16 abril 2009

PARTIDOS E INFLAÇÃO

Voltando à comparação do desempenho das principais variáveis macroeconómicas de acordo com o partido que está no poder, é interessante verificar o que se passa em relação às taxas de inflação. Se tivessemos uma divisão ideológica muito marcante entre os partidos do bloco central (os partidos tradicionalmente de poder em Portugal), seria tentador concluir que os governos do PS tenderiam a privilegiar o combate ao desemprego em vez da inflação. Por outro lado, se o PSD fosse um partido de direita clássico, certamente que a estabilidade macroeconómica (e, assim, uma taxa baixa de inflação) deveria ser um dos objectivos dos seus governos. Porém, quando olhamos para os números, a história da jovem democracia portuguesa não nos dizem isso. Com efeito, os governos maioritários do PS batem aos pontos os governos do PSD em relação à inflação: os períodos de governação socialista têm uma inflação média de 6,1%, enquanto que os períodos de governação social-democrata têm uma inflação média de 9,3% (ver tabela ao fundo. do texto). O que é que quer isto dizer? Que o PS se preocupa mais com a inflação do que o PSD? Não necessariamente. A verdade é que o período em que o PS governou sozinho durante mais tempo (1995-2001) e (2005-2009) foram períodos em que a economia portuguesa se preparou para entrar no euro. Ora, uma das condições para o fazer era a convergência das taxas de inflação com os países menos inflacionistas da União. Como foram os governos do PS que conduziram esse processo, é natural que os números espelhem esse facto. Isto não quer dizer que, obviamente, não haja mérito desses governos, simplesmente que não sabemos se os governos do PS (e o Banco de Portugal) teriam dado preponderância à inflação se a adesão ao euro não
Uma história ligeiramente diferente são os governos de coligação. O PS coligado tem um registo inflacionário muito superior aos governos do PSD coligado. Mais uma vez, talvez isso se deva à época em particular em que estas coligações aconteceram, mas vale a pena sublinhar este facto.
Um último ponto, eu concordo com este comentário do Portugal Azevedo que este tipo de análises são demasiado simplistas e um pouco redutoras, até porque os governos do PS dos anos 1980 têm pouco a ver com os governos actuais (e do PSD também). Porém, mesmo que seja uma mera curiosidade, penso que vale sempre a pena fazer estas comparações, nem que não seja para percebermos um pouco mais da nossa história política recente. Amanhã, falo nos défices.
Taxa de inflação média por partido ou coligação desde 1976:

PS

6.1%

PS coligado

24.1%

PSD

9.3%

PSD coligado

13.4%

3 comentários:

Rui Fonseca disse...

"Porém, mesmo que seja uma mera curiosidade, penso que vale sempre a pena fazer estas comparações, nem que não seja para percebermos um pouco mais da nossa história política recente."

Não há contradição na afirmação? Afinal se da comparação não resulta qualquer conclusão, da comparação pode resultar confusão.

E então perceberemos menos da nossa história política recente.

Ou não?

Rita R. Carreira disse...

A análise vale sempre a pena. Obviamente a democracia portuguesa sendo recente, não nos deixa ter uma confiança muito grande nos resultados. Mas vale a pena as pessoas serem expostas a este tipo de análise.

Falta apenas mencionar que no curto prazo pode-se trocar inflação por desemprego, a chamada curva de Phillips.

Há vários economistas que mencionam está análise feita para a economia americana. O mais famoso deles será o Paul Krugman.

Rolando Almeida disse...

Olá Àlvaro,
O último número da revista Visão inclui um artigo + entrevista a um economista, Vítor Bento, que acabou de lançar um livro sobre a economia nacional, Perceber a Crise para Encontrar o Caminho, Bnomics (2009). Não li o livro, mas segundo parece na entrevista a forte medida que este economista defende é a redução salarial para recuperação futura da economia portuguesa. Ora este argumento parece chocar com um teu argumento que defende precisamente o contrário, que o aumento salarial é um dos factores de aumento da produtividade. É verdade que só estou a avaliar pela entrevista do autor, mas pensei de imediato a quem se refere o autor, ou a que classes sociais propõe ele que se deva reduzir os salários? Segundo parece a proposta é radical: deve-se haver redução salarial a todas as classes. Acontece que para os nossos padrões economicos de vida é quase impossível reduzir os salários mais baixos, já de si tão baixos. Por outro lado, o autor faz referência ao aumento de salários nos últimos anos em Portugal que estatisticamente é muito maior que o da média europeia. Acontece que há uns anos tínhamos salários muito mais baixos que a média europeia, pelo que este aumento algo rápido pode fazer todo o sentido.
Estes argumentos lançam algumas achegas interessantes de discussão e o que te proponho é, se tiveres acesso à revista Visão e se tiveres oportunidade de ler a entrevista, que desses o teu parecer de modo a esclarecer melhor os leitores. Que te parece? Creio que a cada leitor caberá o veredicto final. Acontece que quando queremos pensar a economia escapa ao leitor comum as ferramentas que vocês, economistas, dominam e que na maior parte das vezes alteram substancialmente a verdade ou falsidade das premissas dos argumentos.
Agradeço antecipadamente a tua disponibilidade e fica aqui registada a minha sugestão.
abraço