07 junho 2011

COMO ESCONDER UM DÉFICE

Como é que os governos conseguem esconder os seus défices orçamentais sem que os eleitores dêem conta? Como é que os governos conseguem esconder as suas despesas e os buracos dos seus orçamentos? As perguntas são pertinentes, pois, como sabemos, há vários países europeus numa situação bastante delicada, muito por causa da acção dos respectivos governos. Assim, os governos gregos andaram anos a literalmente a “fabricar” números orçamentais demasiado risonhos, e que pouco tinham a ver com a realidade das finanças públicas helénicas. Tudo para que o país pudesse entrar no euro e para os governos conseguissem ganhar eleições. O problema é que, inesperadamente, a crise financeira internacional eclodiu em 2008 e os governos gregos não puderam mais esconder o verdadeiro estado das finanças públicas helénicas. Porquê? Porque as receitas fiscais baixaram muito, dando azo a défices orçamentais enormes e a uma dívida pública explosiva que não era passível de ser mais ignorada. 
Uma situação semelhante passou-se em Portugal. Embora os nossos governos não andaram a mentir tão descaradamente sobre os números das contas do Estado como os gregos, a verdade é que andámos anos a fio a “disfarçar” os défices do presente ao chutarmos sistematicamente o pagamento de despesas para um futuro mais ou menos longínquo. Neste sentido, e segundo vários relatórios do Tribunal de Contas, os nossos governos não só utilizaram inúmeros truques para aumentar temporariamente as “receitas” do Estado (como a incorporação dos fundos de pensões da PT no sistema público), mas também efectuaram toda uma série de desorçamentações, e abusaram do recurso às chamadas parcerias público-privadas (PPPs). As PPPs permitem que o Estado mande construir obras públicas sem que tenha de pagar um mero cêntimo nos 5 a 10 anos seguintes. E foi assim, com todos estes expedientes, que durante anos os nossos governos apresentaram défices “históricos” e uma dívida pública “controlada”. Tudo feito sem mencionar o pequeno grande pormenor de que essas despesas teriam de ser pagas num belo dia. Por quem? Pelos governos que se seguiam e pelos nossos filhos. É que, quando os governos escondem os seus défices, quem paga são sempre os mesmos: os contribuintes e as gerações futuras. Mas isso não interessa. O que interessa é ganhar as eleições e tentar fazer com que os eleitores não percebam os truques utilizados para disfarçar a incompetência e a irresponsabilidade dos nossos governantes. E foi assim que chegámos à triste situação que hoje nos encontramos. 

Nota: Meu artigo no Notícias Sábado da última semana

4 comentários:

Textículos disse...

Once the maintenance and loan repayment is handled, the revenue stream becomes profits. In the worst case scenario, all the profits go to the private investors leaving the public out of the upside. In better scenarios, there is a way to guarantee a certain amount of profit to the private investor but capture upside revenues for the public sector after that.
http://thesocietypages.org/graphicsociology/2011/06/04/public-private-partnership-financing-schematic/

Anónimo disse...

Caro Senhor Professor,
O seu blog tem sido de uma grande utilidade para compreender a realidade da economia portuguesa e o desempenho do (des)governo cessante. Como Português, agradeço-lhe pelo seu trabalho!
Um abraço também emigrante

Manuel disse...

Caro Anónimo (emigrante):

Eu no seu lugar não estaria tão embevecido com a informação do Desmitos, procuraria ler criticamente toda essa informação empírica que aqui se publica, útil sem dúvida, mas cotejá-la-ia com outra oriunda de fontes diferentes.
Veja os meus comentários nos posts «Despesismo ao rubro» e «Responsabilidade», faço aí alertas para aspectos que são intencionalmente omitidos pelo autor do Desmitos.

Anónimo disse...

Tenho outra teoria: um défice, para ser escondido, tem de estar muito bem escudado com sólidas leis que garantam, sem qualquer margem para dúvidas, uma condição fundamental: impunidade judicial total. Sintetizemos: qualquer "orientação" no mesmo sentido numa contabilidade criativa (a feijões) detectada pelo fisco numa pequena sociedade unipessoal dá um processo muito mais desagradável do que o nada que se aplica a esta gente que andou por aí a "gerir" o que era nosso por empréstimo de terceiros e que não percebe as perguntas directas que os jornalistas lhes fazem, rindo de tais coisas frente a um país e a todos aqueles que lá fora estão de olhos em nós, como se de um circo se tratasse.