15 março 2011

NO PASA NADA

Na sua declaração ao país, o primeiro-ministro foi igual a si próprio: desculpabilizou-se pela sofrível gestão macroeconómica e pela péssima gestão das finanças públicas dos últimos anos, vitimizou-se com a crise soberana europeia para justificar os erros da política económica, e culpabilizou os partidos da oposição pela lamentável situação económica do país. Enfim, nada de novo.
Foi igualmente interessante verificar a acusação de que não há políticas alternativas à austeridade a conta gotas do governo. Ou seja, para o primeiro-ministro os contribuintes, os funcionários públicos, as famílias, as empresas e agora os pensionistas, devem continuar alegremente a perder poder de compra e a sacrificarem-se em prol da sua agenda "modernizadora" e "endividadora" (o TGV continua, as PPPs das estradas idem, e o endividamento da Parque Escolar idem idem) e da deplorável execução orçamental deste governo. 
E, como é óbvio, todos os portugueses se devem sacrificar para que o Estado continue exactamente como está. É que em 4 pacotes de austeridade, pouco ou nada se viu em relação ao emagrecimento do Estado. Ou seja, sobem-se os impostos, cortam-se os salários e reduzem-se as pensões, mas ninguém ousa atacar a gordura do Estado. Não há uma estratégia para fazer diminuir o rápido crescimento dos consumos intermédios do Estado (i.e. as compras de bens e serviços dos organismos públicos) e muito menos para reduzir radicalmente o número de institutos públicos e outras entidades afins. Por que será?
Por outras palavras, há muito por onde poupar nas despesas estatais. O que falta é vontade e capacidade política para o fazer. Como já defendi várias vezes e afirmei recentemente no debate no Massa Monetária: "Do lado das despesas há muito por onde cortar, incluindo:
a) 10% dos consumos intermédios do Estado
b) 10%-15% das despesas de todas as entidades e organismos públicos não essenciais.
c) 10% e 20% dos encargos gerais do Estado (i.e., governo, Assembleia da República, etc.)
d) fim das ajudas e créditos fiscais a muitas das centenas de fundações que o Estado apoia.
e) uma real reforma do Estado que leve à fusão e extinção entre 30% e 50% de todas as entidades e organismos públicos."

Como é visível, não há, assim, alternativa à austeridade a conta gotas do governo. Pois claro que não. Aliás, se nós hoje temos a dívida pública mais elevada dos últimos 160 anos e a dívida externa mais alta dos últimos 120 anos, o que é que nos teria acontecido se não tivessemos tido a sorte de ter um governo tão competente à frente dos destinos do país?

5 comentários:

José Luiz Sarmento disse...

E a oligarquia rentista que vive do Estado há 150 anos? Nem uma palavra sobre ela? Não se podia cortar também por ai? Melhor: não seria por aí que se deveria começar a cortar?

Pedro Teixeira disse...

Qualquer crise tem sempre o poder de se transformar numa oportunidade. É nos tempos de restrição que o intelecto humano cria formas de mudança e de desenvolvimento. Não querendo glorificar uma tragédia que acontece neste momento no Japão, mas o facto de ela ter acontecido está já a fazer reflectir uma boa parte do mundo sobre os seus programas nucleares.

A propósito da crise económica / crise orçamental na qual estamos mergulhados, a austeridade apenas é importante e "moralizadora", se ela vier acompanhada de medidas que garantam que o que levou à necessária austeridade não voltará a acontecer. Quer isto dizer, ciclos negros de redução do poder de compra (através de mais impostos e menos redistribuição) nunca levarão à recuperação, quer das finanças públicas (que irão sofrer com a queda dos rendimentos e aumento da fraude), quer especialmente da economia portuguesa. Mas se os sacrifícios tiverem como contrapartida mudanças de regime económico que possam fazer acreditar que o futuro será melhor, daí poderá vir algo de positivo. Assumo que fui um dos que acreditou que a crise em que nos metemos, e especialmente a pressão internacional de quem nos sustenta, iria levar finalmente à adopção de medidas modernizadoras na nossa economia, que nos permitisse finalmente recuperar competitividade e entrar no comboio da globalização. Infelizmente, por falta de vontade política, ou simplesmente por ignorância e incapacidade dos nossos governantes, continuo à espera de um sinal de que a actual austeridade culminará num ciclo virtuoso.

Guillaume Tell disse...

Eu proponho que o senhor Santos Pereira seja o próximo ministro das Finanças.
Estava à espera de uma oportunidade para regressar não é? Seria uma bela forma de regressar.

osátiro disse...

Essa alínea d) é perigosa.
Então de que ia VIVER MSOARES sem os milhões que recebe sob a capa da Fundação Mário Soares???
E os milhões da Fundação José Saramago para a viúva alegre viver nos maiores luxos capitalistas?
E a Fundação Cidade de Guimarães?
Etc,etc,etc,
Acabava o parasitismo da esquerda...
muito perigoso isso.....lool

Fonseca disse...

Muito Bom Professor!
Gostaria que comentasse a seguinte frase do FMI à 2 anos atras.
"Portugal take the risk to suffer sluggish economic «downturn»!"