13 maio 2008

O MITO DA CRISE ALIMENTAR

Nos últimos tempos anda meio mundo a falar da crise alimentar mundial. Desde o secretário-geral das Nações Unidas, ao presidente do Banco Mundial, a muitos e numerosos analistas, todos avisaram que a subida dos preços alimentares irá ter sérias consequências para os mais pobres do mundo. Isso é evidente e verdadeiro. Porém, muitos outros analistas aproveitaram a deixa para fazer ressuscitar o fantasma de Malthus, o reverendo que em 1798 alertou que a paixão dos sexos era tal que os humanos se reproduziriam sempre a uma taxa geométrica (1, 2, 4, 8, 16...), enquanto os recursos apenas cresceriam a uma taxa aritmética (1, 2, 3, 4, 5...). Consequentemente, de acordo com Malthus, mais cedo ou mais tarde teríamos uma grave crise de subsistência nas nossas mãos.
Durante 200 anos, as previsões de Malthus foram sempre falsificadas, ano após anos após ano. Mesmo assim, sempre houve quem alertasse que desta vez é que era!, agora é que vamos ter uma crise alimentar com consequências trágicas para a população mundial. A retórica associada à crise alimentar mundial insere-se nesta narrativa.
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É verdade que os preços alimentares são os mais altos das últimas 3 décadas. É verdade que a vertiginosa subida dos preços dos bens alimentares afecta desproporcionalmente os mais pobres (não é à toa que se têm registado protestos contra a subida dos preços um pouco por todo o mundo). É igualmente verdade que a grande causa da subida dos preços deve-se à insuficiência da oferta de alimentos.
Porém, esta não é uma crise Malthusiana. Não é a fome que causou a subida dos preços. Bem pelo contrário. É a abundância e o desenvolvimento (conjugadas com a subida dos preços petrolíferos) que provocaram esta crise (bem como uma seca na Austrália, entre outros factores). A crise existe porque os chineses e os indianos, entre outros, querem comer o que nós comemos: vacas, porcos, e galinhas. E não só cereais.
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Dito isto, importa também referir que, como sempre, as pessoas respondem a incentivos. Deste modo, era previsível que a subida dos preços alimentares levasse os agricultores de todo o mundo a aumentar a oferta de cereais e outros bens alimentares, de forma a beneficiarem com o aumento dos preços. É exactamente isso que está a acontecer. Segundo o PUBLICO de hoje: "A produção mundial de arroz vai atingir este ano um novo recorde, chegando às 666 milhões de toneladas mas, a curto prazo, os preços vão continuar elevados porque muito do arroz só será colhido no final do ano, anunciou ontem a FAO (Organização da ONU para a Alimentação e Agricultura)."
Certamente que o mesmo acontecerá com outros cereais e bens alimentares. Os preços elevados estimularão a oferta de alimentos. E os preços cairão. O fantasma de Malthus desaparecerá mais uma vez. Aliás, não será de todo surpreendente que haja um excesso de oferta no próximo ano ou no ano seguinte, levando muitos a bradar contra a descida vertiginosa dos preços alimentares, que tanto têm prejudicado os pobres produtores dos países subdsenvolvidos. Entretanto, até que tal aconteça, podemos ter a certeza de uma coisa: Malthus está morto e enterrado. Não é a recente subida dos preços alimentares que irá ressuscitá-lo.

2 comentários:

Gi disse...

Faz sentido. Vamos lá ver no que vão dar certas aplicações financeiras indexadas ao preço dos cereais...

Anónimo disse...

tenho que discordar com o titulo deste post. A verdade e que estamos perante uma crise alimentar. nao e a toa que o IMF e o Banco mundial e os analistas estao preocupados. Concordo que nao e a crise prevista por Malthus, mas e sem duida uma crise. A subida dos precos e assustadora. se nao acredita pense so no seguinte, podemos dizer que aproximadamente existe 1 biliao de pessoas que vive com $1 por dia. se tivermos em conta algumas estimativas (conservadoras por sinal) de que o custo da comida aumentou cerca de 20% (e em alguns lugares aumentou ainda mais),podemos concluir que cerca de 100m pessoas vao ver a sua vida piorar e regressarao ao nivel de $1 por dia, que e nem mas nem menos que o indicador da pobreza absoluta.

sabemos que tambem parte deste custo se deve a duas grandes forcas
1) o uso de cereais para os ditos bio combustiveis.
2) o use de politicas como a CAP por parte de paises desenvolvidos, i.e. subsidios aos agricultores

concluo entao que o periodo das vacas gordas (i.e. cheap food) are long gone. sera preciso boas politicas e um pouco de sorte para levar a economia para um novo equilibrio da maneira menos prejudicial para a economia. e ate agora esta transicao tem sido mais avassaladora do que os analistas tinham anticipado