10 março 2011

O DISCURSO DO PRESIDENTE

Para os leitores habituais do blogue não será estranho se afirmar que gostei muito do discurso do Presidente. Muito mesmo. Não porque somos de Direita ou de Esquerda, mas sim porque foi um discurso realista e incisivo. Sem floreados e sem recados subliminares ou implícitos. Gostei principalmente porque o Presidente traçou um cenário extremamente realista da nossa situação actual, que é grave, muito grave mesmo. Os dados e os números não mentem. E independentemente de concordarmos ou não com as propostas apresentadas, seria bom e altamente aconselhável que todos nós interiorizássemos de uma vez por todas que estamos a viver a crise económica mais grave desde, pelo menos 1892, quando o país se viu forçado a declarar a bancarrota. E não, não é por causa da crise internacional, mas sim devido a uma profunda crise estrutural, que foi agravada pela crise financeira de 2008. A verdade é que a trajectória económica e financeira de Portugal já era insustentável bem antes de 2008, mas nenhum (repito, nenhum) governo foi capaz de sequer reconhecer e muito menos de actuar contra os crescentes desequilíbrios internos e externos da economia nacional que se foram acumulando nos últimos 15 anos.
E foi assim que aos poucos e poucos fomos chegando à situação actual, que é de tal modo séria e de tal maneira insustentável que já não é passível de ser disfarçada com as habituais práticas de contabilidade criativa, com retóricas políticas inflamadas, com propaganda e demagogia, ad -nauseam, ou fazendo os possíveis e os impossíveis para nos descartarmos das nossas responsabilidades governativas. 
A situação é, sem dúvida, muito delicada. E é importante que todos percebamos isso mesmo. Com o seu discurso, o Presidente deu um importante contributo para podermos encontrar soluções colectivas que nos permitam superar o quanto antes estes tempos tão difíceis. Como disse (e bem) a Helena Garrido, este é, de facto, o Presidente que o país precisa.

9 comentários:

Manuel Henrique Figueira disse...

Senhor Professor A. S. P.:
Apesar de o Desmitos ser um blogue sério, sobre assuntos sérios – a Economia, meu Deus - porque não comentar de vez em quando com um pouco de ironia?
Desta vez vou usar (abusivamente) um texto de outro blogueiro que comigo participa no Murcon (com ligeiras adaptações minhas).
(Início de citação)
«O Prof. Cavaco acabou de chegar à Terra, vindo de um planeta distante, muiiiito distante.
Ao chegar, uma multidão ajoelhou-se-lhe aos pés e, tomando-o por um Deus maior, pediu-lhe a salvação.
Ele, incrédulo de tão grande manifestação de amor, achou-se na obrigação de proferir algumas palavras que fizessem sentido nas mentes daqueles que, de mãos postas e olhar extasiado, o adoravam.
Então disse... bebendo entretanto muita aguinha pelo meio, mas disse. E os acólitos exultaram.
Outros porém, não entenderam e quando entenderam aquilo que entenderam, perguntaram: e por onde é o caminho da salvação, mestre?
Ao que parece, na mensagem que proferiu, o Prof. Cavaco, introduziu telepaticamente uma outra: «tudo ao molho e fé em qualquer coisa que ninguém descobriu ainda o que possa ser».
Terminou a alocução erguendo os braços e exortando todos a agir já... e a correr!
Não importa para onde, importa que corram, mesmo que choquem uns com os outros.
Corram... corram! Não parem de correr!
Entretanto, uma dúvida paira etérea, acima das coroadas cabeças.
Mother, do you think they'll drop the bomb?
Mother, do you think they'll like this song?
Mother, do you think they'll tray to brake my ball's?
http://www.youtube.com/watch?v=r9rYXZnoMn0&feature=related
(Fim de citação)
Respondendo a Helena Garrido, este é o presidente de que não precisávamos agora. Porquê o seu silencio desde há 5 anos, quando o espécime que temos como 1.º ministro sempre foi o que é, e há muito que não engana a maioria dos portugueses? (Ou a única coisa que soube, que foi incompetentemente capaz de fazer contra Sócrates foi o lamentável episódio das escutas em pré-campanha eleitoral)?
A resposta só pode ser: taticismo eleitoral, havia uma eleição presidencial este ano, não era?
No Chile o mandato dos presidentes é único, de 5 anos, e o Chile (não só por isso, como é evidente, mas isso é um bom sintoma de maturidade política) é dos países mais desenvolvidos da América Latina.
M. H. F.

Carlos Pereira disse...

Também gostei do discurso do Presidente da Republica. Há frases que ficaram-me na mente, como: - "Há limites para os sacrifícios que se podem exigir ao comum dos cidadãos." ou ainda ""faço um vibrante apelo aos jovens de Portugal: ajudem o vosso país, façam ouvir a vossa voz..." A dita "geração à rasca", vitima da sua própria passividade. Realmente ninguém conhece a sua voz, tem estado sempre tudo bem, … pontualmente aparecem uns estudantes na rua a fazer ouvir a sua voz contra as propinas, nada mais que isso, e por aí ficamos.
Penso não ter ouvido o Presidente da Republica falar do papel da oposição e dos sindicatos, das suas responsabilidades para com o país e que tantas vezes são esquecidas. Não se pode estar sempre em oposição só porque é oposição. Reconheço não ter ouvido o discurso na íntegra, pelo que ouvi, penso ter faltado falar destes dois assuntos.

Carlos

Gonçalo Correia disse...

Leilões há muitos

Era uma vez o Sr. Leilão com o seu porte tão licitado. A cada licitação, enterram-se mais uns milhões em juros. Não entendam qualquer tom depreciativo para com esse personagem. Não, pelo contrário. O Sr. Leilão é tão necessário para qualquer país como água para matar a nossa sede. Agora, há países que já não têm, sequer, anéis para vender. Tal é o estado de penúria! E não é preciso ir muito além mar ou além terra para se descobrir um bom exemplar. Basta, simplesmente, olhar para o nosso Gigante, claro.

Os sinais inflamados estão aí. Noutros tempos, eram de fogo. Agora, aparecem em qualquer noticiário perto de si, através de sons e de imagens. O que serviu durante alguns anos para disfarçar a trajectória económica e financeira de Portugal rumo ao abismo, abyssus abyssum invocat, já se encontra fora de prazo. Tilt. A mentira e a omissão em discursos arrogantes, ad nauseum, já não colam com a realidade dos factos. Esse jogo labiríntico acabou. Game over. O Pacman foi apanhado num beco sem saída. Para continuar, pisca em letras grandes no ecrã: insert coin. E terão de ser milhares de milhões de moedinhas de euros, sobretudo alemães, para continuarmos em jogo. Coitado do Pacman, está tramado nas mãos do Gigante.

Por enquanto, o Sr. Leilão ainda pode ajudar o Gigante, mas a situação é cada vez mais insustentável. Essa palavra, agora, está na moda. Tarde e a más horas, refira-se. Todavia, mais vale tarde do que nunca! Afinal, alguns profetas da desgraça tinham razão... Será que eram mesmo profetas da “desgraça”?! Na altura, muitos adjectivavam-nos deste modo, sem papas nas bocas tão cheias de erudição. Porém, a mentira tem perna curta. Os números eram bem evidentes e o plano já estava assaz inclinado. Mas, obviamente, outros viam-no perfeitamente achatado, ou seja, como visões “Monty Python” sobre a realidade. Até conseguiram apagar o plano inclinado do ar, imaginem! Como se o povo fosse parvo! Parvos que somos, mas nem tanto!

Pronto, já foi emitida a factura do bacanal orçamental e vamos ter de pagá-la, doa a quem doer. Não vale a pena culpar Baco/Dionísio pelas loucas festanças lusitanas porque esse não era assim tão louco. A nossa embriaguez é outra… O cheiro pestilento do Gigante é completamente diferente, para pior (claro), do cheiro agradável de um bom vinho. A tentação foi grande, a desgraça será muito maior. Ainda há gente que fala em TGV’s e outras coisas tais?! Bem, pelo menos, com Baco/Dionísio as coisas eram bem mais divertidas e interessantes, não acham? Triste fado, o nosso.

António Parente disse...

Todos estamos de acordo com o diagnóstico. As divergências surgem quanto às soluções.

A liberalizaçao das leis laborais combinada com uma política de salários baixos parece-me explosiva na actual conjuntura. Conheço alguns casos de jovens que trocaram Lisboa por Londres em termos profissionais. Abdicaram de empregos seguros em troca de situações salariais mais vantajosas num ambiente profissional altamente competitivo e com leis laborais mais flexíveis.

Se liberalizarmos as leis laborais mantendo os mesmos níveis salariais, criamos todas as condições para aumentar o fluxo emigratório de jovens qualificados que aqui têm empregos mais seguros mas ainda não têm família, filhos, dívidas que os "amarrem" a Portugal.

Li há uns dias que a Alemanha tem falta de quadros especializados e conta recrutá-los em Portugal e Espanha. Até que ponto as imposições políticas do centro da Europa nos vão beneficiar a nós ou a terceiros? É uma questão que me parece muito pertinente.

Depois há outro problema. Queremos ser a China da Europa, com uma combinação de liberdade de despedimentos, salários baixos e investimento estrangeiro temporário que anda de país em país em busca de apoios estatais? É esse o nosso modelo?

Por outro lado, a insistência na liberalização das leis laborais, esconde uma realidade deprimente: não somos um povo de empreendores, gente com capacidade de inovar e criar coisas novas. Ainda por cima maltratamos os poucos empresários que têm a coragem de investir e tentam produzir riqueza.

Sergio Carvalho disse...

Se posso ser um nazi da gramática, tens dois typos que merecem ser corrigidos: "estratural" parece algo saído da boca do JJ, e "ad-nauseum" devia ser "ad-nauseam" e é um erro comum que mais um bocado e se torna mainstream.

Podes apagar o comentário depois de corrigidos os typos.

Pedro Teixeira disse...

Pareceu-me o melhor e mais realista discurso do Presidente, desde que iniciou funções. Tocou nas feridas, de forma claríssima, que enfrentamos e que o governo teima em aprofundar (TGVs e outras grandes obras de limitada criação de riqueza e elevada componente importada), e deu o mote ao que será o programa do próximo governo quando este cair numa das próximas moções de censura (ou já no próximo mês com o pedido de ajuda externo).

Ide levar no déficite ide disse...

não se acharem as coisas, quando são necessárias
e quando surgem serem às vezes tais, que melhor fora não as haver

e se este é de facto o senhor nosso amo que mal se pode livrar de malícia crassa e maldade supina, porque mais nos divide que nos une

cards disse...

Apesar de o presidente ter razão, não deveria ele falar de outra maneira, pois ele esteve 10 anos como primeiro ministro nessa altura que eu me lembre ninguém subia por mérito só por filiação partidária.

Pedro Oliveira disse...

Os tempos começam a ser muito difíceis em Portugal. Não há tempo para falar mas para agir, rápido e em força.

Independentemente do conteúdo do discurso, que é realista, Cavaco Silva não tem qualquer tipo de autoridade moral para criticar o Governo, uma vez que também ele foi Governo - entre 1985 e 1995 - tendo sido provavelmente o maior responsável pelo crescente endividamento em Portugal nesta falida III República. Os maiores empreendimentos e o maior esbanjamento de dinheiro público - até de subsídios - aconteceram no tempo em que Cavaco era Governo. Ele estimulou esta grande crise estrutural, ao querer gastar muito mais do que aquilo que a Economia permitia. Entrámos para a CEE em 1986. Nos 10 anos de Cavaco, entrava dinheiro pelos cofres do Banco de Portugal a dentro aos magotes. Eram receitas loucas que foram desperdiçadas, mal aplicadas.

Por isto acho que é um discurso ao qual não se deve dar grande credibilidade. A situação em Portugal é péssima, já todos sabemos há algum tempo, muito antes do discurso de Cavaco Silva.

Cavaco nem sequer admite o seu enorme erro de governação, nem pediu desculpa pelo mal que fez a Portugal. As consequências desse erro monumental sentem-se agora com uma inércia de quase 20 anos.

A única coisa honesta e séria que ele poderia fazer seria demitir o Governo por incompetência, usando para isso os poderes que lhe foram conferidos pelo Estado da República Portuguesa, e exigir que os próximos Governos tomem medidas muito claras e efectivas tal como Salazar tomou no início da II República, no Estado Novo. Só isso é que interessa. De resto, discursos hipócritas há muitos e não merecem o nosso crédito sequer.