23 abril 2011

SAIR DO EURO (3)

O Expresso perguntou a vários economistas as consequências de eventual saída do euro. Aqui estão as minhas respostas:
Expresso- A saída do euro seria a solução para Portugal? Claramente que não. É óbvio que uma saída é sempre uma possibilidade. Porém, nas circunstâncias actuais (em que temos uma economia com um endividamento externo elevadíssimo), um abandono do euro teria consequências catastróficas para o nosso país. Se um dia quisermos sair do euro, é melhor que primeiro diminuamos o endividamento nacional.
Uma saída do euro também não seria a melhor solução para recuperar a competitividade. É certo que temos tido vários problemas nesta área. Porém, e ao contrario ao que às vezes se pensa, o ajustamento ao euro (e a uma moeda forte) já foi feito. A prova disso é que as exportações nacionais têm demonstrado um notável dinamismo nos últimos anos. Por isso, não faz sentido sair do euro nesta altura.

Expresso- Que consequências seriam previsíveis?  

Uma desvalorização de um “novo escudo” na ordem dos 30% ou 40% teria um impacto imediato de fazer subir substancialmente a nossa dívida externa, que é denominada maioritariamente em euros. Como já temos uma dívida externa bruta a rondar os 230% do PIB e uma dívida externa líquida de 110% do PIB, uma saída do euro tornaria a nossa dívida externa completamente insustentável.
É natural que, num tal cenário, houvesse uma grande fuga de capitais, uma grande contracção do crédito, falências de bancos, uma subida acentuada das taxas de juros, e uma enorme contracção económica. Para além destes pesados custos económicos, teríamos ainda de suportar custos políticos elevadíssimos, visto que seríamos certamente ostracizados pelos nossos parceiros europeus. Em suma, uma saída do euro nesta altura seria um erro de proporções colossais.

Expresso- Há risco de implosão da zona euro com este avolumar de países em resgate e aumento dos eleitorados e opinião públicas que estão contra? 

Penso que não e espero que não. Mas nunca se sabe. Preocupa-me muito a subida dos radicalismos e das vozes populistas na Europa. Por isso, há cenários que não deviam acontecer (como a implosão da zona euro), mas que, nestas circunstâncias, podem realmente vir a suceder. No entanto, acho mais provável que se venha a fazer uma reestruturação das dívidas dos países altamente endividados do que ocorrer uma implosão do euro. E até possível que essa reestruturação acabe por acontecer antes de 2013.

Expresso- O que pode vir a acontecer aos resgates em curso? Manter-se-ão como solução, ou terão de se tomar outras medidas?  

Os resgates só servem para ganhar tempo e para que os bancos europeus tenham tempo para se prepararem para eventuais reestruturações de dívida. Porém, penso que a reestruturação das dívidas é inevitável para alguns países. Acontecerá na Grécia certamente, e com grande probabilidade na Irlanda e em Portugal. Se tal acontecer, o importante é saber planear as coisas devidamente e negociar da melhor maneira possível com os credores. Seria igualmente desejável que uma eventual reestruturação fosse acompanhada da implementação de medidas que ajudassem as economias em dificuldades a tornarem-se mais competitivas e mais produtivas (principalmente no caso da Grécia e de Portugal). 

Nota: Os custos e benefícios de uma eventual saída do euro já tinham sido debatidos aqui.  

4 comentários:

José Meireles Graça disse...

Não sei quem são nem o que vão dizer os outros economistas. Eu, que não pertenço à Igreja dos Economistas nem a nenhuma das seitas em que se divide, digo que o caso contra a saída do Euro não parece muito consistente, porquanto: i) A nossa dívida externa não crescerá realmente um cêntimo por causa da desvalorização, apenas crescerá nominalmente em Escudos na medida da desvalorização; ii) Outro tanto acontecerá com as nossa exportações, que serão facturadas nas moedas de destino, mas convertidas em Escudos; iii) Os artigos importados verão o seu consumo descer, porque os salários não acompanharão o ritmo da desvalorização da moeda; iv) Como os salários não crescerão ao mesmo ritmo da desvalorização, produtos nacionais que agora não são competitivos passarão a sê-lo porque embaratecerão em relação aos equivalentes estrangeiros; v) Os exportadores poderão aumentar a sua quota de mercado no exterior porque passarão a ter margem para reduzir preços; vi) A dívida externa não poderá ser paga sem reescalonamento, mas isso já sucede com o Euro; vii) Os nossos parceiros vêm-nos com maus olhos agora. Não há razões para pensar que nos veriam com olhos piores se negociássemos a saída, quando precisamente há cada vez mais vozes (a meu ver as mais lúcidas) que nos países com economias sólidas se manifestam contra o princípio de vestir o mesmo fato a corpos muito diferentes. Estas razões são discutíveis e outras há a favor da permanência? São, claro, e o caso não é simples. Mas a rejeição do abandono precisa, para ser convincente, de um argumentário bastante mais exaustivo. Se existir.

António Parente disse...

Gostava que alguém me explicasse o interesse dos nossos parceiros europeus em tornarem a nossa economia mais competitiva. Sendo o principal destino das nossas exportações a união europeia e dado que deixámos de ser competitivos frente à China (por isso o nosso têxtil sofreu o que sofreu) é natural que os nossos concorrentes sejam outras empresas da união europeia. Este não é um jogo em que todos possam ganhar e ficar felizes, se as nossas empresas ganham quota de mercado então as empresas dos nossos parceiros europeus registam perdas. Se assim é, qual é o interesse dos outros em tornarem-nos competitivos se até nos vão emprestar dinheiro com um spread de 200 ou 300 pontos base, condenando-nos à indigência financeira durante algumas décadas?

Falta aqui um peça qualquer neste puzzle.

Anónimo disse...

Muito bem !
Todavia penso que uma reestruturação da dívida feita quanto antes seria melhor do que adiá-la para mais tarde.
Reconheço os altos custos que teria no imediato, mas mais tarde vão ser muitíssimo superiores.
Esta reestruturação da dívida deveria ser negociada conjuntamente com a Grécia e com a Irlanda para termos mais poder negocial.
Este é um modesto contributo para este excelente blogue.
Boa Páscoa !

Cidadão comum disse...

Ao ler o comentário do JMG,julgo que as razões enunciadas são o verdadeiro caminho e saída para Portugal sair do buraco financeiro em que se meteu.
Não vale a pena culpar este ou aquele governo, porque é perder tempo e tempo é dinheiro.
Não sou economista nem pertenço a qualquer facção partidária, apenas penso no meu país e no futuro daquelas gerações vindouras que não irão ter vida fácil.
Um País com um fraco desempenho económico, onde importa quase tudo, e exporta muito pouco, sendo a sua BTC sempre negativa e com a chegada da IMF / UE, será muito senão impossível Portugal sair deste atoleiro. As receitas de austeridade impostas pelo IMF / UE serão pouco diminizadoras da economia, e o pais entrará numa recessão sem precedentes.
Por isso este comentário do Sr. JMG têm todo o sentido e por mim tem um voto de apoio.
Cidadão comum