11 abril 2009

JUROS ZERO

O João Madeira do semanário SOL perguntou a alguns analistas sobre as consequências de uma taxa de juro zero na Eurolândia. O DN também me perguntou sobre os prós e contras dos juros zero. Aqui estão as minhas respostas.
SOL_ Quais seriam as consequências de atingir-se, na zona Euro, uma taxa de juro zero (ou um valor muito próximo)?
Antes de mais, penso que, se tal acontecesse, seria mau sinal, pois significaria que a situação económica se tinha agravado ainda mais. A principal consequência de uma taxa de juro zero seria uma grande perda de eficácia da política monetária. O BCE poderia ainda aumentar a liquidez na economia, mas, obviamente, não poderia mais baixar os juros para tentar ajudar a economia. Há até quem defenda a ideia que uma taxa de juro zero conduziria à chamada armadilha da liquidez, em que a política monetária se tornaria completamente ineficaz.
SOL- Que condições económicas teriam de ser observadas para que tal acontecesse?
Penso que o BCE só decidirá baixar as taxas de juros para valores próximos do zero se as condições económicas se deteriorarem ainda mais. No entanto, a descida dos juros da última semana revelou um BCE mais cauteloso do que os analistas estavam à espera. Por isso, não me parece descabido assumir que o BCE prefira manter alguma margem de manobra do que baixar os juros já para níveis próximos do zero nos tempos mais próximos.
~
SOL _ Que riscos comporta esta política? Quais as vantagens?
Vantagens:
Taxas de juros mais baixas ajudam as famílias, as empresas e os investidores. Para a economia portuguesa, a contínua descida das taxas de juros é uma óptima notícia para as famílias e para as empresas, principalmente as mais endividadas. As prestações das casas ficam mais baratas (se as taxas de juros dos empréstimos forem variáveis), as prestações dos cartões de crédito e dos empréstimos ao consumo também baixam. Por isso, o rendimento disponível das famílias aumenta. O mesmo se passa com os empréstimos contraídos pelas empresas. Isto é, de certa forma, uma baixa tão pronunciada das taxas de juros (como a que temos tido nos últimos meses) tem um efeito semelhante ao de um choque fiscal. Este efeito é de saudar, principalmente numa altura em que tantas famílias e empresas passam dificuldades e em que o desemprego ameaça aumentar ainda mais.
Porém, o elevado nível de sobreendividamento pode trazer um efeito perverso não desejado pelas autoridades económicas: esta é uma altura ideal para abater o elevado nível da dívida dos particulares e das empresas, e, por isso, se estes decidirem pagar as dívidas em vez de gastarem o rendimento disponível adicional, o impacto da descida dos juros na economia será muito reduzido. Ou seja, a política monetária é pouco eficaz nestas condições (tanto na Europa como em Portugal).
Riscos:
Primeiro, se as taxas de juros nominais estiverem próximo de zero, existirá pouca margem de manobra por parte da política monetária para estimular a economia. Isto é, se a situação económica se deteriorar ainda mais ou se o PIB permanecer estagnado durante demasiado tempo, as autoridades monetárias pouco poderão fazer para auxiliar a economia. Se as taxas tiverem perto de zero, poderemos cair na chamada armadilha da liquidez, uma situação onde a política monetária é completamente ineficaz. Isto é, as autoridades monetárias podem tentar aumentar a quantidade de moeda na economia, mas os agentes económicos preferem guardar ou poupar a maior quantidade de moeda disponível em vez de a gastar. Alguns economistas, como Paul Krugman, defendem que foi isso que aconteceu no Japão nos anos 90 e que está a acontecer actualmente nos Estados Unidos. Outro grande contra das taxas de juro estarem próximas de zero é que não há incentivos à poupança. Em Portugal, as taxas de poupança têm baixado muito nos últimos anos, o que nos tem feito fazer recorrer ao estrangeiro para financiar as nossas necessidades de financiamento. Taxas de juros ainda mais baixas certamente que não fornecem os incentivos necessários para que esta situação se inverta.
SOL- Nas condições actuais, faz sentido ou não adoptá-la na Europa? Porquê?
Penso que ainda não faz sentido. Baixar os juros um pouco mais talvez ainda se justifique, mas juros zero provavelmente não. As taxas já estão historicamente baixas e não me parece que baixá-las para zero seja uma receita mágica para os problemas da economia europeia. Talvez seja melhor manter alguma margem de manobra na política monetária, que poderá ser importante se a situação económica se agravar. Não digo que, no futuro, não possa fazer sentido adoptar juros zero, mas, por enquanto, não faz.

Sem comentários: