois é preciso que haja um debate alargado sobre o assunto. Porém, e independentemente das nossas preferências políticas, o que seria importante é que os principais partidos políticos portugueses defendessem de uma vez por todas um estudo mais abrangente destes mega-projectos públicos. Seria igualmente desejável que houvesse uma reavaliação das prioridades nacionais numa altura em que temos uma crise interna que já dura há quase uma década, o país sobreendividado tanto interna como externamente, bem como a maior crise internacional das últimas décadas. Não serão estes motivos suficientes para sermos mais prudentes na aplicação de escassos recursos públicos e privados? Não haverão alternativas melhores à aplicação destes fundos? Penso que sim, assim como defendi no meu último livro.
Fico à espera da vossa opinião sobre o assunto. Se desejarem ver o documento, bem como uns gráficos que preparámos sobre a situação económica actual, podem fazê-lo aqui.
Em primeiro lugar, o que nos levou a redigir e subscrever o documento não foi nenhuma motivação política nem uma outra qualquer razão obscura. Entre os 28 subscritores, há pessoas de várias tendências políticas, independentes e ex-ministros de diversos governos, que têm certamente posições muito distintas em relação à política económica nacional.
Em segundo lugar, penso que é importante realçar que o que fez unir 28 pessoas com opiniões tão diversas foi o desejo de alertar os portugueses sobre a necessidade de reflectir um pouco mais sobre os grandes projectos públicos (TGV, aeroporto, e auto-estradas), e de realizar estudos mais aprofundados sobre estes mesmos projectos. Entendemos que, na conjuntura actual, o interesse nacional não é devidamente salvaguardado com o investimento publico em mega projectos de rentabilidade duvidosa. No mínimo, entendemos que deve haver uma reflexão adicional e um debate mais alargado sobre estes projectos.
Em terceiro lugar, certamente que os 28 subscritores do apelo têm opiniões distintas sobre a melhor forma de atacar os problemas estruturais da economia portuguesa. No entanto, o que é notável é que foi possível obter consenso entre tantos economistas. Uma das anedotas mais conhecidas dos economistas é que se colocarmos 5 economistas numa sala a discutir um problema de política económica, sairão de lá 5 recomendações diferentes. Aplicando o mesmo raciocínio, penso que é significativo que 28 economistas esqueceram as suas diferenças para assinar um documento conjunto sobre um tema da maior importância para o país.
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Finalmente, uma opinião mais pessoal. É óbvio que a intenção dos subscritores não foi criar uma arma de arremesso político. Houve inclusivamente o cuidado de avançar somente depois das eleições europeias. No entanto, também me parece evidente que este será um dos temas da campanha eleitoral, o que acho bem, pois é preciso que haja um debate alargado sobre o assunto. Porém, e independentemente das nossas preferências políticas, o que seria importante é que os principais partidos políticos portugueses defendessem de uma vez por todas um estudo mais abrangente destes mega-projectos públicos. Seria igualmente desejável que houvesse uma reavaliação das prioridades nacionais numa altura em que temos uma crise interna que já dura há quase uma década, o país sobreendividado tanto interna como externamente, bem como a maior crise internacional das últimas décadas. Não serão estes motivos suficientes para sermos mais prudentes na aplicação de escassos recursos públicos e privados? Não haverão alternativas melhores à aplicação destes fundos? Penso que sim, assim como defendi no meu último livro.
Fico à espera da vossa opinião sobre o assunto. Se desejarem ver o documento, bem como uns gráficos que preparámos sobre a situação económica actual, podem fazê-lo aqui.
15 junho 2009
PRIMEIRO PASSO
Benditas eleições europeias. Finalmente, parece que vamos ter um debate sobre o TGV e as grandes obras públicas. Hoje tanto o editorial do Publico como o DN se debruçam sobre a necessidade de construir o TGV. Ainda bem. Esperemos que se faça um debate sério e honesto sobre o assunto, pois, se o fizermos, os portugueses facilmente concluirão que a Alta Velocidade não se justifica no situação económica actual do país. Aliás, como já aqui falei várias vezes, o TGV é um autêntico disparate que não faz sentido no contexto em que nos inserimos.
No entanto, mesmo que, na melhor das hipóteses, o TGV seja suspenso indefinidamente, é importante que os partidos da oposição (e o próprio governo) apresentem propostas concretas (isto é, com números) sobre como é que pensam resgatar o país da crise estrutural em que nos encontramos. Ou seja, é ilusório pensar que os partidos da oposição podem tentar vencer as eleições legislativas somente numa plataforma anti-grandes obras públicas. Tem de haver propostas, políticas, e novas ideias que forneçam aos portugueses a esperança que algo pode e deve ser feito para combater a crise nacional. Se tal não for feito, a suspensão das grandes obras públicas como o TGV será apenas um pequeno passo na direcção certa. Um pequeno passo que, apesar de importante, não será suficiente para inverter a alarmante trajectória descendente dos últimos anos da economia portuguesa.
14 junho 2009
CRISE E BANCOS CENTRAIS
Perguntas de Luís Leitão, jornalista do jornal Expansão de Angola, sobre o papel dos bancos centrais na crise financeira internacional
A crise financeira que assola as economias há mais de um ano trouxe para a ribalta os bancos centrais, que se pautaram por políticas de forte intervencionismo pela via da injecção de moeda na economia, da redução das taxas de juro e até a nacionalização de bancos. Apesar de, certa maneira, todos os Bancos Centrais terem seguido estas políticas, quais são as diferenças que podemos encontrar no “meios operandis” do BCE, Fed, Banco do Japão e Banco de Inglaterra no combate à crise?
A Fed e o Banco da Inglaterra foram muito mais activos e tiveram uma intervenção mais contundente nos primeiros meses da crise, enquanto o BCE foi mais prudente. Em parte, esta diferença justifica-se com os próprios mandatos de cada um dos bancos. A FEd e o Banco de Inglaterra têm por mandato a estabilidade de preços, mas também o estímulo da economia, enquanto o BCE só tem por mandato a estabilidade de preços. Penso que essa foi uma das razões que levaram o BCE a demorar um pouco mais a baixar os juros do que os seus congéneres nos outros países mais desenvolvidos.
No entanto, vale a pena assinalar que desde meados de 2008 que os bancos centrais da OCDE cooperaram entre si para aumentar a quantidade de fundos na economia mundial. A crise do subprime levou a uma grande contracção da oferta de crédito e, por isso, os vários bancos centrais actuaram aumentando os fundos existentes.
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Se até há pouco tempo quase toda a gente falava na privatização dos bancos públicos, hoje são poucas as vozes que se levantam para defender esta ideia. Afinal, qual é o papel dos bancos de capitais públicos no meio desta crise? Funcionam um pouco como “a mão invisível” de governos e Bancos Centrais como forma de garantir a tão desejada “estabilidade” económica ou são mais que isso?
A crise financeira internacional veio demonstrar que manter um banco público pode ser útil, principalmente para países com um menor nível de desenvolvimento (e que, assim, estão sujeitos a maior volatilidade). O banco público pode ser utilizado em períodos de maior instabilidade como um garante de estabilidade financeira. Isto é, nestes casos, o banco público pode ser uma autêntica âncora estabilizadora do sistema financeiro. Um banco público pode igualmente servir de suporte ao próprio desenvolvimento económico, ao ser o financiador de projectos de importância estratégica e ao aparecimento de novas empresas. Mas, nem tudo são rosas. Se o banco público não mantiver uma certa independência na sua gestão, há sempre o risco de instrumentalizar em demasia a sua actividade. Por outro lado, é também importante realçar que a nacionalização de bancos privados nos países mais ricos é meramente temporária, até que estes bancos recuperam da crise dos últimos meses.
É conhecida a crispação entre Greenspan e o presidente norte-americano George W. Bush durante o seu mandato, chegando este a utilizar o seu discurso sobre o estado da união em 1991 para mostrar o seu descontentamento do papel da Fed ao dizer que "Temos observado demasiado pessimismo". Qual é a importância dos Bancos Centrais estarem forem da alçada do governo, de serem verdadeiramente independentes? É da máxima importância que isso suceda para o bem da economia ou ambas as organizações (Governo e Banco Centrais) podem/devem estar directamente ligadas?
É muito importante. Vários estudos demonstram que a taxa de inflação média é mais baixa nos países com bancos centrais independentes e que a estabilidade macroeconómica é maior. Para além do mais, quando os bancos centrais não são independentes, há sempre a tentação de um governo pedir ao banco central para estimular a economia antes de uma eleição, por forma a ganhá-la. O banco central pode fazê-lo quer baixando as taxas de juros, quer aumentando a quantidade de dinheiro na economia. Se tudo correr como esperado, a economia cresce, a inflação sobe e o desemprego diminui antes da eleição. Depois de ganhar as eleições, o governo e o banco central são forçados a re-estabilizar a economia e a controlar a inflação, o que irá fazer com que o crescimento económico baixe e o desemprego suba. O processo termina com uma situação semelhante à inicial, mas com maior inflação. Isto é, a situação macroeconómica deteriora-se. Por outras palavras, quando os bancos centrais não são independentes do poder político há sempre a tentação de criar ciclos económicos políticos que somente aumentam a instabilidade económica.
Um exemplo ainda mais dramático da ausência de independência dos bancos centrais é-nos dado pelo Zimbabwe, que viveu recentemente uma das maiores hiperinflações da história mundial. Se o banco central zimbabueano fosse independente do poder político é muito provável que o país não teria sido sujeito à tragédia económica e social dos últimos meses.
A Fed e o Banco da Inglaterra foram muito mais activos e tiveram uma intervenção mais contundente nos primeiros meses da crise, enquanto o BCE foi mais prudente. Em parte, esta diferença justifica-se com os próprios mandatos de cada um dos bancos. A FEd e o Banco de Inglaterra têm por mandato a estabilidade de preços, mas também o estímulo da economia, enquanto o BCE só tem por mandato a estabilidade de preços. Penso que essa foi uma das razões que levaram o BCE a demorar um pouco mais a baixar os juros do que os seus congéneres nos outros países mais desenvolvidos.
No entanto, vale a pena assinalar que desde meados de 2008 que os bancos centrais da OCDE cooperaram entre si para aumentar a quantidade de fundos na economia mundial. A crise do subprime levou a uma grande contracção da oferta de crédito e, por isso, os vários bancos centrais actuaram aumentando os fundos existentes.
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Se até há pouco tempo quase toda a gente falava na privatização dos bancos públicos, hoje são poucas as vozes que se levantam para defender esta ideia. Afinal, qual é o papel dos bancos de capitais públicos no meio desta crise? Funcionam um pouco como “a mão invisível” de governos e Bancos Centrais como forma de garantir a tão desejada “estabilidade” económica ou são mais que isso?
A crise financeira internacional veio demonstrar que manter um banco público pode ser útil, principalmente para países com um menor nível de desenvolvimento (e que, assim, estão sujeitos a maior volatilidade). O banco público pode ser utilizado em períodos de maior instabilidade como um garante de estabilidade financeira. Isto é, nestes casos, o banco público pode ser uma autêntica âncora estabilizadora do sistema financeiro. Um banco público pode igualmente servir de suporte ao próprio desenvolvimento económico, ao ser o financiador de projectos de importância estratégica e ao aparecimento de novas empresas. Mas, nem tudo são rosas. Se o banco público não mantiver uma certa independência na sua gestão, há sempre o risco de instrumentalizar em demasia a sua actividade. Por outro lado, é também importante realçar que a nacionalização de bancos privados nos países mais ricos é meramente temporária, até que estes bancos recuperam da crise dos últimos meses.
É conhecida a crispação entre Greenspan e o presidente norte-americano George W. Bush durante o seu mandato, chegando este a utilizar o seu discurso sobre o estado da união em 1991 para mostrar o seu descontentamento do papel da Fed ao dizer que "Temos observado demasiado pessimismo". Qual é a importância dos Bancos Centrais estarem forem da alçada do governo, de serem verdadeiramente independentes? É da máxima importância que isso suceda para o bem da economia ou ambas as organizações (Governo e Banco Centrais) podem/devem estar directamente ligadas?
É muito importante. Vários estudos demonstram que a taxa de inflação média é mais baixa nos países com bancos centrais independentes e que a estabilidade macroeconómica é maior. Para além do mais, quando os bancos centrais não são independentes, há sempre a tentação de um governo pedir ao banco central para estimular a economia antes de uma eleição, por forma a ganhá-la. O banco central pode fazê-lo quer baixando as taxas de juros, quer aumentando a quantidade de dinheiro na economia. Se tudo correr como esperado, a economia cresce, a inflação sobe e o desemprego diminui antes da eleição. Depois de ganhar as eleições, o governo e o banco central são forçados a re-estabilizar a economia e a controlar a inflação, o que irá fazer com que o crescimento económico baixe e o desemprego suba. O processo termina com uma situação semelhante à inicial, mas com maior inflação. Isto é, a situação macroeconómica deteriora-se. Por outras palavras, quando os bancos centrais não são independentes do poder político há sempre a tentação de criar ciclos económicos políticos que somente aumentam a instabilidade económica.
Um exemplo ainda mais dramático da ausência de independência dos bancos centrais é-nos dado pelo Zimbabwe, que viveu recentemente uma das maiores hiperinflações da história mundial. Se o banco central zimbabueano fosse independente do poder político é muito provável que o país não teria sido sujeito à tragédia económica e social dos últimos meses.
12 junho 2009
IRRESPONSABILIDADE AO RUBRO
O meu artigo no DN de ontem sobre as eleições europeias.
"No rescaldo das eleições europeias, alguns ministros do governo já vieram a público afirmar que o calendário da aprovação das grandes obras públicas era para manter. Não interessa o pequeno pormenor que as eleições legislativas se irão realizar em Outubro e que há sempre a possibilidade de o país mudar de rumo (com ou sem o PS). Não interessa que o partido do governo perdeu as eleições de forma decisiva. Não interessa que os portugueses mostraram um enorme desinteresse em relação à política actual ou que vociferaram um inédito voto de protesto através de um número recorde de votos brancos e nulos. Não interessa sequer que, até hoje, nenhum governo explicou aos portugueses as verdadeiras consequências financeiras e económicas de projectos como o TGV.
Afinal, se as grandes construtoras anseiam pelas grandes obras públicas, o que importam a opinião dos portugueses ou o interesse nacional? No entanto, a verdade é que, ao teimar nessa estratégia autista, contra tudo e contra todos, o governo faz um péssimo serviço ao país. Independentemente da cor política de cada um, as regras mínimas da prudência e da responsabilidade democrática seriam para o governo esperar pelo veredicto das eleições de Outubro antes de embarcar na adjudicação das grandes empreitadas. Para perceber porquê, basta lembrar que projectos como o TGV irão dar azo aos maiores custos financeiros e económicos desde a Guerra Colonial.
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Numa altura em que o endividamento da economia portuguesa atingiu níveis históricos e em que o mundo se debate com a maior recessão das últimas décadas, insistir na irresponsabilidade das grandes obra públicas como o TGV sem as submeter ao plebiscito dos portugueses é de uma irresponsabilidade atroz, com laivos de uma prepotência política indefensável. No mínimo, é uma atitude extremamente questionável.
Por isso, interessa perguntar: porquê tanta pressa? Por que não esperar quatro meses? Por que não perguntar aos portugueses a nossa opinião sobre o assunto, antes de decidir assinar contratos que terão enormes consequências financeiras para as próximas gerações? Ora, sabendo que os fundos europeus não vão ser redireccionados nuns meros quatro meses, sabendo que projectos como o TGV não se iniciarão a tempo para combater a crise actual, sabendo inclusivamente que o impacto de tais projectos no emprego é residual, por que é que o Governo quer aprovar as grandes obras públicas a todo custo antes de Outubro? Sinceramente, é difícil perceber o porquê de tamanha teimosia, a não ser que apelemos a certas teorias conspirativas de interesses obscuros que todos gostamos de negar.
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Esperemos assim que o cartão amarelo das eleições europeias sirvam para o governo reflectir e suspender temporariamente a adjudicação das grandes empreitadas. Pessoalmente, até acho que este governo teve o mérito de iniciar algumas reformas importantes para o futuro do país. Porém, ao insistir numa estratégia cega, demagógica e irresponsável nos projectos das grandes obras públicas, o governo ameaça hipotecar irremediavelmente o seu próprio legado político. E quem pagará a factura serão os portugueses, durante muitas e muitas décadas. E, claro, tal acontecerá mesmo que o governo actual não vença as eleições de Outubro.
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