Um artigo interessante da autoria de Charles Wyplosz, um dos economistas que, nos últimos anos, mais tem investigado a economia da União Europeia. Wyplosz defende que os governos europeus dos países em dificuldades deviam começar já a preparar-se para os cenários menos desejáveis, incluindo a insolvência de um ou mais países do euro e/ou situações de incumprimento. Não é que seja certo que esses cenários aconteçam (apesar de a probabilidade de acontecerem é hoje bem mais elevado do que há uns meses atrás). No entanto, vale mais estar preparado para todas as eventualidades do que acabar por ser surpreendido, o que, decerto, terá consequências ainda mais nefastas para as economias em questão. Ou seja, vale mais prevenir (e preparar) do que remediar.
Aqui estão algumas citações do artigo de Wyplosz:
"According to the IMF, the financing needs of Greece, Ireland, Portugal and Spain over the last quarter of 2010 and 2011 – most of which will come due in the early part of 2011 – add up to € 320 billion. Add Italy and you get € 712 bn. It is understandable that the ECB has called for an enlargement of the European Financial Stability Fund (EFSF) which can provide up to € 440 bn. but this request has just been turned down by the Heads of State. The IMF can add some money at some notice, but this is limited. In short, it is unlikely that we have the means to quiet down market concerns if they lead to a refusal of providing fresh money. We have only a few weeks before we find out how the markets react; recent downgrades by the rating agencies, however, belie the official optimism."
...
"Undoubtedly, policymakers will respond that they cannot discuss openly these issues for fear of pouring oil on a burning fire. This is probably true, but one can hope that they are actively working on these complicated issues and will be ready when and if needed."
3 comentários:
As razões para um endividamento são muitas. As razões das dificuldades que vêm atrás dum endividamento excessivo não são menos. Felizmente, as soluções para as dificuldades são poucas.
Na concessão de crédito há os que se saem bem e os que se saem mal. E quando as coisas saem mal, há poucos virtuosos. Porque é tão feio pedir emprestado o que não se vai poder pagar como é feio emprestar o que não se vai conseguir reaver. (Qual Alemanha sábia. Qual Portugal perdulário.)
Trata-se aqui pois de reaver um incobrável dum soberano. (Coisa difícil na História, diga-se desde logo.) Vejamos algumas das soluções.
Ou se aceita a solução bíblica de «desculpar» partes da dívida. Está a ser feito com as dívidas mais pequenas dos países mais pobres. Aqui a solução seria transaccionar a dívida abaixo do valor do par com um «corte» entendido como apropriado. Os titulares têm que aceitar o correspondente «corte» no resultado líquido que não esteja ainda aprovisionado.
Ou se aceita a solução do departamento de crédito do banco: a reestruturação. A solução é uma combinação de acções sem receita conhecida que se consegue só com muita conversa: um reforço de capital, um «esticar» do prazo, e uma taxa «atraentemente» mais baixa para que quem está mais enfraquecido a consiga pagar. O valor económico da nova proposta é mais baixo. Não haja dúvidas nisso. A questão é saber se a nova proposta pode ser registada na contabilidade ao mesmo valor patrimonial. Leia-se: sem perda.
As outras soluções vêm do departamento de banca de investimentos mas não são mais do que variantes da solução do departamento de crédito. São mais caras e a rapaziada encarregada da apresentação tem regra geral um MBA.
É o caso da solução que nos anos Oitenta foi usada para os países da América Latina junto dos bancos dos EUA: os empréstimos «Brady». Trata-se de substituir o empréstimo «doente» por um empréstimo reestruturado no departamento de crédito do banco (geralmente, com prazo mais longo e taxa mais baixa) mas que leva uma garantia «dourada» ou «AAA» de pagamento atempado e por isso sai classificado sem risco. (Continuo convencido que é para isto que podem servir as EUR-obrigações.)
Não vejo mais soluções. Só vejo muita conversa. De que é parte importante o artigo referido do Professor Barry Eichengreen. Porque contribui para a «construção» de consensos sobre a dívida soberana europeia. O consenso de que a Grécia tem um problema de falta de controlo orçamental. O consenso de que a Irlanda tem um problema bancário em resultado da especulação imobiliária. O problema irlandês não era orçamental à primeira vista mas passou a ser quando o Governo estendeu as garantias a todo o sistema bancário. A proposta de consenso de que a Espanha tem um problema sério com as caixas de aforro regionais também em resultado da especulação imobiliária. O problema espanhol não é orçamental à primeira vista porque as caixas pertencem às Regiões mas ainda pode acabar sendo.
E a sugestão do consenso que se está a construir em relação a Portugal para classificar o problema de Portugal como um problema de dívida bancária que foi «classificada» como privada.
Com efeito, dos quase 498 mil milhões de dólares da posição total no fim do segundo trimestre de 2010, 224 mil milhões de dólares ou 45 por cento é dívida bancária. O Estado tem cerca de 22 por cento da dívida externa total. Só que para ser um problema de dívida privada seria preciso que toda aquela dívida bancária estivesse prometida sem qualquer «conforto» do Estado. Seria então dívida exclusivamente de Empresas e Famílias.
E se assim fôsse, não haveria lugar a uma intervenção do FMI.
Por isso, li o artigo de Barry Eichengreen com o mesmo interesse que o Professor Álvaro Santos Pereira. Porque a Verdade no dia-a-dia nem é nem deixa de ser. A Verdade é o último estádio da construção dum consenso. Que é usado na concessão do crédito. No diagnóstico do incumprimento. Tal como nas terapias sugeridas.
Obrigado.
F
As razões para um endividamento são muitas. As razões das dificuldades que vêm atrás dum endividamento excessivo não são menos. Felizmente, as soluções para as dificuldades são poucas.
Na concessão de crédito há os que se saem bem e os que se saem mal. E quando as coisas saem mal, há poucos virtuosos. Porque é tão feio pedir emprestado o que não se vai poder pagar como é feio emprestar o que não se vai conseguir reaver. (Qual Alemanha sábia. Qual Portugal perdulário.)
Trata-se aqui pois de reaver um incobrável dum soberano. (Coisa difícil na História, diga-se desde logo.) Vejamos algumas das soluções.
Ou se aceita a solução bíblica de «desculpar» partes da dívida. Está a ser feito com as dívidas mais pequenas dos países mais pobres. Aqui a solução seria transaccionar a dívida abaixo do valor do par com um «corte» entendido como apropriado. Os titulares têm que aceitar o correspondente «corte» no resultado líquido que não esteja ainda aprovisionado.
Ou se aceita a solução do departamento de crédito do banco: a reestruturação. A solução é uma combinação de acções sem receita conhecida que se consegue só com muita conversa: um reforço de capital, um «esticar» do prazo, e uma taxa «atraentemente» mais baixa para que quem está mais enfraquecido a consiga pagar. O valor económico da nova proposta é mais baixo. Não haja dúvidas nisso. A questão é saber se a nova proposta pode ser registada na contabilidade ao mesmo valor patrimonial. Leia-se: sem perda.
As outras soluções vêm do departamento de banca de investimentos mas não são mais do que variantes da solução do departamento de crédito. São mais caras e a rapaziada encarregada da apresentação tem regra geral um MBA.
É o caso da solução que nos anos Oitenta foi usada para os países da América Latina junto dos bancos dos EUA: os empréstimos «Brady». Trata-se de substituir o empréstimo «doente» por um empréstimo reestruturado no departamento de crédito do banco (geralmente, com prazo mais longo e taxa mais baixa) mas que leva uma garantia «dourada» ou «AAA» de pagamento atempado e por isso sai classificado sem risco. (Continuo convencido que é para isto que podem servir as EUR-obrigações.)
Não vejo mais soluções. Só vejo muita conversa. De que é parte importante o artigo referido do Professor Barry Eichengreen. Porque contribui para a «construção» de consensos sobre a dívida soberana europeia. O consenso de que a Grécia tem um problema de falta de controlo orçamental. O consenso de que a Irlanda tem um problema bancário em resultado da especulação imobiliária. O problema irlandês não era orçamental à primeira vista mas passou a ser quando o Governo estendeu as garantias a todo o sistema bancário. A proposta de consenso de que a Espanha tem um problema sério com as caixas de aforro regionais também em resultado da especulação imobiliária. O problema espanhol não é orçamental à primeira vista porque as caixas pertencem às Regiões mas ainda pode acabar sendo.
E a sugestão do consenso que se está a construir em relação a Portugal para classificar o problema de Portugal como um problema de dívida bancária que foi «classificada» como privada.
Com efeito, dos quase 498 mil milhões de dólares da posição total no fim do segundo trimestre de 2010, 224 mil milhões de dólares ou 45 por cento é dívida bancária. O Estado tem cerca de 22 por cento da dívida externa total. Só que para ser um problema de dívida privada seria preciso que toda aquela dívida bancária estivesse prometida sem qualquer «conforto» do Estado. Seria então dívida exclusivamente de Empresas e Famílias.
E se assim fôsse, não haveria lugar a uma intervenção do FMI.
Por isso, li o artigo de Barry Eichengreen com o mesmo interesse que o Professor Álvaro Santos Pereira. Porque a Verdade no dia-a-dia nem é nem deixa de ser. A Verdade é o último estádio da construção dum consenso. Que é usado na concessão do crédito. No diagnóstico do incumprimento. Tal como nas terapias sugeridas.
Obrigado.
F
Caro Professor,
Com esta idade eu devia deixar-me destas modernices e andar a estragar esta Sua página. Pedia-lhe que eliminasse o comentário acima em duplicado e se puder fizesse a sua transferência para a Sua última entrada que é onde devia estar. Acima de tudo: as minhas desculpas pela Sua atenção, disponibilidade e motivação.
Muito obrigado.
F
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