Numa altura em que se fala muito das dificuldades que o Estado está a sentir para se financiar, o crescimento explosivo da nossa dívida pública continua a não incluir importantes rubricas, tais como o endividamento de todas as empresas públicas e das parcerias público-privadas. Há, provavelmente, ainda inúmeras dívidas que poderão não estar devidamente contabilizadas e/ou orçamentadas, de modo que a dívida pública real poderá ser ainda mais elevada do que dívida pública oficial (que já é a maior dos últimos 160 anos). Porém, as dívidas do Estados e dos organismos públicos não ficam por aqui. Há ainda as dívidas que transitam para anos posteriores, bem como as dívidas aos fornecedores. E aqui, mais uma vez, as notícias não são muito animadoras, assim como o i refere na sua edição de hoje.
Nomeadamente, se atentarmos para os dados da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças, facilmente percebemos que o prazo médio de pagamentos aos fornecedores das empresas públicas tem vindo a aumentar muito nos últimos tempos.
Assim, e como podemos ver nas tabelas abaixo (a primeira é das unidades de saúde e a segunda é das restantes empresas públicas), os prazos médios de pagamento a fornecedores cresceu muito entre 2009 e 2010. Nas unidades de saúde, 15 hospitais e centros de saúde têm prazos médios de pagamentos aos fornecedores acima dos 250 dias. Entre estes, destacam-se o Centro Hospitalar do Nordeste e o Hospital Litoral Alentejano, que têm prazos médios de pagamentos aos fornecedores de mais de 400 dias. Os centros hospitalares de Coimbra e de Setúbal, bem como o Hospital Infante D. Pedro, apresentam prazos médios de pagamentos de mais de 340 dias.
É igualmente visível que os prazos de pagamentos aumentaram muito no último ano. Mais concretamente, os prazos dos pagamentos das unidades de saúde aumentaram cerca de 80 dias no último ano. Como é evidente, nada disto entra para as contabilidades dos défices de 2010, nem para as dívidas bancárias destas empresas públicas.
Prazo Médio de Pagamentos a Fornecedores (dias)
2009 | 2010 | Variação entre 2009 e 2010 | |
Centro Hospital Nordeste | 253 | 462 | 209 |
Hospital Litoral Alentejano | 226 | 415 | 189 |
Centro Hospitalar de Setúbal | 183 | 360 | 177 |
Centro Hospitalar de Coimbra | 219 | 344 | 125 |
Hospital Infante D. Pedro | 189 | 341 | 152 |
Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental | 178 | 329 | 151 |
Centro Hospitalar Médio Tejo | 178 | 308 | 130 |
Hospital Figueira da Foz | 162 | 299 | 137 |
Hospital Garcia da Horta | 133 | 295 | 162 |
Centro Hospitalar Lisboa Central | 190 | 292 | 102 |
Centro Hospitalar da Póvoa do Varzim | 233 | 287 | 54 |
Centro Hospitalar do Barlavento Algarvio | 182 | 268 | 86 |
Centro Hospitalar Hospital Norte | 137 | 263 | 126 |
ULS Castelo Branco | 191 | 262 | 71 |
Hospital Santarém | 153 | 252 | 99 |
Centro Hospitalar Médio Ave | 125 | 245 | 120 |
Centro Hospitalar do Barreiro Montijo | 150 | 242 | 92 |
Hospital de Faro | 160 | 236 | 76 |
Centro Hospitalar do Porto | 104 | 204 | 100 |
ULS Guarda | 117 | 204 | 87 |
ULS Baixo Alentejo | 110 | 203 | 93 |
Hospital S. Maria Maior | 175 | 203 | 28 |
Hospital de São João | 93 | 202 | 109 |
Centro Hospitalar da Cova da Beira | 119 | 201 | 82 |
Centro Hospitalar Alto Ave | 76 | 196 | 120 |
Hospitais da Universidade Coimbra | 115 | 193 | 78 |
Hospital Curry Cabral | 113 | 182 | 69 |
ULS Matosinhos | 127 | 174 | 47 |
ULS Norte Alentejano | 119 | 156 | 37 |
Hospital Espírito Santo | 123 | 156 | 33 |
Centro Hospitalar de V. Nova Gaia/Espinho | 111 | 154 | 43 |
ULS Alto Minho | 110 | 150 | 40 |
Hospital Fernando da Fonseca | 77 | 146 | 69 |
IPO Porto | 63 | 107 | 44 |
Hospital S. Teotónio | 103 | 84 | -19 |
IPO Lisboa | 68 | 81 | 13 |
Centro Hospital Tâmega e Sousa | 71 | 69 | -2 |
Centro Hospital Trás-os-Montes | 62 | 64 | 2 |
Hospital Magalhães Lemos | 38 | 60 | 22 |
IPO Coimbra | 54 | 54 | 0 |
Hospital de Santo André | 32 | 36 | 4 |
Centro Hospital Nordeste Entre Douro e Vouga | 63 | 33 | -30 |
Fonte: DGTF
Em relação às restantes empresas públicas, o panorama não assim tão preocupante, mas não é propriamente muito animador. Por um lado, é certo o prazo médio de pagamentos das restantes empresas públicas só aumentou, em média, cerca de 3,5 dias entre 2009 e 2010. No entanto, várias empresas registaram um aumento significativo dos pagamentos das suas dívidas. Assim, o prazo de pagamentos do Metro do Porto subiu 76 dias, da Empresa do Alqueva 55 dias, do Metro de Lisboa 50 dias, e da RAVE 39 dias. Mais positivamente, o prazo dos pagamentos de muitas empresas públicas melhorou no último ano.
Moral da história: o crescimento abrupto do prazo de pagamentos de muitas empresas públicas é bastante preocupante e adiciona-se (e é causada pela) à já muito elevada dívida das empresas públicas. Esta é uma espécie de dívida "escondida", que poderá indiciar problemas financeiros ainda mais graves para o sector empresarial do Estado, incluindo as diversas empresas transportadoras.
Ainda mais alarmante é a extraordinária subida dos prazos de pagamentos das dívidas das unidades de saúde. Dívidas que, infelizmente, terão de ser liquidadas e, mais cedo ou mais tarde, contabilizadas.
Prazo Médio de Pagamentos a Fornecedores (dias)
2009 | 2010 | Variação entre 2009 e 2010 | |
Metro do Porto | 90 | 166 | 76 |
EDIA-Empresa Desenv.Infraest Alqueva | 74 | 129 | 55 |
Metro-Metropolitano de Lisboa | 65 | 115 | 50 |
Rave _ Alta Velocidade | 70 | 109 | 39 |
Metro do Mondego | 93 | 100 | 7 |
APL-Admin. Porto Lisboa | 75 | 78 | 3 |
TRANSTEJO | 47 | 72 | 25 |
Teatro Nacional São João | 60 | 62 | 2 |
ENATUR-Empresa nacional de turismo | 54 | 61 | 7 |
Parque Escolar | 58 | 61 | 3 |
REFER | 50 | 61 | 11 |
CP | 70 | 60 | -10 |
Águas de Portugal | 107 | 60 | -47 |
NAV | 48 | 60 | 12 |
OPART | 37 | 58 | 21 |
ANA | 58 | 57 | -1 |
STCP | 77 | 55 | -22 |
SIMAB-Soc.Inst.Mercados Abastecedores | 72 | 53 | -19 |
EMA | 20 | 50 | 30 |
Parque expo 98 | 49 | 49 | 0 |
Carris | 44 | 48 | 4 |
SIEV,SA | 9 | 48 | 39 |
Teatro Nacional St Maria | 43 | 45 | 2 |
Parpública | 22 | 45 | 23 |
Docapesca-Portos | 70 | 44 | -26 |
RTP | 71 | 42 | -29 |
Empordef | 25 | 40 | 15 |
CTT | 45 | 39 | -6 |
APL-Admin. Porto Setúbal | 51 | 38 | -13 |
APL-Admin. Porto Sinesl | 39 | 37 | -2 |
NAER-Novo | 45 | 36 | -9 |
ANAM-Aeroportos | 31 | 34 | 3 |
APA | 52 | 32 | -20 |
ANCP | 33 | 31 | -2 |
AICEP-Agência | 37 | 31 | -6 |
EP | 28 | 26 | -2 |
GeRAP | 36 | 20 | -16 |
APDL-Admin. Porto Leixões | 56 | 19 | -37 |
Lusa | 12 | 19 | 7 |
EDM | 24 | 17 | -7 |
EDAB | 13 | 2 | -11 |
EGREP | 0 | 0 | 0 |
4 comentários:
Quem me deve que pague; a quem eu devo que espere.
São formas criativas de o Estado impulsionar a economia.
O senhor tem feito um trabalho notavél. Face parte de um partido politíco porque o PAíS precisa de si. O seu contributo só assim poderá ter mais utilidade.
Já agora gostava que também indicasse a tabela relativa a ANTES deste Primeiro Ministro tomar posse em 2004.... Vai ver que o prazo médio de pagamentos do Estado não se media em dias mas sim em ANOS. E o que tem ou não que se contabilizar como défice ou dívida não é o que o senhor ou eu ou o senso comum diz que se devem contabilizar. O que se contabiliza, aqui ou no resto da Europa são o que as regras da comunidade europeia dizem que se deve contabilizar e o que fica de fora é o que eles dizem que deve ou pode ficar de fora. Haver regras claras é a única forma de, quer se trate da contabilidade de Estados quer se trate da contabilidade de empresas privadas as coisas serem comparáveis e se poder dizer que o a despesa, o défice ou qualquer número de um País é x em comparação com o de outro país que é y. Os números, como o meu Professor de Macro-economia sempre dizia dizem o que queremos que eles digam....
Se os números antes de 2004 eram muito piores, era interessante para o post, valia a pena colocar aqui um link com a informação.
"O que se contabiliza, aqui ou no resto da Europa são o que as regras da comunidade europeia dizem que se deve contabilizar e o que fica de fora é o que eles dizem que deve ou pode ficar de fora."
Isto é como dizer, não interessa saber que dívida real é que temos, o que interessa é esconder tudo o que pudermos e apenas mostrar aquilo que nos pedem. Bem, isso é o que temos feito.
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