31 janeiro 2011

REPTO AO GOVERNO _ AUDITORIA EXTERNA DAS CONTAS PÚBLICAS

Se o FMI acha mesmo que existe um problema de imagem das nossas contas públicas, o governo tem a obrigação de mostrar inequivocamente que as mesmas finanças públicas estão acima de qualquer suspeita ou de interpretações menos cuidadas. Por isso, nada melhor do que, de uma vez por todas, desfazer as dúvidas que podem subsistir sobre esta matéria por parte dos nossos parceiros europeus, dos mercados financeiros e das instituições internacionais. Como? Sendo transparente e não tendo receio de abrir as contas do Estado aos olhos do mundo. Neste sentido, e face à desconfiança internacional (e dos inúmeros avisos do Tribunal de Contas e da UTAO ao longo dos últimos anos), vale a pena fazer um repto ao governo: se as contas públicas são mesmo de confiar e não ocultam nenhum buraco orçamental, então por que não deixar que uma entidade idónea e independente, como o FMI ou a OCDE, faça uma auditoria exaustiva das nossas contas públicas? Se as contas públicas nacionais são mesmo credíveis e exemplares, por que não mostrar de uma vez por todas que todas as desconfianças e a "má imagem" das finanças do nosso Estado são completamente despropositadas?
É que quem não deve não teme. Assim, se uma auditoria externa confirmar que tudo está bem (isto é, que não existem dívidas ocultas ou buracos orçamentais desconhecidos), todos ganharemos, pois a credibilidade do país aumentará, os mercados financeiros ficarão mais serenos, e o governo fica com um argumento de peso para se poder manter em exercício até final do seu mandato. Por isso, não temos nada a perder com a dita auditoria externa das contas públicas. Bem pelo contrário. Muito menos o governo, que só tem a ganhar com a maior transparência e maior credibilidade que essa mesma auditoria externa proporcionaria às nossas finanças públicas. 
Está assim nas mãos do governo mostrar que os críticos estão errados e que todas as suspeitas e desconfianças em relação às nossas contas públicas são inteiramente injustificadas.

BANCOS NACIONAIS

Os nossos bancos continuam a merecer a atenção dos media internacionais. Agora foi a vez do Financial Times.

PAÍS DOURADO

Sabia que Portugal está no top 15 dos países do mundo com as maiores reservas de ouro? Pois, é verdade. Segundo o World Gold Council, em 2010, Portugal era o 12º país do mundo com as maiores reservas de ouro. Nada mais, nada menos do que 382,5 toneladas nos cofres do Banco de Portugal. Um dos legados do Estado Novo que um dia ainda nos pode vir a ser muito útil.

FORECLOSURES

A bolha imobiliária americana continua a provocar estragos consideráveis. Só no último ano registou-se um aumento de 72% do crédito imobiliário malparado nas maiores cidades do país. Em Las Vegas, 1 em cada 9 casas está em "foreclosure" (isto é, os seus donos não conseguem pagar as casas e "entregam-nas" ao banco), em Miami e em Phoenix 1 em 14 casas está na mesma situação. Para quem está interessado(a), agora é possível visualizar as casas em "foreclosure" por zona metropolitana através do Google. 
Aqui estão alguns exemplos (as casas a vermelho são as foreclosures): 
Miami 
Las Vegas

30 janeiro 2011

LaVETTE

Uma interpretação magistral de Bettye LaVette de "Love Reign O'er Me", um original dos The Who. Um tema incluído no álbum "Interpretations: The British Rock Songbook".

A LIBERDADE ESTÁ A PASSAR POR ALI


Ao ver o que se está a passar na Tunísia e no Egipto, em que as populações se insurgem contra os autocratas que os governam, não consigo de sentir uma espécie de deja vu. Um bonito deja vu. Há 20 anos atrás, foram as ditaduras da Europa de Leste que caíram uma a uma como num baralho de cartas. Será que estamos a assistir um movimento semelhante no mundo árabe? Esperemos que sim.

28 janeiro 2011

A CRISE DE 2008 E A DÍVIDA EXTERNA

É frequente ouvirmos os membros do governo afirmar que as dificuldades actuais foram causadas pela crise financeira internacional de 2008, a crise internacional mais grave dos últimos 80 anos. É óbvio que este argumento tem um fundo de verdade, como já aqui vimos variadíssimas vezes. No entanto, também é verdade que este argumento constitui só parte da história. A outra parte é que os desequilíbrios (internos e externos) da economia nacional já se vinham a fazer sentir há algum tempo. Mais concretamente, há pelo menos uma década.
O sintoma mais evidente destes crescentes desequilíbrios é-nos dado pela evolução da nossa dívida externa, que cresceu a ritmos pouco sustentáveis desde os meados dos anos 1990 e não somente a partir de 2008. Para percebermos porquê, vale a pena olharmos com um pouco de mais atenção para o rácio entre a dívida externa bruta e o PIB (recorde-se que os valores totais da dívida externa bruta já aqui foram analisados). Neste sentido, o gráfico 1 utiliza dados trimestrais para podermos observar a evolução deste rácio desde Janeiro de 1999 até o final de Setembro de 2010 (a que correspondem os dados mais recentes). É perfeitamente visível que a dívida externa bruta portuguesa em percentagem do PIB já tinha vindo a crescer desde os anos 1990, bem antes de 2008, portanto da crise internacional. 

Gráfico 1 _Rácio dívida externa bruta/PIB, 1999-Setembro 2010, por trimestre
Fonte: calculado dos dados do Banco de Portugal, Santos Pereira (2011)

No entanto, se persistirem ainda dúvidas, vale a pena calcular o aumento do rácio entre a dívida externa bruta e o PIB antes e depois da crise financeira internacional ter eclodido (isto é, entre 1999 e o terceiro trimestre de 2008, e entre o último trimestre de 2008 e 2010). É isso que é feito no gráfico 2, que mostra muito claramente que o grande crescimento do rácio dívida externa bruta-PIB antecedeu a crise de 2008 e não depois.

Gráfico 2 _ Dívida externa bruta-PIB antes e depois da crise de 2008

E mesmo se tomarmos em linha de conta a média de crescimento por trimestre da dívida externa bruta ponderada pelo PIB, chegamos também à mesma conclusão: a dívida externa bruta já estava em franca expansão bem antes de 2008. Aliás, o rácio da dívida externa bruta e o PIB até cresceu mais rapidamente antes de 2008 do que no período posterior. Mais concretamente, entre 1999 e o terceiro trimestre de 2008, o rácio entre a dívida externa bruta e o PIB cresceu à módica taxa de 2,9% por trimestre. Porém,  depois de 2008, este crescimento foi "somente" de 1,8% por trimeste. Ou seja, mais uma vez, não foi a crise internacional que deu azo aos nossos desequilíbrios externos. Estes estavam bem presentes e a crescer a um ritmo elevado bem antes de 2008. O que a crise fez foi agravar estes desequilíbrios e expor as nossas dificuldades perante os nossos parceiros europeus e os mercados internacionais.
Já agora, vale a pena olhar para um último gráfico, que nos dá uma média móvel (de 4 trimestres) do crescimento trimestral da dívida externa bruta/PIB desde 1999. Como podemos ver, o período quando a dívida externa bruta mais cresceu em relação ao PIB foi no final dos anos 1990 e nos primeiros anos do novo século, e não após 2008. Afirmar o contrário é simplesmente falso. A verdade é que os desequilíbrios externos da economia nacional não são recentes e não foram originados pela crise de 2008. Bem longe disso. E se é assim, por que é que os nossos governantes insistem em afirmar o contrário? Porque a verdade é que não houve nem vontade nem capacidade política para resolver este grave problema. Um problema que, mais  cedo ou mais tarde, terá de ser atacado, de uma maneira ou de outra.

Gráfico 3 _ Taxa de crescimento trimestral do rácio dívida externa bruta-PIB, 1999-2010



Fonte:SantosPereira(2011)

UM SÓ COMPRADOR

Mais um artigo do Financial Times sobre a dívida soberana portuguesa a alertar para as dificuldades que iremos enfrentar nas próximas semanas. Como afirma um analista:
“There is only one serious buyer of Portuguese debt in the secondary markets and that is the ECB. This could pose problems when Lisbon comes back to the market.”

PALAVRAS SENSATAS (3)

Três posts excelentes de Vítor Bento sobre a subida dos juros da dívida soberana, os especuladores e os mercados, e o "FMI".

REESTRUTURAÇÃO OU NÃO, EIS A QUESTÃO (4)

Roubini também defende a reestruturação da dívida dos países europeus em dificuldades.

27 janeiro 2011

EXPORTAR OU NÃO, EIS A QUESTÃO

Nos últimos tempos tem-se falado muito de exportações e da necessidade de apostar em bens e serviços transaccionáveis (isto é, bens e serviços que concorram nos mercados internacionais). A razão é simples: como Portugal tem um défice comercial crónico (ou seja, todos os anos exportamos menos do que aquilo que importamos), e como as transferências do exterior estão a diminuir (i.e., há menos remessas dos emigrantes do que nos anos 1980, as transferências da UE estão a decrescer, e há menos entrada de capitais estrangeiros no nosso país), o nosso défice externo acumulado agravou-se muito nos últimos 15 anos. Qual é o problema? O problema é que um défice externo elevado contribui decisivamente para o endividamento da economia nacional (isto é, para a nossa dívida ao exterior), um endividamento que é cada vez mais excessivo e cada vez menos sustentável.
Por isso, se conseguíssemos inverter ou, pelo menos, atenuar o défice comercial, poderíamos baixar o défice externo, bem como o endividamento externo. E é aqui que entra a nossa recente (e bem aconselhada) obsessão com as exportações ou os "transaccionáveis".
Mas, será que esta obsessão se justifica? Sim, pelo menos em parte. Porquê? Porque Portugal ainda exporta uma percentagem bastante modesta do seu PIB. Actualmente, o rácio das exportações no PIB nacional ronda os 30%, uma percentagem relativamente baixa para um país de dimensões reduzidas como o nosso (os países pequenos tendem a exportar e a importar mais). Uma percentagem que, ainda por cima, tem-se mantido relativamente estável nos últimos 30 anos, assim como podemos ver no gráfico abaixo.
Entre 2005 e 2008, ainda se registou uma melhoria deste indicador (visto que as exportações revelaram um bom dinamismo, enquanto o PIB estagnou), mas, em 2009, as exportações em percentagem do PIB voltaram a baixar, recuperando um pouco no ano seguinte.

Exportações portuguesas em percentagem do PIB, 1960-2010
Fonte: Banco Mundial, Santos Pereira (2011) "Como Retomar o Sucesso"

O comportamento menos bom das exportações (com a excepção dos últimos anos) é ainda mais aparente se compararmos a evolução das exportações nacionais com as da Zona Euro. Como podemos observar no próximo gráfico, até ao início da década de 1990, as exportações portuguesas em percentagem do PIB tinham valores muito semelhantes aos da Zona Euro. Porém, a partir dessa altura, as exportações em percentagem do PIB europeias aumentaram, enquanto as nossas praticamente estagnaram. Coincidência ou não (não é), foi mais ou menos nessa altura que nos apaixonámos com a construção de estradas e auto-esttradas, e com a chamada política do betão.
E mesmo quando as exportações nacionais registaram um crescimento acima do crescimento do PIB a partir de 2005, as exportações europeias em percentagem do PIB subiram ainda mais. Por outras palavras, apesar das recentes melhorias, é perfeitamente legítimo esperar e argumentar que as exportações nacionais deviam ter uma importância maior na economia nacional. Isto é, o rácio entre as exportações e o PIB devia ser bem maior do que o actual. Há, por isso, bastante margem de manobra para melhorar nesta área.
E este é exactamente um dos motivos que justifica a nossa recente obsessão com as exportações e com os (já) famosos "transaccionáveis". A verdade é que faz todo o sentido apostar nas exportações. Resta saber se a política económica vai mesmo apoiar de forma adequada os nossos exportadores, assim como outros sectores foram apoiados nas últimoas décadas. Esperemos que sim.

Exportações em percentagem do PIB, Portugal e Zona Euro, 1960-2010
 Fonte: Banco Mundial, Santos Pereira (2011) "Como Retomar o Sucesso"

PENSANDO BEM...

Na Irlanda, em plena discussão eleitoral, já se fala em tentar renegociar o plano de resgate do Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF), e em ir contra as vontades e os interesses dos restantes países da Zona Euro. Porquê? Porque existe a percepção de que quem está a suportar todos os custos da crise bancária são os contribuintes, enquanto os bancos acabaram por se sair relativamente bem (dadas as circunstâncias) ao terem sido salvos pelo Estado (com o dinheiro dos contribuintes) e pelo financiamento proporcionado pelo FEEF. Por isso, já há quem defenda uma renegociação do acordo de Novembro do ano passado e uma eventual reestruturação da dívida dos bancos irlandeses, na qual os detentores da dívida bancária (as obrigações dos bancos) teriam também de partilhar os custos do resgate dos bancos. O problema é que, se tal aocntecer, uma hipotética reestruturação da dívida bancária irlandesa teria bastantes implicações para a Zona Euro e para os outros países em dificuldades, pois os investidores poderiam ver essa decisão como sendo o primeiro passo para uma reestruturação mais abrangente da dívida europeia.
Quais são as lições que poderemos retirar de tudo isto? Por que é que esta discussão nos pode interessar? Porque, se nos virmos forçados a recorrer ao FEEF e ao FMI, é melhor que estejamos preparados para podermos negociar um acordo que defenda os nossos interesses e não termos que nos sujeitar a contrapartidas ruinosas que poderão impor um custo muito elevado na economia nacional. Mas, talvez eu esteja enganado. Sim, provavelmente estou. Afinal, para quê prepararmo-nos se Portugal não vai ter de recorrer ao FEEF e ao FMI? E, como é óbvio, se entretanto tiver de o fazer, logo se vê...

DÉFICE RECORDE

Em 2011, os Estados Unidos terão um défice recorde em tempos de paz. Um défice que deverá rondar 9,8% do PIB. A dívida pública americana ainda permanece relativamente baixa (62,1% do PIB em 2010), mas continua a crescer muito rapidamente. Por outras palavras, vale a pena recordar que não é só a periferia europeia que está com problemas graves.

26 janeiro 2011

DESEMPREGO A SUBIR

Segundo os dados mais recentes do Ministério do Trabalho e da Segurança Social, no terceiro trimestre de 2010 já existiam 609,4 mil desempregados em Portugal. Destes, 99 mil tinham idades compreendidas entre os 15 e os 24 anos, 325 mil tinham 25 a 44 anos, e 185 mil tinham mais de 45 anos. 
Mais: cerca de 340 mil desempregados já estão à procura de emprego há mais de 1 ano, um número bastante elevado e muito preocupante, pois o desemprego de longa duração tende a perpetuar-se e é mais difícil de combater. A subida do desemprego de longa duração é visível no gráfico abaixo, que apresenta os dados deste tipo de desemprego desde 1998.

Desemprego de longa duração em Portugal _ Milhares de desempregados, 1998-3º trimestre de 2010
Fonte: Ministério do Trabalho e Segurança Social

Outro dado interessante relaciona-se com o nível educacional dos desempregados. Mais concretamente, o número de desempregados segundo o grau de instrução é o seguinte :
_ Nenhum grau de instrução: 21,4 mil desempregados (dos quais 14,8 mil são de longa duração)
_ Ensino Básico, 1º ciclo: 125,4 mil (dos quais 77,5 mil são de longa duração)
_ Ensino Básico, 2º ciclo: 119,2 mil (dos quais 67,3 mil são de longa duração)
_ Ensino Básico, 3º ciclo: 151,2 mil (dos quais 81,7 mil são de longa duração)
_ Ensino Secundário: 122,2 mil (dos quais 64,6 mil são de longa duração)
_ Ensino superior: 68,5 mil (dos quais 33 mil são de longa duração)

Números que só não são mais elevados porque há milhares de portugueses que já desistiram de procurar emprego (os chamados desencorajados, que não contam para as estatísticas do desemprego), e porque outras centenas de milhares optaram por emigrar. 
O flagelo do desemprego é a consequência mais dramática e mais trágica da estagnação económica da última década, e o retrato mais fiel do tremendo fracasso das políticas económicas que têm vigorado entre nós. 

SONDAGEM

A Bloomberg aproveitou o Forúm Económico Mundial para efectuar uma sondagem junto de 1000 investidores (i.e. os malvados dos especuladores) sobre o futuro do euro e a dívida soberana europeia e os resultados não poderiam ser mais claros. Quase dos terços dos que responderam esperam que um ou mais países vão abandonar a Zona Euro nos próximos 5 anos.
Mais: os investidores acreditam que há uma grande probabilidade de alguns países europeus se verem obrigados a reestruturar as suas dívidas ou entrarem em incumprimento. Mais concretamente, 74% dos investidores inquiridos acreditam que a Grécia entrará em incumprimento (ou terá de reestruturar a sua dívida), 53% pensam que o mesmo acontecerá à Irlanda e 47% vaticinam o mesmo destino para Portugal. No nosso caso, a percentagem de investidores que acredita que Portugal entrará em default ou em incumprimento é quase idêntica à percentagem (48%) que pensa que esse cenário não acontecerá. É, sem dúvida, grande a confiança que os outros depositam em nós.

POPULAÇÕES EXPLOSIVAS

Sabia que se a população mundial continuasse a crescer à taxa de 1% ao ano, no ano 2200 existiriam 44  biliões (mil milhões) de seres humanos na Terra e 1 trilião de pessoas em 2515? É caso para dizer: bendita transição demográfica e bendito desenvolvimento económico.

Nota: A figura foi retirada daqui.

25 janeiro 2011

EXPORTAÇÕES DE TICs

Um dos sectores mais promissores da nossa economia é o das tecnologias de informação e comunicação (TICs). Este sector contém alguns dos nossos empreendedores mais inovadores, bem como várias empresas altamente internacionalizadas. O sector tem sido ainda apadrinhado pelas políticas dos nossos governos, tendo sido inclusivamente o principal beneficiário do há-muito-esquecido Plano Tecnológico. 
Resultado? Desde os meados da década de 90, as exportações dos TICs têm vindo a aumentar, um sinal do crescente dinamismo dos sectores de maior valor acrescentado da nossa economia.  Pelo menos é isso que nos vem dizendo a propaganda oficial. Mas será que a realidade é mesmo essa?
Sim e não. É verdade que o sector das TICs é um dos sectores mais inovadores e internacionalizados da economia nacional, mas não é verdade que o Plano Tecnológico tenha tido um impacto considerável para o sucesso do sector. Bem pelo contrário. Uma mostra disso mesmo é-nos dada se atentarmos para a percentagem das exportações de TICs em percentagem das exportações totais. Como podemos ver no gráfico abaixo, as exportações das TICs têm vindo a diminuir nas nossas exportações totais. Ou seja, não só o Plano Tecnológico foi um enorme fracasso, (como já aqui tinha mencionado), como também, e infelizmente, o sector das TICs tem vindo a perder importância relativa nas nossas exportações. Assim, em 2008 (referente aos dados mais recentes), a percentagem das TICs nas nossas exportações totais já era mais baixa do que em 1999. Por outras palavras, se o sector algum dia vier a ter a importância que merece e que todos desejamos, certamente que tal não acontecerá com mais ou com menos Planos Tecnológicos ou com mais ou com menos propaganda política. É que, como sempre, o sucesso do sector depende bem mais do empreendedorismo e da inovação dos empresários(as) e dos trabalhadores do sector do que um qualquer plano iluminado.

Percentagem das exportações de TICs nas exportações totais, 1996-2008:
Fonte: World Development Indicators

CAJAS E O FUTURO DO EURO

Mais do que um eventual resgate financeiro de Portugal, o futuro do euro irá passar pelas cajas espanholas (bancos regionais), cuja dívidas têm o potencial para gerar uma grave crise bancária na Espanha. Uma crise bancária parecida com o que ocorreu na Irlanda seria nada menos do que trágico não só para o nosso país vizinho (e para nós), mas também para a própria Europa. Toda a gente sabe isso e não é à toa que o governo espanhol tem implementado toda uma série de medidas para tentar assegurar a viabilidade financeira das cajas. Assim, após a fusão de muitos destes bancos regionais e da recapitalização das cajas, agora o governo espanhol ditou que estes bancos têm de aumentar os seus capitais. Se não o fizerem, as cajas arriscam-se a ser nacionalizadas pelo governo central. 
Apesar de todas estas medidas, a desconfiança em relação à solidez financeira das cajas permanece, até porque são exactamente estes bancos que estão mais expostos aos efeitos relacionados com o rebentamento da bolha imobiliária que tem devastado a economia espanhola.
Já agora, uma data importante sobre o futuro das cajas será o final deste mês, quando estes bancos regionais terão de divulgar a sua exposição aos activos menos sólidos da bolha imobiliária. Resta saber se esta infomação que será divulgada será fiável ou se não será só para "especulador ver"., assim como aconteceu aquando dos testes de stress do Verão passado.. Logo veremos.

CRISE IMOBILIÁRIA

A crise imobiliária americana continua, agora com outros contornos.

GUERRA DOS RELÓGIOS

Escoceses contra ingleses por causa das horas.

24 janeiro 2011

ESTABILIDADE A TODO O CUSTO?

Agora que as eleições presidenciais já estão resolvidas, é importante começar a pensar no futuro. Cavaco Silva ganhou e ganhou bem. Apesar da abstenção e dos inacreditáveis problemas relacionados com o cartão do cidadão, Cavaco Silva acabou por ficar 33 pontos percentuais acima do segundo candidato mais votado, uma diferença de tal modo significativa que não merece qualquer contestação. Tentar reduzir o sucesso eleitoral de Cavaco Silva por causa da abstenção não faz qualquer sentido. Por isso, Cavaco Silva só pode estar satisfeito com a sua reeleição. E tem bons motivos para isso.
Dito isto, também me parece evidente que grande parte do eleitorado de Cavaco Silva espera que o Presidente seja bem mais interventivo no seu segundo mandato. A partir de agora, não bastam avisos mais ou menos explícitos sobre a situação do país ou recados ao parlamento ou ao governo. É preciso actuar. A partir de agora, é preciso que o Presidente não deixe que a situação económica do país se deteriore ainda mais.
Acima de tudo, é importante perceber que a estabilidade política não é um fim em si mesmo. Neste sentido, vale a pena lembrar que a dívida externa bruta do país já ultrapassou os 410 mil milhões de euros (mais de 240% do PIB), e a dívida pública nacional em 2011 será a mais elevada dos últimos 160 anos. E todos nós sabemos (ou devíamos saber) quem são os principais responsáveis por termos chegado a esta situação.
A verdade é que não interessa preservar a estabilidade a todo o custo, quando a irresponsabilidade e a incompetência dos nossos governantes não dão mostras de abrandar (basta lembrar que a execução orçamental em 2009 e em 2010 foi desastrosa, as obras do TGV continuam, as empresas públicas continuam a endividar-se em mais de 3 mil milhões de euros ao ano...) Uma irresponsabilidade e uma incompetência que nos descredibilizam aos olhos do mundo e que condenam os nossos filhos a um futuro cheio de dívidas e a um país sem oportunidades.
Pouco importa promover estabilidade política a todo o custo quando a incompetência e a irresponsabilidade estão a conduzir o país para um abismo financeiro que irá marcar inexoravelmente os governos vindouros e as próximas gerações. Pouco interessa defender a estabilidade política a todo o custo quando a incúria dos últimos anos ameaça levar o país à insolvência.  Pouco importa fomentar a estabilidade política a todo o custo quando a taxa de desemprego é a maior dos últimos 80 anos e continua a aumentar. Pouco interessa manter a estabilidade política a todo o custo quando vivemos a segunda maior vaga de emigração dos últimos 150 anos e os nossos jovens já não vêem o nosso país como um destino viável. Pouca importa zelar pela estabilidade política a todo o custo quando vivemos num cenário de produtividade zero e o PIB potencial cresce à módica taxa de 0% ao ano. Pouco interessa apoiar a estabilidade política a todo o custo quando há 600 mil portugueses sem emprego, 300 mil desempregados de longa duração, e há dezenas de milhares trabalhadores desencorajados que nem sequer constam ou contam para os números do desemprego. Pouco importa defensar a estabilidade política a todo o custo quando a factura a pagar pelos eleitores são as políticas falhadas dos últimos anos, um despesismo atroz e milhares de milhões de euros de juros adicionais devido à nossa dívida pública explosiva.
Entre a estabilidade política e a competência e a responsabilidade, a escolha é simples. É que já são muitos anos de irresponsabilidade e de incompetência. Não são uns meses adicionais de governação nem sequer a ameaça da chegada do FMI ou o recurso ao FEEF que irão alterar isso. Bem pelo contrário.

22 janeiro 2011

CARAS PENSÕES

Toda a gente sabe que muitas das nossas pensões são bastante baixas, principalmente quando comparadas com os outros países europeus. Porém, sabia também que, mesmo assim, Portugal é um dos países da União Europeia que mais gasta com o sistema de pensões em percentagem do PIB? Mais concretamente, sabia que o nosso país é o 4º país da União Europeia que mais gasta com o sistema de pensões em percentagem do PIB? Pois é, é verdade, todos os anos, Portugal gasta cerca de 12% do PIB nacional no sistema de pensões. Na União Europeia só a Itália (14% do PIB), a França (13,5%) e a Áustria (12,7%) gastam mais em percentagem do PIB do que nós.Todos os restantes países da UE despendem, em média, muito menos no seu sistema de pensões  do que nós. Por que será?

Gráfico_ Gastos com pensões em percentagem do PIB, União Europeia, 2010

Fonte: Comissão Europeia (2010)

21 janeiro 2011

 Fonte: Wall Street Journal

Contrariamente ao nosso INE, que continua a negar aquilo que é mais do que evidente, o Irish Central Statistics Office já possui estimativas sobre a nova vaga de emigração que está a assolar a Irlanda. Só em 2010, a Irlanda viu emigrar 65 mil habitantes, o que representa uma perda líquida (isto é, emigrantes menos os imigrantes) de quase 40 mil pessoas. Como era de esperar, o ritmo do movimento emigratório está a aumentar, de modo que um relatório do Economic and Social Research Institute estima que cerca de 100 mil pessoas irão sair da Irlanda entre Abril de 2010 e Abril de 2012, algo como 1000 pessoas por semana. Porquê? Porque as oportunidades de emprego são muito limitadas e a taxa de desemprego já ultrapassa 13,5%. Ainda por cima, como é sabido, a situação económica não deve melhorar nos tempos mais próximos. 
Por outras palavras, está a acontecer à Irlanda exactamente o mesmo que está a ocorrer ao outro país europeu com uma forte tradição de emigração, o nosso. É só pena que as nossas autoridades económicas e o INE continuem a fingir que nada se passa. Por que será?

EXEMPLO A IMITAR

Excelente iniciativa do PS e do PSD em Lisboa. A reforma das freguesias lisboetas é uma óptima ideia e devia ser emulada em outros pontos do país. Será este um prenúncio os próximos anos? Ou seja, para uma reforma administrativa mais abrangente e que abarque todo o país?

20 janeiro 2011

A CHINA E A DÍVIDA AMERICANA

O que aconteceria se a China decidisse vender cerca de 1 trilião de dólares de dívida americana? Esta é a pergunta deste interessante artigo do Financial Post. Uma pergunta que faz ainda mais sentido tendo em linha de conta as recentes compras de dívida europeia por parte das autoridades chinesas.

EMIGRAÇÃO PARA A ESPANHA

Segundo os dados mais recentes do Ministério do Trabalho espanhol, o número de portugueses a trabalhar em Espanha tem vindo a baixar significativamente desde 2008, quando eclodiu a crise internacional e a bolha imobiliária espanhola rebentou. Esta diminuição do número de emigrantes portugueses para destinos como a Espanha e o Reino Unido era inteiramente esperada (aliás, como eu já tinha referido aqui), devido ao grande aumento de desemprego registado nestes países desde o ano de 2008. O que é que acontece aos portugueses que optam por sair de Espanha? Não sabemos bem, pois não temos estatísticas fiáveis que nos ajudem a perceber exactamente para onde é que vão estes trabalhadores. Ainda assim, o mais certo é que alguns regressem a Portugal se conseguirem arranjar emprego, mas muitos outros optem por continuar a trabalhar no estrangeiro. Ou seja, muda-se o destino da emigração, mas continua-se a trabalhar fora de Portugal. Não é à toa que,  nos últimos tempos, destinos como Angola, Luxemburgo e Suíça tenham sido crescentemente procurados pelos nossos trabalhadores. A verdade é que enquanto a economia nacional permanecer em crise ou estagnada (como nos últimos 10 anos), e enquanto o desemprego nacional continuar muito elevado, o mais certo é que a nova vaga de emigração não será invertida.

NOVO BLOGUE

Há um novo blogue económico na blogosfera portuguesa. Chama-se Massa Monetária e é uma (boa) iniciativa do Jornal de Negócios. Vale a pena visitar.

19 janeiro 2011

DEBATE SOBRE O ESTADO DO ESTADO (2)

Os videos do debate do Diário de Notícias sobre o estado do Estado podem ser vistos aqui. Na parte 3, a minha intervenção começa aos 7m 30s:





18 janeiro 2011

REESTRUTURAÇÃO OU NÃO, EIS A QUESTÃO (3)

Depois da revista Economist, mais uma voz a defender a reestruturação da dívida dos países em dificuldades. Só que, desta vez, o argumento não se aplica a todos os países em dificuldades, mas sim somente a Portugal. Segundo o autor, só uma reestruturação da dívida portuguesa (e não um mero financiamento ou bailout do FEEF e do FMI) poderá resolver o grave problema relacionado com a nossa elevada dívida pública, bem como evitar que a turbulência financeira que assola a Europa não contagie países como a Espanha e a Bélgica. Vale a pena ler.
Uma posição que, diga-se, é defendida por um crescente número de economistas e analistas.

17 janeiro 2011

CONTAS REGIONAIS

Já estão disponíveis os últimos números das contas regionais recolhidos pelo INE. Como podemos ver no próximo quadro, Lisboa e Madeira continuam bastante destacadas ao nível do rendimento por habitante. É igualmente visível que os Açores aproximam-se a passos largos do rendimento médio no continente. A grande divergência regista-se em relação à Região Norte (com cerca de 80% do PIB per capita nacional) e à Região Centro (83,5% do PIB por habitante português). 
Duas regiões que, cada vez mais, têm vindo a ficar para atrás em relação ao rendimento médio português. Por que será?

PIB per capita (preços correntes), Portugal =100


Total Norte Centro Lisboa Alentejo Algarve Açores Madeira
99.3 80.7 83.5 137.7 92.9 108.1 95.7 131.4

15 janeiro 2011

ENTREVISTA NA SIC NOTICIAS

Aqui está a minha entrevista com a Ana Lourenço no Jornal das 22 na Sic Notícias:

O PESO DA DÍVIDA (4)

Já estão disponíveis os dados mais recente do stock da dívida pública directa. Assim, ficámos a saber que, em 31 de Dezembro de 2010, o montante da dívida do Estado era de 151,777 milhões de euros, cerca de 4 mil milhões de euros a mais do que em Novembro de 2010. 
Vale a pena referir que, entre 31 de Dezembro de 2009 e o último dia do ano passado o stock da dívida pública aumentou mais de 18 mil milhões de euros. A evolução mensal do stock da dívida pública pode ser observada no seguinte gráfico:
 
Stock da dívida pública directa, Dezembro 2009-Dezembro 2010 (milhões de euros)
Fonte: IGCP

14 janeiro 2011

DEBATE E ENTREVISTA

O debate de hoje sobre o estado do Estado pode ser seguido aqui às 10h da manhã. 
Mais tarde, estarei ainda na Sic Notícias para uma entrevista no Jornal das 22.

13 janeiro 2011

DINHEIRO PRIVADO OU PÚBLICO?

O que é que vale mais: um euro nas suas mãos ou um euro nas mãos do governo? Quem gasta melhor esse euro: as famílias e as empresas ou os governos?
Eu sei, eu sei. No Portugal actual não é difícil responder a estas questões. É mais do que evidente que os nossos governos continuam a pensar que um euro gasto pelo Estado tem mais impacto na economia do que deixar esse mesmo euro nas suas mãos. E é óbvio que os nossos governantes estão errados. Aliás, foi esta mentalidade de um despesismo insaciável que nos conduziu à situação actual. Mas este é um assunto para outra ocasião.
Por agora, vale a pena perguntar: de um modo geral, o que é que nós sabemos sobre estas questões? Se nos deixarmos de ideologias, a resposta certa é: depende. Depende se as empresas e as famílias de um país já estiverem muito sobrecarregadas com impostos (como é o nosso caso). Depende se o país possuir boas infra-estruturas ou se despender razoavelmente em Saúde e Educação (o que é o nosso caso). E depende se os fundos públicos forem bem aplicados (o que não é o nosso caso). Há situações em que os países beneficiam se as famílias e as empresas ficarem com o euro adicional, mas por vezes faz sentido que esse euro seja gasto em despesas sociais e infra-estruturas. Tudo depende assim do estado de desenvolvimento do país e de quão competitivos são os produtos que esse país produz.
Todavia, de uma coisa podemos estar certos: às vezes um euro adicional nas mãos dos governos faz mais mal do que bem às economias. E, infelizmente, é exactamente nesse ponto em que nós nos encontramos. 

Nota: O meu artigo no Notícias Magazine, 8 de Janeiro de 2011   

LEGADOS DESTE GOVERNO (5) _ DIVERGÊNCIA REAL

Mais um dos tristes legados deste governo e da nossa década perdida: o regresso da divergência real em relação à Europa. Mais concretamente, o gráfico abaixo dá-nos a evolução do PIB per capita português em percentagem do PIB per capita da Europa Avançada (uma amostra dos 10 países com o PIB per capita mais elevado da União Europeia) entre 1974 e 2009. É visível quão bem sucedidas têm sido as políticas económicas dos últimos anos.

Gráfico _ PIB per capita português em percentagem do PIB per capita da Europa Avançada, 1974-2009
Fonte: Maddison (2006), Conference Board (2010), Santos Pereira "Como Retomar o Sucesso" (2011)

12 janeiro 2011

SINAIS DOS TEMPOS (3)

Já vivo fora de Portugal há bastante tempo e, por isso, já há muito me habituei nunca ver notícias sobre o nosso país nos media internacionais (a não ser que haja um desastre ou uma cimeira europeia ou da Nato). Por isso, é sempre fascinante ver que o nosso país anda nas bocas do mundo, mesmo que não seja pelas melhores razões. 
Ainda hoje é verdadeiramente extraordinário verificar que os mercados financeiros internacionais estão em alta porque o leilão de dívida portuguesa foi bem sucedido. Como já aqui disse, vivemos sem dúvida tempos realmente excepcionais.

O ESTADO DO ESTADO (2)

Aqui está a minha entrevista completa ao Diário de Notícias sobre o estado do Estado:

- Considera que o Estado português é demasiado “pesado”? Porquê?
Claramente. Não tenho quaisquer dúvidas. Porquê? Porque o Estado português está praticamente em todo o lado, sendo quase omnipresente nas mais diversas actividades económicas. Porque o peso do Estado em percentagem do PIB é muito mais elevado em Portugal do que em países com níveis de rendimento semelhantes. E porque o nosso Estado asfixia cada vez mais a economia privada, quer canalizando para si as limitadas fontes de financiamento ao nosso dispor, quer privilegiando certos grupos económicos de uma forma pouco transparente e clara, quer mesmo condicionando em demasia as actividades do sector privado.


- Onde se deve cortar para reduzir a despesa pública?
Há muito por onde cortar. Há muita ineficiência na despesa pública, há muito pouco respeito pelo dinheiro dos contribuintes, e cometem-se verdadeiros atentados inter-geracionais com as gerações futuras, a quem se espera que aceitem pagar o despesismo das actuais gerações. Neste sentido, penso que, a curto prazo, a principal redução da despesa pública terá de acontecer ao nível das aquisições de bens e serviços do Estado (os chamados consumos intermédios), bem como ao nível dos subsídios e das indemnizações compensatórias concedidas às empresas públicas. No entanto, parece-me muito claro que a grande redução da despesa pública terá de advir dos diversos organismos e entidades que constituem o Estado. Inicialmente, um próximo Governo poderia instituir cortes entre 10% a 20% nas despesas com Institutos, Direcções-Gerais e entidades afins. No entanto, numa segunda fase, o que há a fazer é reduzir, fundir e extinguir muitas destes Institutos e organismos do Estado, de forma a se poderem alcançar poupanças significativas na despesa do Estado. No mínimo entre 20% e 30% destes organismos do Estado deveriam desaparecer e/ou ser racionalizados. O que me parece inaceitável (e uma má política) é que se tenham de reduzir os salários dos funcionários públicos e que se tenha de aumentar os impostos das famílias e das empresas para evitar cortar nestes institutos e outras entidades do Estado, só para se protegerem interesses menos claros e para não mexer no nosso sacrossanto aparelho estatal. Um disparate, como é óbvio.


- Na sua opinião, quais devem ser as prioridades do Governo para consolidar as finanças públicas e fomentar o crescimento económico?
Sinceramente, depois do descalabro orçamental de 2009 e de 2010, tenho poucas ilusões que este Governo consiga consolidar as finanças públicas. Tenho ainda menos ilusões que este Governo consiga fomentar o crescimento económico, visto que, nos últimos 5 anos, foi totalmente ineficaz em alterar o mau desempenho da nossa economia. Dito isto, se o próximo Governo decidir reformar o actual estado de coisas, é absolutamente necessário não só consolidar verdadeiramente as finanças do Estado (algo que nunca foi feito em 36 anos de democracia), como também alterar radicalmente as prioridades da política económica.

Mais concretamente, há várias medidas que podemos tomar para consolidar as finanças públicas. Por onde começar? Aumentando a transparência das contas públicas, que são demasiado opacas e demasiado vulneráveis a malabarismos contabilísticos.

_ Mas, se é assim, quer isso dizer que as contas do Estado estão ainda piores do que o governo tem anunciado?

Não tenho grandes dúvidas que quando o próximo Governo mandar fazer uma auditoria às contas do Estado vamos dar conta que o buraco orçamental é não só bem pior do que tem sido anunciado por este Governo, como também vamos dar conta que tem sido feita toda a espécie de manobras contabilísticas para disfarçar o verdadeiro estado das contas públicas nacionais. É, assim, imperioso que acabemos de uma vez por todas com estas situações que só nos penalizam e que nos conduziram à lamentável situação actual. Para tal, é indispensável que se crie uma entidade independente que fiscalize todos os trimestres a execução orçamental e analise o estado das contas públicas. A alternativa será utilizar a UTAO para o fazer. Só assim poderemos credibilizar as contas do Estado.



Para além da transparência, que mais o preocupa em relação às finanças públicas nacionais?

Urge também acabar de uma vez por todas com as desorçamentações levadas a cabo nos últimos anos, bem como com a utilização de medidas extraordinárias para cobrir os buracos das contas do Estado. Nos últimos anos, vários governos têm utilizado estes expedientes para alcançar melhores resultados contabilísticos. Contudo, poucos se têm importado com o impacto que este tipo de actuações tem tido sobre a sustentabilidade das contas públicas. Por isso, é vital acabar com estas deploráveis práticas. É igualmente imperioso que todos os sectores e entidades estatais entrem nas contas do Estado.

Quer isso dizer que as contas das empresas públicas deviam ser tomadas em linha de conta nas finanças do Estado?

Sim, sem dúvida. É preciso contabilizar a dívida pública alargada, que inclui não só a dívida directa do Estado, mas também as dívidas das empresas públicas (que já ascendem a mais de 22% do PIB nacional). Só assim é que se pode travar a espiral do endividamento das empresas públicas e só assim é que podemos ambicionar levar a cabo uma real consolidação das contas do Estado.

É preciso também acabar com a vergonha de utilizar as parcerias público-privadas (PPPs) para efectuar despesa pública (ou pseudo-pública) sem que esta conste nos Orçamentos do Estado. As PPPs já são responsáveis por mais de 30% do PIB em dívida pública futura, uma dívida que terá de ser paga pelos nossos filhos e pelos governos vindouros. Por isso, as PPPs tornaram-se no maior atentado inter-geracional da nossa História recente e são um dos mais lamentáveis episódios de abuso governamental dos últimos tempos. No fundo, o que as PPPs permitem é que o Estado pague a crédito as obras que pretende fazer (estradas, hospitais, TGVs, etc.). Os privados endividam-se para edificar as obras para que, mais tarde, possam receber rendas do Estado durante décadas. Como as PPPs não começam a ser pagas nos primeiros anos de concessão, os governos que as mandam fazer inauguram a obra sem terem de desembolsar um único cêntimo. Uma total falta de ética para com os governos que se seguem e um autêntico atentado para o bem-estar dos nossos filhos. E é por isso que é imperioso limitar ao máximo as PPPs e regulamentar muito bem este tipo de contratos altamente ruinosos para o nosso Estado e para os contribuintes.


_ E também já defendeu a necessidade de termos um orçamento equilibrado a médio prazo, certo?

Sim, é verdade. Acho absolutamente indispensável que o próximo governo apresente a meta de défice zero para os próximos anos. Mais concretamente, já defendo há algum tempo que é perfeitamente possível alcançar o equilíbrio orçamental (o tal défice zero) até 2016. A meta do défice zero seria importante para credibilizar as contas públicas nacionais, quer internamente, quer aos olhos dos nossos parceiros europeus e dos mercados internacionais. Esta meta é perfeitamente exequível, desde que haja vontade política para o fazer (um grande “se”, como é evidente).

Ao nível da politica económica, penso que o próximo governo devia implementar políticas para fomentar a produtividade nacional, bem como a competitividade das nossas exportações. No meu próximo livro, apresento estas medidas com algum pormenor.


- Acha que a redução do número de funcionários públicos é um caminho inevitável?
Acho que acabará por acontecer, quer seja feita por nós, quer se for imposta pelos outros, isto é, quando tivermos de recorrer ao Fundo Europeu de Estabilização Financeira e ao FMI (o que é muito provável que aconteça ainda em 2011). Por enquanto, a redução do número de funcionários tem sido bastante modesta e tem sido conseguida muito à custa da transferência de entidades públicas para o sector empresarial do Estado (as empresas públicas, que não entram para as contas do Estado). Dito isto, é importante perceber que a redução do número de funcionários públicos não pode ser feita às cegas, sem critérios rigorosos e sem estudos de rigorosos sobre as áreas onde há excesso de funcionários e sobre as áreas onde precisamos ainda de mais trabalhadores especializados. Cortar por cortar e sem critérios da procura do emprego público não faz qualquer sentido.


- As despesas com obras públicas comprometem o futuro do País?
Em relação às despesas com as grandes obras públicas, sem o mínimo de dúvidas. Aliás, a tradicional obsessão dos nossos governantes em deixar “obra feita” (de preferência de betão) é uma das grandes causas do mal-estar actual. Insistir na aposta das grandes obras públicas numa altura em que estamos a viver uma gravíssima crise de liquidez e em que estamos muitíssimo endividados é não só um erro, mas também é meio caminho andado para a insolvência do país.

Eu não tenho nada contra as obras públicas, grandes ou pequenas. No entanto, é por demais evidente que as grandes obras públicas são completamente contraproducentes neste momento. Insistir neste caminho é de uma irresponsabilidade total e de um completo desrespeito pelo futuro do país. Por isso, esperemos que haja um pouco de bom senso e que possamos ainda travar muitas das grandes obras públicas já projectadas.

Em contrapartida, as pequenas obras públicas podem até ajudar à criação de mais emprego, bem como dinamizar alguns sectores da nossa economia. Ainda assim, não há registo que uma obra pública tenha sido algum dia a receita mágica para o crescimento de um país. E nós não somos excepção à regra.


- Em Portugal existe uma eficiente fiscalização da máquina do Estado?

Claro que não. Aliás, existe uma péssima fiscalização da máquina estatal. Se houvesse uma fiscalização eficiente os nossos governos não teriam tido a possibilidade de levarem a cabo os verdadeiros atentados orçamentais que foram cometidos nos últimos anos.

Aqui está um excerto da entrevista que concedi há uns meses à revista da Ordem dos Engenheiros
 
1 - Um estudo do FMI recentemente divulgado (26 Outubro) revelou que Portugal foi o 3.º país do mundo que menos cresceu nos últimos 10 anos, seguido da Itália e do Haiti, posicionado no fim da lista. Os primeiros lugares pertencem à Guiné Equatorial, Angola, China e Índia… como pode esta tendência ser contrariada?
Esta tendência pode ser invertida acabando com as más políticas dos últimos anos e acabando com o modelo de desenvolvimento (baseado no investimento público e numa “política de betão”) que temos vindo sido a seguir. A prioridade tem de ser dada ao sector privado e à criatividade nacional, apostando numa verdadeira política de promoção das exportações e implementando medidas que poderão fomentar o crescimento da produtividade.

2 - A economia europeia está a ganhar força, sobretudo a alemã (crescimento previsto de 3,4% para 2011). O PIB português foi revisto no segundo trimestre de 0,2% para 0,3%. Porque é que Portugal cresce por décimas? É suficiente? Prevê que continue a crescer?
Portugal cresce pouco porque a produtividade está quase estagnada, e porque o nosso excessivo endividamento penaliza o consumo e o investimento. As exportações têm dado mostras de um notável dinamismo, mas que não é suficiente para inverter o actual estado de coisas.
Claro que crescer umas poucas décimas não é suficiente, até porque, a estas taxas há mais destruição de emprego do que criação de emprego.
Sim, penso que nos próximos 2-3 anos, o crescimento manter-se-á muito modesto.

3 - Perante o desenvolvimento das economias da China e Índia, com níveis de produção elevados e a baixo custo, assentes não já em mão-de-obra pouco qualificada, mas em recursos humanos tendencialmente mais qualificados, que lugar fica reservado à Europa, nomeadamente a países como Portugal?
Há muitos sectores e muitas indústrias onde a Europa e Portugal se podem especializar. O que é muito claro é que os nossos salários baixos já não são suficientes para tornar as nossas exportações competitivas. Por isso, temos que continuar a apostar em sector mais inovadores e com maior valor acrescentado.

4 - Qual o(s) grande(s) problema registado na nossa economia, nos últimos 20 anos? Competitividade? Porquê?
A competitividade e o endividamento (público e privado). A competitividade porque não fomos capazes de atenuar significativamente o nosso défice externo crónico. Bem pelo contrário. Na última década, vários sectores nacionais (como os têxteis e calçado) tiveram que enfrentar com uma concorrência mais acérrima por parte de países como a China e a Europa de Leste, o que desferiu um rude golpe nas suas quotas nos mercados internacionais.
Os nossos problemas de competitividade têm assim contribuído para o crescimento do endividamento externo, que já atingiu níveis verdadeiramente históricos e poucos sustentáveis.

5 - Que soluções preconiza para resolver esses mesmos problemas? Exportar? Cortar na despesa? Poupança? Reformas estruturais? Faz-se poupança quando a economia cresce; as reformas levam muito tempo; a nossa dependência externa é muito elevada…
Sim, precisamos de apostar mais nas exportações e no apoio aos exportadores para podermos reduzir o nosso défice externo. E sim, precisamos de fomentar a poupança interna, para que não estejamos tão dependentes do financiamento do exterior, que nos coloca numa situação de vulnerabilidade, como agora estamos a ver. Precisamos também de tentar importar menos.
É verdade que estas coisas levam tempo e a dependência externa é elevada. No entanto, estas coisas têm de ser feitas, pois não há volta a dar. Não temos outro remédio se não fazê-lo, sob pena de o nosso declínio relativo se transformar num empobrecimento absoluto. 

6 - Tendo em conta a realidade actual, sair do euro seria uma “solução” a perspectivar?
Não. Seria um erro enorme, pois teria custos políticos e económicos substanciais. Uma saída do euro só agravaria ainda mais a nossa situação económica, pelo menos a curto prazo. Para além do mais, nós estamos demasiado endividados para podermos equacionar uma saída do euro. Só quando a nossa dívida externa baixar é que podemos pensar, se quisermos, em tal hipótese.

11 janeiro 2011

O CANTO DO CISNE

A estratégia de anunciar uma redução do défice orçamental acima do que era esperado é, à primeira vista, boa. Ainda por cima porque a margem de manobra orçamental (a rondar os 800 milhões de euros) é significativa. O problema é que não só este anúncio poderá vir já demasiado tarde, como também é provável que não seja suficiente para acalmar a tempestade financeira que nos tem vindo a assolar. Neste sentido, e apesar de certamente saudarem este esforço adicional, os mercados e os nossos parceiros europeus poderão ver este anúncio somente como uma tentativa desesperada de evitar a todo o custo o recurso ao Fundo de Estabilização Financeira e ao FMI. 
Mais: toda a gente sabe que esta margem de manobra orçamental acrescida foi conseguida à custa de um malabarismo contabilístico com os fundos de pensões da PT, que, por si só, permite uma folga orçamental em cerca de 1,6% do PIB. É ilegal utilizar este tipo de expedientes para combater os desequilíbrios orçamentais? Não, não é. Vários países europeus já o fizeram e nós também, inclusivamente em 2003 e 2004, quando os governos de então avançaram com este tipo de medidas temporárias. Porém, lá por não serem ilegais ou lá por já terem sido usadas anteriormente não quer dizer que estas práticas contabilísticas sejam uma boa ideia ou que sejam muito louváveis. Não são. Para além do mais, é importante não esquecer que o ambiente político e económico que se vivia em 2003 e 2004 é muito diferente do actual. Em 2003 e em 2004, toda a gente sabia que esses malabarismos contabilísticos eram pouco recomendáveis, mas ninguém se importava porque se pensava que, a curto prazo, as consequências políticas e económicas não eram consideráveis nem para os países que as utilizavam ou para a própria Zona Euro. Hoje em dia, em plena crise da dívida soberana europeia, recorrer a essas mesmas medidas temporárias não é tão aceitável ou recomendável. 
Para além do mais, decerto que os mercados e os nossos parceiros europeus não deixarão de reparar que a despesa acumulada do sector Estado continuou a aumentar em 2010. É verdade que o aumento da despesa acabou por ser menor do que foi temido em Setembro do ano passado. No entanto, também não deixa de ser verdade que as despesas públicas baixaram nos outros países europeus em dificuldades, mas subiram em Portugal. E como uma subida é uma subida é uma subida, não há muito por onde nos orgulharmos por este crescimento da despesa pública ter ficado aquém do que era esperado. (Há ainda o pormenor técnico da diferença entre a contabilidade nacional e a contabilidade pública, mas prefiro não me pronunciar sobre este assunto por enquanto, pois ainda não sabemos quanto é que será a diferença entre os dois tipos de contabilidade).
Em suma, se somarmos os prós e os contras, não é difícil concluir que a conferência de imprensa de hoje é um caso sério do síndroma "too little, too late". Não sou eu quem o diz. Quem o afirma é o editorial de hoje do Financial Times, que sumaria exemplarmente bem o que está em causa:
"Lisbon was slow to adjust. Political divisions cast doubt on its ability to control public finances. In 2010 the deficit was only shrunk by putting the telecoms pension fund on the public balance sheet. The government now seems committed to control the deficit in earnest, but possibly too late to regain market confidence. If a European rescue of Portugal is still avoidable, it is becoming less and less so.
By refusing to tap European funds until they had no choice, Athens and Dublin made the path to their rescues messier and more painful than necessary. Lisbon is repeating their mistake by seeing it as a national disgrace to ask for help. In truth, pre-emptively going to the EFSF would improve the chance of calming markets and leaving rescue funds untapped."

DEBATE SOBRE O ESTADO DO ESTADO

Aqui está on anúncio do debate do DN sobre o estado do Estado que irei também participar.

10 janeiro 2011

A GRANDE DESCONFIANÇA (2)

Ainda a propósito do eventual recurso ao FMI e ao FEEF, é muito sintomático observar que a cadeia CNBC está hoje a transmitir de Lisboa (!). Já há quem especule sobre os valores do resgate, que devem situar-se entre os 60 e os 80 mil milhões de euros.