O editorial do DN refere hoje o pedido de desculpas do primeiro-ministro canadiano aos aborígenas pelos abusos cometidos durante décadas das chamadas "residential schools" (onde se pretendia ensinar aos "índios" "boas maneiras" e assimilá-los para a cultura ocidental). Diz o DN:
"Stephen Harper pediu em nome do Canadá desculpa aos povos indígenas do país, vítimas durante séculos de abusos e de uma tentativa deliberada de assimilação. Foi uma cerimónia cheia de colorido, celebrada no Parlamento de Otava, e nela participaram, além do primeiro-ministro, líderes de vários tribos índias e esquimós (inuit, como preferem se chamar). Foi também um momento de reconciliação entre os canadianos, um povo em permanente construção, onde a unidade nacional resulta da vontade de viverem juntos, sejam anglófonos ou francófonos, descendentes de europeus ou índigenas, filhos de velhas famílias de colonos ou imigrantes recentes. O gesto vale pelo simbolismo, mas é inútil, como foi inútil o pedido de desculpas recente do primeiro-ministro da Austrália aos aborígenes. E é inútil felizmente, porque é feito, em ambos os casos, por democracias que souberam aprender com os erros do passado e construir sociedades que se esforçam por ser verdadeiramente iguais para os seus cidadãos. Mais do que gestos simbólicos, o importante é mesmo mudar a história."
Inútil? Inútil??? Foi talvez por ser inútil que os líderes aborígenas e milhares de "sobreviventes" (como são conhecidos no Canadá) afirmaram que há décadas que estavam à espera deste dia. Foi talvez por ser inútil que as forças políticas canadianas se uniram como em poucas ocasiões. Foi talvez por ser inútil que após séculos de exploração e de humilhação que os líderes aborígenas falaram que é chegada a hora para a reconciliação.
Inútil? Será que o processo Casa Pia foi (ou é) inútil? Será inútil um pedido de desculpa de desculpas neste caso? É que este pedido de desculpas canadiano é muito parecido com o que motivou o processo Casa Pia. Com a diferença de que, para além dos abusos sexuais e psicológicos, as crianças aborígenas foram sujeitas à tentativa deliberada de erradicar o "índio" dentro delas. Ou seja, durante 130 anos, houve uma política deliberada de apagamento da identidade de milhares e milhares de crianças. E essa política durou até 1998 (!). E é por isso que o pedido de desculpas foi tão inútil...
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