26 novembro 2010

RESGATAR PORTUGAL PARA SALVAR A ESPANHA (E O EURO)

Segundo a edição de hoje do Financial Times alemão (e do Jornal de Negócios), o BCE quer convencer o governo português a aceitar aceder ao fundo europeu de estabilização financeira (e ao resgate do FMI). Porquê? Para que diminuam as pressões dos mercados sobre a Espanha. É que, como já aqui mencionei, um resgate de Portugal não terá um grande impacto para a Zona Euro (um impacto que certamente não será maior do que já aconteceu com a Grécia ou com a Irlanda), visto que a economia portuguesa é relativamente pequena no contexto europeu. O mesmo já não sucede com a Espanha, cuja economia tem um peso muito mais elevado na economia europeia e cujo eventual resgate seria bem mais caro e bem mais problemático para a estabilidade da Zona Euro. Dito isto, as questões que se colocam são: 1) será um bailout português mesmo inevitável?, e 2) conseguirá um resgate de Portugal evitar que a Espanha tenha o mesmo destino?
Comecemos com a primeira questão. Parece evidente para quase toda a gente que um bailout português e o recurso ao FMI é cada vez mais provável. Aliás, se eu gostasse de apostas, eu diria que existem cerca de 60% a 70% de possibilidades que Portugal venha a recorrer ao fundo de estabilização financeira (FEEF) e ao FMI para conseguirmos financiar as necessidades referentes à nossa dívida pública e evitar uma situação de congelamento do financiamento da nossa economia, o que decerto teria graves repercussões para todos nós.
Por isso, tudo indica que a grande questão que deparamos actualmente não é se iremos ou não ser resgatados, mas quando. E se os nossos parceiros europeus (e o BCE) não nos forçarem recorrer ao fundo de estabilização financeira até ao final do ano, decerto que um recurso ao FEEF e ao FMI tal será bastante provável nos primeiros meses de 2011. 
Dito isto, será que um resgate português poderia evitar que a Espanha fosse a senhora que se segue? Talvez, ou talvez não. A verdade é que há cada vez mais gente a acreditar que os desequilíbrios da economia espanhola e, em particular, dos bancos espanhóis, são profundos e com tendência para se agravarem. Porquê? Porque há inúmeros bancos regionais, as "Cajas", em dificuldades e porque o rebentamento da bolha imobiliária espanhola tem originado cada vez mais estragos. Agora já há quem diga que as situações de incumprimento dos créditos imobiliário às famílias poderão triplicar nos próximos meses e que os preços médios das casas em Espanha poderão descer mais de 20% em 2011, o que fará com que os activos detidos pelos bancos desvalorizem ainda mais, e o que causará ainda mais dificuldades ao sector bancário espanhol. Ainda por cima, há inúmeras dúvidas relacionadas com os preços das casas em Espanha, o que só aumentará ainda mais as questões sobre a sustentabilidade das finanças públicas espanholas e sobre o verdadeiro estado do sector bancário espanhol. Moral da história: é muito provável que um eventual resgate de Portugal acabe por não ser suficiente para salvar a Espanha do mesmo destino, principalmente se estas dúvidas se mantiverem e/ou se os problemas dos bancos espanhóis se agravarem nos próximos meses. É exactamente isto que parecem indiciar uma série de artigos na imprensa económica internacional. Começa a implantar-se a ideia de que o teste final à Zona Euro se fará com a Espanha e não com Portugal. Decerto que os próximos dias e semanas serão fundamentais para podermos responder mais adequadamente a todas estas questões.

3 comentários:

Tiago Oliveira disse...

O problema destes senhores é que já deviam estar a olhar seriamente para à Espanha, não estão a conseguir definir correctamente as prioridades. E para meu choque total, continuam a ser reactivos e não proactivos. Faz-me confusão.

Um país tão pequeno como o nosso terá assim tanto peso na economia Espanhola? Não tem. Alias, o nosso peso na economia europeia é tão pouco que arrisco a dizer que quando cairmos, não vamos contagiar ninguém.

Agora quando a Espanha cair no 3º ou 4º trimestre de 2011, vão ser momentos "interessantes" na Europa.

MAS disse...

No inicio deste mês estive em Madrid (onde vivi, estudei e trabalhei) em reuniões de trabalho, e, como sempre, fiquei em casa de amigos.
Fiquei a saber que o desespero para atrair depositantes é tal que chegam ao ponto de oferecer €500 a quem depositar lá o salário!
Isto é real, aconteceu a uma amiga minha.

Anónimo disse...

A probabilidade dum envolvimento da UE/FMI na resolução do problema da tesouraria portuguesa (e não do problema económico português) vai de braço dado com as necessidades de financiamento do défice das contas públicas e do défice das tesourarias dos bancos. Presumo que a probabilidade de 60 a 70 por cento que o Professor Santos Pereira deduziu lhe vêem só dos actuais preços da dívida pública e duma estimativa da sua recuperação em caso de incumprimento.

Mas como se torna cada vez mais claro, a «necessidade sistémica» dum pedido de ajuda português a exemplo do irlandês deveria levar o Governo português a não se precipitar e a aceitar quaisquer condições. Por que as condições mudaram, uma taxa de 5 por cento é hoje exorbitante. E no nosso caso, não se percebe como é que uma estagnação esperada dá para pagar uma taxa acima de 2 por cento.

Obrigado.

F