11 fevereiro 2011

RAZÕES PARA A CENSURA

Nas próximas semanas vamos debater até à exaustão as razões da moção de censura do Bloco de Esquerda, bem como se o PSD e o CDS devem aprovar um texto que terá certamente uma forte componente ideológica para poderem derrubar o governo. É claro que o timing interessa até porque um dia após a votação da moção, no dia 11 de Março, a Europa irá debater os mecanismos de reforço do FEEF. A recente instabilidade nos mercados financeiros será igualmente utilizada pelo governo para se vitimizar e para acusar a oposição de falta de patriotismo. No entanto, e independentemente, do texto da moção, ou de saber se o "FMI" chega em Março ou em Maio (ou até de saber se a Europa vai fazer do papel do FMI), não seria mais racional pensarmos no estado a que o país chegou? Para quem não sabe, aqui vão uns gráficos que ilustram bem a situação actual:
 
1) A média do crescimento económico é a pior dos últimos 90 anos
Fonte: Santos Pereira (2011)

2) A dívida pública é a maior dos últimos 160 anos

Dívida pública portuguesa em % do PIB, 1850-2010
Fonte: Santos Pereira (2011)

3) A dívida externa é, no mínimo, a maior dos últimos 120 anos (desde que o país declarou uma bancarrota parcial em 1892)

Dívida externa bruta em % do PIB, 1999-2010
Fonte: Santos Pereira (2011)
 
4) O desemprego é, no mínimo, o maior dos últimos 80 anos. Temos 610 mil desempregados, dos quais 300 mil são de longa duração

Taxa de desemprego em Portugal, 1932-2010
Fonte: Santos Pereira (2011)

5) Voltámos à divergência económica com a Europa, após décadas de convergência

PIB per capita português em % do PIB per capita da Europa Avançada 
Fonte: Santos Pereira e Lains (2010)

6) Vivemos actualmente a segunda maior vaga de emigração dos últimos 160 anos

Emigração portuguesa (milhares de pessoas), 1850-2008

Fonte: Santos Pereira (2010)

7) Temos a taxa de poupança mais baixa dos últimos 50 anos

Taxa de poupança bruta, 1960-2010
Fonte: AMECO, Santos Pereira (2011)

Isto já para não falar naquilo que se transformou a Justiça, nos problemas constantes e no facilitismo reinante no sector da Educação, no abuso inter-geracional que foi feito com as parcerias público-privadas, no endividamento recorde da economia nacional, no despesismo e no compadrio do Estado, entre muitos, muitos outros problemas. Por outras palavras, as verdadeiras razões de uma censura ao governo são muito claras. Muito claras mesmo. Só não vê quem não quer.

19 comentários:

Guillaume Tell disse...

O problema da moção de censura é político, e isso condiciona tudo.
É triste mas é assim...

Contra.facção disse...

Admiro a sua "coragem" de neste caso concreto se "colar" ao BE (penso que nem simpatizante é) contra a maioria dos políticos que acusam este governo, provam a sua ineficácia, indicam-nos o abismo para onde nos levam e vão votar contra a moção (se ela for votada no Parlamento), permitindo que tudo continue em plano inclinado.
Honestidade intelectual e coerência, é o que se exige e por isso, parabéns.

Anónimo disse...

Ex.mo Sr. Prof. A.S.Pereira:
O seu blogue é, porventura, dos mais úteis da blogosfera portuguesa, para mim é-o de certeza.
No entanto, como lhe referi em comentário anterior, o senhor «mancha» (em minha opinião desnecessária e contraproducentemente), quer a utilíssima informação que diariamente nos presta, quer a sua competência como reputado professor e economista.
Os gráficos que nos mostra, complementares entre si, ou uns naturalmente decorrentes dos outros, o que nos mostram é uma paulatina perda de «tónus muscular» da nossa economia desde o início dos anos 70, fruto de uma ilusão permanente: primeiro, a da manutenção do Império colonial (Estado Novo), a seguir, a do igualitarismo societal (deriva populista de 74-76); depois, a do «paraíso prometido» da CEE (pedido de adesão); a seguir, a do «leite e mel» atingidos devido à competência governativa (cavaquismo); finalmente, o do banquete fácil de digerir (guterrismo).
A conta apareceu às claras em 2003, ainda assim, continuámos a viver a ilusão de que o essencial podia continuar (TGV, Aeroporto, PPP, Novas auto-estradas, Scutt , etc.) desde que conseguíssemos varrer o lixo para debaixo do tapete, isto é, atirássemos tudo para a dívida pública, que outros pagariam mais tarde.
O pote da dívida pública encheu-se, mas a retórica ilusionista continua, quer no governo, quer nas oposições.
É preciso falar verdade, sem tacticismos partidários, delinear uma estratégia com hipóteses de sucesso tendo em conta 3 dados essenciais: o nosso atraso (e aqui incluo tudo, educação, organização judicial, organização político-administrativa – pense na máquina político-administrativa para gerir um pequeno território e apenas 10 milhões de seres –, etc. etc.); o desafio de não perder o pé na concorrência dentro da EU; o desafio de não perder o pé na concorrência da globalização.
A radiografia macro está há muito feita, os seus gráficos mostram-no, agora é SÓ preciso agir.
Temos de nos deixar de «manchar» as nossas análises de tacticismos político-partidários, como o senhor acaba por fazer (consciente ou inconscientemente), dando a ideia de que é preciso remover já o governo, porque nos levou a isto. Não é verdade, apenas agravou, e muito, um longo trajecto de decadência lenta mas persistente.
É preciso remover o governo quanto antes, mas antes temos de ter uma alternativa com um projecto estruturado e moralizador da vida pública consistente, de futuro. Mais folclore eleitoral não!
Os portugueses não são todos estúpidos, compreendem as dificuldades e os sacrifícios se estes lhes forem explicados, mas não compreendem que, ao mesmo tempo que se pedem sacrifícios duríssimos a uns, se permitam mordomias indecorosas a outros (duplas e triplas reformas acrescidas de ordenados chorudos no activo; remunerações incompreensíveis dos gestores – muito acima da média da EU - enquanto se alega que os trabalhadores não podem ter 15 euros/mês de aumento porque a economia não aguenta, só aguenta para os ordenados dos gestores; reformas conseguidas por apenas 5 ou 6 anos de serviço em determinada função, p. ex. no BdP, etc. etc.)
E até agora, sobre o essencial, nada de novo da oposição, muito menos dos putativos responsáveis pelo próximo futuro governo.
Esse é o nosso drama, excesso de diagnóstico, défice de propostas, acção tantas vezes contrária às necessidades.
Se não fosse trágico, que divertido seria termos eleições já amanhã!
Manuel Henrique Figueira

Pedro Soares Lourenço disse...

Magnifico post..., linkei e partilhei.

Anónimo disse...

Lendo este post percebemos que o que falta é mesmo uma Moção de Censura à Economia Portuguesa.

Ou então só está ali uma (meia) razão para a moção de censura de que se fala.

Anónimo disse...

Uma pergunta técnica: o que representa a dívida externa bruta, no seu livro?

- o endividamento do Estado face ao estrangeiro? Governos estrangeiros? Empresas/bancos estrangeiros? Os dois?

- o endividamento de todos os agentes económicos - estado, empresas, particulares - relativamente ao estrangeiro (e aí também, qual estrangeiro)?

Pedro Velhinho Bandeira

PS: belo post.

JAM disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Foi curioso ver ontem na TVi o Manuel Maria Carrilho a despejar os dados que contam deste post sem referir onde os foi buscar. Limitou-se a dizer pomposamente "andei a coligir uns dados", como se tivesse sido ele a fazer a pesquisa. É mesmo vaidoso, o raio do homem !

Cptos

melnik@netvisao.pt disse...

O Sr anónimo que deixou o largo comentário acima, esquece-se de uma coisa (como muita boa gente, aqui pelo burgo), é que um dos principios basilares da democracia é a nossa possibilidade de mandar o governo embora, mesmo quando temos dúvidas... e nunca será por isso que irá cair o carmo e a trindade (veja-se o caso da Bélgica). Não o fazer, porque devemos esperar que surja o perfeito líder, põe em causa a democracia (é o que nos está a acontecer - temos as mesmas caras, ao logo dos últimos 30 anos) além de que o "perfeito líder" não existe! Este senhor anónimo é um espelho do velho do restelo, e um carrasco da esperança que sempre renasce em cada processo de mudança (ou então é monárquico!).

Anónimo disse...

Sr. ou sra. Melnik?:
Eu não sou anónimo, assino sempre por baixo tudo o que escrevo.
Para além de parecer padecer de míopia (o meu nome é bem grande para não ser visto) parece ter também graves problemas de compreensão, pois não percebeu patavina do que leu.
Infelizmente há gente de mais assim, por isso também é que estamos como estamos.
Manuel Henrique Figueira

Milan Kem-Dera disse...

Ao Álvaro Santos Pereira

Os meus parabéns pelo excelente post, cujos gráficos (e nada como os gráficos construídos sobre os dados verdadeiros, não os viciados dos políticos) são uma verdadeira radiografia histórica do Portugal económico e social do último século (às vezes mais)!

Gostei, linquei e postei sobre os seus dados:

( http://insustentavelbelezadosseres.blogspot.com/2011/02/monumental-obra-do-partido-socialista-e.html )

Ao Manuel Henrique Figueira

Gostei da sua análise; todavia, e quanto ao que nele é discordante, devo dizer-lhe que, perante o estado a que tudo isto chegou, eu já digo como Deng Xiao Ping (quando começou a liberalizar a economia na China) - «desde que cace os ratos, não importa se o gato é branco ou preto»...

Milan Kem-Dera disse...

...porque, apesar de a crise já vir de trás, tivesse este país em 2005 um primeiro-ministro inteligente e sério, isento de amiguismos e não prostiuído ao compadrio e à chulice da facção do partido que o sustenta, e não estaríamos agora na situação de ruptura e de falência.

Em 2005, outro que não José Sócrates teria ido ainda a tempo de evitar a hecatombe. Daí que se apresente tão urgente a necessidade de derrubar este governo, antes que ele consiga fazer ainda pior.

E acredite, apesar de já quase nada estar de pé, este governo irá conseguir destruir ainda mais! Não irá ficar pedra sobre pedra!
Simplesmente porque, tanto o governo como este primeiro ministro e o partido que o sustenta (e é por ele também sustentado), só sabem fazer uma única coisa: -DESTRUIR e DISTRIBUIR TACHOS AOS AMIGOS. E aos amigos dos amigos. E aos familiares dos amigos. Numa palavra, a toda a "famiglia"!

Manuel Henrique Figueira disse...

Mila Kem-Dera,
Estamos de acordo, o meu ponto não é esse.
Quando mudamos (e ainda bem que podemos mudar) é para ficarmos melhor. Para pior ou para igual não vale a pena a mudança.
O processo de mudança tem custos financeiros, económicos, sociais e políticos: se é para o mesmo ou para pior, não, embora estejamos muito mal assim.
Até agora nada me anima no que vejo como alternativa.
É só isto e nada mais.
Manuel Henrique Figueira

Anónimo disse...

Bom, os gráficos são um bocado estranhos porque não acertam com os dados que se conhecem, como por exemplo os da PORDATA (http://www.pordata.pt/).
Algumas dos cinco pontos não parecem correctos e, de uma forma geral, reflectem tendências que já existiam nos governos de Durão Barroso e Santana Lopes.
Por exemplo, a divergência com a Europa (ponto 5) começou com Durão Barroso.

Mas o mais grave é outra coisa, o mais grave é muito pouco disto ser culpa de Sócrates (ou Durão Barroso).

O buraco em quer estamos deve-se principalmente a termos aderido ao Euro como muitas na altura previram e ninguém ligou.

Alvaro Santos Pereira disse...

Caro O Raio,

Quais são os dados que fala? Quais são os dados que acha estranhos?
Todos os dados utilizados neste post são provenientes de entidades como o Banco de Portugal, do Eurostat, da OCDE, do INE, e os dados dos Labor Surveys de vários países (os dados da emigração).

Obrigado

Alvaro

Anónimo disse...

No ponto 5) refere o PIB pc em % em relação ao PIB pc dos países avançados da Europa. Ora, esse valor encontra-se em máximos. Não será isso positivo? Ou estou a ver mal?

Cumps

Mentiroso disse...

Por muito mérito que este artigo possa ter, os gráficos estão errados ou viciados. Não vou perder tempo em grandes demonstrações, como um dos comentadores. Basta-me uma. refiro-me ao gráfico intitulado «A média do crescimento económico é a pior dos últimos 90 anos»

Toda a gente sabe que logo após a implantação da república pela Carbonária, que se seguiu aos seus assassinatos. Este gráfico demonstra uma subida de produção, o contrário do que a história nos relata.
Depois mostra uma grande queda de 1925 a 1937, quando se passou exactamente de modo inverso.

Ap+os isto, nem quis perder tempo lendo um artigo, talvezx verdadeiro mas baseado nestes tremendos erros ou mentiras.

Os outros gr'aficos não podem ter credibilidade devido aos anos serem completamente ilegíveis. Assim sendo, não passam de «linhas na algibeira», absolutamente impossíveis de verificar e não ilustrando nada.

Anónimo disse...

Caro Alvaro Santos Pereira
Para alem do excelente trabalho de campo, o que mais aprecio neste seu post e a frontalidade, o descomplexo e a independencia desta analise da evoluçao macro-economica de Portugal.
O que apresenta sao factos nao sao opinioes.
O que nos pode surpreender e indignar e a desfaçatez daqueles que apesar de verem a realidade nua e crua, por razoes que nos facilmente advinhamos, tentam distorcer essa mesma realidade.
Manuel de Castro

Anónimo disse...

Li,gostei e concordo plenamente.Não sou nem nunca fui político.Só voto nas alturas próprias.
Mas não vale a pena indicar,SEGURAMENTE, as causas da crise.O povo quere e vai mesmo para o fundo.