20 abril 2009

COMENTÁRIOS AO "MEDO DO INSUCESSO" (2)

Comentários de José Batalha, dirigente de uma cooperativa de habitação e estudante universítário, ao Medo do Insucesso, seguido das minhas respostas:
"Sou um "jovem" estudante universitário de 55 anos de idade, que entrou na Universidade ao abrigo do programa para maiores de 23 anos, por não ter concluído ensino secundário em devido tempo,mas espero concluir a licenciatura em Turismo este ano. Nada sei de economia embora goste muito do tema. Li o seu livro "Os mitos da economia portuguesa" e gostei muito.
Acabei agora de ler "O medo do insucesso nacional" e não resisti a fazer alguns comentários.
Genericamente concordo consigo.
Não me parece que venha grande mal ao mundo se o défice orçamental, pontualmente, exceder os 3% do PIB (este ano provavelmente será perto do dobro), principalmente se a sua origem se dever a investimentos claramente reprodutivos. Já tenho grande relutância relativamente a défices (qualquer que seja a sua dimensão) devidos a maus investimentos e a uma Administração Pública gorda e ineficaz. Por outro lado, quando esses défices se prolongam continuamente por mais de 30 anos, não vejo como os encargos com a dívida pública que originam não se tornem um fardo insuportável. Isto partindo do princípio que será possível continuar a financiá-los, pois como sabemos o dinheiro está a ficar cada vez mais escasso e mais caro.
Não tenho qualquer dúvida em que temos de apostar numa Educação a sério, mesmo que isso, no curto prazo, leve a um aumento de chumbos por falta de preparação de base e, quiçá, a um aumento do abandono escolar. Fiquei contente em saber que os seus filhos andam numa escola boa pública, mas fiquei com uma dúvida. Essa escola é em Coimbra ou em Vancouver?
Também estou contra a construção do TGV e acho que as pessoas que têm algum acesso aos Media deviam lançar uma petição na Internet contra este projecto ou até apelar a que nas próximas eleições se anule o voto escrevendo no boletim "Não ao TGV", mas temo que já seja demasiado tarde para o parar.
Também sou favorável, numa situação normal, a impostos tão baixos quanto possível, mas na actual situação tenho dúvidas que a baixa dos impostos se traduzisse por um acréscimo de consumo ou de investimento. Penso que neste momento o investimento público pode dar resultados mais rapidamente, desde que sejam investimentos criteriosos e não TGVs e auto-estradas supérfluas. Infelizmente ainda não vi por parte das oposições alternativas credíveis.
Também concordo que são precisas medidas radicais e audaciosas para combater a desertificação do interior do país (e não é a regionalização que resolverá o problema) mas estamos a entrar num círculo vicioso (não há pessoas porque não há empregos mas também não há empregos porque não há pessoas) de que será difícil sair.
Não sou um pessimista militante e sei que o país não irá fechar, mas tenho alguma dificuldade em já ver a Primavera só pelo facto de termos algumas (poucas) andorinhas. Termino desejando que em breve possa estar numa Universidade portuguesa, ajudando a mudar este país."
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Obrigado José Batalha. Antes de mais, parabéns por ter decidido voltar a estudar. Acho que tomou a decisão acertada, que certamente trará não só benefícios pessoais, mas também colectivos. Alguns dos meus melhores alunos foram os chamados "mature students" e é bom saber que há cada vez mais portugueses a seguir o caminho de uma maior escolarização. Em relação aos seus comentários, aqui vão as minhas respostas:
1) défice orçamental. Concordo plenamente. Apesar de ser contra o fundamentalismo do défice orçamental que vigorou nos últimos anos, sou plenamente a favor da introdução de legislação que obrigue os governos a atingirem o equilíbrio orçamental ao longo do ciclo político. As consequências das irresponsabilidades orçamentais estão bem à vista de todos e não é aceitável que nos últimos 35 anos não tivemos um ano sequer de equilíbrio orçamental A consequência é exactamente essa: mais impostos.
2) Sou, de facto, um adepto da escola pública, quando é possível, isto é, quando há qualidade. Porém, não sou um fundamentalista sobre o assunto. Se não houver qualidade, no ensino público, acho que os pais devem procurar outras alternativas, se de todo for possível. Acho que deve haver mais escolha e que a concorrência é boa para todos, para o ensino privado e público. Os meus filhos andam numa escola pública em Vancouver, porque é aqui que moro. Se estivesse em Coimbra (onde moro quando estou em Portugal), os meus filhos estaria na escola pública perto da minha casa.
3) TGV. Concordo consigo. E, sinceramente, espero que ainda não seja tarde de mais...
4) Pessimismo e regresso. Sei bem que é muito fácil criticar quando se está de fora. E sei que é mais fácil ser menos pessimista por não estar a viver em Portugal actualmente. Também acho que é mais que natural que os portugueses estejam descrentes. A crise já se prolonga há uma década e ainda não se vislumbra a luz ao fundo do túnel. O que fazer? O primeiro passo tem que ser mudar algumas das políticas do país. Temos que apostar numa verdadeira política de competitividade e apostar em políticas que melhorem os nossos sistemas de incentivos. Quanto ao meu possível regresso, como disse nas últimas páginas do "Mitos da Economia Portuguesa", eu tenciono voltar pois acredito no futuro do país. Se não acreditasse, não equacionaria um regresso, pois tal decisão iria afectar negativamente o futuro dos meus filhos. Por isso, quando surgir uma oportunidade concreta e realista, eu volto a Portugal. Obrigado.

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